Capítulo 50 - Me ensina
Fiquei esperando o Rei pegar um microfone ou algo do tipo, mas então lembrei que eles não precisam. Têm aquela audição de super herói.
— Vocês devem estar se perguntando o motivo desta festa inusitada. Pois bem... — Olhou brevemente para mim. — Conseguimos criar a cura.
Quê?
Conseguimos? Eu criei a cura sozinha, velho nojento!
Neste momento, um murmurinho tomou conta do local.
— Por favor, me deixem continuar... Obrigado. — Ele voltou a me olhar. — Agora precisamos testá-la, mas para isso... — pigarreou e depois, abaixou o olhar. — Continue, humano.
Ok. Minha vez.
Dei um passo para frente ao mesmo tempo em que o pai do Zaphy recuava outro. Fechei os olhos a fim de encontrar as palavras certas. Eu não podia deixar aquele monte de aliens em pânico.
Seria perigoso demais.
— Bom... — Olhei de um lado a outro, ainda procurando aquele mimado. — Para testar a cura, precisarei de três voluntários. Três de vocês. — O murmurinho voltou a aparecer, dessa vez um pouco mais intenso.
— Silêncio por favor — pediu o Rei, e imediatamente a calmaria ressurgiu.
Se ele não fosse ele, eu até agradeceria.
Respirei fundo antes de continuar.
— Os três voluntários serão contaminados com o vírus e logo depois, receberão uma dose da cura — aumentei o tom pois o falatório tomou conta de repente. — Infelizmente não há outra forma de testá-la ou garantia que funcionará! — me vi obrigada a quase gritar no final.
Ironicamente, após eu ter terminado, o silêncio reinou. Acho que eles ficaram esperando mais informações, porém era só isso o que eles precisavam saber.
Sendo assim, o Rei voltou a tomar a frente, e eu, me deixei respirar com um pouco mais de alívio.
Aquele monte de olhos negros sempre me causarão aflição.
— Sei que é uma decisão difícil. — Notei que suas mãos estavam inquietas. — Dói em mim lhes pedir algo desse tipo, mas é muito importante lembrar que não estará fazendo isso por você, nem por esse ao seu lado ou por aquele atrás de ti, mas sim por uma raça inteira. Um planeta inteiro. Uma espécie que foi brutalmente destruída sem nem ao menos saber que mal havia feito para merecer algo tão cruel... — ele parou bruscamente, me permitindo sentir um ar emocionado nele.
Sério que eu estava com pena dele?
— Enfim, se nenhum de vocês se voluntariar, eu irei entender. Não se sintam obrigados a nada.
O Rei levou as mãos para trás e ficou apenas aguardando alguém se pronunciar. Cruzei meus braços, fazendo o mesmo.
Aquele silêncio continuou no amplo salão. Todos aparentavam estar muito angustiados, e com razão. O que estávamos pedindo, era que arriscassem as suas vidas. Confesso que eu não sei se teria coragem.
— Eu vou.
Uma alien se manifestou. Parece jovem e tímida, seu rosto rechonchudo levemente rosado destacava isso. Ou só estava nervosa mesmo.
Sem demora, ela começou a subir.
— Você sempre será lembrada, Surdja 65. — o Rei a cumprimentou quando a mesma chegou no topo da estrutura, unindo sua testa à dela
Não demorou muito e outro voluntário levantou o braço.
— Eu também quero ir.
Esse deveria ter a mesma idade do Zaphy, e assim como ele, também era muito bonito. Não tanto quanto, mas não deixava de ser bem atraente.
— A Primeira Potência nunca se esquecerá de tal atitude, Torpak 51.
Após receber o cumprimento, ele me olhou sério e foi se juntar à outra alien, do lado esquerdo do Rei. Me mantive logo atrás deles.
— Tem vaga para mais um, meu Rei?
Aquela voz infelizmente conhecida invadiu os meus ouvidos.
Dashni!
Sem esperar uma resposta do pai do Zaphy, ele subiu. Me olhou de baixo para cima e em seguida, se dirigiu ao Rei.
— Sua existência jamais será esquecida, Dashni 52. — o Rei fez o mesmo cumprimento com ele, unindo suas testas
Depois o velho se virou para trás, onde estavam eu e o Nepo.
— Já pode tirar isso daqui — falou baixo ao Nepo, se referindo a mim.
Velho nojento!
— Pode deixar que eu a levo. — Dashni simplesmente surgiu ao meu lado.
Recuei um passo, já sentindo a repulsa tomar conta do meu corpo.
— Não será necessário, Dashni. — Nepo pronunciou o nome dele de maneira estranha, enquanto me puxava pelo braço.
Ao tocar no chão, soltei o restante do ar que eu ainda estava prendendo. Esses minutos pareceram horas. Então, o Rei continuou tagarelando sobre algo que não quis prestar atenção.
— Para onde eu vou agora? — perguntei, voltando a procurar o Zaphy.
