27 | Isabel
"Eu não me importo se doer,
eu quero ter o controle.
Eu quero um corpo perfeito,
eu quero uma alma perfeita."
——————
Merliah
TALVEZ SEJA NORMAL SENTIR DOR. Dor física, como se eu sangrasse lentamente e a cada segundo chegasse mais perto da morte. Meus órgãos pareciam funcionar de uma maneira estranha, minha cabeça doía e eu me sentia fraca. Eu sei que parte disso é porque não consigo comer, só bebo água. E não bebo água por vontade e sim pra tirar o gosto de sangue que se impregnou em minha boca.
Eu mordia constantemente minha bochecha numa tentativa de abafar o barulho do meu choro. Infelizmente não consigo estrangular os gritos que me assolavam enquanto eu dormia. O pior é que não tinha horror a nada anormal, somente a mim.
Hans fingia muito bem que não escutava nada, talvez tentando parecer gentil. Ele fingia muita coisa, entre elas se importar comigo. Se ele se importasse faria alguma coisa, não faria?
Faz quase dois dias que senti o sangue de Calvin escorrendo por minhas mãos. A textura ainda estava presa na minha mente, o calor. Me sentia enganada e usada ao mesmo tempo em que me sentia uma mentirosa, manipuladora. Não devia me sentir assim, certo? Fiz a única escolha com a qual eu podia viver, fiz aquilo por amor.
Você fez isso por amor, Merliah. Você fez isso por amor, por amor.
Repeti isso a mim mesma por horas mas não melhorou minha situação, isso não apagava o que eu fiz. Eu matei ele e isso me torna uma pessoa horrível porque a verdade é que eu matei Calvin por egoísmo. Pensando no melhor pra mim e o melhor pra mim é que Seth ficasse vivo.
Coisa que ele está.
Porque tudo não passou de uma mentira. Porque é fácil manipular à mim.
Isabel queria que eu me sentisse um monstro e eu me sentia. A pior espécie de monstro, aquele traiçoeiro e egoísta que espera o momento certo para atacar.
Afinal não foi só isso que eu fiz a minha vida toda? Aticei meu irmão até que ele explodisse em forma de lobo, humilhei meu pai por ter me mandado para morar com minhas irmãs, joguei com James até que ele me pedisse em namoro e então o trai, o trai com o cara que eu tratei mal e jurei a mim mesma que nunca cederia.
Acho que tudo que eu sei fazer é destruir quem está perto de mim, já era de se esperar que eu acabasse dessa maneira. Não quero uma alma mais, os Deuses podem levar a minha e fazerem o que bem entender.
Meus olhos se ajustam a luz a medida que a porta é aberta. Consigo ver os cachos do cabelo de Hans se aproximando e então seu rosto bonito. Ele se agacha na minha frente, seu cheiro doce e enjoativo vindo até mim.
— Vamos pra Forks agora, certo? — ele diz, buscando o meu olhar.
Quando encaro suas íris cor de carmim lembro do sangue de Calvin escorrendo por seu peito. Engulo a seco e desvio os olhos.
— Certo — consigo concordar. — Obrigada.
Fecho meus olhos tentando ignora-lo e rezando para que ele vá embora. Queria ir pra casa... Talvez eu morresse também mas isso não importava muito agora. Queria sair desse lugar com cheiro de mofo, isso seria suficiente por um tempo.
— Merliah, eu sinto muito — Hans diz me fazendo lembrar que ele estava lá.
Não, você não sente — tenho vontade de dizer mas não o faço. Não queria perder minhas palavras descontando meu ódio pra cima dos outros. Não iria mais discutir nada, podiam fazer o quem bem entendessem comigo.
— Isso não importa de verdade, no final dá tudo no mesmo — consigo responder.
— É, eu sei.
Abro meus olhos e o encontro ainda parado no mesmo lugar.
— Por que você fica aqui?
Minha pergunta parece te-lo pegado desprevenido, sua expressão fica pensativa por alguns segundos.
— Eu não tenho mais nenhum lugar pra ir. Não gosto de ficar sozinho, não quero uma eternidade só tendo a mim mesmo como companhia.
