Capítulo 2 Parte 2 (Rascunho)

De manhã cedo, o jovem acordou, alegre, e tratou de despertar a namorada, enchendo-a de beijos e carícias, cheio de vontade e logo correspondido. Estavam bastante envolvidos quando a porta do quarto abriu-se.

– Mas o que raio vem a ser isso? – perguntou a mãe dele, consternada.

O jovem saltou para o lado e Luana cobriu-se com o lençol. Meio irritado, ele disse:

– Mãe, quer fazer o favor de fechar a porta e nos dar um pouco de privacidade...

– Que droga, Pedro! – exclamou a mãe, exaltada –, vocês são menores de idade e isso é proibido.

– Primeiro, seremos maiores em poucos dias – retrucou o jovem, irritado –, segundo, nós queremos casar o quanto antes, terceiro, nunca ouvi falar nessa proibição.

– Mas é sim e deviam saber disso...

– Talvez soubéssemos se você e o pai não vivessem que nem mortos-vivos naquela porcaria de simulador que está acabando com vocês – vociferou o jovem, ácido e sem lhe dar tempo de argumentar. – Ainda não se deu conta que não nos falamos há mais de um ano? Se você vive naquela droga e só sai para comer e dormir, como eu posso saber alguma coisa, mãe? Desde que fiz seis anos a senhora piorou de forma radical. Vocês são viciados naquele maldito modelo de controle social e nem se dão conta de que são zumbis, cordeiros fabricados, e tudo o que eu e a Luana temos é um ao outro. Nas ruas quase não se vê mais adultos, apenas crianças com menos de seis anos. Isso é pura decadência, mãe, sem falar que há muito menos garotos do que antes porque as pessoas nem mesmo têm filhos, vivendo realidades viciantes e falsas. Eu e ela vamos casar e não há força no mundo que nos impeça porque não existem mais pessoas capazes de viver a realidade.

– Mas o governo é que decide os casamentos... – insistiu, tentando desviar a atenção da sua fraqueza e sendo interrompida pelo filho.

– O governo que se dane – explodiu ele. – Eles não podem controlar tudo. Afinal, que interesse terão em duas pessoas sem qualquer expressão e que vivem neste fim de mundo desolado?

– As máquinas estão de olho em tudo e eles fazem seleção genética conosco, Pedro – disse a mãe, com lágrimas caindo. – Acha que eu gosto daqui? Eu vivia na parte nobre da cidade, lá onde você esteve, vivia bem, mas eles escolheram a minha vida no dia dos meus dezesseis e me colocaram com o seu pai. Por isso estou sempre deprimida, filho. Por isso fiquei tão abatida quando o levei ao centro, porque lembrei da minha infância. Eles manipulam tudo. Vocês nunca tiveram aquilo, nem vocês, nem os vossos pais, mas, para quem já teve, como eu, viver aqui é uma tortura. Tentei enfrentar, no início, mas fui vencida. E tudo isso para que eu tivesse filhos com o seu pai.

Luana e Pedro olharam-se, preocupados.

– Mas por quê? – perguntou-se Luana, assombrada.

– Manipulação genética, eu presumo – respondeu o namorado, demonstrando de forma inconsciente o seu raciocínio lógico bem acima do padrão. – Seleção natural provocada de forma artificial. Só pode ser isso. Mãe, desculpe pelo que lhe disse, mas eu não pretendo desistir dos meus sonhos e muito menos da mulher que eu amo.

– Tudo bem, meu filho, eu o entendo e espero que não lhe façam o que me fizeram, mas fique atento. Talvez eu também devesse ter lutado assim, me rebelado – disse, puxando a porta atrás de si. Ainda finalizou, dizendo-lhes. – Tomem cuidado. É mais seguro que ninguém saiba de nada.

– E agora, amor? – quis saber Luana, muito preocupada.

– Agora temos duas opções – começou o namorado. – Ou tratamos de dar o fora daqui ou arriscamos. Se ficarmos, acho que dá tempo de saber o que acontecerá. Eu terei que ir para o centro em três dias e você mais duas semanas. Se fôssemos fugir, teríamos de sair do planeta porque o braço do governo abrange tudo.

– Então o que faremos? – Luana voltou a perguntar.

– No momento – disse Pedro, levantando-se –, vamos tomar um bom banho, já que nos interromperam de forma tão cruel. Depois, vamos sair e comer alguma coisa. O resto, faremos de noite...

― ☼ ―

Caminhavam para o restaurante quando Luana disse:

– Fiquei com pena da sua mãe, amor, você pegou pesado.

– Senti-me mal, quando ela disse aquilo – concordou o namorado, encolhendo os ombros. Quando parecia que não ia dizer mais nada, acrescentou. – Mas é verdade. Aquilo não é desculpa para os nossos pais nos deixarem abandonados. E cadê esse maldito governo que deveria velar por nós?

Mais calmo, continuou:

– Sabe, se não fosse eu ter você do meu lado, nem saberia como ia aguentar todos estes anos.

– Eu também – disse ela, apertando-o mais contra si. – Lembro bem aquele dia na praça, quando começamos a namorar. Eu tava sofrendo tanto que preferia até morrer para fugir de tudo.

– Sim, eu lembro. Eu me sentia quase assim, mas daí ia para a praça procurar você. Sabe, acho que nascemos para ficarmos juntos e sei que nada, nada mesmo, me impedirá de lutar por você, minha Luzinha.

