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𖹭⠀࣭⠀ֹ capítulo um ⊹ㅤ ㅤ゜★
❛ quando a casa harkness virou circo. ❜
❛ postado em 30/11/2024
6.504 palavras | não revisado.




O RELÓGIO MARCAVA 7H30 DA MANHÃ, e a casa dos Harkness estava em seu momento mais caótico - como sempre. Agatha, de pé na cozinha imaculadamente moderna e equipada com tudo o que o dinheiro podia comprar, servia café em uma caneca com os dizeres: "Advogar é fácil, lidar com crianças é um inferno", um presente de Yelena Belova em sua última visita a Londres.

─── Vocês têm exatamente cinco minutos para descer ou eu juro que vou deixá-los na escola de pijama!

Ela gritou, segurando uma tigela de cereais com a outra mão. Seu tom era de ameaça, mas, como sempre, Nicky e Elle sabiam que a chance de ela cumprir era zero.

Nicky apareceu primeiro, arrastando os pés, com a mochila caindo de um ombro e um dos cadarços desamarrado. Aparentemente, hoje estavam decididos a fazer Agatha infartar.

─── Mãe, você viu meu livro de ciências?

Ele perguntou, a voz ainda grogue de sono. Agatha arqueou uma sobrancelha, encarando seu filho.

─── Se está no chão do seu quarto, enterrado sob aquela pilha de roupas que eu mandei você dobrar, então sim, eu vi.

Agatha deu um gole no café e revirou os olhos.

─── Bom dia pra você também...

Nicky murmurou, afundando na cadeira enquanto tentava inutilmente amarrar o outro cadarço.

Elle surgiu logo em seguida, saltitando como se tivesse dormido doze horas, o que era, claro, uma mentira.

─── Eu estava pensando, ─── começou ela, mordendo uma torrada sem nem olhar para onde as migalhas iam cair. Agatha pode sentir seu olho tremer. ─── Se eu me candidatar a presidente do grêmio, isso pode me dar pontos extra?

─── Depende, ─── respondeu Agatha, franzindo a testa. ─── Você está realmente interessada em ser presidente ou isso é só uma estratégia?

Elle deu de ombros.

─── Estratégia. Mas, convenhamos, é um bom plano.

─── Planos são bons quando não envolvem você me pedindo dinheiro para fazer coisas que você só quer fazer por despeito.

Elle deu um sorriso ladino, o tipo de sorriso que Agatha sabia ser prenúncio de problemas.

─── Você só me repreende porque sou igualzinha a você. Admito, é difícil competir com a perfeição.

Elle disse, exagerando no tom dramático enquanto mordia outro pedaço da torrada, espalhando migalhas pela bancada reluzente. Agatha não a repreendeu dessa vez, sentindo seu próprio ego massageado pelas palavras de sua filha. Ainda assim, a Harkness mais velha suspirou, apoiando uma das mãos na cintura.

─── Primeiro, você está longe de ser perfeita. Segundo, ser parecida comigo não é desculpa para comportamentos duvidosos. E terceiro- ─── Ela parou, franzindo a testa enquanto olhava a torrada sendo esmigalhada na bancada. ─── Você vai limpar isso antes de sairmos, certo?

─── Claro que sim.

Elle respondeu com a confiança de quem já estava planejando escapar pela porta sem olhar para trás.

─── Ela nunca limpa

Murmurou Nicky, agora finalmente de pé e com os dois cadarços amarrados de maneira desajeitada.

─── Ei! Você está do lado de quem, hein?

Elle apontou para o irmão com a torrada quase terminando de desintegrar em sua mão. Agatha já via a cozinha rodar.

─── Do lado de quem não vai ser assassinado pela mamãe hoje de manhã.

Ele respondeu, colocando a mochila no ombro e tentando se afastar da zona de conflito.

─── Vocês dois vão acabar no internato suíço se continuarem assim, ─── Agatha cortou, pegando sua bolsa e as mochilas deles de uma vez. ─── Nicky, você anda como um zumbi, Elle, você fala como se fosse a rainha do mundo. E eu? Bem, eu ainda estou me perguntando como sobrevivo a isso todo santo dia.

─── Porque você nos ama,

Elle respondeu prontamente, piscando de forma descarada. Aquela menina era parecida demais com Agatha para seu próprio bem. Agatha olhou para a filha por um longo momento antes de soltar um suspiro exagerado.

─── Amar é um trabalho exaustivo.

Quando os três finalmente saíram pela porta, com Elle segurando a torrada pela metade e Nicky ajeitando a alça da mochila, Agatha parou no topo da escadaria da entrada e olhou para os dois.

─── Não façam nada que me envergonhe na escola hoje. Ou melhor, só façam as coisas que não podem ser rastreadas até mim.

─── Sem promessas.

Elle respondeu, enquanto Nicky murmurava um educado, "Vou tentar."

No caminho para a escola, o ambiente no luxuoso SUV de Agatha era, como sempre, puro caos e declarações exageradas. Enquanto dirigia pelas ruas impecavelmente pavimentadas que levavam à escola particular onde os gêmeos estudavam, Agatha aproveitava os raros momentos de silêncio.

Bom, ao menos até Elle decidir que aquilo era insuportável.

─── Eu estava pensando...

