¹²|Nós fizemos de tudo
Ele deixou uma planta nova na minha porta.
Eu a encontrei quando cheguei ontem da casa dos Blackburn após o jantar. Depois que Arnold me ligou, eu esqueci isso, mas quando estaciono há um quarteirão da boate onde tudo começou, isso me vem à mente. Não sei como ele entrou no prédio. Convenientemente, as câmeras de segurança do meu prédio estão em processo de substituição. Legal, não é? Vou deixar um vídeo no meu notebook para que os policiais vejam depois que eu for assassinada no meu próprio apartamento com apenas meu gato como testemunha.
Ando o quarteirão restante para chegar no beco dos fundos da boate. Eu ignoro tanto os cacos de vidro no chão, como o sangue. Não é sangue. Deve ser ketchup ou molho... Sei lá. Se alguém tivesse morrido aqui... Digamos, o barman com quem eu estava quase transando naquele dia fatídico - antes de ontem -, eu teria ficado sabendo. Tenho um alerta no Google para casos de homicídio em Chicago. Ninguém morreu aqui.
Dou sorte quando uma mulher que trabalha na boate - lembro de vê-la algumas vezes quando vim aqui - está saindo. Ela nem mesmo questiona o que vim fazer aqui e só deixa a porta aberta para que eu entre.
É estranho estar aqui sem que a música esteja tão alta que chacoalhe o meu crânio ou que não haja vários corpos se esfregando uns nos outros. Até o chão parece limpo.
- Quem é você?
Viro-me para a voz, encontrando um homem atrás do bar. Ele não parece em nada com Neil, no entanto. Eu esperava que ele estivesse aqui e eu pudesse completar os noventa e sete por cento de certeza que tenho de que ele não morreu.
- Oi. Você sabe se o Neil está aqui? Preciso entregar uma coisa a ele. - Lhe dou um sorriso que diz "Você sabe, o idiota esqueceu a cueca na minha casa".
Por sorte, esse cara ri, entendendo a minha mentira.
- Foi mal, moça, mas ele não está. Na verdade, ele se demitiu.
- Sério? Por quê? - Tenho um mal pressentimento sobre isso.
O homem começa a limpar o balcão enquanto fala.
- Na outra noite teve um assalto no beco aí de trás. Pelo menos foi o que Neil disse.
- E não é verdade? - Qualquer outra pessoa talvez desconfiasse que estou perguntando demais, mas esse cara está mais interessado em olhar o meu decote.
- Sinceramente? Acho que ele tá envolvido com aquela gangue que comanda tudo aqui. Sabe?
Anuo.
- Pois é. Destruíram o carro dele, mas essa não foi a pior parte. Colocaram pregos nas mãos dele. Cada um em uma mão. O cara que fez isso pregou tão fundo que atravessou as mãos do Neil.
Todo o sangue do meu corpo vira gelo. Ele... Ele pregou as mãos do Neil? De verdade?
- O Neil não era só barman, sabe. Ele trabalhava na manutenção também. Aqueles pregos? Eram dele mesmo. Isso é muito azar.
Concordo novamente, ainda distraída pelo horror que está embrulhando meu estômago.
- Por isso eu acho que foi coisa de gangue. Bandido normal não faz isso. Eu mesmo nunca fiz, moça. Eu só roubo e deixo a pessoa em paz, sabe?
Olho para ele, mas quem quer que seja esse cara, ainda está hipnotizado pelo meus bens aqui.
- Sei - respondo secamente. - O que aconteceu com o Neil depois? Ele não chamou a polícia?
- Que nada. Ele estava assustado pra caralho. Isso só me deu mais certeza que foi a gangue. Ele deve tá devendo dinheiro e aí aquele Alexander Vega, sabe, o chefão, mandou alguém assustar o cara.
Não achei que fosse possível, mas tudo em mim para de funcionar. Ele não disse o nome que eu acho que ele disse, certo? Quantos anos faz que não ouço alguém dizer o nome desse homem em voz alta? Só leio sobre ele em jornais, mas tento realmente não fazer.
Claro, todo mundo que mora em Chicago conhece ele ou pelo menos seu nome, mas é muito irônico que esse cara desconfie que Alexander Vega tem algo a ver com isso, algo que está ligado diretamente... a mim.
Puta que pariu.
- Obrigada.
Saio da boate o mais rápido possível e olho por cima do ombro durante todo o caminho até o meu carro.
Ao entrar no veículo, deixo minha cabeça cair no volante e fecho meus olhos com força.
Aquele cara lá no bar não faz ideia da suposição que está falando, principalmente porque Alexander Vega não é chefe de gangue alguma.
Ele comanda a porra do tráfico em Chicago. Tudo passa por ele: drogas, armas...
Eu.
☠️
QUATORZE ANOS ATRÁS
Estou atrasada para o jantar.