Isso na verdade é tão normal e trivial que me surpreendeu. Era só isso, simples. Hans não queria ficar sozinho, queria uma companhia. Eu conseguia entender isso, nesses últimos dias tudo o que eu queria era alguém pra conversar.
Mas alguém que não tivesse olhos vermelhos.
— Eu entendo — murmuro em resposta, virando o rosto.
— Isso não anula o fato de eu sentir muito — ele acrescenta. — Gosto de Isabel, gosto de verdade, mas acho que ela usa seu poder da forma errada.
Ele só acha? Sério?
— Acha que ela vai matar alguém?
Hans assente.
— Acho que se ela não tiver a Alex ela vai
matar sim.
— E sobre o Elijah?
— Elijah estava com Isabel há séculos, ela o amava, mas ele nunca foi a prioridade dela. Eu esperava que fosse. Esperava que ela se revoltasse e desejasse mais do que tudo matar aquele lobo, o seu lobo, mas depois daquilo a sede de vingança por Alex ter a abandonado apenas ficou maior. Ela não é uma pessoa ruim, ela só não vê motivos para ser boa, Isabel já sofreu muito.
Uma risada escapa da minha boca, uma risada de verdadeiro humor. Ela sofreu muito, foi abandonada pela Alex e é por isso que fazia da vida dos outros um inferno. Hans devia mesmo gostar dela para conseguir arrumar argumentos em sua defesa.
— Cara, eu queria um amigo como você — praguejo, encarando as frestas da minha janela.
Ela dá uma risada nasalada.
— Acho que amor é isso, certo senhorita? Reconhecer os erros de quem ama, mostrar o caminho certo e torcer pela mudança porque é simplesmente impossível somente deixar de amar.
Eu esperava que isso fosse verdade, a parte de ser impossível deixar de amar.
— Acha que meu namorado vai me perdoar por matar aquele homem inocente? — pergunto.
Era essa a pergunta que eu queria fazer há tempos, essa pergunta que eu faria ao meu irmão se estivesse com ele. Sentia falta do Jacob, muita falta mesmo, a pior parte de morar em Nova York foi não vê-lo. Sempre fomos próximos e ver sua vida sendo ameaçada despedaçava meu coração, eu queria ser forte e poder fazer algo pra impedir tanto sofrimento.
Mas eu só sou humana.
— Acho que ele não precisa te perdoar, acho que você precisa se perdoar — começa Hans, me fazendo sair de meus devaneios inúteis. — Você fez o que achava certo, fez o possível para proteger quem ama. Você escolheu a alternativa com a qual seria mais fácil viver. Eu também fiz essa escolha. Minha irmã estava morrendo num surto de gripe em 1839, eu sabia o que Isabel era e pedi a ela para que a salvasse. Então eu percebi que ela viveria pra sempre e eu não, e eu não ia conseguir continuar a minha vida sabendo disso. Foi quando pedi à Isabel para me transformar.
— E onde está sua irmã? — pergunto mesmo já imaginando a resposta.
— Ela morreu à um século — responde, desviando o olhar e se afastando um pouco. — Para mim, para muitos aqui, viver desse jeito é o único jeito que sabemos viver.
— Nunca pensou em ter uma família?
Ele descarta a alternativa com um chacoalhar de cabeça.
— Seres como eu não tem família.
Essa afirmativa me lembra de uma coisa.
— E o bebê?
Hans demora alguns segundos para me dar uma resposta.
— Bebê? — repete. Bem, não era exatamente uma resposta mas servia.
— É, o bebê. Eu ouvi ele.
— Não tem nenhum bebê — mente. E ela sabe que eu sei que ele está mentindo. Sua expressão perfeita de pedra conseguia esconder muitas coisas mas não isso.
— Você está mentindo pra mim — minha voz fica afiada, amargurada.
Hans se aproxima e me encara com seus olhos vermelhos.
— O que levaria um de nós a querer ter um bebê? — pergunta, erguendo sua sobrancelha.
Cruzo os braços.
— Eu não sei, tá bom? Só não me trate como se eu fosse idiota Hans.