Começou Elle, recostando-se no banco de couro enquanto mexia no cabelo.

─── Por favor, não.

Agatha respondeu de imediato, sem sequer tirar os olhos da estrada.

─── Você nem sabe o que vou dizer!

─── Se for algo relacionado a um plano mirabolante ou uma desculpa para evitar problemas, já sabemos onde isso vai dar.

Nicky interveio, do banco de trás, enquanto tentava terminar o dever de casa que claramente deveria ter feito na noite anterior.

─── Não é nada disso, ─── Elle respondeu, ofendida, mas claramente não convencendo ninguém. ─── Eu estava pensando que, se você realmente quisesse me apoiar, mamãe, poderia me ajudar a organizar minha campanha para presidente do grêmio.

Agatha soltou uma risada seca.

─── Ah, claro. Porque o que eu mais quero na vida é me envolver em uma guerra política escolar de adolescentes.

─── Não é uma guerra! É uma oportunidade para liderança. E networking.

Elle disse com seriedade, como se tivesse ensaiado aquele discurso. O que ela provavelmente fez, porque era uma filha de sua mãe. Nicky, por sua vez, bufou.

─── Você só quer se vingar da Chloe Parker porque ela roubou sua ideia para o jornal da escola.

─── Roubou não. Plagiou descaradamente, ─── Elle corrigiu, apontando um dedo para Nicky pelo retrovisor. ─── Além disso, Chloe Parker é uma metida que acha que só porque o pai dela é dono daquela cadeia de restaurantes todo mundo tem que se curvar para ela.

─── Ela tem razão, ─── Agatha murmurou distraída, antes de perceber que estava alimentando o ego da filha. ───Quero dizer... isso não é desculpa para transformar sua campanha em um ato de vingança pessoal.

─── É exatamente o que você faria!

Elle rebateu, com um sorriso de triunfo.

─── Certo, sem argumentos contra isso. Novo plano: vou trocar você de escola.

─── Não se preocupe, mãe, ─── Nicky disse, tentando aliviar a tensão. ─── Elle provavelmente vai ser expulsa antes de você precisar fazer isso.

─── Você é tão solidário. Nerd.

Elle respondeu, revirando os olhos. Quando finalmente chegaram ao portão imponente da escola particular - uma construção imaculada com tijolos aparentes e um jardim de rosas que parecia saído de uma revista de paisagismo -, Agatha estacionou em sua vaga reservada para "convidados de honra". Porque, claro, nada menos que isso seria aceitável.

─── Certo, crianças, hora de sair e fingir que pertencem a esta elite social.

Agatha anunciou, desligando o motor.

─── Fingir? ─── Elle disse, erguendo uma sobrancelha. ─── Eu sou a elite social. Eu sou uma Harkness!

─── E é por isso que você precisa de um pouco de humildade.

Agatha rebateu. Nicky já estava abrindo a porta, tentando se afastar do embate verbal antes que fosse puxado para o meio.

─── Tchau, mamãe.

Ele disse rapidamente.

───Boa sorte não sendo expulso hoje, Nicky,

Agatha respondeu com um meio sorriso. Elle hesitou na porta, lançando um olhar para Agatha.

─── Você sabe que vai se arrepender de não me apoiar, né? Quando eu for presidente e revolucionar a escola, vai dizer para todo mundo que me ensinou tudo o que sei.

Agatha arqueou uma sobrancelha, aquele olhar afiado que fazia advogados experientes tremerem no tribunal, mas nunca sua filha.

─── Querida, se algum dia eu assumir a responsabilidade por suas idéias revolucionárias, é porque finalmente perdi o juízo.

Elle estreitou os olhos, uma faísca de desafio em seu rosto.

─── Você só diz isso porque sabe que sou brilhante.

─── Você é brilhante, ─── Agatha concordou, inclinando-se para frente para ajustar a alça da mochila da filha, com um sorriso que só uma mãe poderia dar. ─── Mas também é insuportável. Agora, vá revolucionar o mundo. E, pelo amor de tudo que é sagrado, não derrube ninguém no processo.

Elle sorriu, convencida, e saiu do carro com uma confiança que só uma garota de doze anos poderia ter, sua torrada ainda na mão como se fosse um cetro de poder. Agatha provavelmente deveria a levar para um nutricionista.

A Harkness observou os dois caminharem para o portão. Nicky parou para ajudar Elle a ajeitar a barra da saia, provavelmente por saber que, se ela fosse pega pela diretora com o uniforme fora do padrão, seria um escândalo matinal. Eles trocaram um rápido empurrãozinho, mas o gesto parecia mais de cumplicidade do que provocação.

Enquanto eles desapareciam pelo portão da escola, Agatha deixou escapar um suspiro longo. Apesar de toda a bagunça e das constantes trocas de farpas, ela sentia um orgulho profundo ao vê-los crescer - mesmo que isso significasse assistir Elle tentando dominar o mundo e Nicky encontrando maneiras discretas de cuidar da irmã sem ser assassinado no processo.

Antes de dar partida, Agatha pegou seu telefone no console para checar as mensagens. Entre as notificações de trabalho e um lembrete de que precisava ligar para a escola sobre a próxima reunião de pais, havia um SMS inesperado de Dottie: "Querida, jantar hoje à noite? Eu tenho novidades para você. Beijos, Dottie."

