12. O segundo que mudou tudo.
Quando abre o olhos outra vez, não é para se encontrar ainda caída no meio da destruição. Não. Jules desperta em um lugar calmo, muito quieto, muito claro, e cheirando a alguma coisa que faz seu nariz pinicar.
A primeira coisa que ela realmente vê em sua confusão sonolenta, levando a mão ao rosto para esfregar os olhos embaçados, é o catéter intra-venoso em seu antebraço, não conectado a nada, mas ali em todo caso. Jules sabe o suficiente para perceber que não precisou de uma transfusão de sangue, talvez nem mesmo soro fisiológico.
Ainda assim, considerando que a dor enfim parece suportável, é óbvio que ela foi bem dopada com todos os tipos de analgésicos possíveis. E graças a Deus por isso.
Ela olha por um tempo ao redor, tentando reconhecer o lugar, ou qualquer coisa nele, fitando as grandes janelas com vista para a cidade, e esperando. Apenas esperando. Não há um botão para chamar os enfermeiros e, depois de longos minutos, ninguém aparece para checá-la.
Claro, ela não é um paciente de risco que precisa de verificação constante, mas ainda seria legal ter algumas respostas.
Por exemplo, onde estavam seus amigos?
Onde exatamente ela estava?
Jules rola e se contorce um pouco na cama, e é quando seus olhos se deparam com algo em uma mesa de cabeceira. Um controle remoto. Ao menos eles se preocuparam se ela ficaria entediada, soa meio engraçado até.
Jules o alcança, torcendo o rosto em uma careta pela pontada de dor que atingiu seu lado, e rapidamente voltando a abaixar o braço. Sua dor, felizmente, não foi em vão, e ela aponta o controle para a televisão pendurada no canto do quarto, ligando-a na esperança de obter algumas respostas.
Isso não demora para acontecer. Pelo idioma na maioria da programação, ela conclui que ainda devia estar em Viena, ou ao menos na Áustria. Isso sanava uma de suas dúvidas.
Certo, ela ainda não tinha certeza de onde estavam seus amigos, mas podia apostar que, pelo contexto geral, ao menos alguns deles estavam em outros quartos nesse mesmo hospital.
E isso, na verdade, a deixava com um outro questionamento.
O que diabos aconteceu na conferência?
É óbvio que uma bomba os atingiu, isso nem é algo que precisa ser dito. Mas quem, como e por quê, são perguntas que precisam de respostas.
Talvez ela possa obter algumas quando finalmente sair dali.
Aborrecida, Jules volta a zapear pelos canais, até que algo chama sua atenção, um noticiário internacional.
Espera, aquilo era...?
— Uma bomba escondida num carro de reportagem destruiu o prédio da ONU em Viena. — Oh, ótimo, respostas. — Há mais de 70 feridos. Ao menos 12 mortos, incluindo o rei T'Chaka de Wakanda. — Jules ofegou, sentindo seu peito apertar de maneira dolorosa que não foi amenizada nem mesmo pela tonelada de remédios. Doze mortos. — Foi divulgado um vídeo do suspeito identificado como James Buchanan Barnes... — Ela não escutou mais nada depois disso, a respiração presa na garganta enquanto seus olhos congelaram na imagem estática da câmera de segurança que focava no rosto borrado do suspeito.
O suspeito de explodir uma bomba que matou doze pessoas e feriu setenta, incluindo ela.
James Barnes.
O controle escorrega pelos dedos trêmulos de Jules, deslizando pelos lençóis esticados e estalando no chão, provavelmente se partindo. Ela não encontrou forças para se importar com isso, não quando parecia haver uma pata de elefante pressionando seu peito.
Um elefante inteiro.
Exalando com força, ela entrou em pânico ao percebe que não parecia haver oxigênio suficiente na sala, ou no mundo. Puxando o ar repetida e desesperadamente, seu peito apenas doía mais e mais, queimando em esforço.
Jules não conseguia respirar.
Ela achava que ia morrer, sentia como se fosse. Nunca sentiu tanto pânico em toda a vida.
Pareceram levar horas até que ela conseguisse chutar os cobertores com força e se empurrar para fora da cama, cambaleando no caminho até a porta e se atrapalhando com a maçaneta. As luzes pareciam fortes demais, tão brilhantes que ardiam seus olhos, e ela praticamente tropeçou no corredor, se apoiando na parede com as mãos, e desabando sobre os joelhos trêmulos.