Hans sorri e dá de ombros.
— Nunca achei que você fosse idiota.
A viagem foi longa mas tranquila e não procurei guardar algum detalhe de onde estava. Agora me encontrava sentada no chão da floresta, um cabana destruída estava atrás de mim e pra qualquer lugar que eu olhava via um par de olhos vermelhos me encarando.
Eram muitos, muitos mesmo.
Alguns deles rapidamente se espalham, indo pra longe de nós. Percebo pela expressão deles que sentiam dor e isso provavelmente é por conta do meu sangue. Eles deviam estar proibidos de me atacar e algo me dizia que essa proibição os deixavam irados.
Mas pouco me importava, estava grata no momento por não dar fim a minha vida como janta de vampiro.
— O que eu devia fazer agora? — pergunto, cruzando meus braços. As íris de Isabel estavam bem escuras, quase pretas. — Tem mais alguém pra eu matar já que você e seu incrível corpo sobrenatural parece não ser o suficiente?
As palavras queimam minha língua e a indiferença com que as digo me faz mal mas simplesmente não consigo evitar. Não queria demonstrar fraqueza na frente dela, pouco me importava que todos tenham me ouvido chorar e berrar nos últimos dois dias, Isabel não veria mais lágrimas em meus olhos.
— Continue falando assim e faço você matar um de seus amigos — ela rebate, desviando os olhos de mim.
Foi o suficiente para me fazer ficar quieta. Eu já fiz o bastante e ela também.
Observo Hans com um grupo de vampiros que pareciam ouvir com atenção o que ele dizia. Algo no modo como todos aqui se comportavam me fazia acreditar que ele e Benny estavam logo abaixo de Isabel na questão do comando, os vampiros pareciam gostar muito dele e respeitá-lo também. As vezes parecia que gostavam mais deles do que de Isabel.
— Qual é o plano? — um deles pergunta.
Isabel não se dá ao trabalho de participar da conversa e deixa Hans lidar com todo o grupo. Seu olhar estava fixo no telefone celular em suas mãos no qual ela digitava mensagens com uma rapidez incrível, sua testa estava franzida e ela parecia preocupada.
Queria saber com o que.
— Estão procurando ela então logo logo vão nos encontrar, foi aqui que eu deixei o bilhete, devem estar por perto — é Benny quem responde.
Então quer dizer que deixaram um bilhete e tudo isso aqui deveria ser um tipo de armadilha. É óbvio que eles viriam, pelo visto não tiveram nenhuma pista desde que sumi e Jacob não deixaria escapar uma oportunidade como essa.
Eles viriam, com cuidado mas viriam. E as coisas podiam não acabar bem.
Não sabia quais eram os planos de Isabel, quais as ordens que ela havia dado ao seu grupo mas sabia que as chances de que eu fosse dormir feliz hoje à noite eram nulas.
— Então o nosso plano é esperar? — uma mulher de cabeça raspada pergunta.
— Bom, se você quiser ser a porta voz fique à vontade, talvez eles não arranquem sua cabeça — Benny retruca me arrancando um sorriso.
A expressão da vampira careca se torna irada mas ela se controla muito bem.
— Tanto faz — praticamente rosna e dá de ombros, pulando no topo da árvore.
Em algum momento no final da tarde uma vampira asiática vem até mim e com a ordem de Isabel me leva para longe, mais cinco vampiros vão conosco entre eles uma tal de Judith que recebia as ordens diretas.
Eu achei que me matariam mas não mataram.
Me deram água e se sentaram em volta de mim com um rádio ligado em mãos. Nem olhavam na minha direção, era como se eu não existisse e isso me dava um pouco de conforto. Seria tudo mais fácil se eu fosse realmente invisível.
A nossa calmaria acaba quando a noite chega e finalmente o rádio transmite alguma coisa. A mão da tal Judith tapa minha boca quando a voz de Isabel invade meus ouvidos.
— Olá — consigo ouvi-la dizer.
— Olá Isabel, você fugiu bem rápido da última vez, ficou com medo?