Agatha bufou, deixando o telefone de lado sem responder. Ela sabia que "novidades" de Dottie geralmente significavam algo que lhe daria uma dor de cabeça monumental - ou, pior, algo que obrigaria Agatha a demonstrar entusiasmo.

─── Ótimo, ─── murmurou para si mesma enquanto ligava o carro. ─── Como se minha vida já não fosse suficientemente cheia de drama.

Ela deu partida e seguiu em direção ao trabalho, com um leve sorriso no rosto. Afinal, ela podia reclamar o quanto quisesse, mas sabia que, no fundo, adorava o caos que era sua vida.

(...)

AGATHA ESTAVA SENTADA EM SUA MESA, rodeada por pilhas de papéis e relatórios que mais pareciam um labirinto do que trabalho real. Sua caneca de café, agora fria, estava esquecida ao lado de uma pilha de processos que ela ainda não tinha tocado. A janela do escritório mostrava a movimentação frenética de Londres, mas nada ali parecia capaz de desviar seus pensamentos para longe daquilo que realmente a incomodava.

O som da porta se abriu, interrompendo seus devaneios. Era Wanda, sua meia-irmã, com aquele sorriso malicioso que sempre significava que ela estava prestes a soltar uma opinião não solicitada.

─── Não estou interrompendo nada, estou? ─── Wanda perguntou, entrando e fechando a porta atrás de si. Ela se apoiou na borda da mesa de Agatha, observando as pilhas de trabalho com uma expressão de desdém. ─── Parece que o caos reinou por aqui.

Agatha soltou um suspiro e passou a mão pelos cabelos, tentando disfarçar a tensão que sentia.

─── Se você está sugerindo que eu sou a causa do caos, está absolutamente certa.

Ela olhou para a tela do computador, sem muita vontade de encarar Wanda, mas sabia que não ia escapar de uma conversa. Maximoff sempre tinha algo a dizer, e geralmente sobre coisas que Agatha preferiria evitar.

─── Eu ouvi a notícia, ─── Wanda disse, sentando-se na cadeira de visitantes com um ar de quem já sabia de tudo, mas queria ser a primeira a dar sua opinião. ─── Dottie e você... noivas? Eu ainda estou tentando digerir isso.

───Eu não estou nem um pouco empolgada com essa conversa, Wanda.

Agatha disse, finalmente olhando para a irmã. Wanda estava com os braços cruzados, sua postura habitual de quem estava pronta para julgar.

─── Não me diga, ─── Wanda respondeu com uma risada seca. ─── Acho que ninguém pode ser realmente empolgado com isso, a não ser Dottie, claro. Ela deve estar no céu agora que conseguiu prender você.

Wanda fez uma careta, claramente incomodada com a ideia. Agatha deu de ombros, um pouco irritada com o tom da irmã.

─── Eu não tenho muito o que fazer sobre isso. Ela é teimosa. Você sabe como é. Me venceu pelo cansaço.

─── Ah, eu sei, ─── Wanda disse com um sorriso cínico, sem esconder o desprezo. ─── E é exatamente por isso que eu nunca entendi como você poderia se casar com ela. A mulher é tão... superficial. ─── Ela se levantou e começou a caminhar pelo escritório, examinando as fotos e os livros de direito nas estantes. ─── Eu só posso imaginar o que Rio deve estar pensando disso."

O nome de Rio caiu como uma pedra no silêncio que se seguiu. Agatha sentiu o peito apertar, como sempre fazia quando o nome de Rio surgia. Mesmo após todos esses anos e o fim do casamento, Rio ainda era uma sombra constante em sua vida, uma presença silenciosa que ela não conseguia apagar. A ideia de Dottie tomando o lugar de Rio a incomodava mais do que ela queria admitir.

Agatha se endireitou na cadeira, o olhar fixo no computador à sua frente, como se estivesse tentando encontrar alguma coisa ali para se distrair. Ela não queria, de forma alguma, permitir que a conversa seguisse por um caminho emocional mais profundo. Wanda, contudo, não parecia disposta a deixá-la escapar.

─── Eu não sei o que você quer insinuar, Wanda, ─── Agatha disse, forçando um tom firme na voz. Ela sabia que sua irmã estava apenas tentando cutucá-la, mas não seria tão fácil. ─── O que aconteceu entre Rio e eu é passado. E Dottie é quem está aqui agora. Eu sei que você não gosta dela, mas... não é como se eu fosse perguntar sua opinião sobre meu relacionamento.

Wanda deu uma risada curta e sem humor, cruzando os braços em frente ao peito.

─── Ah, Agatha, você acha mesmo que isso é sobre Dottie? ─── Ela deu um passo à frente, diminuindo a distância entre as duas, quase como se fosse um lembrete de que ela estava ali, observando, compreendendo. ─── Eu nem me importo com Dottie, sinceramente. O que me preocupa é você. Como você se convenceu de que isso é o melhor para você. Porque eu vejo você tentando preencher um vazio que... bem, que nunca vai ser preenchido.

