14 - parcela 9
Capítulo catorze,
Parcela Nove
O motor da Kombi morreu com um engasgo pesado, deixando para trás apenas o som abafado das árvores balançando ao vento. A estrada era estreita e deserta, cercada por mato alto e troncos grossos que se erguiam como vigias silenciosos. Um muro de pedra antiga, manchada de musgo, bloqueava a visão de algo mais além, como se tentasse esconder um segredo que ninguém deveria descobrir.
— Parece só um muro de pedra pra mim. — Pope disse, meio cético, enquanto empurrava a porta enferrujada da Kombi e pulava para fora, ajustando a mochila nos ombros.
— É aqui. — Mackenzell afirmou, saindo do próprio carro e batendo a porta atrás de si com força.
Ela se apoiou com uma mão no tronco de uma árvore retorcida e esticou o braço na direção de uma casa grande e sombria além do muro. O mato à volta estava tão alto que quase escondia a construção.
JJ apareceu ao lado dela, com as mãos no bolso, os olhos semicerrados em uma mistura de reconhecimento e arrependimento.
Kiara saiu da Kombi com um estalo de surpresa.
— Tá de sacanagem. — Ela ficou parada por um segundo, de boca aberta. — Logo aqui?
John B veio por último, fechando a porta da Kombi com um estrondo seco.
— Que merda... — Pope murmurou, como se o peso daquela revelação tivesse acabado de cair sobre ele. — Essa é a pior das hipóteses.
JJ esfregou o rosto com uma mão, como se quisesse apagar alguma memória ruim. — Tinha que ser aqui... De todos os lugares? — Pope perguntou, franzindo a testa, desconfortável.
— O que tem de tão especial nesse lugar? — Mackenzell perguntou, confusa, enquanto passava a mão pela franja, inquieta.
JJ soltou um riso curto, sem humor.
— Dizem que a senhora Crain enterrou a cabeça do marido aqui.
Mackenzell fez uma careta de nojo, o nariz se torcendo como se sentisse o cheiro do horror naquela história.
— Credo. Que horror.
— Bora. — John B disse de forma seca e já começou a andar em direção ao muro.
Mackenzell arregalou os olhos.
— Você tá falando sério? — Ela agitou os braços, indignada. — Vai entrar logo no lugar onde a mulher matou o marido?
John B parou, girando o corpo ligeiramente para ela. O sorriso de canto parecia mais um desafio.
— Não quer entrar? — Ele deu de ombros. — Fica aí e avisa se vier alguém.
O olhar dele ficou por um segundo preso no dela, o que fez Mackenzell apertar os punhos ao lado do corpo, sentindo a provocação queimar na pele.
— Atrás de você.
John B arqueou uma sobrancelha, satisfeito, e retomou o caminho pelo matagal. A folhagem alta sibilava e estalava sob os pés deles enquanto avançavam. Os galhos secos raspavam suas pernas e os cercavam como uma prisão de madeira.
— Sério... Qual é a história desse lugar? — Mackenzell perguntou, olhando ao redor com desconfiança enquanto afastava um galho da frente do rosto.
— Você não sabe? — Kiara questionou, levantando uma sobrancelha e conseguiu reparar em Mackenzell incomodada com as plantas, coçando os braços. Não era o habitat natural dela.
John B ergueu a voz um pouco mais do que deveria.
— Eu não acredito nessas coisas, não.
JJ virou rapidamente para ele, fazendo um sinal com a mão. — Fala baixo, porra.
John B revirou os olhos, mas não respondeu. Ele olhou para Kiara e continuou — Que histórias? O que você ouviu?
Kiara deu de ombros.
— O mesmo de sempre: a senhora Crain matou o marido com um machado. E agora ela mora sozinha aqui. Dizem que, em noites de lua cheia, você pode ver ela pela janela.
— Caralho, que sinistro. — Pope murmurou atrás deles, tropeçando num galho seco. O estalo alto fez Mackenzell dar um pulo de susto.
— Ah, que merda! — Mackenzell reclamou, cruzando os braços, irritada, enquanto Kiara ria baixinho. — Não tem graça.
— Isso é real, tá? — JJ advertiu, com uma expressão mais séria do que o normal. — Não brinca com isso.
Mackenzell virou para ele, intrigada. — Como assim, real?
— Conheço a Hollis. — JJ respondeu, em tom sombrio.
— Quem é Hollis? — Mackenzell perguntou, ainda mais curiosa, franzindo a testa.
— A filha da senhora Crain. — JJ explicou, como se isso já fosse óbvio. — Ela era minha babá. E me contou tudo.
— O quê?! — Pope parou, incrédulo. — Você conhecia essa garota?
— Sim, conhecia. E ela me contou a verdade sobre o que aconteceu aqui. — JJ lançou um olhar significativo para John B, como se quisesse que ele entendesse a seriedade do que estava falando.
— A verdade sobre o quê? — Mackenzell perguntou, cruzando os braços. A incredulidade clara no tom dela parecia mais uma barreira emocional do que desconfiança genuína.
JJ respirou fundo, como se preparasse para contar algo sombrio.
— Quando a Hollis era pequena, sempre ouviu que a mãe dela matou o pai. Mas a Rolls nunca acreditou... Até aquela noite.
O grupo parou por um momento, como se o ar tivesse ficado mais pesado ao redor deles. JJ continuou
— A Hollis tinha seis anos. Uma noite, ela ouviu os pais brigando no andar de baixo. Quando desceu, viu a mãe lavando as mãos na pia. As mãos estavam cobertas de sangue.
— E o que a mãe dela disse? — Mackenzell perguntou, a expressão tensa, como se tentasse encontrar alguma falha na história.
— Que tinha cortado o dedo. No dia seguinte, ela disse que os pais tinham se separado.
— E...? — Kiara pressionou, com os olhos arregalados.
JJ passou a língua pelos lábios, olhando ao redor como se esperasse que alguém estivesse escutando.
— Só que a Rolls percebeu uma coisa estranha... A mãe dela entrava e saía da sala o tempo todo. Carregando sacos plásticos.
O silêncio caiu sobre eles como uma sombra. Mackenzell engoliu em seco. — E aí?
— Um dia, a Hollis estava usando o banheiro externo. Quando olhou para baixo... Viu a cabeça do pai. Olhando direto pra ela.
— Ah, você tá mentindo. — Mackenzell balançou a cabeça, como se recusasse a acreditar.
— Juro por Deus que é verdade. — JJ afirmou, com os olhos escuros e sérios.
— Você é um mentiroso de merda, Jay. — John B disse, rindo e dando um tapinha no ombro dele, antes de continuar a andar.
Pope sacudiu a cabeça, ainda incrédulo.
— E ela não chamou a polícia?
— Não deu tempo. — JJ respondeu, seco. — E desde então... Ela nunca mais foi vista em público.
O grupo ficou parado por um instante, em silêncio, antes de Kiara balançar a cabeça. — Vamos logo.
O grupo continuava avançando, abaixado no meio do matagal que cercava a casa sombria. A cada passo, as folhas secas e galhos quebravam em estalos abafados, deixando para trás um rastro quase imperceptível, mas suficiente para deixá-los inquietos. O muro antigo havia ficado para trás, e agora eles estavam a poucos metros da entrada da casa, onde uma janela quebrada deixava visível parte do interior escuro.
John B ia à frente, agachado, com os olhos fixos na casa como se nada pudesse desviá-lo daquele objetivo. O vento frio soprava, levantando seu cabelo e fazendo a camiseta encostar na pele suada. Ele se moveu rápido, mas a alguns passos da varanda, JJ segurou a barra da blusa dele com força.
— Espera! Espera, espera, cara! — JJ sussurrou, puxando John B de volta para trás de uma moita.
John B se virou irritado, ajeitando a camiseta onde JJ havia esticado o tecido.
— Que foi?!
JJ olhou em volta rapidamente, como se estivesse esperando que algo terrível acontecesse a qualquer momento. Seu peito subia e descia rápido, a adrenalina começando a pesar nas veias.
— Cara, a gente tá prestes a entrar na casa de uma assassina. — Ele estreitou os olhos e balançou a cabeça, incrédulo. — Você tem certeza de que quer fazer isso?
John B deu de ombros, sem se deixar abalar.
— A gente não tem nada a perder.
— Ela matou o marido com um machado, cara. — JJ insistiu, apontando para a casa com um aceno nervoso. — E você tá usando gesso!
John B olhou para ele como se aquilo não importasse.
— E daí? Não tô nem aí se ela é uma assassina.
Enquanto John B falava com desdém, Mackenzell levantou a mão lentamente, os dedos trêmulos, como se finalmente percebesse o quanto aquela ideia era estúpida.
— Eu não quero mais. — A voz dela saiu hesitante, quase infantil, como quem admite um erro mas espera que ninguém a julgue muito por isso.
Todos pararam e se viraram para olhar para ela ao mesmo tempo. A expressão coletiva de exasperação foi clara: olhos se reviraram, sussurros frustrados escaparam pelas bocas.
— Por que a gente trouxe ela, mesmo? — JJ murmurou para si, balançando a cabeça.
Mackenzell abaixou o braço, meio envergonhada, mas claramente arrependida de ter se enfiado naquela situação.
John B soltou um suspiro curto e olhou de novo para a casa, como se pesasse suas opções por um breve momento, antes de dar de ombros mais uma vez.
— Eu já disse. A gente não tem nada a perder.
Com isso, ele se abaixou e começou a avançar de novo pelo mato, seus passos silenciosos e decididos. JJ hesitou por um segundo, mas acabou seguindo. Pope, Kiara e Mackenzell foram logo atrás, embora esta última claramente tentasse evitar pisar em qualquer coisa que fizesse barulho demais.
Eles se moviam em silêncio, abaixados, como sombras espreitando no meio das plantas. A casa se erguia à frente deles, escura e cheia de cicatrizes do tempo, como se esperasse para engoli-los no momento em que cruzassem a porta. Mackenzell se encolhia a cada passo, sentindo o arrependimento crescer no peito. Ela olhou para os outros e quase riu, amarga. Estava se metendo exatamente onde não tinha sido chamada — e sabia que aquilo não ia acabar bem.
— Tudo bem, Parcela nove, água. — Mackenzell perguntou, a voz baixa, enquanto continuavam abaixados no matagal perto da casa.
O vento balançava levemente os galhos ao redor deles, fazendo o som das folhas se misturar aos sussurros. John B espiava à frente, tentando ver além da escuridão entre as janelas quebradas e a porta envelhecida.
— Água tipo um laguinho? — Pope ergueu a cabeça, franzindo o cenho, sem entender direito a pergunta dela.
— Na carta do Denmark dizia pra procurar perto da água. — Mackenzell repetiu, segurando a respiração por um segundo, como se tivesse medo de estar falando alto demais
— Água de bong? — JJ perguntou, com um meio sorriso de canto, como se não conseguisse perder a oportunidade de brincar, mesmo ali.
