O primeiro motivo


Eu nunca fui uma pessoa muito apaixonada pela vida. Eu não acordava com um sorriso no rosto, muito menos bem humorado. Eu era aqueles típicos adolescentes depressivos dos filmes, que somente sabe falar "queria estar morto". Só que tinha uma diferença: eu não era triste. Ao contrário desses filmes, eu não era um adolescente rebelde, incompreendido e depressivo. Não, eu era completamente normal, somente não via motivos para ficar vivo. E isso não foi somente durante minha adolescência.

Desde criança, eu olhava ao meu redor e me perguntava o sentido de tudo. Para que jogar na Mega-Sena se você não vai ganhar? Para que fazer a prova para aquele concurso, se você não tem chance nenhuma de passar? Para que chegar em alguém, se você vai levar um toco? Para que viver, se no final você somente vai morrer?

Desesperança. Era esta a palavra que cercou minha vida. Desde o momento em que meu raciocínio lógico foi formado, eu fazia as coisas por apenas obrigação. Eu vivi minha adolescência estudando para passar de ano. Meu início da fase adulta foi me esforçar para concluir a faculdade com excelência, tendo um bom estágio remunerado, para ter uma vida confortável, para morrer. A cada atitude que eu tomava, eu somente pensava no quanto queria estar morto.

Era uma rotina, beirava até o agradável para mim. Eu reclamava de tudo, mas estava sempre de barriga cheia. Sempre soube disso, mas nunca mudou o fato de não ver o sentido da vida.

Isso até que eu o conheci.

Park Jimin era a pessoa mais peculiar de todo o mundo.

Eu o conheci da maneira mais aleatória o possível — e isto não é uma hipérbole. Meu carro havia quebrado, e como estava no concerto, eu tinha que andar de metrô.

Lá estava eu. Tinha acabado de sair da faculdade e estava a caminho do meu estágio. Esperava pacientemente, estava tranquilo. Não pensava em nada, apenas observava meu redor, encarando todas aquelas pessoas apressadas, correndo de um lado para outro. Até que Jimin entrou em minha visão.

No meio de todos aqueles tediosos cabelos castanhos — iguais ao meu, vale ressaltar — os seus fios loiros se destacaram. Meus olhos foram atraídos para a sua pequena figura. Caso você queira uma analogia, eu posso até dizer que foi como um imã, mas aí eu acabaria pensando que se um lado atrai, o outro iria repelir, e de jeito algum minha atenção seria repelida de Jimin.

Ele também andava apressado, como todos os outros. Mas uma das gritantes diferenças que ele possuía, quando comparado a qualquer outro mundano, é que ao invés de um fino terno, ou de roupas sociais e engomadas, ele usava roupas simples. Calça jeans rasgada, blusa, coturno. Roupas normais, que nele ficaram belíssimas.

Mexia em sua bolsa de maneira um tanto desesperada. Ela estava cheia de papéis, e como Park sempre foi um completo desastrado, conseguiu deixar a bolsa e o que tinha dentro dela cair no chão, espalhando tudo.

Se abaixou para catar, soltando vários palavrões, sem nem ligar para as pessoas que passavam ao seu redor o encarando estranho.

Eu não sou — e nunca fui, por sinal — um exemplo de boa pessoa, porém eu senti uma extrema necessidade de ajudar o baixinho boca suja. Tudo bem, ele não era de verdade baixo, mas esses 6 centímetros já foram o suficiente para me fazer zombar dele — na verdade era legal ver a sua face ficando vermelha de raiva, mas isso é outra história.

Abaixei em sua frente, catando as folhas tomando cuidado para não amassá-las. Já ele apenas pegava tudo rapidamente enquanto as socava no fundo da mochila, pronunciando xingamentos durante todo o processo.

Assim que acabamos, eu ia apenas entregar as folhas para ele e seguir com a minha tediosa vida. Mas ele mesmo não deixou.

Ao entregar as folhas e levantar, ele começou a puxar assuntos aleatórios comigo. Eu não entendia o porquê daquilo, qual o propósito dele.

Quando eu dei por mim nós já embarcavamos em uma conversa sobre como deve ser difícil pescar com as próprias mãos e sobre o quão talentosa deve ser a pessoa que o faz. O mais engraçado é que eu nem me lembro como este assunto se iniciou, porém ele se encerrou com a chegada do metrô.

Eu tinha que embarcar naquele mesmo, já ele na verdade estava saindo do metrô na hora em que tudo caiu.

Nos despedimos e trocamos nossos números, para podermos nos ver novamente e continuarmos a conversar. E durante todo o percurso até meu estágio fomos trocando mensagens.

Na verdade, nós conversamos por vários dias. Desde o "Bom dia" até o "Boa noite", nossos dias eram completamente compartilhados um com o outro. Eu já sabia o nome das pessoas do trabalho que ele odiava e ele já havia até mesmo descoberto sobre o meu grande amor por lasanhas. As conversas nunca eram tediosas, sempre me rendiam boas risadas. Me acostumei a esta nova rotina grudado ao celular, apenas aguardando por alguma mensagem. Até que marcamos de nos encontrar novamente.

Foi em um dia horroroso. O céu estava nublado, com nuvens pesadas repletas de água pronta para cair, mas não caía. Soprava um vento um tanto seco, que fazia minha rinite me incomodar e ter que carregar comigo soro, apenas para que meu nariz não ressecasse tanto ao ponto de sangrar.

Combinamos em uma cafeteria, pelo fato de eu ser um viciado em café e Jimin ser um viciado em bolos. Era um lugar até calmo e aconchegante. Não costumava a ficar cheio e a comida lá era muito boa.

Eu tinha acabado de sair do meu estágio, e como meu carro já havia voltado do concerto, fui dirigindo e acabei pegando um terrível trânsito. Confesso que me senti um tanto mal quando eu recebi a mensagem de Park dizendo que já tinha chegado, quando que para mim ainda faltava 15 minutos. Porém, eu consegui chegar lá.

Naquele dia meu humor não estava um dos melhores. Tanto pelos fatos que eu já citei, quanto por eu dificilmente estar de bom-humor. Não carregava uma carranca no rosto, mas também não andava saltitando distribuindo sorrisos por aí — na verdade eu sequer consigo compreender quem consegue fazer isso.

Ao abrir a porta da cafeteria, escutei o familiar sino. O cheiro de café misturado ao de vários doces lotava o ambiente, mas aquilo sequer me incomodou. Na verdade era agradável.

Olhei ao meu redor, buscando a figura loira. O encontrei olhando pela janela, mantendo o cenho franzido enquanto sua mente vagava em diversos pensamentos que eu nunca descobri.

Fui me aproximando devagar. Seria até estranho se eu não andasse devagar, o lugar estava em completa paz, não teria sentido sair correndo para sentar em uma cadeira que estava a dois metros de distância.

Somente depois que consegui me aquietar na cadeira, que Jimin reparou em minha presença. Quando seus olhos se focaram em minha pessoa, sua fisionomia se suavizou, dando lugar a um belo sorriso. Nem um sorriso eu deveria falar — aquilo estava mais para O sorriso.

Tive uma sensação estranha. Meu peito se aqueceu e meu coração bateu mais rápido, mais forte. Nada alarmante, era algo delicado e doce, talvez mais doce até que o bolo de morango que Jimin pediu segundos depois.

— Está atrasado — Brincou comigo, mas eu ainda estava muito fora de órbita para poder responder.

Eu apenas tinha em mente aquele sorriso. Eu queria vê-lo todos os dias, em todos os momentos. E aquele sorriso tornou-se o primeiro motivo pelo qual eu queria estar vivo.

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