𝚝𝚑𝚒𝚛𝚝𝚢 𝚜𝚒𝚡

Satoru mal conseguia abrir os olhos por causa da dor de cabeça terrível. O fato de as cortinas não estarem completamente fechadas também não ajudava muito.

As lembranças da noite anterior começaram a invadir a mente dele uma de cada vez. Ele tinha se comportado como um belo de um idiota, mas não conseguia negar que estava minimamente feliz em ter conseguido a sua atenção de novo. Mesmo bêbado, ele tinha se desculpado com você por ter ido embora depois do sexo e, pelo menos antes de ir dormir, as coisas pareciam estar relativamente melhores entre vocês.

Ele também tentou esquecer o fato de que tinha lhe dito que não seria nada sem você. Ainda que aquilo fosse a mais pura verdade, só de pensar na declaração alcoolizado já o fazia querer se enterrar nos travesseiros e não levantar nunca mais.

Falando nisso, ele tateou devagar o seu lado da cama, até perceber que estava vazio. Finalmente ele tomou coragem de abrir os olhos e percebeu que você realmente não estava mais lá.

O coração dele já estava se apertando de novo, imaginando que nada tinha mudado na noite passada e vocês ainda estavam na estaca zero. Mas, foi quando ele olhou para a cabeceira dele que notou algo. Tinha uma cartela de analgésicos, um copo d'água cheio e um post it.

Mei Mei disse que tinham algumas coisas faltando na cozinha, então saí pra comprar. Ela veio mesmo sendo feriado, mas não deve fazer muita coisa. Então, se puder ir acordando Megumi, eu agradeceria.
Volto já já.

Você não precisava assinar para que ele reconhecesse a sua caligrafia. Era tão suave e afiada ao mesmo tempo. Parecia até com você.

O platinado fez um leve esforço para se levantar, mas, depois de se arrepender na mesma hora, desistiu e voltou a deitar. A cabeça dele estava prestes a explodir em uma ressaca que ele nunca teve antes. Resolveu tomar o analgésico primeiro, mas demoraria algum tempo até começar a fazer efeito e ele precisava acordar Megumi antes que você chegasse.

A relação de vocês já estava mal demais. Ele precisava, no mínimo, fazer o que você pediu e acordar o filho de vocês.

Mas, como se o universo estivesse do lado dele naquela manhã, uma batida suave o tirou dos próprios pensamentos.

— Entra, filho — Ele disse, sem nem precisar perguntar quem era porque já reconhecia aquelas batidas muito bem.

A porta se abriu devagar, relevando um serzinho muito pequeno de cabelos negros e um pijama amarelo chamativo. Megumi estava com tanta cara de sono que mal conseguia manter os olhos abertos, enquanto entrava no quarto e fechava a porta atrás de si. Tudo isso ao mesmo tempo em que segurava um bichinho de pelúcia nas mãos.

Satoru não conseguiu não rir antes de se sentar e ajudar o mais novo a subir na cama, o colocando ao lado dele, no seu canto do colchão. Megumi deitou a cabeça no seu travesseiro e tentava manter os olhos abertos, mas essa era uma luta que ele estava perdendo.

— Cadê a mamãe?

— Ela saiu pra comprar umas coisas no mercado e já já volta — Satoru respondeu, enquanto fazia um carinho leve nos cabelos negros do filho, que estava quase adormecendo de novo.

— Você não ficou em casa ontem.

O coração do Gojo se apertou com força. Ele sabia que esses problemas envolvendo o relacionamento de vocês acabava afetando muito o mais novo. E, mesmo assim, ele foi covarde no dia anterior e fugiu de casa para se embriagar. Era exatamente esse tipo de comportamento que fazia ele ter certeza de que seria um péssimo pai e um dos motivos para ele nunca ter adotado Megumi antes dessa missão começar.

— Me desculpa — Ele teve que suspirar antes de continuar a falar — Eu tive uma conversa com sua mãe que não foi nada legal, então eu tive que sair pra respirar um pouco.

— Vocês ainda tão mal?

— Na verdade, estamos melhor do que antes — Pelo menos ele esperava que isso fosse verdade.

— Ela resolveu ficar com a gente?

— Não vai dar — Era engraçado ele estar conversando sobre algo tão adulto e pessoal com uma criança, mas Megumi sempre foi diferente e bem mais maduro do que as crianças da idade dele. Ao mesmo tempo, era triste pensar que ele não conseguiria amenizar as coisas para o mais novo, porque seria muito difícil enganar ele — A agência não vai deixar ela em paz depois que a missão acabar.

— Ela vai fugir de novo — Aquilo não foi uma pergunta e os olhos de Megumi já estavam tão abertos quanto de costume.

— É — Foi só o que Satoru conseguiu responder.

— E se a gente for com ela?