— Não, cara! — Pope revirou os olhos, impaciente.
— Nossa, essa é a mensagem secreta mais idiota que eu já ouvi — Kiara disse, cruzando os braços e balançando a cabeça.
De repente, um som estridente invadiu o silêncio. O celular de Mackenzell vibrou e tocou em suas mãos, como se explodisse na hora errada.
— Merda! — ela sibilou, arregalando os olhos.
Com dedos trêmulos, ela apertou o botão lateral, encerrando a ligação antes que alguém pudesse ouvir mais. O toque sumiu, mas seu coração ainda martelava no peito. Desbloqueou a tela com pressa, os olhos correndo pelas notificações acumuladas.
— Foi a Ambrie... — murmurou para si mesma, lendo o nome na última chamada.
As mensagens explodiam em fila:
"Onde você tá?"
"Mackenzell, mas que merda!"
"responde logo!"
E todas, claro, eram de Rafe. O nó em seu estômago apertou ainda mais. Ele estava tentando falar com ela desde a madrugada — exatamente desde que o Topper tinha jogado John B do píer. Mackenzell respirou fundo, guardando o celular no bolso como se ele estivesse quente.
— Vou procurar o quadrante nordeste — Pope disse, quebrando o silêncio, apontando para JJ com um movimento direto. — Você fica com o noroeste.
— É, claro, o quadrante da decapitação. Maravilha. — JJ resmungou, soltando os braços para o lado em um gesto exagerado, como se estivesse prestes a desistir ali mesmo. Seus olhos voltaram para Mackenzell, que mexia no celular de novo, claramente inquieta. — Ei, desculpa, nossa busca desesperada por ouro tá te entediando?
— O quê? — Mackenzell piscou, levantando o olhar com uma expressão confusa. — Não! É só que... a Ambrie não para de me ligar. Acho que aconteceu alguma coisa.
— A Ambrie? — JJ arqueou a sobrancelha e se aproximou ligeiramente, esticando o pescoço para espiar o celular dela. Viu o nome de Rafe destacado na tela e riu, irônico. — Sei.
Mackenzell engoliu em seco, desviando o olhar.
— É sério, eu... acho que é melhor eu ir embora. — A voz saiu mais alta do que pretendia, e ela se abaixou para pegar o mapa que estava no chão, enfiando o celular de volta no bolso com pressa.
— O quê? Você vai embora? — Pope girou o corpo para encará-la, a incredulidade estampada no rosto.
— Eu sei, eu sei, me desculpa, de verdade! — Mackenzell levantou as mãos em rendição, recuando alguns passos na direção da saída.
— Qual é? — Kiara exclamou, bufando, sem acreditar no que estava vendo.
Mackenzell deu mais um passo para trás, o peso da culpa evidente em sua expressão.
— Me desculpa, eu preciso ir.
Ela continuou recuando, cada vez mais rápido, como se precisasse escapar daquele lugar.
— Ei, não leva o mapa! — JJ semi-gritou, esticando a mão na direção dela quando percebeu que ela estava saindo com ele.
— Eu tenho que devolver pro meu pai! — Mackenzell respondeu por cima do ombro, sem parar de andar.
— Essa merda não fazia parte do acordo — Pope reclamou, lançando um olhar para JJ, frustrado.
— É, tô sabendo — JJ deu de ombros, como se não houvesse nada que ele pudesse fazer.
— Espera! — ela disse dando meia volta e correndo na direção do JJ — Diga pro John B que na música da minha família tinha uma parte sobre isso! A que a minha mãe contava.
— Como assim sobre isso? — Ele perguntou, esquadrinhando o rosto dela com seu olhar
— Eu não tava me lembrando mas agora veio à cabeça — Era alguma frase boba sobre a profundidade ser a chave. Algo como... — ela disse, ainda respirando descompensadamente por ter corrido — Como, "A chave para a felicidade encontrar, é comum quanto mais profundo mergulhar." Só, diga pra ele, ta? Pode ajudar.
Ele acentiu com a cabeça, então Pope e Kiara ficaram parados, observando enquanto Mackenzell sumia entre as sombras do matagal, os passos rápidos e apressados. As plantas se fechavam atrás dela, e em poucos segundos, ela alcançava o muro, pronta para deixar aquele caos para trás.
Mackenzell dirigia como se estivesse fugindo de algo invisível, os olhos fixos na estrada enquanto o velocímetro ultrapassava limites perigosos. O som do motor rugia, e a música no rádio era apenas ruído de fundo. Seus pensamentos estavam turvos, cada mensagem perdida do Rafe pesando em sua mente.
Ela entrou com tudo na alameda dos Cameron, o carro derrapando no cascalho. Sem nem se dar ao trabalho de desligar o motor, saiu apressada, batendo a porta com força. Seus passos ecoaram pela entrada silenciosa da mansão. As mãos trêmulas empurraram a porta principal, e ela entrou sem hesitar.
— Ambrie! — Mackenzell gritou, a voz cortando o silêncio do lugar.
Ambrie apareceu na sala, os braços cruzados e o olhar cheio de julgamento.
— O que foi? Por que você tava me ligando feito louca? — Mackenzell perguntou, sem fôlego.
Ambrie ergueu as sobrancelhas, como se a pergunta fosse absurda.
— Seu namorado, Mackenzie. Você lembra que tem um namorado? — O tom dela era cortante. — Ele precisa de você.
— Que merda você tá falando? — Mackenzell rebateu, sem paciência.
— Você é impossível... — Ambrie suspirou, revirando os olhos antes de agarrar o braço da irmã e puxá-la para um canto. — Aconteceu uma coisa.
— O quê? O que aconteceu? — Mackenzell insistiu, impaciente.
— Foi com o traficante dele. Algo deu errado. Quando eu cheguei aqui... Ele tava uma bagunça. — Ambrie explicou, baixando a voz. — Só sobe e fala com ele, tá? Odeio aquele cara, e tive que ficar de babá pra ver se ele ficava bem. Só se vira.
Antes que Mackenzell pudesse responder, Ambrie já estava de saída, cansada de estar ali.
— Ambrie! Espera! — Mackenzell chamou, a voz subindo de tom. — Você não pode só...
Ambrie ignorou o apelo, desaparecendo pela porta da frente. Mackenzell apertou o corrimão da escada, os dedos cravados na madeira. Ela não queria estar ali, não queria ver Rafe, mas precisava subir. Respirou fundo, fechando os olhos por um segundo antes de finalmente dar o primeiro passo.
Cada degrau parecia mais pesado que o anterior, como se as escadas quisessem impedi-la de chegar até ele. Quando chegou à porta, hesitou, a mão pairando no ar antes de bater duas vezes.
— Rafe? — sussurrou, empurrando a porta devagar.
O quarto estava em silêncio. A luz fraca iluminava as paredes, e Rafe estava no chão, encostado na cama, com os joelhos dobrados e os braços ao redor do corpo.
— Ei... — Mackenzell chamou suavemente, fechando a porta atrás dela. — O que aconteceu?
Rafe desviou o olhar, como se a presença dela fosse insuportável.
— Vai embora, Kenzell — murmurou, a voz áspera.
Ela atravessou o quarto, aproximando-se dele devagar. O ar estava pesado, e o cheiro familiar de cigarro misturado com álcool fazia o estômago dela revirar. Quando chegou perto da cama, se abaixou até ficar na altura dele.
— O que tá acontecendo? — perguntou, a voz suave, mas firme.
— Eu te liguei um milhão de vezes... — Rafe murmurou, fungando. — Mas você nem se deu ao trabalho de responder ontem à noite.
— Rafe... — Mackenzell começou, mas ele a interrompeu, a voz carregada de frustração.
— Não. Não quero ouvir desculpa nenhuma. Não preciso de você.
Ela piscou, tentando entender o absurdo daquilo. Então por que ele tinha ligado tanto? Por que Ambrie estava tão desesperada? Nada fazia sentido.
— Vem cá. Relaxa, me conta o que aconteceu. — Ela tentou tocá-lo de novo, mas ele se afastou levemente, como um animal acuado.
Foi então que Mackenzell notou o antebraço dele. A pele estava vermelha e machucada, com marcas de queimadura espalhadas como cicatrizes frescas.
— Quem fez isso com você? — perguntou, o coração acelerado.
Rafe apertou os lábios, desviando o olhar para o chão, as mãos tremendo de raiva. — O Barry...
— Eu falei pra você parar de se envolver com essa merda... — Mackenzell sussurrou, a voz embargada por uma mistura de medo e frustração.
— O que você queria que eu fizesse, hein? — Rafe explodiu, os olhos vermelhos e brilhando. — Eu tô ferrado! Tô devendo o cara. Por isso ele fez isso.
Ela respirou fundo, passando a mão pelos cabelos, tentando acalmar a mente em caos. Como ela poderia ajudá-lo?
— Vem cá... — sussurrou, abrindo os braços.
Rafe hesitou por um instante, mas finalmente se deixou envolver. Mackenzell o puxou para perto, segurando-o com firmeza.
— Vai ficar tudo bem, tá? — murmurou contra o ombro dele, sentindo o corpo dele relaxar levemente.
— Eu vou largar isso. Eu prometo. — Rafe sussurrou, como se tentasse convencer a si mesmo.
— Eu sei, eu sei... — Mackenzell repetia, acariciando os cabelos dele.
Enquanto o segurava, sua mente trabalhava rápido. Ela precisava encontrar uma solução. Tinha dinheiro, mas não podia simplesmente pegá-lo do pai. E se... se envolvesse na busca pelo ouro?
Ela nunca quis se enfiar nessa história, mas... talvez fosse a única chance de tirar Rafe daquela vida.
— A gente vai dar um jeito nisso. — Mackenzell disse, apertando-o um pouco mais forte.
E ali, naquele abraço silencioso, a decisão começava a tomar forma.
Depois de um longo tempo em silêncio, dos dois juntos em um ninho sobre o carpete, Rafe finalmente deixou que Mackenzell cuidasse do machucado. Ele a seguiu até o banheiro, relutante, como se estivesse carregando o peso de cada decisão errada que tomara até ali.
— Senta aqui. — Mackenzell apontou para a beirada da banheira, e ele obedeceu, sem discutir, apenas um fantasma do garoto que costumava ser.
Ela se agachou na frente dele, o joelho pressionando o piso frio enquanto abria a pequena caixa de primeiros socorros. A vulnerabilidade de Rafe era quase sufocante — ele estava ali, tão exposto, o cabelo bagunçado, o rosto cansado, como se a máscara de arrogância que sempre usava tivesse finalmente desmoronado.
