Capítulo 08 - 0 Milhas

Jamie

Despertei na manhã seguinte com o som estridente do toque do meu celular. Eu me sentia desnorteado e exausto, parecia fazer poucos minutos que havia pegado no sono. Ainda parcialmente adormecido, eu levei o telefone à orelha, atendendo a chamada.

— Alô… — Summer se moveu ao meu lado, eu me virei para encará-la.

Não pude evitar sorrir diante de sua expressão cansada. Nós passamos boa parte da noite acordados, e ela não era a única que precisava recuperar a energia.

— O que você está fazendo, Jamie? É uma chamada de vídeo — a voz da minha mãe soou do outro lado com diversão

Eu pisquei atordoado, afastando o celular da orelha, encarando o rosto divertido de minha mãe do outro lado.

— Bom dia, mãe — eu bocejei me sentando.

— Feliz ano novo, filho — ela sorriu.

— Obrigado, eu queria estar aí para te desejar feliz ano novo pessoalmente — Eu suspirei.

— Não foi por falta de convite — ela me alfinetou.

— Na verdade, eu tentei ir, mas aconteceram tantas coisas e acabei preso na Dinamarca. É uma longa história e…

— Jamie, você pode contar essa longa história em outro lugar? Qual é faz uns vinte minutos que nós dormimos — Summer se levantou ao meu lado.

Ela estava com os cabelos bagunçados e eu suspeitava que não estava totalmente acordada quando foi até o banheiro, vestindo apenas uma regata e a calcinha, sem perceber que eu estava em uma chamada de vídeo, se trancando ali.

Eu vi minha mãe empalidecer por completo antes de um tom vermelho, que só aparecia quando ela estava irritada, tomar conta de seu rosto.

— Jamie, seu cretino filho da puta, eu te ensinei melhor que isso.

— Não é o que você está pensando, e você sabe que é minha mãe, certo? — eu finalmente me levantei da cama, procurando um lugar mais reservado para aquela conversa, apesar de saber que não existia.

— Não importa! Eu sei reconhecer um sem vergonha. Sabia que você tinha puxado para o seu pai!

— Eu posso explicar…

— E que tipo de justificativa você pode dar para ter feito isso com a sua noiva?

— Nós não vamos mais nos casar.

— Como não? O casamento é em menos de três meses!

Summer voltou para a cama, se cobrindo até a cabeça com o edredom. Decidi ir até o banheiro para não incomodá-la mais, fechando a porta atrás de mim.

— Ela desmarcou tudo. Eu ia te contar, estava voltando para casa, mas o clima acabou atrapalhando minha viagem, e foi quando conheci a Summer.

— Jamie, deve ter sido apenas uma briga. Você lembra que a Janice desmarcou o casamento com seu pai faltando uma semana para acontecer. Você deveria esperar um pouco antes de pular na cama de uma desconhecida.

— Em primeiro lugar, Summer não é uma desconhecida. Em segundo lugar, Janice quis cancelar o casamento porque você falou  que não daria paz para ela. E em terceiro lugar, Meilin terminou comigo porque fui demitido e ela me classificou como um peso morto fracassado, então não, nós não vamos voltar.

— Aquela vadia falou que você é o quê? Eu vou…

Foi quando eu vi o relógio no canto superior da tela, me fazendo arregalar os olhos.

— Mas que merda, mãe, eu preciso ir! — eu interrompi seu discurso.

— Mas…

— Eu vou tentar chegar ainda hoje, mas preciso me apressar para pegar o ônibus — eu expliquei antes de encerrar a chamada sem esperar nenhuma resposta.

Eu corri para o quarto, apanhando a camisa que estava no chão, vestindo-a apressado.

— Summer acorda.

— Eu estou cansada, me deixa em paz, Jamie — ela murmurou com a cabeça ainda coberta.

Eu fui até a cama, arrancando o edredom de cima de seu corpo.

— Já passa das dez da manhã. Nós temos menos de uma hora para chegar a estação e pegar o maldito ônibus. E eu gostei muito do tempo que passamos aqui, mas não pretendo ficar um segundo a mais que o necessário nesse país.

Ela levantou da cama em um pulo, parecendo assustada com a informação. Após nossa segunda comemoração da noite anterior, Aksel nos contou sobre um ônibus que partiria no fim da manhã em direção a Ofende, uma cidade a algumas horas de distância que era grande o suficiente para contar com um aeroporto internacional.

— Como pode ser tão tarde? Parece que eu dormi meia hora — ela praguejou enquanto procurava uma roupa para se vestir.

— Eu sei, mas nós precisamos nos apressar, eu não quero perder outro Voo.

Apesar de ter adorado conhecer Summer e passar aquele tempo com ela, eu não aguentava mais nenhum imprevisto naquela viagem.

Por sorte nós conseguimos chegar a tempo de embarcar, e estávamos tão exaustos que dormimos boa parte do trajeto. Despertei quando estávamos quase em nosso destino. Summer dormia em meu ombro enquanto trafegávamos pela paisagem coberta de neve da Dinamarca. Chequei o horário de nossos voos em meu celular.

Nós chegaríamos a tempo!

Voltei a observar seu belo rosto, sentindo algo se revirar dentro de mim só de pensar que em algumas horas eu me despediria dela em definitivo.