Agatha fechou os olhos por um momento, a pressão nos ombros aumentando. Ela não queria ouvir isso, não agora, não de Wanda. Já estava cansada de carregar o peso do que aconteceu sozinha. Agora, a sensação de ser julgada por tudo, até pelo simples fato de ainda sentir alguma coisa por Rio, estava a corroendo.

─── Você não sabe o que está falando, ─── Agatha disse com a voz mais fria, tentando ignorar o aperto no peito. ─── Não tem nada de vazio aqui, Wanda. Apenas uma decisão racional. Dottie e eu... temos uma convivência funcional. Eu não preciso do que o passado representou. E Rio... Bem, Rio e eu já fomos.

─── "Já fomos", ─── Wanda repetiu com um sorriso triste, quase como se ela estivesse lamentando as palavras que Agatha havia acabado de dizer. ─── Você pode dizer isso a si mesma o quanto quiser, mas... não vai mudar o fato de que você ainda pensa nela. Eu vejo isso o tempo todo, Agatha. E eu só não entendo por que você tenta negar. Por que você insiste em seguir com alguém como Dottie quando, no fundo, você sabe o que realmente quer.

Agatha engoliu seco, a raiva e a dor ameaçando transbordar. Ela sabia que Wanda estava jogando sujo, mas a verdade era que, no fundo, ela sabia que estava dizendo algo que a Harkness não queria admitir. Um silêncio pesado pairou sobre as duas, e, por um momento, foi como se o tempo tivesse parado.

─── Não sei o que você espera de mim, Wanda, ─── Agatha respondeu, tentando recuperar o controle. ─── Você quer que eu fique aqui, sofrendo pelo que aconteceu enquanto Rio faz sexo como se sua vida dependesse disso? Quer que eu fique chorando por ela? Isso não vai acontecer. Eu não sou mais aquela pessoa. Dottie... ela é o que eu tenho agora, e isso basta. Eu não preciso de mais nada.

─── Mas você quer mais, ─── Wanda disse, com um sorriso ligeiramente amargo. ─── E isso é o que é mais frustrante. Você tem medo de admitir isso, Agatha, porque se fizer, vai ter que enfrentar tudo o que ainda está enterrado lá dentro. E isso, minha irmã, é algo que você evita com todas as suas forças.

Agatha se levantou da cadeira com um movimento brusco, sua paciência finalmente se esgotando.

─── Chega, Wanda. Eu já tive o suficiente disso por hoje.─── Ela olhou diretamente nos olhos da irmã. ─── Eu sei o que é melhor para mim, mesmo que você não entenda ou aceite. E se você não tem nada de bom para acrescentar, talvez seja melhor você sair. Agora.

Wanda a observou por um instante, o rosto dela ainda carregado de um pesar que Agatha não conseguia ignorar, mas também não queria mais discutir. Ela deu um último olhar à sua volta, como se estivesse avaliando a irmã, depois suspirou, desistindo da batalha por enquanto.

───Eu só queria que você fosse mais honesta consigo mesma, Agatha, ─── Wanda disse, já virando a maçaneta da porta. ─── Mas, tudo bem. Você vai descobrir sozinha, como sempre.

A porta se fechou atrás dela com um leve estalo, e Agatha se viu sozinha, o som da conversa ainda ecoando em sua cabeça. Wanda não estava errada. Ela sabia disso, mesmo que não fosse algo que quisesse enfrentar naquele momento.

Agatha sentou-se de novo, os dedos tocando a tela do computador sem realmente olhar para o que estava ali. Ela pensou em Rio, nas memórias que se recusava a apagar, nas palavras de Wanda, e, por mais que tentasse se convencer do contrário, a verdade era que ainda sentia a falta da ex-esposa de uma forma que não sabia como lidar.

Ela passou uma mão no rosto, cansada. Não havia como voltar atrás. E, por mais que tentasse seguir em frente com Dottie, sabia que uma parte de si ainda estava completamente ligada ao passado. E talvez fosse isso que a impedia de seguir em frente de verdade.

(...)

WANDA ESTACIONOU O CARRO ESPORTIVO PRETO NA FRENTE DA ESCOLA COM UM ESTILO QUE SÓ ELA CONSEGUIA SUSTENTAR - óculos escuros, jaqueta de couro e aquele ar de quem sabia exatamente o que estava fazendo (mesmo que fosse um plano improvisado). Enquanto esperava, cruzou os braços e se recostou contra o carro, ignorando os olhares curiosos dos outros pais.

Logo, viu Nicky e Elle saindo pelos portões da escola. Elle vinha na frente, andando como se fosse dona do mundo, enquanto Nicky, tímido, carregava a mochila com os ombros curvados, claramente aliviado por ver Wanda.

─── Ei, Lacração número um e Lacração número dois!

Wanda chamou, erguendo a mão em um aceno exagerado. Elle revirou os olhos com um sorriso de canto de boca.

─── Sério, tia Wanda? Gêmeos Lacração? Não podia pensar em algo mais original?

─── O quê? ─── Wanda ergueu uma sobrancelha, tirando os óculos escuros. ─── É um apelido icônico. E, convenhamos, combina. Vocês causam o caos por onde passam. Estou apenas sendo realista.

─── Eu não causo caos

Nicky murmurou, chutando uma pedrinha no chão.

─── Não, você não causa ─── Elle respondeu, cutucando o irmão com o cotovelo. ─── Mas eu compenso por nós dois, então está tudo equilibrado.