O sentimento que me assola assim que ouço a resposta de Alex é indescritível. É um alívio tremendo saber que ela estava bem, que eu estava perto de todos eles. Eu sei que tudo podia dar errado em breve mas me confortei com a possibilidade de vê-los por alguns segundos.
— De vocês? — Isabel ironiza.
Acho que ela não tinha medo deles na verdade, acho que ela tinha medo do sentimento que tomava conta dela toda vez que ela via Alex. Medo do amor e o ódio que vinha junto dele.
— Ou talvez de pegar uma gripe — rebate Alex.
A mão de Judith continua firme contra a minha boca me impossibilitando de rir.
— Seu senso de humor continua terrível Alex.
Não há uma resposta pra isso. Somente ouço um farfalhar de folhas e alguns grunhidos distantes. Eu sabia que eram os lobos e temia pela segurança deles ainda mais do que temia pela minha.
— Onde está ela? — ouço Alex perguntar.
Meu coração começa a bater mais rápido, conseguia ouvi-lo soar em meus ouvidos.
— Como tem tanta certeza que ela está viva? O cheiro que eu usei pode ser de uma roupa...
— Porque ela é o único jeito de você alcançar a mim. Vamos parar logo com essa conversinha e ir direto ao ponto.
Há uma longa pausa até Isabel falar:
— Hans.
Não entendo seu comando até Hans — depois de alguns poucos minutos — aparecer bem na minha frente. Ele sussurra um "senhorita" como cumprimento e pede autorização com seus olhos para me colocar em suas costas. Eu sentia a súplica em seu olhar, ele tinha que fazer isso de qualquer maneira e queria que eu facilitasse pra ele. Eu facilitei, é claro.
Se fosse pra morrer que eu pelo menos veja o rosto de quem eu amo uma última vez.
Enquanto Hans corre comigo em suas costas eu mantenho meus olhos fechados e penso em meu pai. Como será que ele está? Será que surtou quando eu sumi? Ele já estava velho, as coisas podiam ir mal. Estranho como você se esquece dos problemas normais quando se mete com seres sobrenaturais.
Antes que pudesse finalizar meus pensamentos sou colocada no chão e uma sensação de enjoo me atinge. Hans me segura pelo braço com seus dedos gelados, me firmando para que eu não caia. Levanto minha cabeça para tentar enxergar algo a minha frente.
Conseguia ver eles, a pelo menos trinta metros a frente. Os Cullen, as matilhas. Identifico os olhos tanto de Seth quanto de Jacob me encarando, o ódio estampado em seus dentes. Tudo repuxado em uma careta animalesca. Eles eram poucos comparados a quantidade que Isabel tem, seria literalmente um massacre.
— Eles machucaram você? — Alex pergunta, chamando minha atenção pra ela.
Balanço a cabeça. Ela assente pra mim e solta um suspiro em seguida, dando alguns passos pra frente. Percebo como Leah fica tensa.
— Tudo bem, vamos fazer o seguinte, você libera ela e eu volto com você — sugere Alex.
Hans desvia o olhar como se soubesse o que viria a seguir.
— Você voltaria comigo?
— Sim.
— E não tentaria fugir?
— Isso.
Vejo de soslaio Benny balançar a cabeça em afirmação. O que Alex dizia era verdade, pelo menos agora era verdade.
Não foi o suficiente.
— Acha que eu sou idiota?
— Eu te dou minha palavra que não irei embora — Alex insiste.
Há um segundo de silêncio até a risada de Isabel ecoar por toda a floresta. Uma risada de verdade, como se ela estivesse assistindo um show de humor, como se tudo isso fosse uma piada.
— Alex, todos nós aqui sabemos que suas palavras não tem muito valor.
— O que quer dizer com isso?
— Você disse que me amava — Isabel a lembra.
Reviro os olhos.
— E eu amava mas o amor acabou. Você pode me obrigar a fazer muita coisa mas não pode me obrigar a te amar.
Isabel assente, dando alguns passos pra frente.
— É verdade mas qual o intuito de ter você comigo se vai sumir novamente num piscar de olhos?
— Já disse que não vou fugir.