Mas Pedro não dizia tudo o que sentia. Ele estava certo de que era bem mais complexo enfrentar a poderosa máquina que governava cinco bilhões de pessoas. Por outro lado, se ele se deixasse abater, então seria pior. Talvez a melhor opção seria fingir que cooperava com o sistema e aguardar a hora certa de se evadir. Poderiam deixar tudo preparado para uma fuga enquanto ele avaliava o que aconteceria dali a três dias.

Em um impulso, disse:

– Vamos ao espaçoporto, vamos analisar opções.

– Boa, amor – comentou Luana. – Qual é a ideia?

– Ainda não sei – comentou Pedro, pensativo. – Mas temos de estar preparados para fugir, caso a coisa complique.

― ☼ ―

O caminho mais simples era o que sempre tomavam, mas Pedro desejava estudar outras opções. A rua terminava em uma praça que era delimitada de um lado pela cerca do porto, do outro pela rua e as laterais tinham um pequeno bosque também protegido por uma cerca de uns dois metros de altura.

Essa praça não tinha nada de especial, como brinquedos para crianças, por exemplo, mas era muito mais cuidada. Havia algumas mesas e o casal sentou-se em uma delas. Pedro tocou no bracelete e disse:

– Quero o mapa de todos acessos por terra ao espaçoporto, tanto ruas quanto caminhos. Apresentar um mapa da área.

Luana apontou um ponto vermelho.

– Acho que estamos nesta praça, apesar de haver umas quantos quase iguais.

– Sim, e tem este acesso aqui, pequeno e que passa quase desapercebido, sem falar que fica mais próximo das naves.

– Podíamos tentar chegar lá. – Apesar de sozinhos, ambos falavam baixo e isso foi bom porque uma voz soou atrás deles, não muito longe.

– Não sabia que era possível olhar mapas no bracelete. Como descobriram isso?

Contrariados, olharam para trás e viram o velho junto à cerca do espaçoporto. Tinha um sorriso gentil, mas Pedro não gostou.

– Como chegou aí sem que o víssemos? – perguntou, contrariado. – O senhor sempre chega de surpresa!

– Ora, filho, sou um velho lobo do espaço, acostumado a ficar em silêncio muito tempo. Aprendi a andar sem chamar a atenção. Vai me dizer como se faz isso?

– Simples – disse o garoto. – Quando me entregaram o bracelete e o palm, falaram do manual dos dois dentro do palm. Está tudo lá.

– Sério? – perguntou o velho rindo. – Devia ter lido o manual.

– Devia sim – acrescentou Luana. – Por que o senhor não fica no simulador? Até parece o único homem adulto normal nesta cidade!

– Eu amo o espaço – disse ele, rindo –, não essa baboseira que deixa todo mundo maluquinho.

Pedro levantou-se, pegando a mão da namorada e puxando por ela.

– Nós vamos indo – disse ele. – Até outra hora.

Caminharam quase dois quilômetros. Ali, havia bastante vegetação e árvores, como um pequeno bosque urbano. Andaram mais um pouco e viram uma trilha quase invisível que entrava mata adentro na direção desejada. Empolgados, seguiram por aquele caminho durante algum tempo. A trilha alargava-se após duzentos metros e havia pegadas que mostravam com clareza que pessoas passavam por ali e não eram crianças, de acordo com o tamanho que se apresentava. Após quase meia hora de caminhada, depararam-se com a cerca, mas, para o lado, viram uma brecha oculta por arbustos.

Ali era bem perto do box de pouso da nave em forma de águia e Pedro ficou bastante pensativo. Ao fim de um tempo, puxou a namorada para saírem do local, mas andou fora da trilha, o que era mais difícil. Quando voltaram para a praça de sempre, Luana perguntou:

– Porque não quis retornar pelo caminho, amor?

– Havia pegadas no chão, algumas bem recentes, amor – respondeu, pensativo. – Estou quase certo que aquela trilha é usada para algo não muito lícito, como contrabando ou coisa que o valha.

– Isso pode ser útil para nós...

– Muito útil, Luaninha – concordou o namorado. – Já temos uma rota de fuga; agora precisamos de um meio de troca. Se são contrabandistas, é óbvio que procuram algo que tenha algum poder de barganha. Vamos, vamos jantar que está tarde.

– Você acha legal a gente dormir na sua casa? – perguntou, preocupada.

– Conheço a minha mãe, Lu – respondeu, tranquilo. – Ela não só ficará na dela como nos protegerá de tudo o que puder.

– E o que faremos?

– Não temos tempo para arrumar algum poder de troca, amor, então vamos fazer o jogo do sistema, por enquanto. Posso até estar errado, mas acho que não acontecerá nada de imediato. Quanto mais bem planejados estivermos, mais eficaz será a nossa fuga.

– Que bom que tenho você só para mim – brincou a moça, beijando-o.

Pedro acompanhou e riu, acrescentando:

– Lembre-se, amor, que os algoritmos que modifiquei no palm e no bracelete permitem que nos comuniquemos em segredo. Agora, esqueçamos as preocupações e continuemos o que a minha mãe interrompeu esta manhã. Por enquanto, quero esquecer os problemas e seus carinhos são o melhor remédio.

Luana riu e tratou de se agarrar ao namorado, fazendo o que ele mais queria no momento.

― ☼ ―

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