Wanda sorriu e acenou para que entrassem no carro. Assim que eles estavam acomodados, com Elle já mexendo no rádio e Nicky segurando o cinto de segurança como se fosse uma bóia salva-vidas, Wanda decidiu sondar o terreno.

─── Então, como estão as coisas com sua mãe?

Ela começou, casualmente, enquanto puxava o carro para o trânsito. Nicky olhou para Elle, que deu de ombros antes de responder.

─── Normais, eu acho. Ela está um pouco mais insuportável ultimamente, mas nada fora do comum.

─── Insuportável como? ─── Wanda perguntou, apertando os olhos em um tom de brincadeira. ─── Tipo o insuportável que dá para ignorar ou o insuportável que faz você querer mudar de nome e fugir para o México?

─── Eu diria que está mais para o México, ─── Elle disse, inclinando-se no banco. ─── Tudo tem que ser no ritmo dela. E agora tem a Dottie para piorar. Essa mulher... meu Deus, é como conviver com uma Barbie falante.

Wanda mordeu o lábio para não rir alto.

─── Barbie falante? Essa é nova.

─── É verdade! ─── Elle insistiu, jogando as mãos para o alto. ─── Ela tem aquela risada irritante, tipo... "hihiihi"

Elle imitou o som, e Nicky finalmente riu, mesmo que baixinho.

─── Vocês não gostam dela?

Wanda perguntou, inclinando a cabeça para ver a reação dos dois pelo espelho retrovisor. Nicky encolheu os ombros, tentando evitar a pergunta. Mas Elle, claro, não perdeu tempo.

─── Não. Ela é falsa. E, sinceramente, eu não entendo o que a mamãe vê nela. Tipo, eu sei que ela é bonita e rica e blá-blá-blá, mas... ela não parece real. Parece mais um acessório do que uma pessoa.

Wanda soltou um som afirmativo, como se Elle tivesse acabado de confirmar algo importante.

─── Entendi. E quanto à sua mãe? Vocês acham que ela está feliz com Dottie?

Nicky finalmente falou, sua voz baixa, mas firme.

─── Não acho que ela está feliz. Acho que ela só quer que pareça que está tudo bem. É como se ela estivesse tentando... provar alguma coisa, talvez.

Wanda lançou um olhar pelo retrovisor, surpresa pela profundidade do comentário de Nicky. Elle, por outro lado, parecia menos interessada em análises emocionais.

─── Isso é complicado, ─── Elle disse, cruzando os braços. ─── Mas, pra ser honesta, eu acho que ela nem gosta tanto assim da Dottie. Ela é sempre meio... sei lá... desconfortável quando está com ela.

Wanda sorriu, satisfeita. Aquilo era tudo o que precisava ouvir.

─── Bom, parece que vocês dois são mais espertos do que muita gente por aí.

─── Claro que somos ─── Elle disse, inclinando-se para frente. ─── E, antes que você pergunte, sim, acho que a mamãe ainda ama a mãe Rio. Isso é óbvio, tia Wanda. Até você já percebeu, né?

─── É óbvio?

Wanda perguntou, fingindo inocência.

─── Pelo amor de Deus, tia Wanda! ─── Elle exclamou, jogando as mãos para o alto de novo. ─── A mamãe pode até fingir que não, mas dá pra ver. Principalmente quando ela acha que ninguém está olhando. Ela ainda fica toda estranha quando falamos da mãe Rio.

Wanda riu, não conseguindo mais esconder a diversão.

─── Vocês dois são um espetáculo. Acho que vou precisar da ajuda dos Gêmeos Lacração para resolver umas coisinhas.

─── Resolver o quê?

Elle perguntou, os olhos brilhando de curiosidade.

─── Ah, nada demais, só um pequeno plano para ajudar sua mãe a perceber umas verdades.

Nicky, preocupado, inclinou-se para frente.

─── Isso não vai causar problemas, vai?

Wanda olhou para ele pelo retrovisor com um sorriso maroto.

─── Nicky, querido, se não causar um pouquinho de problemas, então nem vale a pena.

(...)

O CARRO DE AGATHA CORTAVA AS RUAS MOVIMENTADAS DE LONDRES, impecável, exceto pela tensão palpável que preenchia o espaço. Nicky estava sentado no banco de trás, olhando pela janela com um ar melancólico, enquanto Elle, ao lado dele, parecia prestes a explodir de raiva, os braços cruzados e os pés batendo no chão no ritmo de sua frustração.

Agatha, ao volante, mantinha o rosto estoico, mas era óbvio que ela sentia a tempestade iminente.

─── Vamos lá, crianças, isso não é tão ruim assim. ─── Agatha começou, tentando quebrar o silêncio desconfortável. ─── É só um jantar. Vocês podem fazer isso sem drama, certo?

─── Certo, mamãe ─── Nicky respondeu baixinho, mas havia um tom de mágoa em sua voz que fez Agatha olhar para ele pelo retrovisor. ─── Nós sempre fazemos o que você quer, de qualquer forma.

A resposta bateu como um tapa. Agatha segurou o volante com mais força, sentindo um aperto no peito.

─── Nicky, querido, não é questão de fazer o que eu quero. É uma oportunidade para vocês conhecerem melhor a Dottie.

