𝕮𝖆𝖕 29
Cap 29: Último suspiro
O teto branco do hospital parecia girar levemente diante dos olhos de Hana. O cheiro forte de antisséptico misturado com a brisa gelada do ar-condicionado tornava o ambiente ainda mais impessoal. Seu corpo estava pesado, a dor latejante em suas mãos e joelho a lembrava da realidade cruel. Ela não sabia quanto tempo havia passado desde que perdera a consciência, apenas recordava-se de ser carregada até ali por Kim Dae-un antes que tudo se tornasse um borrão.
O som da maçaneta girando a fez desviar o olhar. A porta se abriu lentamente, e Kim Dae-un entrou, os braços cruzados e a expressão indecifrável. Hana piscou algumas vezes antes de fazer um esforço para se erguer na cama.
— Sensei... — murmurou com a voz fraca, sentindo um peso esmagador em seu peito.
Kim Dae-un manteve-se em pé por um instante, estudando Hana antes de falar.
— A doutora disse que você fraturou as mãos e o joelho esquerdo, mas que logo ficará melhor. — Seu tom era seco, mas não rude. — E também, que não comia bem há dias.
Hana abaixou o olhar para os próprios dedos enfaixados, sentindo a ardência se espalhar por seus braços. Ela sabia que seu corpo estava um desastre, mas isso era o menor dos seus problemas.
— Eu... não posso ficar aqui nessa cama. Eu tenho que continuar lutando... — A urgência em sua voz foi quebrada pelo tremor em suas palavras.
Kim Dae-un finalmente descruzou os braços e deu um pequeno suspiro antes de se aproximar.
— Até grandes campeões precisam de descanso nesse momento.
— Sensei... — Hana tentou começar, mas foi interrompida.
— Eu sei. — A mulher se sentou na beira da cama, cruzando as pernas e observando o quarto com um olhar perdido. — É o mesmo hospital que...
Hana arregalou os olhos, como se tivesse sido atingida por uma descarga elétrica.
— Você sabe! Ele está aqui, ele está vivo! — A súbita esperança em sua voz fez seu peito arder.
Kim Dae-un virou o rosto para Hana, seus olhos carregando uma sombra de melancolia.
— Hana... você sabe. Ele está em coma há dias. Ninguém mais acredita que possa acordar. O hospital vai desligar as máquinas.
O coração de Hana parou por um instante, o pavor se espalhando como veneno por suas veias.
— Eles não podem! — Sua respiração estava irregular, a dor em seu joelho esquecida diante da ameaça real que pairava sobre ela.
Kim Dae-un desviou o olhar por um momento antes de soltar um longo suspiro.
— É melhor assim... Eu sei que é doloroso. Mas foi um milagre ele não ter morrido na hora.
Hana sentiu um nó em sua garganta, seus olhos arderam e ela apertou os lençóis com força.
— Sensei! Eles me disseram que ele reagiu bem à cirurgia!
Kim Dae-un balançou a cabeça, seu semblante pesado.
— Mas isso não é o suficiente. Se ele não acordar do coma... você já sabe.
Hana sentiu o mundo ao seu redor desmoronar.
— Não...
— Eu sinto muito, Hana...
O choro veio antes mesmo que ela pudesse conter. As lágrimas escorreram pelo rosto pálido enquanto Kim Dae-un a puxava para um abraço firme. Hana não resistiu, afundando o rosto no ombro da sensei, sentindo os soluços rasgarem seu peito.
Após alguns minutos, elas se separaram lentamente. O silêncio era quase ensurdecedor.
Hana limpou as lágrimas com as mãos trêmulas antes de respirar fundo.
— Eu... quero ver ele, pela última vez...
Kim Dae-un assentiu, sua expressão mais branda.
— Está bem. Depois disso, vão desligar as máquinas... e mandarei levar o corpo dele para a Coreia para cremar.
Aquelas palavras a perfuraram como uma lâmina afiada. Seu corpo estava coberto de curativos, cada passo doía, mas ela ignorou. Levantou-se da cama, seu andar vacilante sendo acompanhado de perto por Kim Dae-un.
O corredor parecia interminável. As paredes brancas, o som abafado de passos e o cheiro do hospital pareciam zombar da sua dor.
