A loira
Eu andei até o portão.
- Por favor - repetiu Hugo.
Meus lábios se fecharam e eu o agarrei pelo pescoço.
- Fred! - Meu pai alertou-me.
Meus dedos envolto ao pescoço de Hugo provocavam-me arrepios, ele havia destruído tudo e, justo quando ele aparece, Heloise morre, logo depois, ele é misteriosamente sequestrado e Geovane aparece morto, mas, por cima de tudo, ele ainda aparece na minha casa pedindo a minha ajuda! Eu não confio nele! Não vou pestanejar.
- Fre....Fred... - Hugo dizia com esforço, o ódio nos meus olhos se intensificando.
- Filho, não o faça. - Meu pai disse atrás de mim. - Mostre que não somos como Marco, mostre que há outras maneiras.
Meus olhos se encheram de lágrima e eu larguei o loiro. Hugo caiu de joelhos na calçada, sua roupa encharcada colando-se ao seu corpo.
- Entre. - Disse.
Hugo olhou para mim, alguns pingos de chuva caíam de seus fios de cabelo.
Meu pai correu com a chave e acolheu o rapaz. Na mesma hora em que pensei no que tinha acabado de fazer eu me senti péssimo.
- Pai - Assim que entramos novamente na sala comecei a dizer - por que não me impediu?
O homem que sempre usava terno olhou para mim.
- Nós devemos fazer as próprias escolhas.
Eu adquiri aquelas palavras dentro de meu coração e, naquele momento pude sentir a "presença" de Heloise naquela sala, parecia que eu podia sentir o toque da ruiva. Ela havia escolhido estar lá em Campos naquela noite. Depois desse pensamento, um alívio recaiu sobre meus ombros.
- Ah meu deus. - Disse minha mãe observando os machucados na bochecha e nos lábios de Hugo. - O que houve?
- E... - ele começou a dizer.
- Ele foi sequestrado. - Respondi secamente.
- Como tem certeza?
Foi a última mensagem que recebi dele, então, deduzi que ele havia sequestrado.
Eu subi até meu quarto, deixando a sala num silêncio sepulcral, depois, desci as escadas com um cobertor nos braços, Hugo tremia muito.
- Que mensagem? - Meu pai disse.
- Não lembro direito se ele mandou para mim ou para Emily, só sei que ele dizia que Marco estava na frente do hotel em que Heloise estava.
- Is...isso. - Confirmou Hugo.
- E depois? - Perguntou minha mãe.
- Depois eu vi tudo ficar preto, colocaram um saco na minha cabeça, depois, fiquei zonzo, fui atingido por algo. Quando...quan... - Hugo espirrou - Quan... quando acordei eu estava amarrada a uma coluna de metal.
- Uma barra? - Sugeriu minha mãe.
- Acho que sim.
- E eles te amordaçaram? Por isso os machucados faciais? - Minha mãe fazia perguntas interruptamente.
- Sim. - Hugo estranhou.
- Em Campos do Jordão. Igual à notícia da televisão. - Concluiu ela. Minha mãe nunca parecera tão esperta quanto estava sendo aquela noite.
Meu pai, de repente, sacou uma arma da cintura. Como eu nunca havia percebido aquilo antes?
- Saia de perto dele, Fred. - A arma na mão de meu pai tremeluzia à luz da sala.
- Mas, pai... - Agora até eu fiquei confuso, aquilo estava parecendo, de certa forma, injusto.
- Sai de perto dele! - Ele repetiu e eu obedeci.
- Tenho que chamar Emily aqui, pai. Ela precisa ver que Hugo está bem!
- Quer mais um assassino nessa sala, filho?
- Como é?
- Você viu a ficha de Emily, lá estava escrito que ela cometeu assassinato!
- Até aí não significa nada! Você também cometeu, pelo o que eu entendia até agora. - Eu abaixei meu tom de voz. - Ela precisa saber.
Meu pai olhou de relance para mim.
- Chame-a.
Eu assenti e corri para o telefone.