— [Nome] tem seus motivos pra não querer que a gente vá com ela. A vida de um foragido não é nada fácil e você é só uma criança. Ela não quer que a gente abra mão das nossas vidas por causa dela.

— Mas eu não vou ser feliz sem ela — Os olhos azuis do platinado se arregalaram e se voltaram na direção do mais novo, que tinha os olhos úmidos, quase cedendo às lágrimas — Eu prefiro ficar com ela do que ter uma vida fácil e normal.

— É, eu também — Nem foi preciso muito esforço para Satoru chegar nessa conclusão.

Suguro estava certo no outro dia. Ele já tinha a resposta para esse grande problema. Não deixaria você ir sozinha. O Gojo e Megumi iriam com você, porque, não importa o quão difícil a vida de foragidos pudesse ser, nada seria mais difícil do que não ter mais você nas vidas deles.

— Então, está decidido — Satoru disse, firme — Vamos com ela.

— Certo! — O mais novo se animou tanto que até sentou na cama, mas, logo depois, ele ficou pensativo — Eu vou ter que trocar meu nome? Eu gosto de Megumi.

Isso arrancou uma risada divertida de Satoru, que pegou o mais novo e o colocou entre os seus braços, deitando-o seu novo.

— Pode ficar com o seu nome se quiser.

— Eba!

Eles passaram um tempo assim, abraçados, mas os dois estavam tão eufóricos que não conseguiram cochilar de novo. Minutos depois, o platinado mandou Megumi ir tomar banho. Queria que ele já estivesse pronto quando você chegasse, para eles contarem que tinham se decidido e que iriam com você, seja lá para onde você estivesse pensando em fugir.

Satoru também aproveitou para tomar um banho gelado e foi até a cozinha pegar algo para comer. A ressaca parecia uma brincadeira de criança comparado com a ansiedade de finalmente ter se decidido em não abrir mão de você.

Mas o humor dele foi para a casa do caralho quando sentiu uma mão feminina firme acariciando os ombros dele.

— Puta que pariu — Ele resmungou, irritado.

— O que foi? Você adorava isso — Mei Mei disse, com a voz maliciosa — Faz um tempo que a gente não faz nada divertido.

— E, se depender de mim, vamos continuar assim por muito mais tempo — Ele respondeu, se esquivando do toque dela e caminhando para longe.

— Eu fiquei quieta esse tempo todo — A mais velha falou, dessa vez irritada — Mas você não tá facilitando nada.

— Não tem o que facilitar ou não, Mei. Eu não quero mais ter nada com você — Satoru deu de ombros — É simples.

— Você vai mesmo jogar tudo o que a gente tinha fora por causa dela?

— Primeiro, a gente não tinha nada — Ele finalmente se virou para encarar ela — Segundo, mesmo se a gente fosse casado, eu teria te largado por causa dela.

Um sorriso ameaçador e pretensioso tomou conta dos lábios dela.

— Você não sabe o que a agência vai fazer com ela, não é?

— Prender e obrigar ela a fazer uns trabalhos forçados? Alguma coisa assim, não é? — Os olhos dela se arregalaram — Pois é, tô sabendo dessa brincadeira.

— Se você sabe, por que não desiste logo?

— Porque eu amo aquela mulher, Mei — A forma como era fácil falar em voz alta que amava você até o assustou um pouco — Você me conhece. Eu nunca me senti assim por ninguém antes e, agora que eu finalmente achei uma pessoa que eu não consigo imaginar minha vida sem, não vou abrir mão dela, nem que eu precise ir pra porra do inferno por ela.

— Eles vão matar você.

— Essa ideia parece muito mais atraente do que passar o resto da minha vida sem ela.

Satoru nunca tinha sido tão sincero na vida e Mei Mei sabia disso. A confissão a deixou sem palavras. Ela, que passou muitos anos tentando ser alguém importante na vida daquele homem, não conseguia imaginar como ele tinha se apaixonado por alguém. Mei, mais do que ninguém, sabia o quão frio e calculista o Gojo era. Só a ideia de ele colocar toda a vida em risco por causa de outro ser humano não entrava na cabeça dela.

O platinado aproveitou que ela não falou mais nada para dar a volta e andar em direção do quarto de Megumi, pondo um fim àquela conversa. Ele esperaria você voltar para casa e finamente vocês poderiam, juntos, elaborar um plano para fugirem.

Só que você tinha outro plano em mente. Sua mão estava congelada na maçaneta da porta principal, do lado de fora do apartamento. Estava voltando para casa com as compras quando começou a ouvir a conversa de Satoru com Mei Mei.

Você já sabia o que ele sentia por você. O Gojo nunca tentou esconder muito isso. Mas, depois da conversa que tiveram no dia anterior, achou que ele tinha largado essa ideia de seguir você. Seu coração doía com a ideia de abandonar ele e Megumi, mas a dor era muito maior quando você pensava em tudo o que eles teriam que abrir mão para fugir com você.

