Parte XIV - Luz
- Como pretende nos ajudar? - Belinda disse enquanto comia alguns biscoitinhos, a carruagem balançava dando alguns solavancos que fazia Belinda quase pular de seu assento.
- Como já disse, sou amigo do rei, acredito que ele aceitará lhe hospedar durante um tempo em seu castelo se disser que você é minha filha e que precisa de proteção.
- Porque eu precisaria de proteção?
- Bom, somos uma família antiga, temos muito dinheiro, posses que podem ser usadas como pagamento em um possível sequestro.
- Aposto que tem muitos inimigos também.- Eros disse enquanto olhava pela janela.
- Sim.- O homem disse olhando para Eros.- Acredito que queira me perguntar algo meu rapaz.
Belinda não sabia bem o que estava acontecendo, os ombros de Eros estavam tencionados e o garoto olhava vidrado para fora da carruagem, como se tentasse evitar os olhos cor de avelã do homem a sua frente, a garota resolveu então ficar calada e apenas observar.
- Sabe alguma coisa sobre... Lucina?- Eros perguntou e Belinda viu seus olhos ficarem mais escuros.
- Lucina, se não me engano ela é sua mãe correto?- o homem perguntou e Eros assentiu com a cabeça.
- Acho que você sabe mais do que somente o fato de ela ser minha mãe.- Eros falou olhando nos olhos do homem que se encostou em seu banco como quem tenta lembrar de algo.
Belinda nunca viu Eros citar ao menos a lembrança da mãe dele, foi a primeira vez que a garota se perguntou o que teria acontecido.
- Diga algo.- Eros falou e o homem finalmente abriu seus olhos.
- Lucina era uma mulher brilhante, cheia de luz, nunca conheci alguém tão incrível quanto ela.- O homem falou olhando para fora da carruagem, parecia ser uma espécie de lembrança dolorosa.- Eu me lembro quando a conheci, estava correndo pelo campo, meus pais nunca me deixavam entrar na floresta, não sabia a razão, certo dia decidi que queria explorar, ir um pouco mais longe do que de costume, quando vi estava cercado de...criaturas, coisas não humanas, naquele dia Lucina me ajudou a escapar, foi a primeira vez que eu a vi.
Belinda olhou para Eros e seus olhos continuavam escuros, ele olhava fixamente para De Castro que contava a história tranquilamente, como se tivesse medo de chegar no fim.
- Vocês eram amigos?- Eros perguntou.
- Bom, algo do tipo, você tem os cabelos dela sabia?
- Já ouvi algo do tipo.- Eros falou impaciente.
- Crescemos juntos, ela fugia da floresta e eu a escondia em meu quarto para brincarmos, depois, um pouco mais velho, ensinei ela a ler em francês e outras línguas, ela amava a biblioteca que tínhamos em nossa casa e assim fomos criando uma espécie de laço, por volta dos nossos dezessete anos Lucina começou a demorar mais para aparecer, eu não sabia na época mas ela havia se apaixonado por alguém, o seu pai.- Eros olhou para o homem que abriu um sorriso melancólico.
- Entendo.- Eros disse e Belinda se remexeu em seu banco, a garota queria entender melhor.
- Veja, eu era apaixonado por ela, mas tudo que ela sentia por mim era amor de irmão, crescemos juntos, ensinei tudo a ela. Quando descobri, acabei sendo tomado por um impulso, queria saber quem era esse homem, queria ver com meus próprios olhos, desde o dia em que Lucina me salvou eu nunca mais havia adentrado na floresta, mas minha mente teimosa e ciumenta não pensou nas consequências e eu a segui depois de uma de suas visitas. Ela foi seguindo cada vez mais fundo na floresta, até que eu vi, seu pai, estava com outros amigos, ela pulou em seus braços, lembro como se fosse hoje, também lembro de sair correndo tropeçando em meus próprios pés, não sei bem como mas rolei uma ribanceira e bati com a cabeça.
O homem de repente parou de falar puxou seu grosso cabelo paro o lado, exibindo ali uma cicatriz de algo que antes deveria ter sido um corte longo e profundo.
- Eu deveria ter sangrado até a morte se não fosse o fato de que Eleor me achou e me levou para casa, lá eu pude ser socorrido, seu pai salvou minha vida naquele dia. Grato a ele eu permiti que tanto Lucina quanto Eleor se encontrassem em minha casa, com o tempo eu fiquei amigo dele também, minha paixão por Lucina nunca acabou, mas ela estava feliz e isso era tudo o que eu desejava para ela.
- Estamos quase chegando!- Alguém gritou de fora e De Castro bateu com sua bengala na porta para indicar que havia ouvido.
- Muito bem garoto, muita história por hoje, mais tarde eu lhe conto o resto.
Eros iria abrir a boca para protestar mas a carruagem diminuiu a velocidade parando em frente a um casarão rodeado de rosas e árvores cuidadosamente podadas.
- Eu irei mostrar onde vocês vão ficar e cuidarei de mandar a carta ao rei Marcos, confie em mim Eros, se depender disso você e Belinda estarão no castelo logo logo.