- Atende.... atende! - Eu brigava com o telefone.
- Alô? - Disse a voz de Emily do outro lado da linha.
- Emily, venha pra minha casa, agora!
- O que? - Ela parecia um pouco desnorteada.
- Vem pra minha casa, agora! Hugo está aqui! - Eu finalizei a ligação.
- Você vai nos dizer exatamente o que aconteceu, antes que eu chame a polícia. - Ameaçou meu pai..
Hugo assentiu desesperadamente, depois destes acontecimentos, Hugo desejou nunca mais estar na mira de uma arma.
- Eu fui sequestrado por Marco assim que eu cheguei no hotel em que Heloise estava - Hugo retirou o cobertor, e juntou as mãos de tanto nervosismos, pela primeira vez eu não vi Hugo com a cara de cínico que ele sempre esteve, naquela noite ele parecia verdadeiramente abalado. - E como eu já disse, alguém colocou um saco na minha cabeça e m bateu.
- Provável que tenha sido Enrico. - Murmurei para mim mesmo, porém, acabou sendo audível a todos.
- Enrico? - Indagou meu pai.
- O irmão mais velho de Emily - Completei.
Ele assentiu e voltou sua atenção a Hugo novamente.
- Continue.
- Depois disso, eu acordei num lugar abandonado, eu só sabia que lá era bem alto, não sei exatamente onde era. Marco começou a me fazer perguntas sobre Fred e Emily.
- E você disse algo? - Meu pai baixou a arma.
- Pareço ter dito? - Hugo levantou a manga de sua blusa, revelando o queimado do charuto de Marco.
Meu pai continuou fuzilando-o com os olhos.
- Apenas continue.
- Eu.... Eu não me lembro muito bem do que aconteceu, foi tudo muito rápido. Me lembro de Geovane me soltando, brigando com Marco e me mandando fugir, ele disse que havia "dado um jeito" em Enrico e que havia um carro me esperando lá embaixo. - Ele fechou o rosto, uma expressão de espanto o dominou logo em seguida. - Quando eu cheguei no carro, vi o corpo de Geovane cair na minha frente, seus membros, todos quebrados, a faca, ainda no abdômen. - Ele fechou os olhos como se tentasse impedir as memórias de voltarem à sua cabeça. - Acho que ficou mais do que óbvio que Marco o matou.
Meu pai deu um sorrisinho no canto da boca.
- Ou Marco talvez o tenha enviado aqui para nos pegar. - Meu pai sacou a arma novamente. - Por que nós deveríamos confiar em você?
Hugo engoliu em seco, percebi o suor misturando-se com os pingos da chuva.
- Diga-me o motivo para você ter vindo aqui.
Hugo baixou os olhos, parecia pensativo e confuso. A campainha soou.
- Deve ser Emily. - Disse minha mãe. - Abra o portão para ela e volte imediatamente.
Fiz o que minha mãe pediu o mais rápido possível, me surpreendi pelo fato de Pietro não ter vindo.
- Os machucados no braço dele voltaram a doer. - Emily justificou, as vezes me esquecia que ele havia sido atropelado.
Até aquele ponto eu não havia perguntado nada sobre a ficha dela, nem revelei o fato de eu também ser herdeiro da máfia.
- Hugo! - Exclamou a garota ao vê-lo sentado todo encolhido no sofá.
Quando ela o abraçou eu percebi um olhar mais calmo em Hugo. Por um breve momento senti um pouco de ciúmes, mas isso logo passou.
- Como? Como você chegou até aqui? Eles te machucaram? Você ta sentindo algo?
- É o que estamos tentando entender. - Disse meu pai, chamando a atenção de Emily.
- Eu... - Hugo começou a dizer, parecia um pouco perturbado. - Eu só sinto arrependimento.
"Awnt, que dó", pensei
Emily olhou para ele, um pouco duvidosa porém bem mais paciente do que eu.
- Do que você se arrepende, Hugo?
"Acho que agora é aquele momento que o bandidinho da história muda de lado, né?" Pensei novamente.