Ele manteve os olhos baixos, sem coragem de encará-la. A vergonha parecia pesar sobre seus ombros, e ele se encolhia como se quisesse desaparecer debaixo da pele. Mackenzell não disse nada. Apenas se concentrou no que fazia, enrolando cuidadosamente a gaze ao redor do pulso dele.
O silêncio entre eles era espesso, cheio de coisas não ditas. Quando ela terminou de prender o curativo, Rafe ergueu a mão e, num gesto hesitante, passou os dedos pelo queixo dela.
Ela piscou, surpresa pela suavidade do toque, e então fechou os olhos por um momento, apenas sentindo. Ele deslizou o polegar pela cicatriz que restava ali, onde antes havia um curativo.
— Me desculpa. — ele murmurou, a voz rouca, como se as palavras lhe queimassem a garganta.
Mackenzell abriu os olhos e o encarou. Dessa vez, não havia sarcasmo, nem promessas vazias. Era um pedido de desculpa verdadeiro — talvez o mais sincero que ele já havia feito.
— Tá tudo bem. Já passou. — ela sussurrou, inclinando a cabeça de leve para o toque dele.
Rafe soltou uma risada amarga, mais consigo mesmo do que com ela.
— Às vezes, eu fico maluco. — ele admitiu, a voz baixa. — Maluco de raiva. E eu não... consigo controlar. É como se eu quisesse explodir tudo. E no final... Eu sempre acabo machucando quem mais se importa comigo.
Ela inspirou fundo, absorvendo cada palavra. Havia dor e arrependimento na voz dele, um tipo de peso que ela nunca tinha visto antes.
— Eu sei. Eu entendo. — Mackenzell murmurou, encostando a testa de leve no ombro dele. — Também tenho coisas que eu não consigo controlar.
Por um momento, ficaram assim, ela encostada nele, sentindo o ritmo irregular da respiração dele. O corpo dele estava tenso, mas ele não recuou. Não dessa vez.
Mackenzell se afastou o suficiente para encontrar os olhos dele.
— Me desculpa por não ter te respondido ontem. — ela disse, com a voz baixa, quase como se tivesse medo de que ele não acreditasse. — Por te deixar no escuro sobre onde eu tava.
Rafe respirou fundo, passando as mãos pelo rosto.
— Foi horrível. — ele confessou, a voz mais áspera. — Fiquei puto, porque você mentiu de novo.
Ela assentiu, segurando a mão dele entre as suas. O contato entre eles era leve, mas carregado de uma intensidade silenciosa.
— Eu tô aqui agora.
Rafe baixou a cabeça e, pela primeira vez em muito tempo, parecia não saber o que dizer. Ele levou as mãos ao rosto, exalando um longo suspiro, tentando controlar as emoções que borbulhavam.
Mackenzell ergueu uma das mãos e acariciou o cabelo dele, sentindo os fios bagunçados sob os dedos.
— Eu gosto de estar com você. — ela disse, com honestidade crua, mesmo que odiasse que eles não tivessem rótulos. Era comum acharem que eles namoravam, mas aquilo nunca tinha de fato se concretizado. — Mesmo com toda essa bagunça, eu gosto de você.
Ele ergueu o olhar, e havia algo nos olhos dele — uma mistura de esperança e medo.
— Eu também. — ele sussurrou. — Eu tô tentando ser melhor. De verdade. Eu prometo.
Mackenzell o observou por um instante, vendo a sinceridade que ele tanto tentava transmitir.
— Promete mesmo? — ela perguntou, sua voz soando mais como um pedido do que uma pergunta.
Rafe assentiu, seus dedos agora segurando o rosto dela com cuidado.
— Prometo.
E então ele a beijou. Um beijo suave no começo, cheio de hesitação, como se ele ainda estivesse aprendendo a ser gentil. Mas rapidamente, o beijo se aprofundou, se tornando algo mais intenso, mais urgente. Eles precisavam um do outro naquele momento, como se estivessem se agarrando à única coisa que ainda fazia sentido.
Mackenzell se levantou junto com ele, os lábios ainda colados, e os dois tropeçaram pelo quarto, rindo entre os beijos. Mas logo se tornou algo mais intenso, mais urgente.
Cada toque parecia uma promessa não dita, uma tentativa de se conectar de uma forma que palavras nunca conseguiriam. Mackenzell sentiu as mãos de Rafe deslizando pela sua cintura, e ela fez o mesmo, tentando se livrar das roupas dele.
Ele riu suavemente quando ela teve dificuldade com a camisa dele, e o som fez com que ela risse também, aliviando parte da tensão entre eles. Aquele momento era diferente — mais íntimo, mais honesto do que qualquer outra coisa que já haviam compartilhado.
Rafe pairou sobre Mackenzell, observando-a enquanto se acomodava sobre seu colchão macio, repleto de almofadas que pareciam convidá-la a relaxar. Um sorriso suave surgiu em seu rosto ao notar a silhueta delicada dela sob os lençóis. Ele se aproximou, retirando lentamente os próprios jeans, os dedos deslizando com cuidado. A cada movimento, seus lábios encontraram a pele dela, beijando suavemente seu rosto, descendo com ternura até a clavícula antes de retornar a seus lábios.
Rafe sabia que ela era virgem, e essa consciência o fazia querer ser ainda mais gentil. Ele tocou cada parte dela com delicadeza, como se estivesse manuseando algo precioso. Quando finalmente se despediu da calcinha já umedecida, a ansiedade de Mackenzell era palpável, mas não era um sentimento ruim; era uma mistura de expectativa e desejo.
Sentindo-se à mercê de suas emoções, ela fechou os olhos ao sentir Rafe abaixar a cueca e se posicionar. O coração batia forte no peito enquanto um arrepio percorria sua espinha. Com um suspiro profundo, ela abriu os lábios antes que seus lábios se encontrassem novamente, entregando-se ao momento, retribuindo o beijo. A sensação de calor e proximidade envolvendo-os como um cobertor, quando ela sentiu seu pau entrar dentro dela, sem camisinha ou aviso prévio.
Quando Rafe se posicionou, ela sentiu a firmeza dele a penetrar profundamente. O que poderia ter sido uma experiência agressiva se revelou surpreendentemente doce. Cada movimento era meticulosamente lento, como se ele estivesse respeitando não apenas seu corpo, mas também sua alma. A conexão entre eles era palpável, e Mackenzell sentiu-se completamente absorvida pelo momento.
Enquanto ele avançava e recuava, Rafe começou a beijar seus lábios novamente, enquanto sua mão descia pelos peitos dela, explorando cada curva com delicadeza a apertando como sempre quis.
Mackenzell começou a sentir um formigamento em seu corpo, uma nova sensação que a envolvia completamente. Quando ele tocou seu clítoris enquanto a penetrava, mais íntimo, uma onda de prazer a atingiu, surpreendendo-a com a intensidade.
Rafe gemia suavemente em seu ouvido, suas promessas sussurradas misturando-se ao som de suas respirações. Era como se eles estivessem em um mundo só deles, onde nada mais importava. Mackenzell sentiu seu coração disparar, cada batida ressoando em harmonia com as ondas de prazer que a dominavam. Era uma mistura de emoções intensas, uma entrega ao desconhecido que a fazia sentir-se viva.
À medida que a intensidade aumentava, a respiração de Mackenzell tornava-se mais rápida, seu coração batendo forte em seu peito. Rafe gemia suavemente, o som rouco de sua voz era como um eco do prazer que compartilhavam. A conexão entre eles era palpável, uma dança de emoções e sensações que os envolvia, tornando tudo mais vívido, mais real.
Com um impulso de coragem, Mackenzell pediu para ele acelerar, ansiando por mais daquela intensidade que a deixava tonta. Rafe, sempre atento às suas reações, atendeu ao seu pedido, aumentando o ritmo com uma paixão que a fazia sentir-se completa. Ela se ergueu um pouco, buscando aquela sensação que parecia levá-la a um estado de êxtase. Ele a guiava, suas mãos firmes, mas suaves, sempre respeitando seus limites.
Quando ela finalmente atingiu aquele clímax de prazer, uma onda de euforia a envolveu, e Rafe sentiu a transformação entre eles. Então, ainda a penetrando, ele continuou, mesmo que ela sentisse seu interior sensível ela permitiu, enquanto gemia baixo, até que, segundos antes de atingir seu próprio clímax, ele se retirou, gozando sobre a barriga dela, fazendo-a inconscientemente erguer o próprio tronco pra enxergar a bagunça que ele tinha feito, antes de rir e grudar os lábios dele nos dela, feliz com aquilo.
Mais tarde, deitados na cama de Rafe, com os corpos entrelaçados e o silêncio da tarde se instalando, Mackenzell percebeu algo: Estar com ele assim era diferente. Talvez fosse o estado frágil em que ele estava, ou talvez fosse porque ele, pela primeira vez, parecia realmente tentar mostrar quem ele era de verdade.
Uma pessoa boa.
Ela fechou os olhos, sentindo a respiração dele desacelerar ao lado dela. Mesmo sem saber o que o futuro reservava, naquele momento, eles estavam exatamente onde precisavam estar.
Rafe observava Mackenzell se levantar lentamente do lado da cama. A luz alaranjada da tarde entrava pelas frestas da cortina, revelando que já passava das três e meia. Ele acompanhou seus movimentos enquanto ela se inclinava para pegar o sutiã jogado no chão, prendendo-o atrás das costas, com um olhar distante, perdida em pensamentos.
O quarto tinha aquele ar de silêncio pós-tempestade, onde tudo parecia suspenso por um fio invisível, prestes a se desfazer ou a se tornar algo mais concreto.
Mackenzell não sabia ao certo o que pensar sobre o que acabara de acontecer. Ter transado com Rafe era algo que a fazia questionar se aquilo havia sido uma carência passageira ou um reflexo de um sentimento mais profundo. Gostava dele de verdade? Ou gostava do arrependimento que ele demonstrava depois de machucá-la?
Rafe se mexeu na cama, os lençóis se amontoando em volta dele enquanto ele a observava.
— Aonde você vai? — ele perguntou, a voz rouca e baixa, quebrando o silêncio.
Mackenzell olhou de relance para o relógio na cabeceira dele e depois pegou o celular, acendendo a tela.
— Tenho que sair com a Sarah. — murmurou, como se precisasse justificar sua partida. Ela mostrou a ele uma mensagem da amiga, que perguntava onde estava.
Rafe assentiu, sem questionar, surpreendentemente calmo.
— Tudo bem. — ele disse, num tom quase dócil, algo que Mackenzell nunca esperaria ouvir dele. Talvez fosse o efeito do momento, ou talvez ele fosse o tipo de cara que se tornava mais vulnerável depois de fazer sexo. Ou talvez, pela primeira vez, ele realmente gostasse dela, e ela precisasse aceitar isso.