Então, finalmente, elas pararam diante da porta do quarto.
Hana sentiu o estômago revirar. Aquele momento parecia mais aterrorizante do que qualquer luta que já havia enfrentado. Ela respirou fundo, tentando encontrar coragem.
E então, com o coração pesando toneladas, encarou a porta.
Kim Dae-un empurrou a porta com cuidado, e um cheiro característico de hospital invadiu as narinas de Hana. O ambiente era silencioso, exceto pelo som rítmico dos monitores que mantinham Kwon Jae-sung vivo. A iluminação fraca deixava sombras longas sobre as paredes, aumentando ainda mais a sensação de frieza no quarto.
Assim que os olhos de Hana pousaram sobre ele, seu coração se apertou. Kwon Jae-sung estava deitado na cama, o corpo coberto por tubos e fios que o conectavam às máquinas. O bip constante do monitor cardíaco preenchia o ar, enquanto o ventilador artificial subia e descia seu peito mecanicamente.
As lágrimas encheram os olhos de Hana antes mesmo que ela percebesse. Seu peito doía, como se algo estivesse sendo arrancado de dentro dela. Sem pensar, ela avançou até a cama, ignorando qualquer dor em seu próprio corpo. Seu joelho protestou, mas nada importava agora.
Ela se inclinou sobre ele, envolvendo-o em um abraço cuidadoso, sentindo a frieza de sua pele contrastando com o calor de suas próprias lágrimas que escorriam e umedeciam o lençol.
Kim Dae-un permaneceu em pé, imóvel, observando a cena com um olhar difícil de decifrar. Mesmo que não demonstrasse, ela sentia a dor de ver Hana naquele estado.
— A culpa... não foi sua... — Hana sussurrou com a voz embargada, ainda abraçando Kwon, como se uma parte dela acreditasse que ele poderia ouvi-la.
O silêncio pesou no ar. Kim Dae-un desviou o olhar brevemente antes de se aproximar alguns passos.
— Hana... já chega, temos que ir. — Sua voz era firme, mas não fria. Ela queria tirá-la dali, poupá-la daquele sofrimento.
Hana, porém, não se moveu. Lentamente, ela se afastou do corpo imóvel de Kwon Jae-sung e se sentou na beira da cama. Seu olhar estava fixo no chão, perdido em um mar de pensamentos.
— Por que veio atrás de mim?... — Sua voz saiu baixa, quase um sussurro.
Kim Dae-un franziu o cenho, confusa.
— O quê?
Hana levantou os olhos lentamente, agora encarando-a diretamente.
— Eu perguntei por que veio atrás de mim.
Kim Dae-un cruzou os braços, sua postura rígida.
— Isso é pergunta que se faça, Hana? — Seu tom era levemente irritado, mas havia preocupação por trás dele. — Você mal conseguia se manter em pé e achava mesmo que ia conseguir derrubar aquele homem? Em algum momento, você iria parar na cadeia.
Hana soltou uma risada seca, sem humor.
— E isso importa?... Eu já não tenho mais nada. — Sua voz tremeu levemente, mas ela logo recuperou o tom. — A única coisa que eu queria era morrer de uma forma digna, fazendo o que eu amo.
Kim Dae-un respirou fundo antes de responder.
— Você está sendo egoísta.
Os olhos de Hana se estreitaram, a raiva e a dor misturando-se em sua expressão.
— Egoísta? — Ela inclinou a cabeça levemente, desafiadora. — Acha mesmo que eu sou egoísta aqui?
Kim Dae-un hesitou por um momento antes de continuar.
— Seus amigos se importam com você... e...
— E? — Hana pressionou, o olhar afiado.
A sensei desviou o olhar, claramente relutante em dizer a verdade.
— E eles querem te ver.
Hana soltou um suspiro longo, sua expressão se suavizando por um instante antes de se fechar novamente.
— Sensei... você mais do que ninguém sabe que não é egoísmo. Egoísmo é o que a vida fez comigo a vida toda.
Kim Dae-un a encarou, séria, mas permaneceu em silêncio.
— Eu entendo como sua vida pode ter sido difícil, mas...
— Não, sensei, você não entende. — Hana murmurou, sua voz carregada de amargura.