- De tudo, de ter tentando acabar com o relacionamento de vocês e de todo o resto. - Ele se arrumou no sofá. - Mas principalmente disso - Hugo virou a palma da mão, mostrando a cicatriz do corte de sua iniciação.
- O que é isso? - Perguntou meu pai.
Ao se abaixar para analisar a cicatriz de Hugo, o terno abriu levemente, revelando o suficiente para que Emily notasse a arma na cintura dele.
- Hugo! - Ela empurrou o garoto, que foi lançado deitado no sofá e, num movimento mais do que ágil, empurrou meu pai e pegou a arma, correndo até ficar na minha frente. - Fred, nós temos que ir embora.
- O que? - Indaguei. Tudo estava acontecendo rápido de mais. A luz que iluminava a sala deixava tudo com um clima mais quente, talvez o fato de as lampadas serem amarelas ajude nisso. As almofadas dos sofás, à essa altura, já estavam todas bagunçadas.
- Você sabia que seu pai carregava uma arma, Fred? - Ela olhou para mim, porém, ainda segurava arma na direção de meu pai.
- Conte para ela. - Disse meu pai.
- Amor? - Ela me perguntou carinhosamente. - O que você esqueceu de me contar?
No momento em que fui começar a falar, apenas neste momento, ficou um completo silencio naquele comodo.
- Espera um pouco. - Disse. Parecia que, de alguma forma, eu sabia que tinha algo estranho. - Estão ouvindo isso?
- O que, querido? - Perguntou minha mãe.
- Está no sofá. - Disse, saindo de trás de Emily. - Abaixe a arma, Emily.
Ela olhou para mim, seus olhos preocupados e, ao mesmo tempo, carinhosos. Seu cabelo loiro, naquela noite, estava um pouco descabelado.
- Confie em mim. - Disse.
A garota abaixou a arma.
Meu pai andou até ela.
- Eu abaixei a arma, isso não quer dizer que irei entregá-la a você. - Emily disse antes que meu pai fizesse qualquer coisa.
- Garota esperta. - Ele respondeu e sorriu.
- Xiu, ouçam bem.
Tudo ficou quieto novamente.
- Conseguiram ouvir?
Nada foi dito.
- Hugo, está emitindo de você. - Conclui. Ele era a única pessoa no sofá.
- E.... eu? - O garoto travou as palavras na garganta.
- Levanta. - Disse desesperando-me. - Levanta!
O garoto se levantou e o barulho tornou-se mais alto, eu estava certo, o barulho estava sendo emitido de Hugo.
- O barulho estava abafado porque ele estava sentando. - Concluiu minha ma~e.
- Isso. - Disse, agachando-me, justo quando eu estava começando a acreditar em Hugo.....
Eu comecei a tatear os bolsos da frente dele, depois o interior de suas coxas e, por fim, o bolso em seu traseiro, onde, finalmente, achei o celular dele.
- Só pode ser isso. - Conclui e pedi para que Hugo retirasse o celular e me desse.
Quando Hugo me deu o aparelho, de supetão, meu pai o agarrou de minha mão.
- Merda! - Meu pai exclamou e jogou o telefone de Hugo, literalmente, pela janela.
- O que foi?! - Perguntei estupefato.
- O celular dele, está sendo rastreado! Ele se tornou um rastreador ambulante e veio direto pra cá! Isso fazia parte do plano dele! - Meu pai agarrou Hugo pelas vestes.
- Pai, não - comecei a dizer, eu estava improvisando as falas, não tinha certeza do que eu queria dizer - eu sei que Hugo fez muita merda para nós, quase estragou tudo, mas eu realmente acredito que ele não tem nada a ver com esse rastreador. Não sei por que - eu olhei para Emily -, mas eu acredito nele.
Meu pai olhou para mim, depois para minha mãe e finalmente Hugo, soltando-o.
- Temos que sair daqui. - Meu pai correu e subiu a escada de dois em dois degraus.
- Onde ele está indo!? O que está havendo!? - Perguntava Emily.
