Sangue do meu Sangue
Numa fria e chuvosa noite de um domingo em Maio, Heloise e Hugo deleitavam-se com seus corpos unidos em cima da cama dele com fronhas velhas. O quarto de Hugo era um local razoavelmente grande, com uma parede azul cheia de posters, com um armário do lado direito e uma escrivaninha perto da janela, a qual continha um pacote fechado de preservativos.
Hugo estava sem camisa, ofegante, admirando o corpo de Heloise esticado em sua frente. Ele esticou a mão e agarrou um pacotinho de preservativo.
- Não, Hugo, temos de conversar.
- A gente conversa depois. - Ele rasgou o saquinho e abaixou as calças.
- Hugo, falo sério. - Ela se sentou, usando apenas seu sutiã roxo e sua calcinha branca.
- E eu também, há tempo queria fazer isso de novo, nunca consegui fazer isso com Emily e, logo que sai com você, já aconteceu, não entendo por que esta noite seria diferente.
Ela segurou a mão dele que se direcionou à cueca preta.
- Será apenas pelo fato de que eu pude ver a ira nos olhos de Fred? Será que é porque estou cansada desses seus joguinhos malucos? Ele a ama, Hugo, de um jeito que você jamais poderia fazer, nem com ela e muito menos comigo.
Ele respirou fundo, as veias de seu pescoço ressaltando-se.
- Eu não te amo, Hugo. Acho que nunca te amei, eu sei que sinto algo por você, mas é tão confuso, você não é aquilo que eu preciso.
Hugo se agachou na frente dela com os braços em torno de suas coxas.
- E o que é que você precisa? - Ele parecia caçoar dela. - Depois de tudo que minha família, depois de tudo que eu fiz por você.
- Não ouse tocar nesse assunto.
- Você nem deveria estar aqui Heloise. Você não deveria existir.
- Para. - Ela disse, sua voz entorpecendo-se com o choro que se iniciara.
- Você não é nada Heloise, eu te fiz ser tudo.
- Para! - Ela gritou e deu um tapa na cara dele, deixando o arranhão de suas unhas em sua bochecha.
Ele voltou-se para ela, enérgico, cheio de raiva e excitação. Ele agarrou o pescoço dela e jogou-a no chão.
- Trate de saber bem qual é o seu lugar. - ele cuspiu as palavras no rosto dela. Heloise tentava se controlar, mas seus sentimentos nunca estiveram tão confusos, era uma sensação que crescia não de seu coração, mas de sua alma, ela sentia que ela precisava de..... mim.
- Eu preciso de Fred, Hugo.
Ele riu, sua mente incapacitada de entender o que ela dizia.
- Você precisa dele? Não, você não precisa, você anseia por isso, porque você quer ter alguém para amar para que, assim, você talvez tenha a chance de ser amada pelo mesmo.
- Por que.... - ela desabou em lágrimas, afogando-se em seus suspiros. - Por que você é tão cruel?
Ele se abaixou e tocou a mão dela.
- Por que a realidade é cruel.
Ele redirecionou seu rosto na direção dos lábios dela porém, em um movimento rápido, Heloise virou o rosto e ele apenas beijou sua bochecha. Antes que Hugo pudesse reclamar, eles ouviram a campainha.
- Quem será à essa hora? - Ele perguntou, levantando-se e colocando suas roupas novamente. - Ainda não acabamos Heloise.
Ele se dirigiu à porta de seu quarto no momento em que ela disse:
- Sim, Hugo, acabamos.
Ele, então, simplesmente bateu a porta atrás dela, deixando um pobre pássaro que desaprendera a voar.
........
Hugo, ao chegar no segundo andar da casa de seus pais ( uma delas, pelo menos) abriu a porta da sala. A sala de sua casa era luxuosa, com um pequeno candelabro em cima de uma mesinha de centro na qual havia várias revistas, dois sofás beges preenchiam o local e, uma iluminação laranja, criava um clima aconchegante.
Hugo encostou a mão na maçaneta fria e girou-a, recebendo um visitante inesperado. Marco estava ali, parado diante de Hugo, fumando um charuto e com vestimentas escuras que lhe protegiam da chuva.
- Marco, o que faz aqui?
- Isso é, realmente, uma péssima maneira de receber uma visita.
- Não lhe esperava hoje.
- Acho que é o que chamam de visita surpresa, não é? - Marco possuía um tom irônico incomum naquela noite. - E ai, vai ficar parado ou vai me chamar pra entrar?
Hugo pareceu ter um espasmo mental e percebeu com quem estava falando e, surpreso, ouviu sua voz fluir como a água da chuva que caia.
- Entre, é claro.
Marco bateu os pés contra o tapete da entrada e logo retirou seu casaco.
- Seus pais não estão?
- Não, eles não ficam nesta casa durante o fim de semana, nesses dias eles a deixam para mim.
Naquela hora inoportuna, Heloise desceu, vestindo um moletom azul velho com um shorts rasgado e tennis esportivos, seu cabelo ainda desarrumado.
- Vejo que aproveita bem seus finais de semana.
Heloise fuzilou Marco e lhe disse, aproximando-se.
- Não sei o que faz aqui, Marco, mas tire-me disso, não quero participar de mais nada.
- E por que achou que eu te chamaria?
Ela abaixou a cabeça, talvez desapontada consigo mesma ao achar que Marco poderia ter certo interesse nela.
- Estou aqui por causa de Hugo, obviamente.
Marco jogou todo seu peso sob o sofá, encharcando-o com as costas do pulôver preto que vestia.
- Já que está aqui, garota, busque-me um copo d'água.