Disse à mamãe que iria estudar na casa da Beth, mas não contei que Charlie estaria lá também. Ele é irmão de Beth e eu sou muito afim dele. Tipo, pra caralho. Ele fez uma tatuagem escondida dos pais no verão passado e eu fui a primeira pessoa a quem ele mostrou. Fora isso, ele é um garoto legal: joga no time de basquete da escola e tira notas boas... Ah, e ele é do último ano. Mamãe jamais aceitaria ele como meu namorado por causa disso. Não que Charlie e eu estejamos namorando. A gente ficou hoje... e na semana passada... e mais algumas vezes ao longo dos últimos três meses, mas não é um namoro. Namoros são complicados, mas gosto de Charlie e ele de mim, mas ele fica dizendo que quer conhecer minha mãe. É um saco.
Quando chego no prédio que minha mãe e eu moramos, já tenho minha mentira planejada: os pais de Beth demoraram de chegar e nós duas precisamos ficar com a irmã mais nova de Beth porque a babá precisou ir embora. Bem simples. Sou uma ótima melhor amiga, não é?
Mas antes que eu suba para nosso apartamento para abrir a porta e sentir o cheiro delicioso da comida da minha mãe, me dou conta da movimentação na frente do nosso prédio. Há carros de polícia e uma ambulância.
Meu coração dispara e sinto ele na minha garganta quando corro e passo por entre as pessoas que estão se amontoando na frente do prédio. Chego na frente de todo mundo bem a tempo de ver uma mulher em uma maca ser colocada dentro da ambulância.
Mulher asiática com pele clara, cabelos escuros e curtos acima do ombro, vestindo um vestido florido...
- MÃE! - Passo pelos policiais... Ou tento. Um deles me segura e eu começo a lutar. - Me solta! É a minha mãe! Mãe! MÃE!
- Aquela mulher é a sua mãe? - o policial pergunta. Faço que sim, sem tirar os da minha mãe. Minha visão está embaçada com água. Está chovendo? - Tudo bem. Você pode ir com ela.
Quando ele me solta, corro para dentro da ambulância.
- Mãe. Mãezinha... - Pego sua mão porque parece ser um lugar seguro. Há tanto sangue nela... - O que houve? - pergunto a ninguém especial, ciente que há outras pessoas na ambulância e que começamos a nos mover.
- Ela levou quatro facadas. Uma no peito, na costela e duas no abdômen.
- Ela vai ficar bem? - Quando ninguém responde, olho para cima. Os dois paramédicos parecem incertos, mas um deles anue.
- Se ela resistir até chegarmos ao hospital, tenho certeza que os médicos farão o possível.
Ela teve duas paradas cardíacas antes de chegarmos ao hospital.
Às 19h36, o médico diz as palavras que eu sei que nunca mais vou esquecer.
- Sinto muito, mas ela não resistiu. Nós fizemos de tudo, mas a lâmina perfurou o pulmão e não foi possível salvá-la.
Pela primeira vez eu entendi o significado de uma coração partido, porque o meu se estilhaçou e uma parte de mim morreu com a minha mãe.
Minha mãe... Minha mãezinha...
Não lembro como ou por quê, mas vim parar no beco atrás do hospital. Acho que foi depois de uma assistente social aparecer e perguntar se eu tinha algum parente para quem eu queria ligar. Quando a ignorei, o policial contou que a morte da minha mãe foi consequência de um assalto que deu errado, que o bandido tentou arrombar vários apartamentos, mas só teve "sorte" com o nosso, pois a porta estava destrancada. O policial disse que minha mãe lutou.
Não importa, pois ela está morta. E é minha culpa. Ela deixou a porta destrancada para mim porque eu sempre me atrapalhava em lembrar qual era a chave. E isso a matou.
Não sei há quanto tempo estou escondida ao lado dessa caçamba de lixo, mas minhas roupas e minha mochila estão encharcadas por causa da chuva que cai forte sobre Chicago. Mamãe adorava chuva. Ela sempre se sentava perto da janela e tomava chá enquanto ouvia o barulho da chuva. Eu costumava zoar ela por ser tão brega, mas ela só sorria e me convidada para sentar com ela.
Eu deveria ter aceitado. Todas as vezes, eu deveria ter dito sim e ficado feliz por passar mais cinco minutos com ela. Deveria ter aproveitado mais aqueles momentos.
- Kate?
Ergo o rosto de onde havia apoiado em meus joelhos e me assusto ao ver o homem agachado na minha frente.
Me arrasto para trás, mas não há para onde ir porque já estou encostada na parede de concreto.
- Não precisa ter medo de mim. Sou Alexander Vega, amigo da sua mãe. Sinto muito pela sua perda.
