Capítulo 01 - Nevasca Na Romênia
Summer
Eu observei com preocupação a neve que começara a cair com mais força do lado de fora daquele aeroporto de fim de mundo. Fazia pouco mais de uma hora que havíamos decolado de Istambul quando recebemos o aviso que faríamos um desvio para a Romênia por conta da baixa visibilidade causada pelo mau tempo. E pela quantidade de pessoas perambulando por aquele saguão, o meu voo não havia sido o único. Eu abri mais uma vez a troca de mensagens do dia anterior com minha mãe, garantindo que estaria em sua casa em breve. A frustração logo tomou conta de mim. Eu devia ter viajado outro dia!
Apoiei meus cotovelos em minhas pernas antes de descansar o rosto em ambas as mãos, fazendo um pequeno beicinho por conta da situação geral.
Ergui meu olhar ao notar um rapaz se acomodando no assento à minha frente, ele era bonito, muito bonito. Seu rosto era composto com traços fortes e seus cabelos ruivos caiam em mechas sobre sua testa, e como se soubesse que eu o estava encarando, ele ergueu o rosto em minha direção, franzindo o cenho antes de me dar um leve aceno com a cabeça em reconhecimento.
Meu rosto ameaçou corar por um segundo, mas eu estava presa naquele local tanto quanto ele.
Por que não?
— Oi — eu me endireitei, com um sorriso discreto.
— Oi — ele respondeu após uma breve consideração.
— Está vindo de onde?
Ele me encarou, parecendo pensativo por alguns momentos antes de se levantar e vir em minha direção, ocupando o lugar vago ao meu lado.
— Estou vindo de Hong Kong — um leve sotaque inglês se fez presente — e você?
— Istambul. Estava tentando chegar a Londres — eu expliquei.
— Mesmo? Eu também — ele estendeu sua mão para que eu apertasse — Jamie Burton.
— Summer Monroe — eu devolvi o cumprimento com satisfação.
Pelo menos teria uma maneira de passar o tempo enquanto estivesse ali, a previsão para que pudesse voltar a um avião era de duas horas e era frustrante não conhecer ninguém.
— É um prazer conhecê-la, Summer.
Por um momento o silêncio reinou entre nós enquanto o homem me observava, parecendo perdido nos próprios pensamentos, então decidi dar o próximo passo.
— Negócios ou prazer ?
— Desculpe, o quê? — ele parecia atordoado com a pergunta.
— Sua ida a Londres. É por negócios ou por prazer?
— Como você sabe que eu não moro em Londres? — ele exibiu um sorriso mínimo.
— Foi um palpite que você acabou de confirmar — eu ofereci meu melhor sorriso ao homem à minha frente, na esperança de conseguir impressioná-lo de alguma maneira.
Aquilo parece ter surtido efeito já que seu olhar se prendeu ao meu e eu consegui sua total atenção.
Ele soltou um pequeno ruído de seus lábios como se fosse uma espécie de risada antes de me responder.
— Pretendo fazer uma surpresa para minha família — ele se limitou a responder.
Família, que família?
Meu olhar imediatamente escrutinou sua mão em busca de uma aliança. Seria esse motivo de sua hesitação? Estava se sentindo culpado por flertar com uma desconhecida enquanto planejava surpreender sua mulher e filhos?
Parabéns Summer! Você sempre escolhe os melhores!
— Minha mãe e minhas irmãs estarão na festa de ano novo de minha tia — ele seguiu o meu olhar até sua mão, provavelmente adivinhando meus pensamentos — elas não sabem que estou indo, por isso é uma surpresa.
— Isso é atencioso — não pude evitar de sorrir diante da história.
— E quanto a você? — ele questionou ainda me observando.
— Bem, eu... QUE MERDA! — eu me levantei em um rompante ao olhar em direção ao painel que exibia os voos.
— Qual é o problema? — ele também se levantou, me acompanhando.
— Meu voo foi cancelado! Eu não acredito — eu murmurei marchando em direção a um guichê, deixando-o para trás.
Sim, ele era bonito, mas não o suficiente para me manter presa na Romênia por um segundo a mais do que o necessário.
— Com licença — eu chamei atenção do funcionário do outro lado do guichê.
— Sim?
— Meu voo está aparecendo como cancelado — eu apontei meu problema.
— Sim, todos foram — ele respondeu com desinteresse — sua companhia lhe oferecerá transporte até o hotel mais próximo.
Eu respirei fundo diante da informação. Aquilo tinha que ser uma piada. Eu devia ter aceitado a oferta de meu pai de acompanhá-lo até Antalya.
— Eu preciso de uma passagem em outro voo, e não de transporte até o hotel mais próximo.