Enquanto ela colocava a blusa, Rafe se aproximou por trás, esgueirando-se pela cama com aquele jeito preguiçoso e confiante. Ele deslizou o braço forte ao redor da cintura dela, envolvendo-a com facilidade. O toque era possessivo, mas não agressivo — como se ele quisesse mantê-la ali por mais um segundo.
Então, ele pressionou os lábios contra a costela dela, deixando um beijo suave que a fez arrepiar.
— Me liga mais tarde. — ele sussurrou contra a pele dela, a voz baixa e carregada de uma intimidade inesperada.
Mackenzell fechou os olhos por um instante, sentindo a suavidade do beijo.
— Sim... sim, claro. — murmurou, ainda meio atordoada pela mistura de emoções que ele despertava nela.
Ela terminou de vestir a blusa e, com alguma dificuldade, puxou os shorts até a cintura. Rafe a soltou devagar, como se não quisesse deixá-la ir, mas também soubesse que não podia prendê-la ali para sempre.
Quando ela estava pronta para sair, pegou a bolsa, jogando-a sobre o ombro, mas algo a fez parar. Ela se virou de repente e encontrou Rafe ainda deitado, observando-a com aquele sorriso levemente provocador, como se soubesse exatamente o efeito que tinha sobre ela.
Sem pensar duas vezes, Mackenzell voltou até ele e o beijou com intensidade — um beijo cheio de desejo e confusão, como se aquele momento fosse um ponto de ruptura entre o que eles eram e o que poderiam ser. Ele correspondeu na mesma intensidade, segurando o rosto dela com firmeza, como se quisesse marcar aquele momento na memória.
— Até mais tarde. — ela disse, com um sorriso que misturava desafio e uma ponta de vulnerabilidade.
— Até mais tarde. — Rafe respondeu, a voz baixa e arrastada, com um sorriso meio safado.
Ela deu um tchauzinho meio torto, ainda um pouco desconcertada, e saiu do quarto dele, fechando a porta atrás de si com um clique suave. Assim que estava do lado de fora, ela parou por um momento no corredor, respirando fundo.
O peso do que acabara de acontecer caiu sobre ela como uma onda silenciosa. Seu coração ainda batia rápido, não apenas pelo que tinham feito, mas pelo que aquilo significava.
Foi bom. Melhor do que ela imaginava. Era estranho, porque sempre hesitava em se entregar para Rafe. Achava que ele seria rude, que não saberia ser gentil, que seria o mesmo idiota de sempre. Mas ali, entre os lençóis e os sussurros daquela tarde, ele havia mostrado uma versão de si que ela não conhecia.
E talvez, apenas talvez, ele estivesse tentando ser essa pessoa por ela.
Mas será que ela estava pronta para isso? Será que Rafe podia realmente ser alguém em quem ela confiasse, ou ele voltaria a ser o garoto quebrado que se afogava em raiva e caos?
Por agora, Mackenzell decidiu não pensar demais. Ela estava ali, e ele também. Isso era o suficiente. Ela ajeitou a bolsa no ombro e começou a descer as escadas, tentando ignorar o fato de que pela primeira vez em muito tempo, havia gostado do que sentira com ele.
E mais do que isso... gostava da possibilidade de que ele também sentisse o mesmo.
— Então quer dizer que eles podem ter encontrado o ouro e você não estava lá? — Sarah perguntou, segurando a bicicleta com uma só mão enquanto tentava dar um tapinha no ombro de Mackenzell, que desviou da abordagem da amiga com um leve movimento.
— É, e o que você queria que eu fizesse? — Mackenzell respondeu, a frustração tingindo sua voz, enquanto o calor da tarde envolvia as duas.
— Que você mandasse o Rafe à merda! — Sarah interrompeu, a incredulidade transparecendo em seu tom.
Mackenzell nunca imaginou que faria algo assim. Estava ali, de tênis, pisando em um terreno irregular, cercada por mato alto, indo em direção ao Castelo, como eles chamavam a casa de Johb B.
Nunca tinha ido até lá antes, e a curiosidade misturada com um leve nervosismo a acompanhava. Na verdade, não sabia nem como era o lugar. As raras vezes que tinha estado com os Pogues de verdade se resumiam a festas, surf e momentos descontraídos na Kombi.
O castelo, para ela, sempre pareceu um espaço inacessível, uma fortaleza do qual nunca tinha sido convidada a fazer parte. E agora, ali estava, sentindo uma mistura de ansiedade e expectativa. O que ela estava fazendo ali?
Podia mentir para si mesma e pensar que estava ali pelo Rafe, que se conseguissem o dinheiro, poderia ajudá-lo. Mas havia algo mais profundo a guiando. Algo que a conectava à sua mãe, que sempre estivera envolvida na história do ouro.
Aquela conexão a fazia sentir que precisava descobrir o que realmente havia acontecido, especialmente porque nunca teve a chance de se despedir da mãe.
— Eu não podia. Ele precisava de mim. — disse Mackenzell, a determinação nas palavras.
— Não, tudo bem — Sarah respondeu, suavizando a expressão. — Se você gosta do meu irmão, não tem problema, tá?
Ao invés de recusar, como fazia normalmente, Mackenzell encarou a amiga e sorriu torto, um gesto que misturava gratidão e compreensão.
— Acha que eles vão nos aceitar de boa? — Sarah perguntou, com uma leve hesitação na voz.
— Ah, com certeza não. Mas eu não tenho me importado muito com isso — respondeu Mackenzell, pensativa.
— Eles até que são bem gente boa, né? — Sarah comentou, avaliando a situação com um olhar contemplativo.
— É porque eles não te conhecem — Mackenzell disse, um sorriso brincando em seus lábios.
— Ao contrário. Eles te conhecerem torna tudo mais fácil. Você já foi amiga deles, mesmo que tenha sido uma cuzona — Sarah disse, com um toque de sinceridade. — Você acha que eles já encontraram? Digo, o ouro? — Sarah perguntou, um brilho de esperança nos olhos.
— Não, acho que não — Mackenzell respondeu, balançando a cabeça. — Se já, teríamos visto o JJ Maybank passando por nós em um barco novo no cais
— É verdade! — Sarah riu, a tensão dissipando-se um pouco. — Vem cá, Mack. Você acha que essa história de ouro é baboseira? Só uma história pra que a gente acreditasse quando criança?
A pergunta a pegou desprevenida.
— Ah, eu não sei. — ela disse dando de ombros. — Mas gosto de pensar que a minha mãe falava dela por um motivo. Mesmo que seja mentira.
Enquanto conversavam, avistaram uma figura masculina correndo em sua direção. O coração de Mackenzell disparou ao reconhecer John B, que se aproximava com um sorriso tão grande que iluminava seu rosto.
— Oi! — Sarah exclamou, se aproximando e o abraçando calorosamente.
— Oi! — John B respondeu, com a voz cheia de alegria, e os dois começaram a andar lado a lado, um pouco tímidos.
Mackenzell observou pela primeira vez como eles pareciam realmente se gostar, e isso a fez sentir uma pontada de felicidade por eles.
Enquanto caminhavam em direção ao castelo — como chamavam a casa de John B — o sol começava a se pôr, lançando uma luz dourada sobre a paisagem ao redor. O ar estava impregnado com o cheiro fresco do mar e da vegetação ao redor. Sarah e John B caminhavam lado a lado, suas bicicletas balançando levemente enquanto as rodas giravam no chão irregular da trilha. Eles conversavam animadamente, seus rostos iluminados com sorrisos e expressões de alegria que Mackenzell observava em silêncio, segurando sua própria bicicleta com firmeza, um pouco atrás deles.
Mackenzell sentia-se como uma espectadora naquele momento, um pouco alheia à intimidade que fluía entre os dois. A maneira como Sarah gesticulava com as mãos, destacando cada ponto da conversa, e como o olhar de John B buscava o dela, deixava claro que havia um vínculo forte entre eles, algo que ela ainda não compartilhava. Ela forçava um sorriso, tentando se incluir, mas a insegurança a deixava hesitante.
— Quer dizer que acharam o ouro? — Sarah perguntou, a animação transparecendo em sua voz, enquanto seus olhos brilhavam de excitação.
— Sim! — John B respondeu, um sorriso radiante surgindo em seu rosto, que parecia quase brilhar sob a luz do pôr do sol. — Debaixo da casa de uma assassina!
A expressão de Sarah mudou instantaneamente, passando de empolgação a um misto de incredulidade e diversão.
— Que perfeito! — ela exclamou, um tom de sarcasmo na sua voz. — A única coisa é que o poço é muito fundo.
Mackenzell, que estava escutando atentamente, não pôde deixar de interromper, sua curiosidade despertando.
— Espera, era um poço? — ela perguntou, fazendo os dois pararem de andar. O chão estava coberto de folhas secas que farfalhavam com o movimento, e a brisa leve fazia os galhos das árvores ao redor sussurrarem. — Então quer dizer que a música não é baboseira? Ela funcionou?
— É, ela funcionou — John B disse, balançando a cabeça, e, pela primeira vez, notou o brilho genuíno nos olhos de Mackenzell. Era a primeira vez que a via sorrir de maneira tão genuína, uma felicidade que parecia iluminá-la de dentro para fora.
Era realmente uma loucura pensar que uma simples música de ninar tinha sido o catalisador para algo tão grandioso. Aquela revelação trouxe a Mackenzell um senso de orgulho inesperado, uma sensação de pertencimento que ela estava começando a achar que nunca teria.
— Eu queria ter ido com vocês — Sarah disse, um leve traço de frustração na voz. Ela olhou para John B, como se pedisse para que ele reconhecesse o que estava em jogo.
— Ah, você vai lá hoje — John B garantiu, tentando confortá-la enquanto mantinha o tom leve.
— E tá tudo bem? — Sarah indagou, uma preocupação surgindo em seu olhar. A luz do sol dançava em seus cabelos enquanto ela observava John B, seu rosto um retrato de expectativa.
— Tudo, claro. Por quê? O Vlad e a Val têm que ficar juntos, né?
— Não, não, quer dizer, com os outros — Sarah disse, uma leve confusão em seu olhar.
— Tá, tá, tá tudo bem. O que foi? A Kiara falou alguma coisa, né?
— Não.
— Você é o pior mentiroso do mundo — Sarah brincou, um sorriso se formando em seu rosto.
— Ele é. — Mackenzell franziu o nariz, ficando parada ao lado de Sarah, a amizade entre elas se fortalecendo com aquele momento. A tensão entre John B e Sarah parecia derreter, mas Mackenzell ainda se sentia um pouco deslocada.
— Qual é? — John B disse, lançando um olhar suplicante para Mackenzell, como se esperasse que ela intervisse.
— Eu não tô mentindo — ele insistiu, seu tom se tornando um pouco defensivo.