Ela revira os olhos e dá de ombros, olhando pra mim.
— Tanto faz — é o que ela responde.
Algo no seu tom de voz me faz arrepiar inteira. Hans percebe e tira sua mão gelada da minha pele.
— O que quer de mim? — Alex grita.
— Quero que você sofra, que nunca seja feliz! — Isabel grita de volta. — Seus amores estão destinados ao fracasso Alex, Lucy morreu, aquele revolucionário estúpido também.
— Nunca mais fale de Gervais assim!
— Ou o que?! Você não pode fazer nada! Mas eu posso e vou fazer o possível para seu outro amor fracassar. Eu já estava me entediando mesmo, você sabe como é complicado fugir por tanto tempo, precisamos de algo para nos animar.
— Você me dá nojo.
Consigo ver o sorriso que brota nos lábios de Isabel.
— Eu sei.
— Solte a Merliah! — é Carlisle que grita dessa vez.
— Ah não, não vou soltar ela — Isabel responde, olhando pra ele e então se vira novamente para Alex. — Meus problemas com você já tem uma solução mas ainda falta solucionar meus problemas com ele — ela aponta pra Seth e em seguida pra mim. — Minha amiguinha aqui fez um servicinho sujo só porque ama você, patético não? Mas não posso julga-la muito, eu também caí nessa ladainha.
— Solta ela, fazemos o que você quiser — Alex insiste, seu tom de voz chegando a súplica.
— Ele matou o Elijah e eu amava Elijah — Isabel continua.
As coisas pareciam girar agora, eu olhava cada um presente aqui mas não conseguia realmente vê-los.
Então foquei meus olhos em Seth. No seu pelo cor de areia, comprido e fofo como um pompom. Suas patas grandes e compridas, nos seus olhos escuros. E quando olhei pra ele vi o garoto que costumava ser, o cabelo tigelinha e as brincadeiras na chuva. Provocações infantis, músicas Quileutes e pipoca nos domingos. Os anos sem vê-lo. Todo o sentimento que me atingiu quando voltei a conviver com ele. O amor, o medo, a raiva mas principalmente a cumplicidade. Ele era minha pessoa, era minha metade. Foi como sentir a brisa do mar pela primeira vez, era refrescante, simples, perfeito. Um milhão de cabos de aço me conectavam à ele e seria pra sempre assim, até que meu coração pare de bater.
Sorrio pra ele sem exibir meus dentes. Um sorriso que dizia que tudo ficaria bem, não importando o rumo dessa conversa. Ele uiva.
— Você estava mais preocupada com sua vingança contra mim! — Alex rebate, seu tom de voz continuava alto. O dedo indicador apontava para o peito de Isabel com um tom acusatório.
— Ah droga, acho que você tem razão. Mas andei pensando e cheguei a uma conclusão: aquele cão matou Elijah e eu quero que ele sofra, eu quero que você sofra, quero que essa cadela fedida que você lambe todos os dias sofra.
"Apesar de achar que nada que eu fizer vai causar dor o suficiente, afinal eu queria que vocês queimassem no fundo do inferno por dias, posso começar por algo mais simples. Algo que cause culpa, remorso, que te faça pensar e refletir um pouco sobre o mal que você mesma causou a si e as pessoas que gosta. Há um velho provérbio que diz: a árvore quando está sendo cortada observa com tristeza que o cabo do machado é feito de madeira. Você é a árvore e eu sou o machado, você me fez assim, observe os frutos do seu trabalho."
Eu sabia o que viria a seguir e estava pronta pra isso. Acho que sempre soube que isso aconteceria mas mesmo assim não conseguia me arrepender de ter ido para aquela floresta, porque se o que eu fiz significou salvar a vida de Seth, foi uma coisa boa. E mesmo que os Deuses achem que eu não tenho mais alma, eu não me importo! Não quero uma alma sem ele.
Isabel se vira para nós, Hans já não estava mais ao meu lado.
— Se um deles se mover ataquem — ordena.