Ela ergueu as mãos trêmulas até o pescoço e puxou um colar de dentro da camisa, deixando-o à mostra.
— Sabe o peso que é carregar isso? — Sua voz vacilou, mas ela continuou. — A única coisa que meus pais deixaram antes de me rejeitar?
Os olhos de Kim Dae-un baixaram por um momento até o pingente do colar, mas ela não respondeu.
— Sabe como é ter que ser a melhor em tudo e viver com medo de decepcionar? — Hana continuou, sua voz cada vez mais carregada de emoção. — Sabe o que é perder a única pessoa que conseguia fazer você enxergar a luz?
As lágrimas que antes ameaçavam cair agora escorriam livremente pelo rosto dela.
— Claro que não. Você não sabe. — Ela soltou uma risada amarga, sem tirar os olhos de Kim Dae-un. — Acha que depois de matar o próprio avô isso vai te tornar alguém sofrido, mas não vai. Você não provou a dor de verdade.
O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor.
Kim Dae-un permaneceu imóvel, seu rosto sem expressão, mas seus olhos carregavam algo que ela não queria admitir.
Não havia como negar a verdade nas palavras de Hana.
A garota respirou fundo, tentando recuperar o controle sobre si mesma.
— Eu... preciso ir embora daqui. — Sua voz saiu baixa, mas determinada.
Ela se levantou, seu corpo ainda dolorido, mas sua mente já havia tomado uma decisão.
Passou por Kim Dae-un sem hesitar, mas, antes de sair, parou por um instante e olhou para trás.
Seu olhar pousou sobre Kwon Jae-sung mais uma vez, como se quisesse gravar sua imagem na mente.
— Faça um enterro digno para ele. — Sua voz foi quase um sussurro, mas carregava um peso imensurável. — Diga a Taeyang e a Muttaing para prepararem as melhores flores.
Dito isso, ela virou-se e saiu pela porta, sem olhar para trás.
Kim Dae-un ficou em silêncio por um momento, apenas observando Kwon Jae-sung. O som do monitor cardíaco ecoava pelo quarto frio e estéril, preenchendo o vazio entre eles. Ela inspirou fundo, tentando dissipar a sensação sufocante que apertava seu peito, e deu mais alguns passos à frente até estar ao lado da cama.
Ela olhou para ele, para o corpo imóvel e os fios conectados às máquinas que mantinham seu coração batendo. Era estranho vê-lo assim, tão vulnerável, tão diferente do garoto que um dia lutou ao lado de Hana.
Kim Dae-un soltou um suspiro cansado e abaixou o olhar.
— Ei... — sua voz saiu mais baixa do que esperava. — Eu confesso, você me atrapalhou muito.
Uma risada breve e sem humor escapou de seus lábios, enquanto uma lembrança distante passava por sua mente.
— Mas... agora, está atrapalhando ainda mais.
Ela desviou os olhos para o teto, como se estivesse tentando segurar algo dentro de si. Seu maxilar se contraiu levemente, e seus punhos se cerraram antes que ela voltasse a olhar para Kwon Jae-sung.
— Eu não sei o que vai ser dessa menina agora em diante. — Sua voz tremeu levemente, mas ela não hesitou. — Você não deveria abandoná-la desta maneira.
Houve um silêncio pesado, preenchido apenas pelo barulho das máquinas.
Kim Dae-un fechou os olhos por um breve instante antes de dar um último olhar para Kwon. Em seguida, virou-se e saiu do quarto, sentindo um peso inexplicável em seus ombros.
Ela sabia que não podia deixar Hana se perder.
Sem hesitar, começou a correr pelos corredores do hospital, ignorando os olhares curiosos dos enfermeiros e dos poucos pacientes que estavam ali. Seu coração batia rápido, mas não era por cansaço. Quando finalmente a viu na recepção, seu corpo se moveu sozinho.
Hana estava de costas, os ombros tensos, e parecia pronta para sair. Mas antes que pudesse dar mais um passo, sentiu um impacto forte ao seu redor.
Kim Dae-un a abraçou com força, segurando-a como se sua própria vida dependesse disso.
Hana congelou por um momento, surpresa.
— Kim... — ela sussurrou, a voz trêmula.