— Olha, John B, se ela quer marcar território, eu não vou... — Mackenzell começou, tentando aliviar a tensão.
— Ei, ei, ei, olha, me escuta, tá bom? Você também faz parte disso. Se não fosse você, não teríamos convencido a Mackenzell a entregar a planta de Wavehill, e não teríamos a música — John B explicou, o alívio evidente em sua voz quando Mackenzell assentiu.
— Ele tem razão — Mackenzell concordou, e uma sensação de camaradagem começou a se formar entre os três. O ar ao redor parecia mais leve, e as preocupações momentaneamente esquecidas.
— Aliás, assim que virem, vocês vão ficar animados. Eu prometo — ele disse, um sorriso amarelo surgindo em seu rosto, mas havia uma pequena sombra de incerteza em seus olhos.
A varanda do castelo estava tomada por um clima tenso. Kiara caminhava de um lado para o outro, braços cruzados, sua expressão refletindo a irritação que transbordava. O sol começava a se pôr, lançando sombras longas sobre o piso de madeira desgastada, enquanto ela continuava a alfinetar John B, que tentava evitar o confronto.
— Não acredito! Você trouxe ela aqui? Agora o que? ela está dentro? — Kiara disparou, gesticulando dramaticamente, seu tom desafiador ecoando nas paredes do castelo. O desprezo em sua voz era palpável. — Já não bastava a Kook, que sem ofensas, ninguém suporta, e agora ela?
— Não ofendeu. — a morena deu de ombros, sabendo que merecia o ódio que as pessoas desferiam a ela.
John B, nervoso com a situação, olhava para os lados em busca de apoio, mas Pope apenas resmungava, dando de ombros, como se a briga não fosse da sua conta. A tensão crescia, e ele desejava que a conversa tomasse um rumo diferente.
— Bom, a única coisa que me importa, é que a parte dela sai da sua conta. — JJ disse, quando os olhos de John B caíram sobre ele.
— Olha, eu não me lembro da gente votar! — Kiara continuou, a frustração evidente em seu olhar. — Esse negócio é nosso! É um lance Pogue! E agora você quer enfiar duas Kook's nisso?
— Olha, devo dizer que estou um pouco desconfortável com tudo isso. — Pope declarou, pela primeira vez, todo travadão no lugar.
— Obrigada! — Kiara disse, apontando para Pope, como se agradecesse pela defesa.
— E quando que você ta confortável? — John B perguntou de volta, ácido.
— Sei lá, eu vim até aqui confortável na garupa do JJ. — respondeu Pope, como se a questão fosse ridícula.
JJ, por sua vez, não perdeu tempo e alfinetou: — Verdade. Nunca vi o Pope tão relaxado.
Sarah estava sentada em um sofá antigo e sujo da varanda, o tipo de lugar que já viu dias melhores. Mackenzell, por outro lado, silenciosamente se recusou a se sentar ali, preferindo encostar-se na janela, observando a confusão se desenrolar diante de seus olhos.
A madeira da varanda rangia sob seus pés, enquanto ela considerava o que fazer a seguir. Um dilema se formava em sua mente: deveria se juntar à briga ou permanecer na retaguarda, observando tudo?
— Que fofo, gente — John B disse, tentando apaziguar a situação, mas sem saber exatamente como.
— Aqui estava bem confortável até você trazer ela — Chiara retorquiu, seu tom hostil e incisivo.
— Para de falar de mim como se eu não estivesse aqui! — Sarah exclamou, finalmente perdendo a paciência.
Mackenzell lançou um olhar para JJ, meio que inconscientemente, tentando ler a expressão dele. Ele ergueu as sobrancelhas, seus olhos expressando a mesma confusão e vontade de rir que ela sentia. O clima estava pesado, e as palavras de Kiara só aumentavam a tensão.
O que era engraçado. Essa ligação que eles tinham. Os dois se entreolharam com uma intimidade que não compartilhavam a séculos.
— Tá incomodada? — Kiara debochou — Então sai!
— Eu te disse! — Sarah retrucou, o tom de sua voz agora cortante enquanto ela encarava John B.
— Disse o que exatamente? — Kiara exigiu, cruzando os braços e se aproximando de Sarah. — Que você é mentirosa?
— Não, que você é uma vadia que fala merda! — Sarah respondeu, seus olhos lançando faíscas.
A raiva no ar parecia quase palpável. JJ, percebendo que a situação estava saindo do controle, rapidamente tirou o dinheiro do bolso e virou-se para Pope. — Vamos apostar! — disse ele, tentando mudar o foco da conversa.
Mackenzell se aproximou dele e deu um tapa no braço de JJ, um gesto que dizia "cala a boca", e ele instantaneamente se controlou, como se ela tivesse algum poder sobre ele.
Enquanto Sarah e Kiara continuavam brigando, John B gritou, — Gente, chega! — fazendo todos se calarem. — Kie, você é minha melhor amiga, né? — ele disse, e ela levantou as sobrancelhas como se aquilo fosse irrelevante — E Sarah, você... — Ele hesitou, procurando as palavras. — Você é a minha...
— Pode dizer... — pediu ela, sem conseguir esconder a curiosidade.
— É a minha namorada. — John B declarou, a confissão ecoando pela varanda.
Um silêncio repentino caiu sobre o grupo. Ninguém esperava por isso. Mackenzell soltou uma risada pelo nariz, surpresa e um pouco divertidas com a revelação.
— Você está namorando ela? — Kiara disse, rindo em escárnio — E aquele papo de só usar ela pra ter informação, hein? Arranjar a planta e esquecer ela?
— Você disse que só estava me usando? — Sarah interpelou, sua expressão alternando entre a incredulidade e a frustração.
— Não! — John B se apressou a explicar. — Eu me apaixonei, tá bom?
— Que papinho de merda. — Mackenzell se pronunciou, claramente irritada, e se desencostou da janela suja.
— Vou vomitar. — exclamou Kiara, a exaustão evidente em sua voz.
— A gente não esperava, mas aconteceu — respondeu Sarah, balançando a cabeça em desânimo.
— Olha, pra mim deu. Se elas entrarem, eu saio! — Kiara gritou, sua irritação crescendo.
— Não existe essa opção, querida. — Mackenzell interveio, levantando as mãos em um gesto de rendição. — Sem mim, vocês não encontrariam a casa dos Crain. Na verdade, sem mim, vocês não tinham nem os tanques de oxigênio.
— Fala sério. — Kiara revirou os olhos ao ve-la reviver um assunto tão antigo, quanto quando JJ roubou os respiradores da família dela
— É, Kie. Não tem o que fazer, ela também é necessária — John B defendeu, olhando diretamente para Chiara. — Sem ela, a gente não teria achado a poço.
— Eu acho que a gente achava sim, viu? — disse Kiara, meio que debochando da situação, sua expressão um misto de ceticismo e diversão. — Só escolhe logo!
— Eu não vou fazer isso agora, Kie. Eu não posso! — John B disse, sua voz se elevando.
— Mas é mais que isso! — Kiara insistiu. — Na verdade, eu estou muito interessada. Eu ou ela?
— As duas! — ele respondeu, sem paciência, com a voz firme
A expressão de Sarah se contorceu de decepção. — Vai ser tranquilo, né? — ela disse, parafraseando o que ele havia dito meia hora antes. — Merda, eu vou embora — Sarah disse, se levantando abruptamente.
— Sarah, não! — John B implorou.
— Esquece. — Ela abandonou a conversa com um gesto, sua frustração evidente — Vocês conversam aí. Vem, Mack.
Mackenzell, percebendo que a situação se tornava insustentável, se desencostou da janela, limpou as mãos na roupa e seguiu na direção de Sarah, sabendo que teria que consolá-la. A amizade delas estava à prova, mas ela não poderia deixar a amiga sozinha naquele momento.
— Me avisa depois — disse ela uma ultima vez para John B, a voz suavizando, enquanto as duas saíam da varanda juntos.
O píer da casa de Kiara se estendia sobre as águas calmas da baía, os últimos raios de sol mergulhando no horizonte, criando um espetáculo de cores que contrastava com a tristeza que pairava no ar. O cheiro do mar misturava-se com a madeira envelhecida, e o som suave das ondas quebrando nas pilastras parecia um eco distante da confusão em seu coração. Kiara estava sentada contra uma das pilastras, com as pernas estendidas à frente, os pés balançando levemente sobre a borda. Ela havia cruzado as mãos sobre os joelhos, tentando se segurar, mas as lágrimas que escorriam por seu rosto eram incontroláveis, como se quisessem escapar a qualquer custo.
Pope estava à sua frente, um tanto hesitante. Ele a observava, a preocupação se instalando em seu peito ao vê-la naquele estado. A angústia dela era palpável, e ele não sabia como aliviar a dor que a consumia.
— Olha, só continua com a esquisitice de sempre, tá? — Kiara começou, sua voz tremendo entre as lágrimas. — Tô com ódio do John B agora. É só que eu sei exatamente como isso acaba. Eu já vi esse filme. Eu fui a estrela.
Ela desviou o olhar para o horizonte, como se quisesse escapar da realidade por um momento. Pope a escutava atentamente, sem interromper, reconhecendo a luta interna que ela enfrentava. Kiara continuou, sua voz cada vez mais intensa, repleta de frustração.
— Escuta, no primeiro ano eu entrei na academia Kook. Sabe como aquilo é assustador? — disse ela, a lembrança a consumindo. — E uma das coisas não tem comparação com a outra. Eu não tinha nada em comum com ninguém lá. E quando eu tava a ponto de cortar os pulsos, a rainha me convidou pra gente salvar tartaruguinhas bebês.
A cena da praia se formou na mente dela, um momento que a fez sorrir, mesmo em meio à dor. Ela respirou fundo, como se estivesse revivendo aquele dia especial.
— No nosso primeiro dia juntos, caminhamos na praia. Esperamos os ovos abrirem e espantamos as gaivotas pra tartaruguinhas chegarem na água. Isso... isso parece bem legal. Foi o melhor dia da minha vida. Depois ela me apresentou pra Mackenzell. Não que a gente não se conhecesse, mas... naquela vez foi diferente.
O olhar de Kiara se iluminou ao lembrar das conversas que tiveram, da conexão que formaram.
— Ela foi legal comigo. A gente conversou e descobriu que tinha coisas em comum. Descobri que ela ouvia Bob Marley. E foi... especial. Merda, tão especial. O irmão dela me deu uma tartaruga uma vez, me lembro de recusar, então ele me levou pra costa e devolvemos ela pra praia.
— Mason Kook? Nossa. O cara é um babaca — Pope interrompeu, o desprezo evidente em sua voz.
— É, ele é. — A voz de Kiara falhou ao pronunciar essas palavras, e ela fungou amargamente, deixando que a tristeza voltasse a tomar conta dela. — E aí ela me traiu, como faz com todo mundo. Olha, eu não vou fazer isso com ela. Ele vai ter que escolher.