Ela não precisou dizer mais nada, consegui distinguir entre as formas de lobos meu irmão pulando em cima do primeiro vampiro que entrou no seu caminho. Mais rosnados vieram a seguir e senti a terra abaixo dos meus pés tremendo mas não me permiti olhar pra eles uma última vez.
Eu sabia o que aconteceria.
Isabel tinha muitos, mais do que eles ou eu podíamos imaginar e iriam os conter com facilidade. Meu destino já estava selado, esperava que os Deuses fossem generosos comigo. Esperava que numa outra vida eu pudesse voar como as borboletas.
As íris escuras de Isabel me encontram, suas mãos retesadas de uma maneira que a deixava animalesca.
— Você disse que não ia me matar — sussurro, ouvindo meu coração bater.
— Não. Eu disse que ele voltaria pra casa e bom... Ele está em casa.
Me sentia como um cervo na floresta encurralado por um caçador. E nessa hora meu caçador sorriu de um jeito simpático enquanto avançava para me matar.
Então, como um sinal, uma mensagem apita em seu celular e ela hesita por meio segundo. Mil pensamentos invadem minha mente e percebo do que havia sentido falta por todo esse tempo, lembro do choro manhoso de bebê que ouvi assim que Isabel me trancou naquela cabana. Me lembro do que ela disse:
Tinha um bebê lá, não vou destruir a infância de um pobre bebê.
As vezes você tem tudo o que mais queria e então tiram isso de você.
Hans também havia tentado ajudar, com aquelas palavras bonitas e metáforas. Talvez ele nem ao menos sabia o tipo de arma que havia me dado, talvez tenha sido na inocência...
Uma vez perguntei do que ela tinha medo e Hans não pensou muito antes de responder:
De uma situação em que ela não possa controlar.
Ela tem centenas de anos! Pode ter a vida que quiser, fazer tudo de diferente no mundo! O que era tão impossível assim pra ela se remoer tanto?
O que levaria um de nós a querer ter um bebê? — Hans perguntou.
Eu matei Calvin porque Isabel o queria morto e ele tinha uma filha bebê desaparecida, bebê como o que eu havia ouvido na cabana. Bebê que ela havia pegado e por isso desejava que ele morresse, para que pudesse ficar com ele pra sempre.
O que levaria um de nós a querer ter um bebê?
Ela tinha um bebê, Isabel tinha um bebê e tiraram isso dela. Alguma coisa aconteceu para que ela o perdesse e eu duvido que ela pelo menos não refletiria antes de fazer a mesma coisa com outra pessoa. Eu a vi mandando mensagens o dia inteiro, fazendo ligações, a testa enrugada da preocupação em todos esses momentos.
Nunca achei que você fosse idiota.
Então no meu último segundo eu me encolho e protejo com as mãos o meu bem mais precioso, minha barriga.
— Estou grávida — eu grito. Foi alto o suficiente para todos ouvirem.
E Isabel para, seus olhos escuros se arregalam e ela encara minhas mãos que tentavam de alguma maneira proteger minha barriga. Seus dedos relaxam e me pergunto se vampiros podiam entrar em choque, ela definitivamente parecia chocada. Seus lábios pareciam prestes a tremer, foi a expressão mais humana que eu já vi ela fazer.
Algo em mim dizia que ela choraria se pudesse e isso me faz sentir pena dessa pobre mãe que foi condenada à eternidade sem filhos.
Minha pena não durou muito, em poucos segundos vejo a cabeça dela cair no chão assim como seu corpo, ambos separados. O Cullen que mais parecia um lutador entra em cena e taca fogo no que um dia havia sido Isabel e então Seth se aproxima. Seus olhos queimavam mais do que as chamas na minha frente.
É nesse momento que a voz de Hans irrompe pela floresta:
— Já chega!
Oi gente! Ao longo do capítulo coloquei várias citações de Crepúsculo e citações de capítulos antigos dessa própria história. Ficou bem grande! Eu quis colocar muita coisa e me empolguei escrevendo, achei que seria mais envolvente não dividir ele então espero que não se incomodem.
Espero que tenham gostado, me digam o que vocês esperam do final <3
Vejo vocês no Domingo!
Música: Creep - Radiohead.
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