Por sorte Summer havia conseguido um voo direto para Edimburgo, enquanto eu embarcaria para Londres pouco depois. Aqueles eram nossos últimos momentos juntos.

E eu nunca mais voltaria a vê-la.

Isso era esperado, certo? Na teoria eu não deveria me importar, mas na prática a história era diferente.

— Por que você está me encarando? — ela perguntou ainda de olhos fechados.

Summer piscou devagar, inclinando o rosto em minha direção. Não resisti a beijá-la, eu precisava aproveitar cada segundo ao seu lado.

— O que você vai fazer quando chegar em casa? — ela perguntou assim que nos afastamos.

— Provavelmente ser interrogado pela minha mãe durante horas — eu sorri — e comer as sobras da festa de ontem.

— Parece divertido — ela riu.

— E você?

— Eu vou contar todos os detalhes da minha viagem para minha mãe, de preferência, enquanto como um Salmon Fishcake no The Alaister's — ela suspirou.

— The Alaister's?

— É um restaurante que tem na esquina da rua da minha mãe. É pequeno, mas eu juro que eles fazem o melhor bolinho de salmão que eu já comi na vida. Se eu morasse com a minha mãe, já teria virado uma bola — ela gargalhou.

— Isso eu duvido, aposto que você é uma daquelas garotas que comem muito e ainda mantém a boa forma — eu a provoquei.

— É isso que você pensa? Esse corpinho aqui é mantido com muitas horas de academia, Jamie — ela voltou a rir, se aninhando em mim.

Eu me sentia bem em sua presença, não queria me afastar dela, mas sabia que nossa realidade não era favorável.

Chegamos ao aeroporto em alguns minutos, e passamos por todo o processo de check-in, quando menos esperamos, estávamos no mesmo lugar do nosso ponto de partida. Uma sala de embarque em um aeroporto desconhecido. Mas dessa vez, eu não me sentia nem um pouco ansioso para embarcar no avião para Londres.

— Estão anunciando o meu voo, Jamie — Summer se levantou com um suspiro, parecendo tão incomodada quanto eu.

Eu acariciei seu rosto, desejando que nossa situação fosse diferente e eu não tivesse que me despedir. Mas não podíamos fugir da realidade. Lhe dei um último beijo, aproveitando a sensação de tê-la tão próxima a mim.

— Faça uma boa viagem, Summer.

— Eu te ligo quando conseguir um novo telefone — ela prometeu antes de correr em direção ao portão de embarque, me deixando para trás com suas fotos em meu celular e a sensação de ter perdido uma das melhores oportunidades de minha vida.

Mas foi melhor assim.

***

Eu parei na frente da porta vermelha de um grande sobrado branco com detalhes pretos que era idêntico aos demais sobrados daquela rua.

Aquela era a minha quarta — e eu espero que última — tentativa. Desde que cheguei à casa de minha mãe eu me senti incompleto. Não conseguia parar de pensar ou falar na excêntrica atriz com quem dividi tantos momentos inusitados naquela viagem, e de tanto me ouvir, minha mãe insinuou que eu deveria procurá-la de uma vez.

Foi assim que eu acabei perdido em uma cidade nos arredores de Edimburgo, com um buquê na mão, tendo apenas o endereço de um restaurante como ponto de referência para encontrar a mulher que enfeitiçou minha mente e alma nos últimos dias.

Após bater na porta de duas pessoas que afirmavam não conhecer nenhuma família Monroe, a terceira tentativa foi a da sorte, com um velho senhor que conhecia bem a família e me indicou qual casa eu deveria ir.

Meu coração acelerou ao ouvir sua voz dentro da casa, gritando para alguém que iria atender a porta após eu tocar a campainha.

Eu não deveria estar assim, faz apenas três dias que nos despedimos naquele aeroporto da Dinamarca.

Sem me dar mais tempo para pensar, Summer abriu a porta, e uma expressão surpresa invadiu seu rosto assim que ela me viu ali parado na sua frente, segurando um buquê das mais variadas flores.

— Jamie, o que… — ela parecia sem palavras.

— Eu não sabia qual era sua flor preferida, então peguei uma de cada tipo — eu falei a primeira coisa que veio a minha mente.

Ela aceitou o buquê, levando-o ao rosto para cheirá-lo.

Por um momento eu temi que ela não gostasse daquela surpresa e me quisesse longe. Ela sequer tinha me ligado, como prometeu que faria.

— Ahh cara, não me diz que você mudou de ideia sobre o bordel francês — ela se aproximou, rodeando meu pescoço com o braço livre, enquanto um sorriso espontâneo iluminação seu rosto.

Eu não hesitei em levar minha mão até sua cintura, colando seu corpo ao meu.

— Na verdade, eu vim porque você me prometeu um emprego — decidi entrar em seu jogo — você sabe que agora vou precisar.

— Com um rostinho bonito desses, eu consigo até um papel que você sobreviva até o fim do filme — ela zombou.

— Nesse caso…

Eu não fui capaz de concluir a frase, pois seus lábios logo vieram de encontro aos meus e eu soube que seja lá o que estivesse acontecendo entre nós seria muito mais duradouro do que nossa interminável tentativa de chegar a Londres.

FIM

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