─── A Dottie, claro ─── Elle retrucou, a voz carregada de sarcasmo. ─── Porque é tudo sobre a Dottie ultimamente, não é?

Agatha respirou fundo, contando mentalmente até dez. Ela sabia que Elle estava testando seus limites, mas, depois de um longo dia no trabalho, sua paciência já estava desgastada.

─── Elle, eu não vou discutir com você sobre isso. Dottie é importante para mim, e eu gostaria que vocês pelo menos tentassem ser educados.

─── Importante? ─── Elle soltou uma risada amarga. ─── Mamãe Rio era importante. E olha como isso acabou.

O nome de Rio pairou no ar como uma faca. Agatha sentiu a garganta apertar, mas não deixou transparecer.

─── Não é a mesma coisa, Elle.

─── Claro que não é. ─── Elle virou-se para olhar para a mãe diretamente, os olhos ardendo de emoção. ─── Porque com a mamãe Rio, pelo menos parecia que você se importava.

Nicky olhou para a irmã com um olhar de reprovação, mas não disse nada. Em vez disso, voltou a olhar pela janela, claramente desconfortável com a discussão.

─── Elle, basta. ─── A voz de Agatha saiu mais fria do que ela pretendia. ─── Eu não vou tolerar esse tipo de atitude.

─── Ótimo. Porque eu também não tolero a Dottie.

Elle cruzou os braços de novo, se recusando a dizer mais nada. Agatha suspirou, sentindo o peso da conversa se acumular em seus ombros. Ela olhou para Nicky novamente pelo retrovisor, esperando encontrar algum apoio, mas o menino parecia distante, perdido em seus próprios pensamentos.

─── Nicky, querido, você está bem?

Agatha perguntou, suavizando o tom. Nicky hesitou antes de responder, sua voz quase inaudível.

─── Eu só... eu só queria que fosse diferente. ─── Ele levantou os olhos para encontrar os de Agatha pelo retrovisor. ─── Não que a gente tenha que fazer coisas juntos como antes, mas... era mais fácil quando éramos só nós três.

A sinceridade de Nicky atingiu Agatha como um golpe. Ela sabia que seus filhos estavam lutando para se ajustar às mudanças, mas ouvir aquilo em palavras era outra coisa.

─── Eu sei, querido. ─── A voz dela tremeu um pouco. ─── Mas as coisas mudam. E isso não significa que eu amo vocês menos ou que a nossa família não importa. Vocês são o meu mundo, sempre serão.

─── Não parece.

A voz de Elle foi um sussurro, mas carregava o peso de uma acusação.

Agatha estacionou o carro em frente ao prédio luxuoso de Dottie, o brilho das luzes refletindo na fachada impecável. Ela se virou no banco para encarar os dois.

─── Eu sei que vocês estão chateados. E eu sinto muito por isso. ─── Ela fez uma pausa, tentando escolher as palavras certas. ─── Mas hoje à noite, eu só quero que vocês tentem. Por mim.

Elle bufou, claramente ainda contrariada, mas não respondeu. Nicky assentiu lentamente, mesmo que seu rosto ainda estivesse carregado de tristeza.

─── Obrigada. ─── Agatha disse com um sorriso cansado antes de sair do carro.

Enquanto subiam o elevador para o apartamento de Dottie, o silêncio entre eles era pesado, quase palpável. Agatha sabia que o jantar não seria fácil, mas, olhando para seus filhos, ela só podia esperar que, de alguma forma, eles conseguissem encontrar um meio-termo. Mesmo que isso parecesse mais difícil do que nunca.

O apartamento de Dottie era exatamente como Elle e Nicky esperavam: luxuoso, organizado demais e com um perfume tão intenso no ar que parecia saído direto de uma loja de velas caras. Cada móvel parecia estar posicionado estrategicamente, como em uma vitrine. O lustre no teto brilhava como se nunca tivesse visto poeira, e uma mesa de jantar enorme ocupava o centro da sala, já posta com talheres de prata e taças de cristal.

Dottie surgiu da cozinha, impecável como sempre, usando um vestido creme justo e um sorriso que não alcançava os olhos.

─── Ah, meus queridos! ─── exclamou, estendendo os braços de forma teatral. ─── Que prazer tê-los aqui.

Nicky deu um pequeno sorriso educado, enquanto Elle mal disfarçava seu desgosto.

─── O prazer é todo nosso ─── Elle murmurou, sua voz carregada de sarcasmo.

Agatha lançou um olhar de advertência para a filha antes de se aproximar de Dottie para um abraço rápido.

─── Dottie, a comida já está pronta?

Agatha perguntou, claramente tentando desviar a atenção de Elle.

─── Está quase! ─── respondeu Dottie, voltando para a cozinha com um clique de seus saltos altos. ─── Fiz algo especial para vocês.

─── Deve ser caviar com pó de ouro.

Elle sussurrou para Nicky, que reprimiu uma risada.

─── Por favor, se comportem.

Agatha murmurou entre os dentes enquanto guiava os gêmeos até a mesa. Logo, todos estavam sentados, com Dottie servindo uma entrada que parecia ter saído de um programa de culinária gourmet: pequenas torradas com algo que Agatha suspeitava ser patê de figo. Pavoroso.

