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Ella Branco
O grande dia. O dia para o qual me preparei desde o momento em que meu tio destruiu minha inocência, ignorando a dor que me causava, a dor que marcaria minha vida. Agora, eu estava na delegacia, acompanhada por Mason, Levi, Natasha, meu pai, e António. O peso de tudo estava em meus ombros, mas eu sabia que a decisão que tomaria hoje seria a melhor escolha.
Queria acabar com o sofrimento que me corroeu por tanto tempo, exterminar o pesadelo que aquele homem plantou na minha vida.
Enquanto todos conversavam mais adiante, eu permaneci sentada no sofá da sala os observando. Hércules, deitado ao meu lado, pressentia a gravidade do momento. Eu precisava daquele breve instante de solidão, um tempo para organizar os pensamentos e preparar meu coração para o que estava por vir.
Hoje, eu o enfrentaria. Seria a última vez que cruzaria meu caminho. E, por tudo o que foi tirado de mim, eu garantiria que esta fosse também a última noite dele.
-Como vamos saber que João está mesmo na antiga casa? - perguntou meu pai, a dor evidente na voz. -Na casa onde tudo começou?
-Kaio e Luca estão vigiando de perto. - respondeu Valverde, com firmeza. -Tudo ficará bem. Hoje mesmo João será preso.
-Se fosse você, não teria tanta certeza. - murmurei, mais para mim mesma do que para eles.
O silêncio momentâneo que se seguiu foi pesado. Seus olhares recaíram sobre mim, mas logo voltaram ao plano meticulosamente redigido por Steve, que delineava cada passo para este momento. Para eles, tudo precisava ser metódico, estratégico. Mas para mim, não havia necessidade de nada disso.
Eu não precisava de um plano.
Anos de traumas, de medos e de ódio já haviam traçado a linha reta que eu seguiria. E essa linha só tinha um destino: O fim dele!
Meu tio morreria hoje...
Hércules me notou tensa e com a sua grande parte de um pastor alemão a colocou sobre a minha perna me admirando. Ele sentia a minha ansiedade e a minha hesitação, ele era um cão treinado...ele era um cão de polícia.
-Temos tudo preparado! Pérola levará uma arma caso precise. - Paul anunciou, com um tom resoluto.
-Isso não me anima nem um pouco. - murmurou António, sombrio.
-Pérola é hábil! - Steve rebateu, levantando-se e cruzando os braços. -Ela irá e arrancará toda a confissão de João.
-Eu estou pronta, chefe! - Pérola respondeu, com determinação.
Mas algo dentro de mim se agitava...
Eu QUERIA ir.
Eu TINHA que ir.
Era MINHA a obrigação.
-Eu irei! - minha voz saiu baixa, mas carregada de uma convicção que calou todas as outras vozes. As atenções se voltaram para mim como flechas disparadas. -Ele quer a mim. Então eu vou.
-Ella, não... - Natasha deu um passo em minha direção, seu tom carregado de preocupação.
-Não precisas fazer isso, filha. Não outra vez... - meu pai disse, a tensão evidente em cada palavra.
-Já vivi demais com esse pesadelo! - repliquei, sentindo o peso do meu próprio desespero. -Sou eu quem tem que acabar com isso, e vocês sabem muito bem que se Pérola for, ele não dirá nada. Deixem-me ir.
-Ele é imprevisível, Ella. Não vou arriscar tua vida por causa dele novamente. - Steve concluiu, sua expressão endurecida enquanto lutava com a decisão. Ele hesitou por um instante antes de continuar. - ...mas, se sentires que estás pronta...
-Eu estou. - respondi sem hesitação, minha voz agora firme.
Todos se entreolharam, hesitantes, a tensão visível em seus rostos. O momento era delicado, e o ar na sala parecia mais pesado quando Mason e Levi entraram. O silêncio se aprofundou, os olhares mergulhando em minha direção.
-O que se passa? - Levi perguntou, confuso, enquanto seus olhos se fixavam em mim.
-Eu irei... - declarei, minha voz quebrando o silêncio.
-Irás? - Mason questionou, incrédulo.
-Ella irá ter com o tio, uma última vez. - explicou Paul, com a voz firme.
-Não! Tu não vais. Não tu, eu vou, vou por ti! - Levi veio até mim apressado, suas mãos emoldurando meu rosto enquanto lágrimas enchiam seus olhos. -Já sofreste demais por causa dele... - sua voz falhou, mas seus olhos suplicavam. -Não faças isso. Promete-me, diz que isto é só uma brincadeira. Por favor, irmã.
Hesitei por um momento, mas quando o abracei, senti seu corpo desabar completamente. Ele sabia. Não havia mais escolha. Este era meu momento, o único em que eu poderia acabar com tudo.
O momento da minha VINGANÇA.
-Ella! - a voz de Steve ecoou pelo escritório, chamando minha atenção. -Vem cá! Vamos repassar todo o processo.