Pope se inclinou um pouco para frente, a expressão de preocupação se intensificando. Ele sabia que a situação era complicada, mas não podia deixar de tentar argumentar.
— Sabe que ele não pode fazer isso.
— Por que não? — A incredulidade se misturou à dor na voz dela.
— Porque ele é um idiota — respondeu Pope, a raiva por John B transparecendo em suas palavras.
Ele se levantou, decidindo que precisava dar um tempo a ela para processar tudo o que havia sido dito. Enquanto olhava para Kiara, que ainda estava sentada, de costas, encostada na pilastra, ele sentiu um impulso de oferecer conforto.
— Se fosse comigo, eu sei quem eu ia escolher — disse ele, em um tom mais suave, mas firme.
Ele deu a volta, sentindo a necessidade de deixá-la sozinha por um momento. Kiara ficou ali, mergulhada em seus pensamentos, com a mente agitada, enquanto as ondas continuavam a sussurrar suas verdades silenciosas. As palavras de Pope ecoaram em sua mente, e a luta entre seus sentimentos e sua amizade com John B se intensificava.
Na cozinha bagunçada da casa de John B., a atmosfera era uma mistura de tensão e camaradagem. A luz do fim de tarde filtrava-se pelas janelas, destacando a desordem típica de adolescentes que estavam mais preocupados com a aventura do que com a arrumação. O cheiro de algo indefinido pairava no ar, um lembrete de que a cozinha não era apenas um local para refeições, mas também um centro de decisões complicadas e confissões.
— O que ela disse? — John B perguntou, se referindo à Kiara
— Que você é um idiota. — Pope respondeu.
John B. estava visivelmente frustrado. Ele lançou uma garrafa de água na direção de Pope, que a segurou instintivamente, como se fosse uma bola que ele tinha que pegar. A pressão em seus ombros era palpável; ele sabia que a escolha entre Sarah e Kiara não seria fácil.
— O que vocês acham que eu devo fazer? — John B. perguntou, sua voz um pouco mais alta do que o normal.
— Escolhe a Kiara. — JJ, que estava na geladeira, puxou uma garrafa de cerveja e a abriu, o som do estalo ecoando na cozinha. Ele deu um gole da bebida, olhando de John B. — Que foi? A gente vai empacar porque você é pau mandado? — JJ disse, sua expressão de desprezo bem visível. — Não dá pra gente fazer isso sem a Kiara, você sabe disso.
— E eu não posso fazer isso sem a Sarah.
A menção do nome de Sarah fez com que Pope franzisse a sobrancelha, tentando ignorar a agitação que crescia em seu interior. A tensão aumentava, e ele não sabia como se sentir em relação a tudo isso.
— E por que nenhum de nós tá falando sobre a Mackenzell? — ele perguntou, tentando manter a conversa leve, mas a indignação em sua voz era evidente. — Ela é um pé no saco.
— Não, ela precisa estar — JJ respondeu, dando mais um gole da cerveja, a confiança transparecendo em seu tom.
— Precisa, é? — Pope insistiu, agora claramente perplexo.
— E depois eu que sou o pau mandado — John B. interveio, mas sua voz não tinha o mesmo vigor. Ele se sentia preso entre as duas garotas e os dois amigos.
— Nada a ver, cara, cala a boca — JJ rebateu, defendendo-se com veemência.
— Pera, o que tá rolando aqui? — Pope perguntou, a curiosidade tomando conta dele. Ele sempre foi o curioso do grupo, e a dinâmica entre os três estava longe de ser simples.
— Acontece que o JJ não supera a ex — John B. soltou, uma expressão divertida em seu rosto.
— Ela não é a minha ex. — JJ reclamou, a raiva brotando quando empurrou John B. para o lado, uma mistura de indignação e frustração.
Pope piscou, confuso. — Espera, você e a Kook?
Ele não podia acreditar no que acabara de ouvir. O que deveria ser uma conversa sobre amores e escolhas agora parecia um jogo de tabuleiro, cheio de peças que não se encaixavam.
— É, é, bem-vindo ao clube — John B. disse, rindo da expressão chocada de Pope.
— Nossa! — Pope exclamou, os olhos arregalados e a boca aberta em surpresa. Ele estava completamente sem palavras, surpreso com a revelação que acabara de desferir sobre a amizade deles.
— Mas a questão é, as duas têm que participar — John B. continuou, tentando colocar as ideias em ordem enquanto lutava contra a confusão que o cercava.
Pope olhou de um para o outro, percebendo que a situação não era nada simples. — É, boa sorte com isso — ele disse, um tom cínico na voz.
— Quer saber? — John B acrescentou, sua expressão mudando para um semblante mais sério. — Eu sei que foi culpa minha. Mas é problema nosso. Eu tenho um plano. E os dois merdinhas vão me ajudar.
O sol refletia nas águas calmas da marina enquanto Mackenzell e Sarah caminhavam lado a lado. As sandálias de Mackenzell faziam um som suave sobre a madeira molhada do píer, mas sua mente estava distante. Ela não parava de pensar em Rafe. Ele havia sumido, deixando seu "nos vemos mais tarde" ecoar na cabeça dela como uma promessa quebrada.
— Você não acha isso estranho? — Mackenzell perguntou, lançando um olhar inquieto para Sarah enquanto passavam pelos barcos ancorados.
— O quê? Foi só um convite. — Sarah deu de ombros, os olhos fixos na figura de John B. ao longe, ajustando algo no barco. — Vamos, Mack! Vai ser divertido.
O dia tinha acabado de amanhecer, e o ar ainda carregava aquele cheiro salgado da madrugada. Mesmo assim, a ideia de atravessar o pântano em vez da praia fazia Mackenzell se sentir desconfortável. Alguma coisa sobre a escuridão silenciosa das águas a deixava nervosa, mas ela abafou a sensação. Rafe não tinha respondido suas mensagens, e talvez isso fosse carma ou apenas descaso — mas, de qualquer forma, não importava mais.
— Tudo bem — Mackenzell murmurou, acompanhando Sarah até o barco de John B. Ela observou a estrutura envelhecida da embarcação, tentando imaginar como aquele barco poderia ter sido valioso um dia. Agora, ele parecia mais uma relíquia cansada de aventuras passadas.
— Talvez ele só queira dizer que escolheu a gente — Sarah comentou, um sorriso brincando em seus lábios.
— Você tá apostando todas as suas fichas nisso, né? — Mackenzell respondeu, erguendo uma sobrancelha. O comentário arrancou uma risada sincera de Sarah.
Assim que pisaram no HMS Pogue, John B. se virou para elas com um sorriso largo e despreocupado.
— Prontas para o melhor dia de barco da vida de vocês? — ele perguntou, a voz carregada de entusiasmo.
— Com certeza — Sarah respondeu, erguendo-se na ponta dos pés e deixando um selinho nos lábios de John B. O gesto fez Mackenzell revirar os olhos discretamente. Ela sabia que aquele seria um longo dia.
Com o barco já em movimento e o sol subindo no céu, Mackenzell se sentiu sufocada pelo calor. Decidiu tirar a blusa, ficando apenas com a saia jeans e o biquíni branco, tingido com manchas azuis em um padrão tie-dye. A sensação do vento quente contra sua pele era um alívio, mas não durou muito.
O barco deu um tranco inesperado, jogando todos para os lados. Mackenzell quase perdeu o equilíbrio e precisou se segurar nas barras do convés para não cair.
— Merda! — John B. exclamou, franzindo a testa ao ver o motor falhar.
— O que foi? O que houve? — Sarah perguntou, deixando o lado de Mackenzell e entrando na cabine com passos rápidos. A paisagem ao redor era inquietante — o pântano estava silencioso demais, e aquilo a fez sentir um arrepio.
— Não sei. O motor quebrou. Estamos ilhados — John B. disse, a frustração evidente.
— Mas que merda, Routledge! — Mackenzell reclamou, caminhando descalça até a cabine. — O que você fez?
— Nada. A gente só precisa trocar as manivelas para ele funcionar de novo.
— Parabéns. E você não pensou em checar isso antes? — Mackenzell cruzou os braços, irritada. Não era o mar que a incomodava dessa vez — era a ideia de passar o dia inteiro presa com um casal.
— Podia ter me avisado — John B. retrucou, com uma expressão azeda. Mackenzell riu, desviando o olhar dele para Sarah.
— Palhaço — ela disse, divertida. — Como a gente ajuda?
— Vocês podem pegar a bomba que fica embaixo do convés. Vai ajudar a dar força para o motor ligar de novo — ele explicou.
Sarah deu espaço para Mackenzell descer, e a garota foi até o porão. O lugar era apertado, e a luz escassa dificultava a visão.
— Não consigo enxergar nada! — Mackenzell reclamou, confusa enquanto tentava identificar alguma coisa útil entre caixas e cordas emboladas. — Sarah, vem cá!
Sarah hesitou por um momento, mas logo desceu as escadas estreitas, um passo cuidadoso de cada vez. A luz do celular dela iluminou o espaço apertado, revelando o emaranhado caótico de itens náuticos.
— Espera, John B., o que você... — Sarah começou a falar, mas sua voz foi interrompida pelo som da porta de madeira batendo com força sobre suas cabeças.
As duas se entreolharam, confusas. A realidade do que acabara de acontecer caiu como um balde de água fria.
— John B.! — Mackenzell gritou, socando a porta com o punho. — Abre essa merda agora!
Do lado de fora, o silêncio foi a única resposta. As duas estavam presas no porão do barco, e a sensação de terem sido enganadas era tão sufocante quanto o ar parado ao redor delas.
— Ele nos fez de bobas... — Mackenzell murmurou, a raiva crescendo em seu peito.
Sarah bateu na porta, mas o som era abafado. — John B.! Você não pode estar falando sério!
Nada. Apenas o eco distante da água batendo contra o casco do barco.
O tempo passava devagar no porão abafado do barco. Mackenzell e Sarah estavam sentadas de lado, encostadas na parede de madeira, sem qualquer noção clara de quanto tempo já havia se esvaído. Ambas mantinham expressões emburradas e trocavam olhares de frustração.
— Que merda, não acredito que caímos nessa — Mackenzell resmungou, cruzando os braços e se remexendo sobre o chão áspero.
— Somos duas idiotas — Sarah concordou, suspirando e jogando o cabelo para trás da orelha.
— Quanto tempo você acha que ele vai deixar a gente aqui? — Mackenzell perguntou, mais para ter algo com o que preencher o silêncio do que por real curiosidade.
— Não faço ideia... — Sarah respondeu, desanimada.