─── Então, como foi o dia na escola?

Dottie perguntou, tentando soar casual, mas o tom soava artificial. Nicky olhou para Elle, esperando que ela respondesse, mas, quando ficou claro que a irmã não tinha intenção de cooperar, ele falou.

─── Foi... bom. Eu consegui uma boa nota em matemática.

─── Que maravilha! ─── Dottie exclamou, embora sua expressão não demonstrasse verdadeiro interesse. ─── Matemática é tão importante. Talvez um dia você possa ser um grande empresário, como o meu pai.

Nicky apenas assentiu, tentando evitar contato visual. Elle, porém, não se segurou.

─── Ou talvez ele só queira ser feliz, não um empresário com uma casa enorme e sem vida.

─── Elle!

Agatha repreendeu, sua voz cortante.

─── Tudo bem, Agatha. ─── Dottie levantou a mão, com um sorriso que mal escondia sua irritação. ─── Elle tem uma personalidade forte. É admirável.

─── Ah, você nem imagina.

Elle respondeu com doçura venenosa, sorrindo como se estivesse pronta para uma batalha. Agatha massageou as têmporas, sentindo uma dor de cabeça se formar. Nicky, sempre o pacificador, tentou mudar de assunto.

─── Dottie, você sempre morou em Londres?

Dottie pareceu surpresa pelo tom gentil de Nicky e respondeu com entusiasmo.

─── Oh, não! Eu cresci em Nova York, mas me mudei para cá quando comecei a trabalhar no mercado de luxo. Você sabia que eu gerencio uma das maiores marcas de joias da Europa?

─── Isso é... legal

Nicky disse, embora seu tom fosse mais educado do que genuíno. Elle revirou os olhos.

─── Fascinante. Você também sabe fazer algo útil, tipo consertar uma torneira ou cozinhar comida de verdade?

─── Elle!

Agatha exclamou, a voz agora mais alta. Dottie deu uma risadinha nervosa, mas sua expressão endureceu.

─── Eu sei que é difícil se ajustar a mudanças, Elle. Mas acredite, estou aqui para tornar as coisas melhores, não piores.

─── Melhores para quem? ─── Elle retrucou, inclinando-se para frente. ─── Porque até agora, tudo o que você fez foi aparecer e agir como se pudesse substituir a mamãe Rio.

O silêncio caiu sobre a mesa como uma bomba. Nicky abaixou os olhos para o prato, mexendo na comida, enquanto Agatha fechava os olhos por um momento, tentando recuperar a compostura.

─── Ninguém está tentando substituir ninguém, Elle ─── Agatha disse, sua voz firme, mas cansada. ─── Podemos, por favor, apenas aproveitar o jantar?

─── Claro, mamãe.

Elle respondeu com uma doçura falsa, antes de pegar o garfo e espetar uma torrada com força desnecessária. Dottie tentou retomar o clima leve, começando falar sobre uma viagem recente à Riviera Francesa, mas o clima à mesa permaneceu tenso. No entanto, seu tom casual não durou muito. Ela deu uma risadinha enquanto se servia de mais vinho e lançou um olhar significativo para Agatha.

─── Bem, talvez seja hora de mudar de assunto para algo um pouco mais... emocionante, não acha, querida?

Dottie perguntou, dirigindo-se a Agatha, cujo sorriso congelou instantaneamente. Agatha abriu a boca para responder, mas Dottie já estava em sua própria narrativa.

─── Afinal, jantares como este são perfeitos para celebrar novos começos.

Elle, que até então estava cutucando o prato com desdém, parou imediatamente. Seus olhos se estreitaram e ela cruzou os braços, encarando Dottie como um gato prestes a atacar.

─── Novos começos? ─── Elle perguntou, o tom ácido como um limão. ─── Do que você está falando?

Nicky olhou de uma para a outra, claramente desconfortável.

─── Ah, é apenas algo que Agatha e eu discutimos recentemente. ─── Dottie sorriu com uma falsa modéstia, enquanto agitava a taça de vinho. ─── Algo grande, importante, que mudará as coisas para todos nós.

─── Jones...

Agatha começou, sua voz baixa e carregada de aviso, mas Dottie continuou como se não tivesse ouvido.

─── Não queremos manter segredo por muito tempo, é claro, mas achei que seria bom dar uma dica para as crianças antes de fazer um grande anúncio. Afinal, eles têm o direito de saber.

Elle empurrou o prato com força, o som do garfo batendo no vidro ecoando pela sala.

─── Que anúncio? ─── perguntou, a voz carregada de raiva mal contida. ─── Que tipo de "novo começo"?

Agatha abriu a boca para intervir, mas Elle já estava de pé, com as mãos espalmadas na mesa.

─── Vocês vão se casar?

Ela praticamente gritou, olhando de Dottie para Agatha como se não acreditasse no que estava ouvindo. Nicky deixou escapar um leve "oh" e ficou ainda mais quieto, seus olhos se enchendo de preocupação.

─── Elle, senta.

Agatha ordenou, tentando manter a calma, mas sua filha já estava fora de controle.

─── Não acredito! ─── Elle exclamou, ignorando a mãe completamente. ─── Você quer se casar com ela? Com Dottie? ─── Ela apontou para Dottie como se estivesse acusando-a de um crime. ─── Como se a mamãe Rio nunca tivesse existido?