Onde será que estava aquele babaca idiota?
— Ele não está aqui. Desista. — Nepo sentou-se à uma das mesas, onde possuía comida e uma garrafa com um líquido escuro pela metade, garrafa essa que lembrava muito um funil. — Me faça companhia, pily.
Eu até perguntaria o significado de "pily" se não estivesse mais interessada em saber outra coisa.
Sentei.
— Sabe onde ele está?
— Não sei e nem quero saber. — Levou a garrafa aos lábios.
A voz do Nepo já parecia diferente. Acho que estava ficando bêbado.
Mas tão rápido assim? Essa bebida alienígena é da boa.
No entanto, os meus pensamentos mudaram do foco "estado do Nepo" para o "paradeiro do Zaphy". Será que ele estava com a princesa? Não! Óbvio que não. Porém, de qualquer forma era melhor eu ficar na festa sem graça para caso ele aparecesse.
Então, comecei a beliscar a comida alien para passar o tempo, quando do nada, Nepo levantou-se e pegou uma garrafa que estava em outra mesa.
— Não acha que está bebendo demais?
— Não — riu como se tivesse ouvido a melhor piada do mundo.
Logo a segunda garrafa já estava quase no fim, e o Nepo começou a falar coisas sem sentido com quem passava perto da nossa mesa.
— Como chama aquela coisa que você e o filho do Rei fazem com a boca?
Impressão minha ou ele não estava pronunciando o nome do Zaphy de propósito?
— Beijo — respondi no automático, pois a minha cabeça estava em outro lugar.
Mais especificamente, no lugar onde aquele imbecil estava. E fazendo o quê! E com quem!
A raiva já estava começando a me dominar.
— Me ensina.
Levantei os olhos, encontrando um olhar negro animado.
— Não sei como te ensinar isso. — Apoiei meus cotovelos na mesa e descansei o queixo nas mãos.
Além da raiva, eu estava ficando entediada. Odeio festas humanas, e naquele momento, descobri que odiava festas alienígenas também.
— Faz comigo. — Deixou a garrafa vazia de lado.
Ah, vai sonhando que eu vou beijar um alien gay. Pior ainda, um gay bêbado.
— Eu não vou te beijar, Nepo.
— Por que não? — sua voz estava horrivelmente lenta.
Respirei fundo, reprimindo a irritação.
— Porque não! — Virei o rosto na direção de uma das entradas do salão.
O Zaphy tinha que aparecer!
— Você tem vergonha porque eu sou... — Levantou-se de um jeito desengonçado, de modo que deixou uma das garrafas cair e se espatifar no chão. — Você é igual ele!
Será que o Nepo havia esquecido que é viado e que, tecnicamente, eu não estava solteira?
No segundo seguinte, Nepo sumiu no meio dos outros aliens antes de receber uma resposta, me deixando completamente sozinha.
Mereço!
Continuei revirando a comida e olhando em volta à procura do Zaphy. E foi assim quê, enquanto eu guiava a mão à boca segurando um dos bolinhos azuis, o mesmo caiu sobre a mesa e foi rolando até encontrar o chão, após a minha mão tremer e meu coração parar no momento que os meus olhos encontraram os olhos dele.
O imbecil estava encostado na parede e seus braços quase dobraram de tamanho com a forma firme que ele os cruzou. A perna flexionada com o pé apoiado na parede, me obrigava a olhar para a sua região que eu não conseguia mais viver sem.
Seu semblante sério, o qual carregava olhos cerrados... só fez aumentar a minha vontade de correr até ele e agarrá-lo.
Céus, por que ele tinha que aparecer assim, tão sexy?
Acordei daquele transe e engoli em seco, no instante que ele começou a seguir em minha direção.
Por qual motivo, depois de tanto tempo, o meu corpo ainda agia como se eu estivesse o vendo pela primeira vez?
Caminhando devagar, Zaphy não tirava os olhos dos meus. Na verdade ele nem piscava. E foi então que me senti obrigada a levantar, no instante que ele ficou a poucos passos de onde eu estava. Contudo, uma onda de indignação tomou conta de mim quando ele simplesmente virou para a esquerda e sentou-se à mesa em frente a minha.
O que foi isso?
Voltei a me sentar. Mas não por querer sentar e sim porque não consegui ficar de pé.
Sem ter controle sobre os meus olhos, me peguei observando-o, e foi nesse mesmo momento que ao se sentar, Zaphy sorriu para a alien em sua frente.
Por que ele sorriu pra ela?
Não pude ver o rosto dela pois estava de costas pra mim, porém seus cabelos eram bonitos. Um tom de loiro dourado, diferente do platinado das outras aliens que vejo sempre pelos corredores.
Só podia ser a tal princesa!
Corri meus olhos pela mesa em que ele estava. Seu pai se encontrava de um lado e um outro alien, com um pouco de idade, mas não tão velho quanto o Rei, estava do outro lado.
