O terceiro motivo
Após aquela tarde no parque, minha relação com o Jimin sofreu algumas mudanças. Nós sempre que podíamos, saíamos juntos, conversávamos o dia inteiro, todos os dias. O melhor de tudo eram os beijos que trocávamos. Eu nunca fui capaz de compreender ao certo relacionamentos, mas o nosso em específico era ainda mais difícil de se entender.
Estávamos em um relacionamento não-relacionamento, ou como os adolescentes falam, ficando. Éramos amigos que se beijavam sempre que podiam, que andavam de mãos dadas, que estavam sempre juntos, que iam a encontros e até mesmo – em um dia que eu nunca pretendo repetir – vão em baladas juntos.
Pensar na palavra "amigos" causa um desconforto em meu peito. Não era esse o meu ideal de relacionamento. Não com Jimin pelo menos. Talvez fosse a famosa insegurança – coisa que eu nunca havia sentido, mas que sempre escutava sobre. Na minha impressão, ele estava bem com isso e não queria ter nada a mais comigo. Ah, eu queria estar morto. Talvez assim não doesse quando o loirinho desse conta que ter algo comigo é uma merda e resolvesse terminar. Ou se afastar. Nem temos nada para que ele possa terminar.
Ai. Meus próprios pensamentos conseguem me machucar. Qual o sentido de ser meus pensamentos se nem do meu lado eles estão? Acho que talvez seja meu cérebro tentando evitar que eu seja um trouxa. É, tarde demais, cérebro. Eu me tornei o trouxa número um por Park Jimin e sequer sou capaz de sentir remorso. Tem como ser mais trouxa que isso?
Hoje ele ainda não havia me respondido ainda. Não respondeu o meu "bom dia", não respondeu a minha pergunta de como se fazia pudim – não julgue, além de ser péssimo na cozinha, eu precisava ter alguma desculpa para puxar assunto – e até mesmo ignorou as indiretas que eu postei. E nem adianta tentar defender ele, imaginar que ele está longe do celular, ou que ainda está dormindo, porque ele visualizou. Assim, na cara dura mesmo. Fui plenamente e completamente ignorado.
Como o bom desesperado que eu sou, estou saindo de casa agora, neste momento em que faz -17°C, apenas para bater na porta da casa dele e o obrigar a me responder. Não, isso não tem nada a ver com a minha extrema necessidade de ver ele ou com o aperto que estou sentindo no meu peito, nada disso. Era apenas para encher o saco dele e irrita-lo.
Apertei a campainha, aguardando ansiosamente a porta ser aberta. Eu só queria ver um sorriso se abrir em seu rosto. Escutar um "Kookie, você aqui!", pronunciado em tom animado por aqueles lindos lábios que tanto amava beijar. Receber um caloroso abraço. Mas não foi nada disso que encontrei. Até mesmo porque a porta sequer foi aberta.
Se eu disser que não fiquei triste seria mentira, e se eu disser que eu não insisti seria uma mentira maior ainda. Eu toquei a campainha de novo e nada. Não satisfeito, liguei seis vezes, deixando recados não tão carinhosos na caixa postal. Mandei catorze mensagens, pedindo para apenas dar algum sinal de vida, e quem sabe abrir a porta – afinal, estava frio para caralho e eu me sentia congelando –, contudo apenas obtive o nada, de novo.
Sem muita opção, mandei a ultima mensagem, que dizia simplesmente que eu não iria embora até ver o rostinho dele e que estava sentado na calçada esperando ele ter algum tipo de amor no coração e abrir a porta. E finalmente pude escutar o barulho da chave destrancando. Só com isso, algo tão simples, já me fez sentir aquecido. Ah, eu logo estaria sentindo seus braços quentinhos e adeus frio.
Levantei correndo, pronto para me jogar em seus aconchegantes braços e invadir o calor de sua residência. Mas não foi exatamente isso que eu encontrei.
Ao olhar para seu rostinho, vi que estava com uma expressão de dor, enquanto seus olhinhos estavam inchados e vermelhos – acredito eu ter sido proveniente de algum choro anterior. Aquela cena partiu meu coração.
Eu nunca sequer havia conseguido imaginar Jimin triste, e agora eu estava vendo, cara a cara. Fazia a menor ideia do que poderia ter causado aquilo, mas eu só tinha certeza de que queria o abraçar com força e só o soltar quando ele estivesse pronto para me xingar.
– Jimin? – Corri para próximo de si, conseguindo já sentir o calor que estava dentro da casa – O que houve? Você está bem? Alguém te fez algo?
– Jeongguk... Será que você poderia parar de fazer perguntas, e só me abraçar?
Oh, ele me chamou pelo nome. Não foi de Kookie, idiota nem de babaca, mas sim meu nome. Não sei muito bem o que era para isso significar, mas sei que é algo sério.
Sem nem pensar muito, passei meus braços ao redor de seu corpo, o puxando para mim. Seu pequeno corpo, totalmente aquecido, estava sendo embrulhado por meus braços, o prendendo em um forte abraço – eu tinha o leve pressentimento de que eu estava o sufocando, mas como ele não havia reclamado não seria eu que o faria.