─── Elle, isso não tem nada a ver com Rio! ─── Agatha finalmente elevou a voz, o que fez Nicky encolher-se em sua cadeira. ─── E eu não devo satisfações sobre minha vida pessoal para você.

─── Não tem a ver com ela? ─── Elle riu, mas o som estava longe de ser alegre. ─── Você está brincando, certo? Porque parece que você quer apagar tudo o que a gente tinha! Nossa família!

Dottie, que parecia desconfortável pela primeira vez na noite, tentou intervir.

─── Querida, eu entendo que mudanças podem ser difíceis, mas...

─── Não me chama de querida! ─── Elle interrompeu, apontando o dedo para ela. ─── Você não é nada para mim, e nunca vai ser.

O silêncio que se seguiu foi devastador. Nicky olhou para Agatha com olhos cheios de lágrimas, enquanto Elle saía da sala batendo os pés, deixando o som da porta do apartamento ecoar.

Agatha fechou os olhos, apertando a ponte do nariz enquanto o cansaço emocional se instalava.

─── Ela vai se acalmar.

Dottie disse, tentando soar tranquilizadora, mas sua voz parecia forçada.

─── Não, ela não vai.

Agatha respondeu, a voz cansada. Ela se levantou da mesa e foi atrás de Elle, mas sabia que isso era só o começo de uma longa batalha.

Harkness encontrou Elle no corredor do prédio, sentada no chão com os joelhos dobrados e os braços cruzados. Sua expressão estava dura, mas os olhos brilhavam com um misto de lágrimas contidas e raiva descontrolada.

─── Elle, volte para dentro. Agora.

Agatha ordenou, tentando soar firme, mas sua voz já carregava uma ponta de exaustão.

─── Por quê? Para assistir você fingir que está tudo bem enquanto joga nossa família no lixo?

Elle disparou, encarando a mãe com o tipo de olhar que poderia perfurar aço. Agatha respirou fundo, contando mentalmente até dez.

─── Não estou jogando nada no lixo, Elle. Mas você precisa entender que...

─── Entender o quê? ─── Elle interrompeu, a voz tremendo com a intensidade da emoção. ─── Que você não se importa mais com a gente? Que você prefere aquela... aquela boneca de plástico em vez da mamãe Rio? Do que nossa família?

─── Isso não é verdade! ─── Agatha respondeu, elevando o tom. ─── Você sabe que eu amo você e o Nicky mais do que qualquer coisa neste mundo.

─── Ah, é? ─── Elle levantou-se de repente, encarando a mãe de perto. ─── Então por que parece que você está fazendo de tudo para destruir o que a gente tinha?

─── Elle, eu não estou destruindo nada. Estou tentando... seguir em frente.

─── Seguir em frente? ─── Elle deu uma risada amarga. ─── Isso é seguir em frente? Fingir que o divórcio não aconteceu? Fingir que a mamãe Rio não existe?

─── Eu não estou fingindo nada! ─── Agatha exclamou, perdendo a paciência. ─── E você precisa parar de tratar isso como se fosse um jogo de "escolha uma mãe".

─── Não é um jogo! ─── Elle gritou de volta, sua voz ecoando pelo corredor. ─── É a nossa vida! E você nem liga que está arruinando ela!

O peso daquelas palavras caiu como um soco. Agatha piscou, surpresa, e tentou recuperar o controle de suas emoções.

─── Elle...

Ela começou, mas a garota já tinha mais para dizer.

─── Você nem gosta dela! ─── Elle gritou, as lágrimas finalmente escorrendo pelo rosto. ─── Você só está com ela porque é mais fácil do que admitir que ainda ama a mamãe Rio.

Agatha ficou paralisada. Ela queria negar, queria dizer algo, qualquer coisa, mas as palavras de Elle a atingiram com mais força do que ela esperava.

─── Você não entende...

Agatha começou, mas Elle a interrompeu de novo, gritando: ─── Eu entendo, sim! Entendo que você não se importa com o que a gente sente! Você só se importa consigo mesma!

Agatha ficou em silêncio, seu coração acelerado, enquanto Elle enxugava o rosto com a manga da blusa.

─── Eu te odeio! ─── Elle disse, a voz quebrada. ─── Odeio o que você fez com a nossa família. Odeio que você nos deixou assim.

Agatha sentiu algo quebrar dentro dela.

─── Elle...

Sua voz saiu em um sussurro, quase inaudível.

─── Eu só queria... ─── Elle começou, a raiva finalmente dando lugar ao desespero. ─── Eu só queria que tudo voltasse a ser como antes!

E com isso, Elle se virou e saiu correndo para as escadas, deixando Agatha sozinha, parada ali, sem saber o que fazer. A promotora fechou os olhos, respirando fundo, e sentiu as lágrimas ameaçando vir. Mas ela as conteve, como sempre fazia. Não era o momento para desmoronar. Era o momento para ser forte, mesmo que sua filha achasse que ela era a pior pessoa do mundo.

E, mais uma vez, o fantasma de Rio voltou à sua mente. As palavras de Elle ecoavam em seu coração, mais dolorosas do que ela gostaria de admitir.

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