Resolvi parar de olhar e concentrar toda a minha atenção nas minhas unhas. Eu precisava me acalmar antes que eu tivesse um ataque de fúria e acabasse com aquela festinha de merda!
— Como teve coragem? — uma voz familiar soou às minhas costas.
Mesmo achando que não era comigo, virei-me e me deparei com a ET vadia me fuzilando com seus olhos do capeta.
Será que ela estava com ele? Apareceram quase que ao mesmo tempo.
— Péssima hora para conversar, cadela! — Nem me dei ao trabalho de controlar a violência das palavras.
Zukmi então, bateu com as mãos espalmadas sobre a mesa, fazendo com que as coisas em cima ela tremessem.
— Péssima foi a lavagem cerebral que fez no príncipe. Não pense que você será a única para sempre.
Eu ouvi direito?
— Nunca pensei que justo você melhoraria o meu humor. — Sorri de orelha a orelha.
Ela se afastou um pouco.
— Como tem o atrevimento de rir desse jeito?
Pronto, agora ela estava reclamando até da forma como rio.
Levantei, ficando de frente para ela de braços cruzados, sem conseguir desfazer o sorriso.
Saber que ela estava irritada com o fato de eu ser a única, realmente me deixou com um ótimo humor.
No entanto, de repente sua expressão também ficou risonha.
— Você me odeia porque sabe, que o Príncipe esteve mais tempo comigo do que você jamais conseguirá ficar. Ou será que é tão iludida a ponto de achar que ele, abandonará o trono para ficar aqui com uma mundana estrangeira?
Deus, tirei essa vagabunda da minha frente!
— Melhor você calar essa boca — falei baixo, mas por dentro, estava explodindo de raiva.
Ela riu mais ainda.
— Coloque na sua cabeça que com você ele não ficará, mundana. — Zukmi tentou se aproximar de mim, contudo, a empurrei com força pelo peito.
Que peito?
— E com quem ele ficará? Com uma empregadinha que ele faz questão de dizer que só estava se divertindo?
Mais uma vez, ela sorriu.
— Foi exatamente isso que fizemos ontem na chuva. Nos divertimos muito.
Ao ouvir essas palavras, uma agulhada surgiu na minha espinha.
Olhei para o Zaphy e o mesmo estava com os olhos cravados em mim. Provavelmente ouvindo tudo com a sua audição de alien. A expressão assustada dele, só provava o quanto era culpado.
— Ainda estou com o gosto da pele dele na boca e...
Não esperei ela terminar. Peguei a garrafa vazia a qual o Nepo havia deixado, e estraçalhei-a em sua cabeça. Imediatamente percebi que as pernas dela vacilaram, enquanto se apoiava na mesa ao lado para não cair no chão.
Logo, uma fileira de sangue começou a descer no canto esquerdo de sua testa cinza.
Entretanto, eu não estava satisfeita.
Nunca havia me metido em brigas, minhas discussões jamais passaram de bate bocas, no entanto, algo dentro de mim estava diferente. Era como se não fosse mais eu. Todas as minhas emoções estavam muito intensas, incontroláveis.
Ainda segurando meia garrafa, avancei na direção da Zukmi. Estava disposta a acabar com aquele rostinho de piranha extraterrestre. Era até irônico dizer, porém jamais imaginei que um dia eu sentiria tanto prazer em ver o medo nos olhos de alguém.
Mas de repente, o pedaço da garrafa foi retirado da minha mão antes mesmo que eu ficasse próxima o suficiente para atacá-la.
Assim sendo, os sons e vozes que até então estavam sendo bloqueados pelo meu cérebro, foram aos pouco se revelando. Palavras em um idioma estranho, passos, choramingos de dor.
— Chega, terráquea! — Zaphy gritou e me afastou do caminho para seguir até a ET.
Olhei à minha volta e vi que todos estavam olhando intensamente para nós, enquanto cochichavam algo em sua língua esquisita. Alguns pareciam assustados, outros irritados.
Depois que o Zaphy levantou o rosto da vagabunda para provavelmente analisar o ferimento o qual causei, decidi que não ficaria nem mais um segundo ali.
A passos largos, eu me dirigia à saída mais próxima daquele inferno de festa.
— Humana? — uma voz masculina me chamou, logo após eu passar pela mesa em que o Zaphy estava.
Ao me virar, percebi que pelo olhar em cima de mim, o chamado veio do alien sentado na outra ponta da mesa. Aquele um pouco maduro.
Quarentão, talvez?
E por que ele estava sorrindo pra mim?
— Sente-se. — Ele se inclinou para dar um tapa no banco ao lado dele.
Olhei para os outros na mesa. O pai do Zaphy nem tirou os olhos do seu prato triangular, já a provável princesa, que aliás, achei bonita de rosto, se mantinha indiferente enquanto olhava para os lados.
Resolvi aceitar o convite. Em todo caso, eu não tinha outro lugar para ir, mesmo.
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