Eu me virei e segurei seus braços, tentando não ser violento. Naquele momento, percebi o quanto eu amava o toque de minha pele contra a dela, não importava a situação nem o momento.
- Marco pode estar vindo para cá. Neste exato instante ele já pode estar aqui! - Emily olhou para minha com cara chorosa e, de repente colocou a mão na testa, sentindo-se zonza.
- Lily, tudo bem? - indaguei.
A garota cambaleou até o sofá e sentou-se nele, depois, apoiou as mãos na cabeça.
- Estou, é só essa tontura infernal. - Ela levantou a cabeça e olhou para mim por cima do sofá. - Eu estou bem.
- E vamos ter certeza de que continuará assim. - Meu pai desceu do seu quarto com uma caixa de papelão já amassada. - Nós vamos deixar essa casa esta noite, depois pensamos o que vamos fazer, mas esta noite nós sairemos daqui.
Por um segundo aquela ideia me pareceu extremamente empolgante mas, logo em seguida, tornou-se assustadora.
- Mas, essa é a nossa casa, amor. - minha mãe disse com sentimentos na voz. - Eu não estou preparada para deixá-la assim, tão rápido.
Meu pai correu e a abraçou. Naquela noite eu também percebi o quanto o amor de meu pai era importante para minha mãe, o quanto ele a reconfortava.
- Nossa casa é onde nós estivermos, okay? - Ele disse para ela.
Minha mãe engoliu o choro e concordou.
- Agora cada um de vocês terá uma arma, isso não é uma escolha. - Meu pai voltou para a caixa de papelão e retirou três armas, as quais ele distribuiu para mim, Emily e Hugo.
- Mocinha, eu gostaria da minha arma de volta.
Emily entregou a ele a arma que ela havia pego na confusão anterior.
- Fred eu... - ela começou a dizer, porém um barulho de um carro sendo estacionado nos fundos a interrompeu.
- Ele está aqui! - Hugo disse.
- Vão entrar pelos fundos. - Concluiu minha mãe.
- Temos de partir, agora! - Meu pai disse.
Eu beijei a testa de Emily, ainda sentada no sofá, e disse:
- Isso não é uma despedia.
Ela sorriu e se levantou.
- Querido, o controle do portão. - Minha mãe disse ao meu pai.
- Já está comigo.
Nós andamos até a porta e ele disse:
- Quando eu abrir o portão, corram sempre para frente, sigam reto.
- Para onde vamos? - Perguntei.
- Eu não sei. - Respondeu ele ao apertar um botão no pequeno controle cinza. Muito rapidamente, foi possível ouvir o barulho do portão automático se abrindo.
- Estou num hotel aqui perto, junto com o meu irmão! - Emily pareceu contente com a ideia. - Posso levar vocês até onde estamos ficando, vem! - Ela se virou e começou a correr.
- Espera, Emily! - Eu disse, tentando segurar a mão dela, não queria perde-la de vista.
- Vem! - Ela disse passando a parte do portão, saindo para a rua, o asfalto lutando contra as solas do sapato dela.
Os cabelo dela, mesmo bagunçados, estavam tão lindos. Ela se virou e sorriu, ela também queria ter certeza que eu estava atrás dela, seguindo-a. Talvez ela ainda não soubesse, mas eu a seguiria eternamente.
- Emily! - Berrei, mas a voz parecia não me obedecer.
Tudo aconteceu em câmera lenta, um carro azul-marinho acelerou e chocou-se contra o corpo dela, lançando-a por cima de seu teto, o corpo dela parecia como uma folha que, na primavera, se desloca de uma árvore e é levada pelo vento.
Meu peito se rachou, os estilhaços que eu achei ter remontado apenas se quebraram ainda mais, parecia que uma dúzia de cavalos estava pisoteando-me.
- Emily. - Minha voz travou em minha garganta, o choro inundou meus olhos e os preencheu de dor.
E então a loira ficou ali, parada, imóvel, depois de seu corpo ter caído com um baque surdo no chão de asfalto.
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