— Ajuda... — Ela diz, ou acha que diz, entre os ofegos rápidos e entrecortados. Há um borrão se movendo ao seu redor, mas tudo parece muito branco e lento, então ela fecha os olhos. — Respirar... não consigo... — Falar exige um fôlego que ela não possui agora, e seu peito dói outra vez.
Ela sente, sem conseguir ver, o toque frio de algumas mãos em seus braços. Talvez estejam a levantando do chão. Ela já não sabe, não consegue sentir nada além da falta de ar consumindo seu cérebro. Até mesmo pensar se tornou difícil.
Ela tem certeza que estão lhe dizendo alguma coisa, consegue escutar seu próprio nome sendo dito uma vez ou outra, mas as vozes parecem tão distantes e abafadas, como se de repente te ela fosse mergulhada em uma piscina.
Há uma picada repentina em seu braço direito, e uma ardência se espalhando rapidamente sob a pele. Ela não recua, não consegue. O incômodo desaparece tão rápido quanto veio, e então vem a dormência, seus membros parecendo derreter como geleia enquanto sua mente silencia aos poucos.
E o pânico se esvai, assim como sua consciência.
✦ . ・゚ .
Quando acorda outra vez, Jules já não está sozinha no quarto. Ela fica em silêncio um bom período de tempo, apenas se acostumando com a sensação de despertar após ser sedada, e observa a figura de Scott meio sonolenta na poltrona ao lado de seu leito, assistindo a um desenho qualquer.
— Desde quando você fala alemão? — Ela pergunta lentamente, estranhando sua própria voz rouca e falha.
Scott pula, só então parecendo se lembrar da presença de Julieta no quarto, e então ele a está encarando, preocupação e alívio se mesclando em sua expressão.
Ele sorri um pouco.
— Não falo. — Ele admite. — Mas posso interpretar as imagens. — Jules não ri, e ele sabe imediatamente que há algo muito errado. — Ei, quer me contar o que aconteceu?
— O que aconteceu...? — Ela pergunta, o rosto franzido em uma confusão letárgica.
— Você teve uma crise de pânico, Jules. — Ele explica pacientemente. — Tiveram que sedar você. Eu estava lá, foi assustador.
Jules suspirou, os olhos voltados para o teto antes de fechar os olhos mais uma vez, apenas cansada demais.
Muito cansada.
— Onde estão Charles e Hank? — Ela pergunta, tanto para desviar do assunto, quanto para preencher as lacunas em sua mente.
Doze mortos. Ela tenta afastar esse pensamento, apertando a mandíbula e abrindo os olhos para focá-los em qualquer outra coisa.
— Charles está no fim do corredor, e Hank não se feriu tanto, então ele está no local com uma equipe, ajudando a amenizar os danos. — Scott responde, e Jules solta uma respiração que não sabia estar segurando. — O Professor ouviu sua mente quando você começou a entrar em pânico, ele está preocupado.
— Ele deve estar ouvindo agora, então já sabe que eu estou bem. — Jules comenta com humor, e Scott sorri afetado.
— E você está? — Scott questiona. — De verdade?
— Scott...
— Não, Jules, é sério. — Ele a interrompe, a voz áspera não deixando espaço para discussão. — Nós conhecemos há mais de uma década, e nada do tipo nunca aconteceu.
— Uma bomba explodiu no meu rosto. — Ela justifica, percebendo tarde demais que seu argumento era bastante fraco. Já aconteceram coisas muito piores que uma explosão, e mesmo assim ela nunca teve um ataque como esse, nem mesmo parecido. — Acho que posso ser perdoada por entrar em pânico depois do que aconteceu. — Conclui, esperando que isso torne sua explicação mais plausível.
— E o quê aconteceu? — Scott pergunta teimosamente. — Porque não pode esperar que eu acredite ter sido só isso.
— Muitas pessoas não chamariam um bomba literal de "só isso". — Ela faz aspas com as mãos.
— Pare de tentar me enrolar, Fawley.
— Mas que droga, Scott! — Jules esbraveja, jogando a cabeça para trás contra o travesseiro e suspirando pesado. — Eu não posso dizer. — Ela declara, a voz baixa e falha, evitando o olhar de seu amigo enquanto sente seus olhos se humedecendo bem rápido.
— O quê? — Ele está chocado, e não é para menos. Havia pouquíssima coisa, talvez nenhuma, que não soubessem um sobre o outro. — Por que não, Jules?
Scott está com raiva, obviamente, mas não direcionada à ela. É apenas um terreno novo pra ele, ter uma de suas melhores amigas em uma situação ruim e não saber o porquê, não ter ideia de como ajudá-la. Ele odeia não saber.