-Eu não preciso disso. - cruzei os braços, mantendo a voz firme. Eu já não tinha medo. - Meus instintos e minha vingança me levarão até onde quero. Sei exatamente onde ele estará na casa.
-O quarto, anjinho? - Natasha perguntou, sua voz carregada de receio. -Por favor, Ella, não vás.
-Eu preciso! - repliquei, a intensidade das minhas palavras cortando o ar. -Preciso libertar toda essa dor que está em mim, e vocês sabem, mais do que ninguém, que isso é verdade.
Valverde suspirou fundo, mas não tentou argumentar. Sabia que eu estava decidida.
Quando pegamos os carros e dirigimos até poucos metros da casa, meu estômago se revirou. Não era pânico. Era preparação. Eu precisava tornar minha mente à prova de balas. João não iria me afetar novamente.
Ainda dentro da carrinha, Steve se aproximou e se colocou diante de mim. Suas mãos firmes pousaram sobre meus braços, e seus olhos não deixaram os meus por longos segundos. Ele estava aflito, isso era claro.
-Não precisas fazer isto, Ella. - sussurrou, sua voz fraca e quase suplicante.
-Não, não preciso. - respondi, com firmeza. - Mas mais do que ninguém, eu mereço isso. Eu mereço esta vingança.
-Ella...
-Eu ficarei bem. Tudo isso acabará rápido.
Steve suspirou profundamente, resignado. Pegou um colar com uma pequena câmera e um auricular, colocando-os com cuidado em mim. Sem dizer mais nada, entregou-me sua arma já carregada. O peso dela em minhas mãos parecia confirmar o que eu já sabia: eu estava pronta. Este era o momento mais importante da minha vida, o que eu esperara por tanto tempo.
-Sabes usá-la? - perguntou, ainda com a voz hesitante.
-Lopez fez questão de que eu aprendesse a me defender. Ele me preparou para este momento.
-A hora é agora. Ella... - Pérola se aproximou, o rosto sério e atento. -Estás pronta?
-Eu renasci pronta.
Confiante, lancei um último olhar para todos dentro da carrinha. Suas expressões diziam mais do que palavras: preocupação, medo, e talvez, uma centelha de esperança. Respirei fundo, virei-me, e segui caminho. Cada passo era deliberado. Cada respiração era medida. Minhas mãos estavam firmes, prontas para o grande momento.
Esta noite, tudo terminaria...
Quando cheguei à frente da casa, um turbilhão de memórias tomou conta de mim. Imagens de momentos sombrios, medos profundos, e desconfortos insuportáveis emergiram como fantasmas. Este lugar era o berço de tudo o que me assombrava.
A porta da frente estava entreaberta, rangendo suavemente com o vento. A escuridão dominava o interior, e o silêncio cortante parecia amplificar cada batida do meu coração. Meus sentidos estavam em alerta máximo.
Eu sabia que ele estava lá dentro. E eu também sabia que não sairíamos os dois vivos.
Andei pela sala, e as lembranças tentavam cortar meu coração como facas afiadas. Mas não podia permitir que isso me dominasse. Precisava manter o foco. Quando finalmente ouvi o som de passos vindo do corredor, meus olhos se voltaram instantaneamente para o meu antigo quarto. Aquele quarto que eu jamais esqueceria.
-Fico tão feliz que tenhas vindo, sobrinha! - a voz do meu tio ecoou, carregada de sarcasmo, enquanto ele surgia no corredor com um sorriso provocador. -Aceitas o convite para entrar?
Eu queria, e nada, nem mesmo as ordens explícitas de Steve e Valverde no meu ouvido, me impediria agora. Combati cada sombra de dúvida dentro de mim para estar novamente diante dele. Faria isso quantas vezes fossem necessárias, até vê-lo em um túmulo.
-Vamos acabar com isto. - minha voz cortou o silêncio quando entrei no quarto.
As paredes brancas estavam desgastadas pelo tempo, mas ainda reconhecíveis. O piso de madeira, com vestígios do sangue daquela noite, parecia inalterado, como se o próprio tempo tivesse preservado o horror que ele representava.
-Esperei tanto por este reencontro... - ele avançou, a voz gotejando desprezo. Instintivamente, minha mão foi para a arma escondida atrás das minhas costas. -Hesitante para me dizer que ainda me amas? Que fui eu quem te salvou a vida? Que fui eu quem te fez mulher?
-Tu nunca me ensinaste nada! NUNCA! - minha voz saiu carregada de raiva. -Aquela noite, contudo, me ensinou algo: que nem mesmo na nossa própria família se pode confiar.
Minhas palavras rasgaram o ar como lâminas. O silêncio que se seguiu foi tão cortante quanto a voz que ouvia no auricular, tentando me acalmar. Ignorei-a. Eu sabia o que estava fazendo.
-Eu posso ter muitos defeitos, Ella. Posso ser um destruidor de vidas...mas mentiroso, nunca fui. E tu sabes disso mais do que ninguém.