— Todos foram cancelados. Não há outro — ele tentou me dispensar.
— Então eu preciso…
— Summer? — Eu ouvi a voz grave de Jamie atrás de mim, enquanto eu tentava chamar a atenção do rapaz do outro que insistia em me ignorar.
Eu relutei em olhar em sua direção por um segundo. Por mais que o tivesse considerado extremamente atraente, no momento, eu precisava convencer aquela criatura de que ele tinha que me colocar em um outro voo. Se eu não conseguisse chegar a tempo para a festa de ano novo minha mãe me mataria!
— Sim?
— Talvez eu tenha uma solução — ele indicou com a cabeça para que eu me aproximasse e aquilo acabou me tirando de meu antigo posto, para alívio do rapaz.
Ele me afastou do guichê, me deixando impaciente para saber qual era seu plano mirabolante.
— E então? — eu cruzei os braços o encarando com expectativa.
— A previsão não é muito boa, nós não vamos conseguir um voo — ele começou — eu reservei uma passagem de trem, e se você quiser...
— Espera, você quer que eu cruze a Europa em um trem com você? — eu descruzei os braços, surpresa pela sua proposta.
— Eu apenas...
— Olha, sinto muito, você parece ser um cara legal. Mas eu sou inteligente o suficiente para saber que não devo embarcar em uma viagem com alguém que eu acabei de conhecer.
— Não foi o que eu propus — Ele devolveu.
— Eu prefiro não correr o risco de acabar presa em um bordel francês — eu neguei — por mais que meu pai seja ótimo, ele não é o Liam Neeson, eu me daria mal.
— Você acha que eu vou te sequestrar e te vender para um bordel francês? — ele ergueu ambas as sobrancelhas.
— Sabe o que dizem, nunca confie em estranhos — eu o desafiei.
— Então você tem outro plano, boa sorte — ele parece ter desistido, começando a se afastar.
Eu olhei em volta, localizando o guichê de aluguéis de veículos.
— Eu vou de carro. É mais seguro — eu garanti.
Aquela declaração fez o homem estancar em seu lugar antes de se virar para mim novamente com um olhar incrédulo.
— Então viajar comigo em um trem com vários outros passageiros não é seguro. Mas você, uma mulher completamente desacompanhada, alugar um carro no meio da noite, e cruzar alguns países, que você provavelmente desconhece, é seguro?
— Bem...
— E eu que vou te colocar em um bordel francês? — ele parecia dividido entre a diversão e perplexidade.
— Não é essa questão — eu o encarei.
— Bom eu não vou ficar até descobrir qual é a questão, eu já consegui uma passagem e tenho um trem para pegar. Boa sorte — ele desejou antes de se virar e me deixar para trás pensando em minhas opções.
Eu olhei em volta diante do caos que tomava conta do saguão do aeroporto com todos reclamando sobre seus vôos, minhas opções eram permanecer ali até conseguir um voo para Londres, sem saber ao certo quando isso aconteceria e sem conhecer ninguém ou acompanhar o homem e fazer o trajeto de trem. Aquela opção não parecia tão ruim quanto a possibilidade de ficar presa na Romênia...
Com esse pensamento tratei de segui-lo.
— Jamie, espera eu vou com você.
Eu corri atrás dele arrastando minha mala sem muita dificuldade, ele olhou por sobre o ombro arqueando ambas as sobrancelhas em um olhar questionador.
— Pensei que eu fosse algum tipo de sequestrador — ele me provocou.
— Bem é que…
— Além de tudo você não me conhece. você não deveria viajar estranhos, lembra? — ele continuou me provocando.
— Talvez eu tenha exagerado um pouco, você não tem cara de sequestrador — eu ofereci meu melhor sorriso na tentativa de conquistar sua confiança enquanto saíamos do aeroporto.
Ele indicou com a cabeça alguns táxis estacionados e eu segui naquela direção sem pensar muito.
— Eu não sabia que sequestradores tinham um tipo específico. Eu ainda posso ser um sequestrador e não parecer com um, não acha?
— Talvez eu deva te passar o telefone do meu pai então, ele tem dinheiro e pode pagar o resgate — eu revirei os olhos diante de sua última frase.
Ele não pode esquecer aquilo?
— Seu pai tem dinheiro para pagar o resgate? Ótimo! Você devia escrever isso em uma placa e colocar no vidro do carro que você alugar para cruzar a Europa sozinha — ele desdenhou.
— Não foi o que eu quis dizer e você sabe disso — eu cruzei meus braços tentando permanecer séria, enquanto o taxista alternava o olhar entre nós dois sem saber ao certo o que estava acontecendo.