Quando as duas se afastaram, Hana pôde ver que os olhos de sua sensei estavam vermelhos. Kim Dae-un passou rapidamente as mãos pelo rosto, limpando qualquer vestígio de lágrimas antes de começar a falar.
— Hana, eu sei que pode ser difícil pra você. A dor... difícil de suportar.
Ela respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas.
— Hana, o que eu queria dizer aquela hora... você não pode me deixar.
A garota piscou, confusa, mas permaneceu em silêncio.
— Você foi a única aluna que eu vi um potencial diferente. — A voz de Kim Dae-un enfraqueceu por um instante, mas ela continuou. — Desde criança, você iluminou minha jornada como sensei.
Hana sentiu um aperto no peito ao ouvir aquilo.
— Se eu falhei com você, me perdoa... — Kim Dae-un desviou o olhar por um momento antes de encará-la novamente. — Eu não fui o que você merecia.
O coração de Hana bateu dolorosamente contra seu peito.
— Aqueles treinos pesados e rígidos moldaram o que você é hoje... Mas...
Ela hesitou, seus olhos brilhando com algo que Hana nunca tinha visto antes: vulnerabilidade.
— Eu queria que fosse forte. A melhor do mundo. Para que não sofresse mais.
Hana apertou os lábios com força, segurando o choro.
— Mas talvez eu estivesse enganada... — A voz de Kim Dae-un se quebrou levemente. — Eu não posso controlar o futuro, muito menos sua decisão.
As palavras pairaram no ar como um peso invisível.
Hana permaneceu imóvel, sentindo as lágrimas deslizarem por seu rosto sem que pudesse impedi-las. Ela queria responder, mas não sabia como.
Kim Dae-un assentiu para si mesma e virou-se para sair, convencida de que já tinha dito tudo.
Mas então, uma voz interrompeu seus passos.
— Com licença, você é a responsável por Kwon Jae-sung?
Kim Dae-un se virou de imediato, sentindo o estômago afundar. Seu olhar encontrou o da médica que se aproximava, a expressão séria.
O coração de Hana acelerou, e ela trocou um olhar apreensivo com sua sensei.
— Sim, sou. — Kim Dae-un respondeu, já se preparando para o pior.
A médica hesitou por um segundo antes de dizer com urgência:
— Precisam vir comigo, agora!
Hana sentiu o corpo enrijecer.
Ela olhou para Kim Dae-un, seu cenho franzido em confusão e medo. Mas sem hesitar, ambas seguiram a médica apressadamente pelos corredores.
Assim que entraram no quarto de Kwon Jae-sung, a visão diante delas fez o coração de Hana parar por um segundo.
O quarto estava cheio de médicos e enfermeiros se movendo rapidamente ao redor da cama. O som de máquinas sendo ajustadas e comandos urgentes enchia o ambiente.
Hana sentiu suas pernas tremerem.
As lágrimas começaram a brotar antes mesmo que ela tivesse coragem de perguntar.
— E então... precisam de mais algum documento para levar o corpo dele para a Coreia? — Kim Dae-un perguntou, a voz fria e controlada, como se estivesse se preparando para a confirmação do inevitável.
A médica a olhou com surpresa.
— Coreia? Deseja fazer um transferimento?
Kim Dae-un franziu o cenho, algo na reação da médica lhe dando uma ponta de esperança incômoda.
— O que quis dizer com isso?
A médica sorriu de leve, e foi então que suas palavras vieram como um choque.
— Eu vim dar as boas notícias.
O coração de Hana quase parou.
— O doutor estava prestes a desligar os aparelhos, mas... o paciente Kwon Jae-sung...
A médica fez uma breve pausa antes de continuar.
— Foi algo milagroso. Era como se ele estivesse lutando para sobreviver. E então, sua respiração voltou.
Hana arregalou os olhos, sentindo o mundo ao seu redor girar.
Ela virou-se para a janela do quarto e viu os médicos ajustando os equipamentos, recolocando os aparelhos em andamento.
Era real.
Suas mãos voaram para cobrir a boca enquanto um soluço escapava. As lágrimas começaram a cair sem controle, manchando seu rosto em uma torrente de emoção.
Kwon estava respirando sozinho.
Kwon estava vivo!
Continua...
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