— Por favor, Scott. — Ela implora, apenas piscando para afastar as lágrimas, ainda olhando para qualquer coisa menos ele. — Eu só não posso.
— Isso é uma grande besteira. — Ele grunhe para si mesmo. — E se acontecer de novo? E se, da próxima vez que acontecer, for ainda pior?
— Não vai acontecer. — Jules afirma.
— E como você tem tanta certeza? — Scott joga as mãos para o alto, soando profundamente frustrado. — Caramba, Jules, me ajuda a te ajudar!
— Se quer ajudar, então nos tire daqui. — Ela dispara, impaciente.
Scott pisca, repentinamente confuso.
— O que? — Jules suspira, olhando trocando olhares entre Scott e a porta do quarto, esperando que ele entendesse. — Quer que eu te ajude a fugir do hospital? Você que acabou de insinuar que teve uma crise de pânico devido a estresse pós-traumático? — Ele soa incrédulo, olhando-a como se tivesse crescido uma segunda cabeça. — E acha que eu vou concordar com isso depois de ter te visto ser sedada há poucas horas?
— Eu menti, tá legal? — Ela praticamente rosna, aborrecida com sua falação desenfreada. — Era isso que queria ouvir? Eu não entrei em pânico por causa da explosão... tecnicamente não.
Scott cruza os braços, sorrindo arrogantemente como se ter razão fosse seu único objetivo de vida.
— Então...?
— Então que isso não muda o fato de que não posso dizer. — Ela repete, enfatizando as últimas três palavras como quem fala com uma criança teimosa. Scott bufa. — Mas ainda precisamos sair daqui.
— Pra ir pra onde, mulher abençoada? — Jules percebe que Scott parece prestes a entrar em colapso nervoso, observando a veia proeminente em sua testa. — Você está internada em um hospital, e não encarcerada em uma prisão de segurança máxima. Que desespero é esse pra sair?
— Temos que voltar pro Instituto. — Ela explica pacientemente, sentindo pena de causar tanto estresse em seu amigo.
— Eu vou perguntar "por que?" só mais uma vez, e espero que dessa vez você responda honestamente. — Scott murmura, olhando-a como quem olha uma criança que derrubou a árvore de Natal em cima da avó.
No entanto, não é Jules quem responde. A voz de Charles ecoa nas mentes de Jules e Scott.
— Porque preciso usar o Cérebro pra encontrar alguém.
Jules suspira, mas não pode deixar de sorrir suavemente. É óbvio que Charles já havia vasculhado cada canto de sua mente à essa altura, e provavelmente sabia cada detalhe de seus próximos planos. Leitor de mentes irritante.
Ela fica feliz por saber que não precisaria convencê-lo, que ele a conhecia o suficiente para confiar em seu julgamento.
— Está falando sério, Professor? — Scott questiona com certa descrença. — E isso é tão urgente que não pode esperar até vocês se recuperarem?
— Não, não pode. — Jules responde rapidamente, ignorando o rosto de suspeita que Scott faz pra ela.
— E posso ao menos saber quem vamos procurar? — Ele pergunta lentamente.
Em silêncio, Jules contempla as consequência de contar a Scott o que está prestes a fazer, calculando as inúmeras hipóteses de isso acabar mal. Aquele é seu amigo, parte da sua equipe, alguém em quem ela confia sua vida, e quem também confia a própria vida em suas mãos.
Ela faz uma escolha.
— O Soldado Invernal. — É sua resposta que tem Scott completamente pasmo, o queixo caindo lentamente enquanto contempla se tudo não é apenas uma piada.
— Mas que p...
✦ . ・゚ .
Olá, pessoas.
Passando só pra dizer algumas coisinhas que acho pertinente explicar pra vocês.
A primeira é que, à partir daqui, a história já se afasta bastante do cânone (se já não estava antes), e segue um enredo próprio que eu tirei dos meus devaneios antes de dormir. E nem é piada.
Todo mundo sabe que à essa altura nos filmes o Bucky seria encontrado pelo Steve e levado sob custódia, onde conheceria o Zemo, seria ativado outra vez e etc (insira aqui toda a pataquada que foi Guerra Civil). No entanto, como o próprio título desse capítulo diz "o segundo que mudou tudo" é exatamente sobre a decisão da Jules em ir atrás de sua alma-gêmea, atitude essa que vai dar uma direção totalmente diferente pra toda essa situação.
Sim, eu estou mexendo na burrada que foi esse roteiro. Não, eu não me arrependo.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top