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Naquela manhã enquanto Belinda tomava um delicioso desjejum e o senhor de De Castro mandava uma carta para o rei, Eros impacientemente batucava com seus dedos a mesa, o som irritava Belinda mas ela decidiu ignorar, dado ao fato de que a testa franzida de Eros demonstrava sinal de estresse e raiva.
- Meu querido Eros, você poderia parar um instante com este som? Preciso me concentrar nesta carta.- De Castro pediu e Eros parou de bater.
- Acha mesmo que isso vai funcionar?- Eros perguntou sem um fio de paciência.
- Claro, irei mandar hoje mesmo a carta, creio que logo receberemos a resposta, mandarei vocês o mais cedo possível, recebi notícias e o reino tem feito avanços territoriais na floresta, ameaçando várias das fadas das flores. - De Castro falou e Belinda observou como o homem parecia por dentro de toda a situação, muito mais por dentro do que ela própria.
- Como você sabe disso tudo? - Belinda perguntou inocentemente.
- Tenho recebido relatórios de Eleor, ele conseguiu essas informações, mas não sei como.
Naquele mesmo instante um pássaro azul entrou pela sala de jantar, ele piava incessantemente como quem tenta chamar atenção.
- Acho que ele quer que você o siga.- Eros falou olhando o passarinho que rodeava a cabeça de Belinda.
- Está bem! - Belinda falou tampando os ouvidos, no mesmo instante o pássaro tomou rumo e Belinda o seguiu.
Eros vinha logo atrás seguido por um De Castro muito curioso, o homem hora ou outra coçava a cabeça em sinal de surpresa e estranhamento.
- Ele está indo para a floresta!- Belinda disse quando vou o pássaro tomar rumo.
- Bom, eu fico por aqui, sabe, não tenho muitas lembranças boas dali, se quer sou bem vindo.- De Castro disse se encostando em uma árvore que ficava ainda em seu terreno.
- Vou com Belinda.- Eros falou não dando espaço para qualquer discussão.
Ele e Belinda seguiram o curioso passarinho, adentraram na floresta que estava calma e um tanto úmida, Belinda tirou seus sapatos onde o salto afundava sem parar e os segurou na mão, Eros simplesmente se manteve em silêncio enquanto seguiam um estreito caminho entre as grossas árvores, quase que de repente o passarinho começou a piar mais alto, balançando as azas e rodeando uma árvore, esta era mais grossa que as outras ali presente, com frutos grandes e vermelho vivo, seu fruto parecia suculento, o que fez Belinda se esticar para tocar.
- Se queres um amoreira tem que pedir!- O som vindo da árvore assustou Belinda que deu um pulo para trás.
- Puta que pariu! - Belinda exclamou levando uma de suas mãos para o coração.
A árvore começou a abrir no meio, o estalar de galhos quebrando foi ouvido e dali saiu uma mulher, seus cabelos eram da cor do fruto daquela árvore, eles flutuavam como se uma leve brisa estivesse soprando, embora ali não houvesse nenhum tipo de vento, sua pele era branca da cor de papel e brilhava, em suas costas longas asas repousava, elas pareciam como renda fininha e delicada, eram de uma cor de violenta. A mulher ergueu uma de suas mãos até um dos frutos e em seguida murmurou algo, o fruto caiu delicadamente em sua mão.
- Faça um pedido!- A mulher falou para Belinda.
- Não faça nada!- Eros falou logo em seguida.
A estranha mulher olhou para Eros e inclinou a cabeça de lado como quem se diverte.
- Você sabe que isto não vai me ferir não é?- Ela falou se referindo a longa espada que Eros segurava com maestria.
- Não custa tentar.- Eros falou simplesmente.
- Tudo bem, eu estou em paz!- A mulher falou novamente e Eros abaixou a espada.
- Espera, só porque ela disse isso você confia nela?- Belinda perguntou e a mulher sorriu.
- Ela é uma fada, fadas não podem mentir se não perdem sua magia ou suas asas.- Eros disse e Belinda olhou de volta para a mulher.
- Então... Fadas existem mesmo?
- Ora, é claro que eu existo!- A fada disse batendo suas asas.
- Mas que coisa, nunca vou me acostumar.- Belinda falou mais para si mesma.
- Está bem, não tenho tempo a perder, tenho recados da Mãe Natureza!
- Que recados? - Belinda perguntou e a mulher simplesmente meteu a mão na própria barriga, tirando dali um grosso pergaminho que ela abriu.
- Há, eu vou sonhar com isso!- Eros falou coçando a cabeça.
- "Querida filha!"- A mulher pronunciou e Belinda revirou os olhos com tédio. - "O reino tem feito avanços por todo o nosso território, estou perdendo forças, criaturas estão morrendo, preciso que aja rápido para que possamos voltar ao equilíbrio de nossa nação."
- Ok, já entendi!- Belinda falou sem paciência.
- Eu ainda não terminei de ler!- A mulher falou e Belinda se calou.- "Preciso que faça exatamente o que eu te pedir, devido a todas as infrações que o rei vem fazendo nós não vemos outra escolha."- Dito isso a mulher fez uma pausa e Belinda trocou o peso de uma perna para outra.- "Nós precisamos"- ela continuou.- "que mate o rei!"
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