Foi nesse momento que ambas ouviram passos no convés acima delas. Os sons eram rápidos e leves, claramente não pertencentes a John B. Mackenzell franziu a testa, tentando identificar as vozes. Quando finalmente ouviu com mais clareza, seu coração deu um salto: JJ. Ela reconheceria aquela voz irritantemente familiar em qualquer lugar.
— Sério, JJ? Não consegue fazer nada sem mim? — Kiara reclamava, seus passos ecoando pelo piso.
— Tô tentando, calma aí — JJ respondeu com aquele tom de brincadeira irresponsável. Mackenzell conseguia até visualizar o sorriso idiota dele.
Kiara entrou na cabine e, de repente, parou, encarando a mesma tampa no chão que havia prendido Mackenzell e Sarah. As duas se animaram e começaram a bater no teto, tentando chamar atenção.
— JJ! — Sarah gritou, socando a madeira com toda força.
— O que foi isso? — Kiara perguntou, mas JJ parecia desinteressado.
— Sei lá. Deixa pra lá, não tem nada demais — ele disse com desprezo, já se afastando.
— JJ, abre essa porta agora! — Mackenzell gritou, o rosto ficando vermelho de raiva.
Ainda assim, JJ e Kiara pareciam mais interessados em qualquer outra coisa. Quando Kiara hesitou e finalmente abaixou-se para abrir a tampa, a porta rangeu e se ergueu lentamente.
— Mas que merda...? — Sarah sussurrou, enquanto ela e Mackenzell corriam para fora do porão, disparando as escadas na direção do convés.
— Gente! — Kiara gritou, olhando para o lado de fora. — Eles estão saindo com o barco!
Mackenzell e Sarah chegaram ao convés e viram JJ, John B. e Pope nadando de volta para um pequeno barco à deriva próximo ao deles.
— Vocês só podem estar de sacanagem! — Mackenzell gritou, batendo a mão contra a coxa, incrédula.
— Voltem aqui agora, seus idiotas! — Kiara berrava atrás delas, mas os garotos riam enquanto subiam no barco.
— Não podemos voltar até vocês se resolverem! — John B. gritou, provocando, enquanto JJ e Pope se jogavam despreocupadamente no barco menor.
— JJ, seu idiota! — Mackenzell gritou, a raiva explodindo em sua voz como uma corrente elétrica.
— Relaxa, tem comida na cabine! — Pope gritou de longe. — E o JJ bolou um baseado!
— Cretinos! — Mackenzell esbravejou, os olhos ardendo de frustração.
Num ímpeto de pura raiva e adrenalina, Mackenzell começou a tirar o short, decidida a nadar até eles. Em segundos, ela estava apenas de biquíni. Sarah e Kiara hesitaram, mas acabaram seguindo o exemplo dela, jogando as roupas de lado.
Mackenzell chutou os tênis para longe, agarrou o cós do short e o puxou para baixo, lançando-se para a água com um mergulho rápido e preciso. O impacto gelado quase tirou seu fôlego, mas ela começou a nadar vigorosamente em direção ao barco dos garotos.
— Espera! — ela gritou, os braços batendo na água, tentando alcançá-los. — JJ, seu cuzão!
Mas o barco já se afastava, os risos deles ecoando pelo ar enquanto sumiam ao longe.
— Eles não vão voltar, Mack! — Kiara gritou da margem do barco, tentando fazer com que a amiga caísse na real.
Mackenzell nadava com todas as suas forças, determinada a alcançá-los — até que sentiu algo tocar sua barriga. O contato foi súbito e viscoso, como se alguma coisa pegajosa a tivesse agarrado.
Ela gritou, o som agudo e desesperado, e num segundo de puro pânico, seu corpo afundou na água. A sensação era horrível, como se algo tivesse arrancado uma parte da sua pele.
— Merda, merda, merda! — ela gritou, engolindo água enquanto tentava voltar à superfície, os braços se debatendo descontroladamente.
— Mackenzie! — Sarah berrou, jogando-se na água atrás dela sem pensar duas vezes.
— Uma água-viva me queimou! Merda! — Mackenzell gritou, sua voz fina e desesperada, enquanto a dor cortante e a água gelada a consumiam.
Sarah, vendo a amiga afundar, entrou em pânico e, sem hesitar, se lançou na água. O coração dela disparava, e a adrenalina fazia seus movimentos parecerem automáticos. Se eu não pular agora, ela vai se afogar, pensou, o medo tomando conta de cada fibra do seu corpo.
Ela alcançou Mackenzell a tempo, puxando-a para a superfície com força e a ajudando a escorar-se na escada do barco. Mackenzell ofegava descontroladamente, engolindo água e tossindo, cada respiração um desafio. O pânico em seus olhos era palpável.
De repente, não era mais a água fria do mar — era Mason. A lembrança do irmão a segurando debaixo d'água, a sensação do pulmão queimando e o medo esmagador, tudo voltou com força total. Ela se debatia, os braços fracos, mas frenéticos, lutando para não ser levada pela memória.
— Vem cá, relaxa. Eu te peguei, Mack. Tá tudo bem. — Sarah sussurrava, tentando acalmá-la enquanto a apoiava na escada. Sua voz era firme, mas doce, como se quisesse ancorá-la na realidade e afastar os fantasmas do passado.
Assim que Mackenzell conseguiu puxar ar suficiente, Kiara apareceu no convés, cruzando os braços e lançando um olhar crítico.
— Você nadou direto em cima de uma caravela. O que achou que ia acontecer? — Kiara falou com sarcasmo, arqueando uma sobrancelha.
Ainda tentando regular a respiração, Mackenzell encarou Kiara com os olhos ardendo de raiva. A dor em seu estômago era excruciante, mas a indignação foi mais forte. Mesmo tonta e com o corpo pesado, ela se inclinou para frente, como se fosse avançar na amiga.
— Vai se foder, Kiara! — Mackenzell cuspiu, a voz rouca e cheia de fúria. A adrenalina pulsava em suas veias, e ela puxou instintivamente o cós do biquíni para ver o ferimento. A pele estava vermelha e irritada, queimando a cada toque do tecido molhado.
Quando ela tentou dar mais um passo, Sarah se colocou entre as duas, pressionando as mãos suavemente contra os ombros de Mackenzell.
— Calma, Mack, para. Você precisa se cuidar, não brigar. — Sarah murmurou, mantendo o corpo firme entre elas. Seus olhos imploravam para que Mackenzell recuasse, e aos poucos, o peso da dor e do cansaço pareceu derrubar a raiva da amiga.
Ainda com o corpo trêmulo, Mackenzell se afastou, encostando-se na escada novamente. Seu peito subia e descia rápido, e os ecos do trauma finalmente começaram a diminuir. Sarah ficou ao lado dela o tempo todo, segurando sua mão por um momento, silenciosa, mas presente.
Kiara soltou um suspiro, ainda com o ar debochado, mas sem insistir mais na provocação.
— Vamos limpar esse ferimento antes que piore. — Sarah sugeriu, suavemente, quebrando o silêncio.
Mackenzell assentiu com relutância, sua respiração começando a se acalmar. O dia estava longe de terminar, mas ela sabia que, pelo menos naquele momento, Sarah a tinha salvado — tanto da água quanto dos fantasmas que a assombravam.
— Não tem como limpar. — Kiara disse passando a mão pelos cachos — Só xixi.
— Você não vai mijar em mim, Sarah. — Mackenzell disse, desesperada e sincera, como se aquilo saísse do fundo do seu coração.
— Esqueçam isso. — Kiara disse, dando de ombros — Eu tenho uma ideia melhor.
Mackenzell ainda respirava com dificuldade, o corpo tremendo da adrenalina e da dor. Sentada no banco do convés com Sarah e Kiara, ela esfregava o braço onde a caravela tinha encostado, como se pudesse aliviar a queimadura. O barco balançava levemente, e as três permaneciam em silêncio, o peso do momento se infiltrando no ar.
Kiara quebrou a quietude, puxando um pacotinho do bolso e balançando na frente das duas.
— O JJ deixou a erva aqui. Vai melhorar sua dor — disse, com um sorriso travesso.
Mackenzell revirou os olhos, exausta demais para discutir.
— Claro que vai — respondeu, com sarcasmo, mas no fundo sabia que qualquer coisa seria melhor que continuar sentindo aquela queimação insuportável.
Kiara abriu o pacotinho e começou a enrolar com agilidade, o isqueiro estalando enquanto a chama iluminava por um segundo o rosto despreocupado dela.
— Essa aqui é forte. Do primo do JJ. — avisou, acendendo e puxando a fumaça com a naturalidade de quem já fizera aquilo muitas vezes.
Mackenzell hesitou por um instante antes de pegar o baseado. Não era muito fã de maconha, preferia cigarros comuns, quais ela era viciada, mas naquele momento, qualquer alívio era bem-vindo. Ela levou o cigarro aos lábios e deu uma tragada longa e desesperada, como se aquilo fosse resolver todos os problemas.
— Vai com calma, Kook, essa parada é forte — Kiara alertou, rindo, mas Mackenzell já tinha puxado demais.
O efeito veio como uma pancada, e ela começou a tossir violentamente, dobrando o corpo enquanto o gosto amargo tomava sua boca e seus pulmões imploravam por ar. Sarah pegou o cigarro rapidamente das mãos dela e deu uma tragada leve, soltando a fumaça com tranquilidade pelo nariz.
— Eu avisei — Kiara disse, rindo enquanto se ajeitava no banco.
— Vai se foder, Kiara — Mackenzell murmurou entre tosses, tentando recuperar a dignidade.
Sarah passou o baseado de volta para Kiara, que deu mais uma tragada preguiçosa e se recostou com um sorriso satisfeito.
— Que foi, eu realmente avisei. — provocou, olhando para as duas com um sorriso mais amigável
Mackenzell respirou fundo e encostou a cabeça na madeira do banco, sentindo o efeito relaxante finalmente se instalar. A dor ainda estava ali, mas mais distante, como se não importasse tanto naquele momento.
— Tá bom, ponto pra você, Kiara — Mackenzell admitiu com um sorriso fraco.
As três ficaram ali, dividindo a brisa e o silêncio, enquanto o barco balançava suavemente sobre a água. Por alguns minutos, o mundo parecia mais leve, e todas as preocupações ficaram para trás, flutuando junto com a maré.
O efeito da maconha havia tomado conta das três. Já era noite, e o céu estrelado parecia mais próximo e confuso para elas, como se cada estrela estivesse piscando em câmera lenta. Mackenzell, Sarah e Kiara estavam sentadas na beirada do casco do barco, as pernas penduradas sobre a água escura. A brisa noturna soprava suave, mas o riso delas ecoava alto no ar parado.
Sarah, que parecia a mais chapada de todas, olhava para cima, os olhos semicerrados, tentando focar em algum ponto fixo no céu. Então, ela soltou uma risada sem sentido.