Engoli em seco, mas não
deixei minha postura vacilar.
-Já te disse isto antes?...Foi tua mãe quem me pediu para te bater, para te ferir, para te violar. - sua voz saiu firme, sem qualquer hesitação. -Pois é! Tua mãe nunca foi um exemplo de mãe e muito menos e mulher. E olha só onde ela está agora: na prisão, por fingir a própria morte.
Minha respiração acelerou,
mas mantive os olhos fixos nele.
-E tu não escaparás dela também.
-Sério? - ele deu mais um passo em minha direção. Num reflexo, apontei a arma para ele. -Ah, Ella! - ele riu, como se estivesse se deliciando com a cena. -Não consegues imaginar o quanto amo ver-te assim. Olha para ti, tentando parecer forte. Mas no fundo, sempre foste uma fraca. Nunca serás como eu.
Dei um passo à frente, mantendo a arma firme.
-Tens razão. Eu nunca serei como tu. Porque nunca me rebaixaria a tanto para alimentar a minha própria felicidade.
Ele gargalhou, um som seco e vazio.
-Ah, sobrinha! Que palavras comoventes. Pena que me esqueci de chorar.
A raiva atingiu meu limite. Num impulso, joguei a arma para perto do armário embutido, ignorando as vozes de cautela no meu auricular. O sorriso cínico do meu tio me provocava, e aproveitei o momento para me aproximar.
-Eu posso até ser fraca... - falei, minha voz carregada de fúria. -...mas aqui, dentro destas paredes, sou quem tem a máxima agilidade cerebral!
-Mostra-me. - ele desafiou, seu tom encharcado de desdém.
Sem hesitar, desferi um soco em sua face. Ele cambaleou por um instante, mas se recuperou com um sorriso sarcástico, quase como se estivesse gostando. Isso apenas alimentou minha fúria. A luta escalou quando ele agarrou meu cabelo, puxando-me com força até me posicionar diante do espelho de parede perto da porta.
Ele queria me quebrar. Queria me fazer encarar meus medos, submeter-me à escuridão de meus traumas, flutuando ao meu redor como fantasmas.
-TU NUNCA SERÁS COMO EU! NUNCA! - ele rugiu, seus dentes cerrados enquanto se agachava, sem soltar meu cabelo. -SEMPRE SEREI SUPERIOR! SEMPRE!
O impacto da minha cabeça contra o vidro foi brutal. As palavras dele ecoaram em minha mente, como facas perfurando a pele. Mas minha força não cedeu. Com um movimento rápido, dei uma cotovelada em seu peito, forçando-o a soltar-me momentaneamente. Meus olhos procuraram desesperadamente pela arma.
Precisava alcançá-la!!!
Mas antes que pudesse, ele me puxou pelo pé, arrastando-me de volta ao chão. Caímos em uma guerra selvagem, uma batalha de vida ou morte. Segundo a segundo. Respiração a respiração. Suas mãos apertavam meu pescoço com força crescente, e minha visão começou a escurecer. Lembrei das lições de Lopez, de suas palavras firmes: "-Sempre há uma saída, mesmo na escuridão." Reuni toda a força que me restava e lutei. Quando finalmente minhas mãos encontraram a arma, não hesitei. Disparei três tiros. Um. Dois. Três. Todos no peito do meu tio.
Ele caiu para trás, e a
pressão no meu pescoço desapareceu.
-Isso acabou. - murmurei, quase sem forças, meu corpo desabando no chão. Cada fibra do meu ser clamava por socorro, mas eu sabia que era o fim.
Meus ouvidos latejavam, minha respiração estava irregular, mas não deixei de ouvir a voz do meu irmão ecoando pela casa vazia.
-Ella!
Seus passos rápidos soaram como um trovão. Quando ele entrou no quarto e me viu, parou por um segundo, chocado. Então, ajoelhou-se ao meu lado, segurando-me com firmeza, como se sua presença fosse o suficiente para me manter viva.
Sempre há alguém em quem podemos confiar...
Logo, os outros começaram a chegar. O ambiente antes carregado de terror agora parecia mais leve. Então, a voz de Steve quebrou o silêncio. -Confirmado. Óbito. - essas palavras encerraram tudo.
Minha ALMA, finalmente, poderia descansar.
Meu CORAÇÃO, lentamente, começaria a se acalmar.
E minha MENTE...talvez, por fim, estivesse livre dos pesadelos.
-Enfim acabou, Ella. - Natasha se ajoelhou ao meu lado, beijando minha testa com carinho. Sua voz soou como um sussurro gentil. -Acabou, anjinho. Tudo.
Respirei fundo, sentindo o peso
de anos finalmente se dissolver.
Oie gente, novo capítulo aqui na área da vossa querida autora Mary, temos novos capítulos todas as terças e sextas-feiras ás 19h em Portugal e às 15h no Brasil.
Obrigada, beijinhos!
Boa Leitura 🩷
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