Heloise piscou e foi até a cozinha, passando friamente por Hugo, sem demonstrar qualquer sentimento, todavia, Heloise despedaçava-se aos poucos por dentro.
Hugo sentou-se no sofá ao lado do de Marco.
- A que lhe devo as honras? - Ele indagou.
- Pelo amor, Hugo,não trate-me de forma tão respeitosa e falsa, ambos sabemos como você é.
Hugo cocou-se e disse:
- Desculpe-me. - E então abaixou os olhos.
- É por isso que quero você como meu sucessor.
- Como é?
- Quero-lhe como meu sucessor.
- Sucessor a?
- À Máfia, Hugo, a máfia italiana.
Hugo espantou-se e, logo em seguida, levantou e começou a andar em círculos.
- Máfia? Tipo, Bonnie e Clyde?
Marco demonstrou desdém.
- Claro que não, aqui tratamos de algo muito maior. Eu preciso de você, Hugo.
- Por que eu?
- Por ser cético, sínico e frio, não tem medo de machucar as pessoas com as palavras.
Hugo parou ao lado da mesinha de centro, refletindo.
- Mas, sua sucessora não seria um de seus filhos?
- Tisc - Marco disse, batendo levemente na ponta do charuto, derramando algumas cinzas sobre suas roupas.
- Fracos, não confio neles.
- Então, por que confiaria em mim?
- Pois você parece saber do que sou capaz, não se assustou tanto ao ouvir meu pedido. Além de que, a sua pobre crença em coisas imagináveis me fascina, você acredita no concreto, não no imaginário.
Os olhos dele brilharam, Hugo demonstrava tamanha atenção nos argumentos de Marco, como se fosse uma coruja caçando um rato.
- E o que lhe faz pensar que eu aceitarei?
Marco se levantou e andou até Hugo, sua estatura batia na metade do queixo do loiro.
- Porque, se não fazê-lo, você desaparecerá com o tempo, ninguém fará questão de lembrar quem você foi, eu farei isso com o imenso prazer.
Marco baforou no rosto de Hugo, que tossiu depois que a fumaça entrou em suas narinas.
A cozinha ficou quieta, o que fazia muito sentindo, já que Heloise ouvia tudo atentamente.
- Heloise. - Disse Hugo.
- Sim? - Ela respondeu, aflita e temerosa.
- Por que está demorando tanto? Você já foi mais eficiente.
- E você menos cretino. - Ela sussurrou, por entre seus lábios vermelhos, para si mesma.
Marco direcionou seu olhar à porta que interligava a sala de jantar à cozinha e disse:
- Heloise, aproveite e me traga uma faca.
Hugo arregalou os olhos, involuntariamente.
- Eu ainda não dei minha resposta. - Disse Hugo.
- Ah, sim, acho que deu. - Disse Marco, apoiando a mão na arma que carregava na cintura.
Em poucos segundos, Heloise voltou com um copo cheio d'água e uma faca de desossar, ela fora bem mais eficiente do que antes. A faca reluzia a luz do candelabro.
- Hugo, ajeitei-se em minha frente. - Ordenou Marco.
Ao ficar cara a cara com Marco, o mesmo ordenou:
- Dê-me seu pulso. - Disse o italiano, já agarrando o pulso de Hugo com seus dedos fortes que deixariam marcas doloridas mais tarde. Ele fez um aceno com a cabeça indicando para Heloise andar até eles.
- Agora, Heloise, quero que faça um corte em minha mão direita. - Ordenou Marco, estendendo sua mão na direção da garota.
- Não. - Ela disse.
- Como é? - Perguntou Marco indignado, de certa forma.
- Não, Marco, não quero fazer mais parte de nada disso.
- Você não tem escolha, garota tola. Você já está se afogando em culpa e mágoa e, se não me obedecer, morrerá sentindo ambas. - Marco fez o mesmo movimento que fizera para Hugo, soltou a mão dele e apoiou sobre a arma.
Heloise, receosa, colocou a faca na palma da mão de Marco e afundou-a lentamente, tentando causar o mínimo de dor e, logo, deixou o sangue escorrer pela faca prateada.
Ela soltou uma lufada de ar quando acabou o corte na vertical, que se estendia por toda a palma da mão de Marco.
- Corte a de Hugo, agora. - Ele ordenou, causando surpresa na garota, deixando-a ainda mais pálida, se fosse possível.
- Hugo, eu....
- Faça! - Ele gritou para ela, o que a fez lembrar de toda a vergonha e sofrimento que ele já fizera-a passar, foram incontáveis dias, houve uma quantidade maior de dias ruins do que bons.
Ela, não mais receosa, pegou a palma da mão de Hugo e cortou-a de leve e, diferente de Marco, Hugo expressou dor,o que levou Heloise a pensar quantas vezes Marco já havia feito aquilo.
- Dê-me sua mão, Hugo. - Marco estendeu a mão ensanguentada para ele e Hugo a apertou. Marco soltou a mão dele e dois pingos de sangue caíram no chão. Marco elevou a mão até a bochecha de Hugo e passou sua mão, deixando-o marcado de um vermelho rubro.
- Está feito. - Disse ele.
- Se me permite perguntar, o que exatamente foi feito aqui?
Heloise, naquele momento, já havia pego um pano molhado e começava a limpar o corte de Hugo, diferente do que fizera com Marco, o qual ela simplesmente jogara o pano.
- Foi feito uma iniciação, a sua iniciação, Hugo.
- E o que irá acontecer comigo?
- Não seja tão receoso, moleque. Você deveria comemorar este dia. - Marco sorriu, talvez pela primeira vez. - Seja bem vindo à Máfia.
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