Jamie indicou as malas com a cabeça para que o ele as guardasse no porta-malas antes de abrir a porta do carro para que eu entrasse no banco de trás. Eu me acomodei ali, me sentindo frustrada pela forma como ele estava agindo.
Onde foi parar o rapaz gentil que estava conhecendo momentos atrás?
Ele se acomodou do meu lado em seguida, pedindo ao taxista que nos levasse à estação de trem central.
— O que eu realmente quero saber é: como seus pais confiam em te deixar viajar sozinha? — ele voltou a falar após alguns momentos em silêncio.
— Hei, eu não sou incapaz — eu o encarei chocada.
— Não, apenas é uma pessoa fácil de se sequestrar — ele devolveu quase imediatamente, fazendo meu olhar se tornar ainda mais incrédulo.
Ele está falando sério? Ele ficou chateado por minha preocupação com a minha segurança?
Eu senti o olhar surpreso do motorista do táxi sobre mim através do retrovisor e eu logo me virei em sua direção a fim de esclarecer aquela declaração.
— Ninguém está sendo sequestrado — eu tranquilizei o homem antes de voltar minha atenção para Jamie — e se é o que você deseja ouvir, eu sinto muito pelo que disse antes.
— Por sugerir que eu sou um traficante de mulheres? — ele me encarou.
— Foi uma preocupação sincera — eu me justifiquei — eu vejo as notícias, você poderia...
— Esse é o pior pedido de desculpas que eu já ouvi — ele reclamou — aliás, acho que quem deveria se preocupar sou eu, já que é você quem não para de falar em sequestro!
Nós notamos novamente o olhar ansioso do taxista sobre nós através do retrovisor.
— Ninguém está sendo sequestrado — acabamos falando juntos, para tranquilizar o homem.
Nós voltamos a ficar em silêncio, e eu pensei que aquilo duraria pelo resto de nosso percurso, mas ele logo voltou a falar.
— Eu já te aviso que não tenho dinheiro e ninguém para pagar o resgate. Você não parece o tipo que me mataria, então acabaria me mantendo em cativeiro por um bom tempo. Talvez não seja uma má ideia, você teria que me alimentar.
Eu respirei fundo, talvez eu estivesse melhor se tivesse permanecido na droga do aeroporto. E em pensar que vou ter que aguentá-lo até chegar a Londres.
— Quer saber, eu retiro minhas desculpas! E é melhor a gente não se falar — eu murmurei cruzando os braços em um gesto defensivo.
Jamie soltou uma risada forçada, mas acatou meu pedido, se mantendo em silêncio pelo restante do caminho até a estação de trem.
O taxista parecia aliviado ao nos deixar com nossas malas no nosso destino, e eu quase tive que correr para acompanhar o homem até o interior do prédio.
— Hey, espera — eu pedi.
— Você pode comprar sua passagem naquele terminal eletrônico — ele indicou com a cabeça — deve comprar uma passagem para Budapeste. O trem sai em vinte minutos, então se apresse.
— Budapeste!? Eu tenho que ir para Londres!
— E nós vamos, mas os trens expressos estão com as passagens esgotadas, então teremos que fazer o trajeto por vias alternativas — ele explicou.
— Mas vai demorar uma eternidade! Você já tentou uma passagem para outro país mais próximo?
Eu não podia correr o risco de não chegar a tempo, seria a maior decepção da vida da minha mãe. Bom, ela teve outras decepções. Na verdade, ela já está acostumada, mas dessa vez, não se tratava apenas dela.
— Summer, olhe em volta. Estamos no dia 29 de dezembro, isso aqui está uma loucura e todos os vôos foram cancelados — pela primeira vez, ele pareceu realmente perder a paciência — eu sequer te conheço, estou tentando te ajudar e tudo o que você tem feito é agir como uma criança mimada que não se contenta com nada!
— Mas…
— Você pode fazer o que quiser, comprar passagem para onde quiser, ou ficar aqui — ele me cortou — eu vou fazer o meu caminho para Londres.
E então ele deu as costas, me deixando sozinha ali no meio daquela multidão. Minha mente girava com suas palavras. Ele falou sério? Eu não sou mimada, apenas quero chegar a tempo na casa de minha mãe! Senti algumas lágrimas queimarem em meus olhos, mas tratei de logo afastá-las.
— Ele nem te conhece, Summer — eu murmurei para mim mesma — vamos encontrar o nosso caminho para Londres.
Mas ele tinha razão. Não demorou muito para perceber que eu não teria outras opções, aliás, se demorasse muito nem aquela opção eu teria mais. Eu me contentei em comprar a passagem e me apressei para a plataforma de embarque, me sentindo derrotada.
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