Meus lábios tremem com força que estou fazendo para não voltar a chorar. Eu não conheço esse homem e mamãe nunca mencionou nenhum Alexander Vega.
Enxugo meu rosto, apesar de ser inútil, e dou uma boa olhada no homem a minha frente. Está escuro, mas ele está tão perto que tenho quase certeza que posso ver a cor dos seus olhos. Se eu estiver certa, são azuis. Ele é branco e apesar de estar abaixado, tenho a sensação que é bastante alto quando está de pé. Seu rosto mostra marcas do seu envelhecimento e acho que ele não deve ter mais que quarenta. Seu cabelo está molhado por causa da chuva, então não sei dizer a cor. Ele usa terno, o que me diz que deve ser importante. E seu sorriso é amigável.
Mas mamãe nunca mencionou nenhum Alexander Vega.
- Me deixa em paz - digo e me encolho um pouco mais.
- Eu sei que está assustada, mas só quero ajudá-la. Sua mãe provavelmente nunca falou de mim. Estou certo? - Não digo nada. - Ela trabalhava no meu bar às vezes. Ela também sabia que eu tenho... certo poder e influência na cidade. O suficiente para proteger a filha dela se algo lhe acontecesse.
- Minha mãe pediu para você cuidar de mim se ela... se ela...
- Sim.
Franzo as sobrancelhas.
- Por quê? Por que ela faria isso?
- Você quer questionar uma mãe por proteger e garantir a segurança da sua filha? - Alexander arqueia a sobrancelha.
- Por que faria esse favor a ela? E não me diga que é só porque ela trabalhou no seu bar. Eu não sou idiota. - Meu instinto diz que eu não deveria falar com esse homem assim, mas estou tão cansada, e a minha mãe, ela....
- Sei que não é, querida. - O sorriso dele me causa calafrios agora. - Vou ser breve porque senão nós dois vamos pegar um resfriado nessa chuva: sua mãe salvou minha vida. Eu levei uma bala e ela a tirou e evitou que eu morresse. Em troca, eu prometi cuidar de você se algo acontecesse. Sua mãe era uma boa enfermeira.
Eu ignoro as lágrimas quentes que deslizam pelas bochechas. Ele está certo sobre ela ser uma boa enfermeira. Ela trabalhou no hospital central como enfermeira por um tempo, mas foi demitida porque precisaram fazer cortes.
- Minha mãe nunca ajudaria um criminoso - deixo escapar. Não sou idiota. Homem de poder e influência? Levar uma bala e deixar uma enfermeira que nem era mais enfermeira cuidar de você ao invés de ir ao hospital? Ele com certeza não é um homem bom.
- Mas ela ajudou e confiou sua segurança a mim. Agora você vai vir comigo e deixar eu cumprir a promessa que fiz a sua mãe?
Ele não negou que é um criminoso. Deus, onde que minha mãe estava com a cabeça?
Isso importa? Agora ela está morta.
É verdade e eu não tenho para onde ir. Nosso apartamento virou cena de crime e tem uma assistente social atrás de mim. Ela com certeza vai me mandar para um orfanato ou algo assim. Talvez seja mais seguro que ir com Alexander... Ou talvez eu vá para um lar adotivo com algum tarado que vai me estuprar a noite quando eu for dormir.
Assim como pode acontecer com Alexander.
Mas ele conhecia minha mãe. Ele sabia sobre o trabalho dela de enfermeira. E sinceramente, mamãe era paranóica. Queria duvidar mais um pouco, mas ela faria qualquer coisa para me proteger - de quê, eu não sei - inclusive pedir ajuda a alguém como Alexander. Talvez ele seja aquele tipo de criminoso que não fere mulheres e crianças, certo?
- Tudo bem, mas eu quero uma arma - eu não sei porque digo isso, eu nem sei usar uma arma, mas se vou embora com esse estranho, preciso ter alguma coisa para me defender.
Alexander me observa por um momento onde apenas o barulho da chuva é ouvido, mas depois anue. Ele olha por cima do ombro e estende a mão. Só então percebo os dois homens parados nas sombras do beco.
Ele tem guarda-costas. Jesus.
Um deles lhe entrega uma arma e eu estendo a mão.
Tenho não ficar surpresa quando Alexander põe a arma na minha não. É pesada e estranha para os meus dedos, mas eu a seguro como um salva-vidas.
- Vamos. Não quero que fique doente.
E eu vou com ele.
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Capítulo especial para GabrielaPassos865. Feliz aniversário, flor♥️😘✨
OOOiiiiiiiii. Obrigada pelos 3K🖤.
Não postei capítulo ontem pq estava me sentindo mal e eu sei que esse capítulo é pequeno, mas AMANHÃ TEM MAISSSSSSS.
E o capítulo de amanhã tem 4K, hein👀👀
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2bjs, môres♥
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