Fiquei revivendo a cena anterior em minha mente, lembrando-me de seu rostinho abatido enquanto falava meu nome, e foi nesse instante que eu reparei um fato curioso – e um tanto inútil – sobre o loirinho: em qualquer circunstancia, hipótese, situação, ele sempre permanecia lindo. Como ele conseguia ser portador de tamanha beleza?
Senti ele se mexer, então soltei meus braços, o livrando do abraço. Pus minhas mãos em seus ombros, o deixando a uma curta distância de mim, mas me deixando enxergar cada detalhe do seu rosto.
– O que houve, Jimin? Você sabe que pode contar comigo. Sempre.
– Vamos entrar, Kookie. Está frio aqui fora.
Tentei não me deixar ser atingido por sua resposta, ou pela frieza de sua voz, ou por qualquer uma das diversas coisas que incomodava meu peito. Contudo esse meu esforço foi falho. Eu senti sim uma pontada, eu senti meu nariz ter uma leve queimação – que não era proveniente do frio que estava do lado de fora –, e também me senti decepcionado. Mas não era momento para nenhum desses meus sentimentos. Tinha um loirinho triste e precisando de atenção a poucos passos de mim. Eu poderia engolir meus sentimentos. Ah, estar morto seria tão mais fácil.
Me arrastei para dentro da residência, fechando a porta atrás de mim. Fui recebido por uma lufada de ar quente, e eu nunca me senti tão feliz por isso. Estava tão quentinho...
Tirei um dos casacos que vestia, junto do meu tênis e luvas, deixando tudo ali perto da porta mesmo. Adentrei de fato no local, vendo a aconchegante casa que eu já frequento a algum tempo. Eu me sentia tão confortável ali.
Não o achei na sala, então fui direto para seu quarto. Passei pelo corredor, repleto de retratos de família pendurados. Tinha alguns levemente tortos, e eu tive que controlar minha vontade de ajeita-los. Parei em frente da porta de seu quarto, a encontrando entreaberta. A empurrei com calma, vendo um bolo de edredom e Jimin na cama.
Me aproximei, pé ante pé. Nem sei o porque, mas eu só senti a necessidade de ir, bem devagar, até sua cama, sentando na beirada dela e pondo minha mão apoiada no meio de alguma parte daquela montanha no meio da cama.
– Jimin... Me conta, por favor. Estou preocupado. – Meu orgulho não gostava muito do fato de eu ter que implorar, mas como sempre eu mandei meu orgulho para o espaço.
– Minha... minha avó – sua voz, embargada pelo choro, chegou aos meus ouvidos com dor. Doía ver sua dor, e aquilo era extremamente estranho – ela faleceu.
Eu não sabia ao certo o que fazer. Morte não era exatamente a minha especialidade. Não é como se eu nunca tivesse perdido alguém na vida, mas na verdade eu somente não sei o que falar para alguém quando ela perde um ente querido. Eu por exemplo gosto que não falem nada, gosto de sentir minha dor sozinho. Mas tem pessoas que não são assim. Cada um tem a sua maneira de sentir dor, e eu não sabia qual era a maneira do Jimin.
Eu apenas me aproximei ainda mais dele, o abraçando com todo o cuidado que eu poderia ter. Seu rosto ficou em meu peito, encharcando a camisa com suas lágrimas, contudo aquilo não me incomodou.
– Pode chorar, meu amor – acariciei seus fios, em um tímido carinho. Oh céus, eu o chamei de amor. Em voz alta, ainda por cima! – Eu estou aqui, pode por tudo para fora.
Eu sentia os solavancos que seu corpo dava, cada soluço e cada fungar, mas em momento algum eu parei o carinho ou me afastei.
Será que se eu morresse, ele também ficaria assim? Ele choraria? Ele sofreria? Eu não quero que ele sofra nunca e, principalmente, ser a causa da sua dor. Eu queria o ver todos os dias com um lindo sorriso no rosto, tal sorriso tão único que ele dava.
Com o tempo, seu choro foi parando, enquanto seu corpo soltava-se do meu, completamente mole. O deixei deitadinho na cama e levantei, sendo observado por seus pequenos olhos inchadinhos e vermelhos.
– Kookie... não vai embora não. – Me pediu com a voz mais manhosa que podia fazer.
– Eu vou ficar aqui. Só levantei para pegar o controle da televisão mesmo. – ele fez um pequeno biquinho após escutar a minha resposta e eu não entendi direito o porque, mas só sei que foi adorável.
Achei o bendito e me deitei ao lado de Jimin, enquanto ligava a televisão e botava em um canal qualquer. Eu só queria que ele se distraísse, tirasse aqueles pensamentos tristes da mente. Ele deitou a cabeça em meu peito, onde eu pude ficar acariciando seus fios. Ele assistia a TV enquanto eu observava a sua beleza. Ocasionalmente soltava uma risada ou outra por conta do filme – que descobri ser de comédia – e aquilo preenchia meu peito de paz. Ver ele rindo, sorrindo. Era exatamente isso que eu queria ver, para o resto da minha vida.
E assim achei o meu terceiro motivo para continuar vivo: transformar as lágrimas de Park Jimin em risadas.
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