— Uau! — disse, como se tivesse acabado de ter uma revelação importante.
Kiara, já irritada, bufou.
— O que foi agora, Sarah?
Sarah deu uma risada boba e virou para Mackenzell, os olhos arregalados e brilhando.
— Ei, Kiara... você prefere ter mamilos nos olhos ou olhos nos mamilos? — perguntou, explodindo em risadas sozinha antes mesmo que qualquer uma pudesse responder.
Mackenzell soltou uma gargalhada alta, caindo contra Sarah, como se a piada tivesse sido a coisa mais genial que já ouvira.
— Imagina, Kiara, quando você envelhece... — Sarah continuou, tropeçando nas palavras e rindo ao mesmo tempo. — Seus peitos caem! E aí eles ficam igual cadarços desamarrados, pendurando!
Mackenzell quase caiu para trás de tanto rir, segurando a barriga. Era a primeira vez que ficava tão chapada, e cada palavra soava como a coisa mais absurda e hilária do mundo.
Kiara, por outro lado, estava impassível, apenas encarando as duas com um olhar exausto e descrente.
— Isso é sério? — perguntou, incrédula. — Esse é o primeiro baseado de vocês ou o quê?
Sarah balançou a cabeça, tentando parecer séria.
— Não... eu já fumei antes. — Mas não convenceu ninguém.
Kiara bufou, rolando os olhos, e murmurou:
— Meu Deus, por que eu ainda tô aqui?
Sarah ficou momentaneamente em silêncio, a mente lenta demais para processar a irritação de Kiara. Ela passou a mão pela barriga, tentando sentir a queimadura que a caravela tinha deixado. A sensação estava esquisita — quente e distante, como se ela estivesse tocando outra pessoa.
— Ei, Kiara — Sarah chamou de novo, com uma voz quase sonhadora.
Kiara virou para ela, os ombros caídos de frustração.
— Pelo amor de Deus, Sarah. Chega dessa merda, tá?
Mackenzell mordeu o lábio para segurar outra risada, mas falhou miseravelmente. Kiara revirou os olhos, e o silêncio desconfortável se instalou por alguns segundos.
— Tá, foi mal... — Sarah murmurou finalmente, encolhendo os ombros.
— Por que você fez aquilo? — Kiara disse, exausta daquela hipocrisia, cansada de fingir que tudo estava bem entre elas. Seu olhar era uma mistura de raiva e tristeza, e ela não se conteve em perguntar diretamente a Sarah.
Mackenzell observava a cena, o coração acelerado, à espera da reação da melhor amiga. O clima estava tenso, e o ar parecia denso ao redor delas.
— Porque eu fiz o quê? — Sarah respondeu, tentando adotar um tom cínico, mas sua voz trêmula entregava a fragilidade de sua posição.
— Vocês eram minhas melhores amigas! — Kiara desabafou, sentindo a dor da traição. — A gente roubava a cerveja dos nossos pais, assistíamos filmes juntas, chorávamos por garotos. Kenzell, eu namorei seu irmão, cara. E agora, de repente, eu tenho que ver sua festa de aniversário pelo Instagram? — Kiara olhou diretamente para Sarah, as duas garotas Kook desviando o olhar, uma onda de culpa as envolvendo.
Talvez fosse o peso da brisa e da maconha, ou talvez fosse apenas a vergonha do que tinham feito.
— Foi só uma festa! — Sarah rebateu, revirando os olhos, mas sua defesa parecia frágil.
— Você convidou todo mundo, menos eu! E depois você disse pra todo mundo que a polícia apareceu por minha causa! — Kiara continuou, a indignação crescente em sua voz.
— Certo, mas quem mais teria chamado a polícia? — Mackenzell interveio, como se a culpa fosse evidente.
— Você nunca perguntou! — Kiara deu de ombros, tentando se defender. — Você sequer tentou falar comigo. Só presumiram que fui eu. Nossa, você é tão hipócrita, Mackenzell. — A raiva e a frustração a consumiram, e ela sentiu seu rosto arder, a náusea subindo enquanto percebia que estava lutando uma batalha sozinha, contra as duas que sempre estiveram juntas. — Foi você que foi atrás de mim. Você quem pediu pra ser minha amiga de novo e então fugiu como sempre! Eu não pedi pra você ir se desculpar.
— Espera, você pediu desculpas para ela? — Sarah disse, arqueando a sobrancelha e observando Kenzell com uma mistura de incredulidade e raiva.
— Você não devia ter desconvidado ela do nada. O que queria que eu fizesse? Nós éramos amigas! — Mackenzell se defendeu, percebendo que a atenção estava de volta sobre ela.
— Essa não é a questão! É só que... vocês me abandonaram! E eu nem sei o porquê... É sério, Sarah! O que foi que eu fiz? — A vulnerabilidade de Kiara era palpável, a tristeza estampada em seu rosto.
Sarah balançou a cabeça em negação, engolindo em seco, sabendo que a sinceridade era a única opção. — Você gostava de mim. Ela tirou o cabelo do rosto, que o vento insistia em bagunçar.
— O que? — Kiara questionou, cerrando as sobrancelhas em confusão.
— Quando as pessoas se aproximam demais, eu me sinto encurralada, então eu fujo. Sarah explicou, sentindo as lágrimas se acumularem em seus olhos. — E culpo elas por isso.
— Mas e a Mackenzell? — Kiara semi-sussurrou, a dor em sua voz trêmula evidente. — Por que eu?
— Porque ela... — Sarah começou, encarando Mackenzell, que a olhava com ternura. O vínculo entre elas era inquebrável; conheciam-se desde a infância, e Sarah sabia que, independentemente do que mostrasse, Mackenzell sempre estaria ao seu lado. — Porque ela já viu quem eu sou e escolheu ficar comigo. Ela escolheu ser minha amiga no instante que nos conheceremos na pré escola. — As palavras saíram acompanhadas de um fungar, e um sorriso tímido surgiu entre elas.
— Isso torna ela seu cachorrinho. — Kiara disse, exasperada, em um desabafo que misturava dor e humor.
— Pode ser que sim. — Sarah reconheceu, lembrando-se de momentos em que, na verdade, controlava Mackenzell, como quando a afastou de Kiara. Sabia que não era certo, mas agora se sentia culpada por isso. — Eu sinto muito mesmo. — A sinceridade do momento a fez chorar ao olhar para as duas. — Eu não devia ter feito você parar de falar com Kiara só porque eu estava assustada.
— Tudo bem... — Kenzell respondeu, segurando as lágrimas, embora seu coração estivesse apertado. Ela sempre se esforçou para ser forte, mas as emoções a desafiavam.
Percebeu que, ao longo da vida, permitiu que outras pessoas a controlassem, mesmo que tentasse esconder isso. Rafe fazia aquilo. Seu pai fazia aquilo. Mason fazia aquilo. Agora, entendia que também deixara Sarah fazer o mesmo.
— E eu sinto saudade. — Sarah confessou, desviando o olhar. — Acha que tem alguma chance de ficarmos bem de novo? — Ela se voltou para Kiara, esperando por uma resposta.
— Sinceramente? — Kiara fechou os olhos por um momento, como se quisesse se concentrar. — Eu não sei.
— O meu pai descobriu sobre mim e o JJ no verão passado. — Mackenzell finalmente teve coragem de dizer isso em voz alta, como se finalmente se sentisse segura com as duas. — Eu não fui embora porque tinha uma bolsa ou porque queria que esquecessem que eu estava andando com os Pogues.
— O quê? Mas você disse... — Kiara começou, mas Mackenzell a interrompeu.
— Ele ficou paranoico e começou a dizer que havia chance de eu estar grávida. — Ela fungou e balançou a cabeça em negação, como se a ideia fosse absurda. — Então ele fez com que eu e Ambrie fôssemos morar com Mason na faculdade. Ele disse que não éramos mais problema dele, se fôssemos... Você sabe.
— Ell... — Sarah disse, colocando a mão sobre a coxa da amiga. — Por que você não me disse na época? Você devia...
— Não teria jeito. O meu pai é assim. Quando coloca algo na cabeça, ele não muda de ideia. Então, eu só... fui embora. — A tristeza na voz de Mackenzell ecoou.
Ela encarou Kiara, que parecia processar tudo. Kiara deu alguns passos à frente no convés e se sentou de frente para Mackenzell, a determinação em seus olhos.
— Então, quando eu pedi desculpas depois da festa, Kie, ou quando eu fiquei com o JJ — ela disse revirando os olhos como se aquilo tivesse sido à séculos — Eu não estava sendo uma vadia, Eu só... Eu te prometo que estava sendo sincera. Eu não aguentava mais ter que fingir ser quem eu não era e você era tão boa nisso... — A vulnerabilidade de Sarah era palpável.
— Nisso o quê? — Kiara questionou, encarando-a.
— Em ser você.
De repente, as três garotas se abraçaram. Sem mais desculpas ou lágrimas, apenas um abraço silencioso que representava o último pedido de desculpas entre elas, dando fim àquela guerra que as separava.
— Ei, Sarah. — Kiara disse, uma última vez, quando as três se deitaram no convés com sacos de dormir, percebendo que passariam a noite ali.
— Ei, Kiara. — Sarah respondeu, na mesma cadência.
— Promete pra mim que não vai fugir do John B. Ele não é só mais um cara, e ele gosta muito de você.
Relutante, mas decidida, Sarah finalmente cedeu. — Não vou.
— Me promete? — Kiara perguntou, virando-se na direção dela. Mackenzell, deitada atrás de Sarah, ouvia tudo em silêncio, perdida em seus pensamentos sobre como seria viver livre com elas. Se aquela pergunta fosse feita a ela, sobre o JJ...
Merda, o JJ. Ela sempre terminava o dia pensando nele.
Mas não podia, porque Rafe estava em algum lugar daquela ilha, cheirando cocaína e pensando nela. Provavelmente ligando agora para seu telefone fora de área, já que ela se entregou a ele no fim das contas.
Ele era um namorado em potencial.
— E me desculpa por ter chamado a polícia. — Kiara disse, quebrando o silêncio.
As três começaram a rir alto ao ouvir a confissão de Kiara. — Sua piranha! — Sarah disse entre risos.
— Eu disse! Eu sabia, sua vaca. — Mackenzell também riu alto.
E assim, continuaram rindo sem parar, até que finalmente adormeceram, confortadas pela presença uma da outra.
______________
13.335 palavras
TREZE MIL cês tão ligadas nisso?
Espero que gostem. (vocês TEM a obrigação de gostar)
Se n tiver comentários eu nnc mais posto. (Drama Queen)
Boa noite (ou bom dia) pq são quase cinco da manhã.
Pf ignorem os erros meu corretor automático erra os nomes sempre.
Bj bj
Back.💋
Comentem!
Em todos os parágrafos de preferência.
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