Sua mão tremia no mesmo lugar. O desespero já estava tomando conta dos seus pulmões e respirar havia se tornado uma tarefa muito difícil.

Sabia o que tinha que fazer, por mais que não quisesse. Queria entrar no apartamento para dar um beijo de bom dia em Megumi e falar para Satoru que o amava tanto quanto ele lhe amava.

Queria ter o seu próprio final feliz.

Mas isso era pedir demais.

Você afastou a mão da maçaneta. Deixou as sacolas com as compras no chão e pegou o elevador de novo. Sua cabeça estava uma confusão absurda enquanto andava pelas ruas da cidade.

Nunca tinha se sentido tão aflita em toda a sua vida. Geralmente você era bem certeira sobre o que faria, principalmente depois de passar anos praticando atos ilegais. Mas, naquele momento, sua razão lhe mandava para um lugar, enquanto o seu coração implorava para ir para outro.

Teve que respirar fundo algumas vezes para afastar as lágrimas que queriam muito cair dos seus olhos antes de entrar no bar.

— Seja bem vinda — Nanami falou, com a habitual cara de emburrado e zero simpatia.

Não tinham muitas pessoas no lugar. Claro. Não eram nem dez da manhã. Seria estranho se um bar estivesse lotado naquela hora. Na verdade, seria estranho um bar estar aberto em uma hora dessas, mas você sabia que a agência o mantinha aberto o máximo de tempo possível caso vocês precisassem fazer algum contato.

Você se sentou no balcão, como costumava fazer.

— Meio cedo pra uma cerveja, não? — O loiro brincou, mas não conseguiu arrancar um sorriso do seu rosto.

— Vodka com gelo e limão — Foi o que você respondeu, sem olhar na direção dele — E um papel e uma caneta.

Ele franziu as sobrancelhas, mas assentiu com a cabeça e foi preparar o seu pedido. Enquanto ele fazia sua bebida, você pensava a todo tempo que poderia simplesmente dar meia volta e ir embora, voltar para Satoru e para Megumi. Manter essa farsa por mais algum tempo. Mas você sabia que nenhum tempo seria o suficiente se não fosse a vida inteira. E isso você não podia ter.

— Como anda a missão? — Nanami perguntou, depois de colocar o copo na sua frente.

Você bebeu metade do líquido antes de responder, fazendo uma careta ao sentir o ardor do álcool descendo pela sua garganta.

— Não tenho muitas atualizações — Pela primeira vez desde que você chegou lá, olhou para ele. O loiro estava desconfiado e você não precisava ser treinada para saber disso. Você não o culpava. Tinha evitado aquele lugar desde sempre. Não gostava da companhia daquele homem e sabia que Nanami fazia de tudo para atrapalhar seu relacionamento com Satoru — O papel e a caneta.

— Vou trazer.

Ele saiu do seu campo de visão e você virou o resto da vodka com limão. Quando ele voltou, lhe entregando um caderno e uma caneta azul, você pediu outra dose, enquanto já começava a fazer algumas anotações.

— Problemas no paraíso?

— Como assim? — Você perguntou sem parar o que estava fazendo.

— Você e Satoru brigaram?

— Essa é uma forma de colocar a situação.

— Não tá escrevendo a sua carta de demissão, né? — Por mais que ele tentasse soar brincalhão, você conseguia perceber a tensão pesada na voz dele — Você sabe que isso não é uma opção.

— Não é uma carta de demissão — Você finalmente acabou de escrever o que precisava. Arrancou a página do caderno e a dobrou. Entendeu a folha para o loiro, mas, quando ele ia pegar, recuou o papel — Quando essa missão acabar, vocês vão cumprir a parte de vocês e me dar o dinheiro, certo?

— Certo.

Era mentira. Você já sabia, mas precisava de uma última confirmação e conseguiu ela ao perceber o mínimo vacilo que Nanami deu antes de responder.

Não tinha mais volta, então você estendeu o papel para ele mais uma vez, o deixando pegar.

Nanami abriu a folha enquanto você virava de uma só vez a segunda dose que ele tinha feito para você. Quando você se levantou da cadeira e pegou a carteira para jogar uma nota em cima do balcão, ele tinha acabado de ler suas anotações.

— Isso é...

— Pode avisar pra Masamichi que eu espero o meu pagamento amanhã de manhã no máximo — Você o interrompeu e colocou um mini sorriso no rosto antes de continuar — Foi um prazer trabalhar com você, Nanami.

Sem esperar uma resposta, até porque o loiro ainda estava com os olhos arregalados, revezando entre olhar para a folha de papel e para você, você se virou e começou a andar para fora do estabelecimento.

As lágrimas começaram a escorrer descontroladamente pelo seu rosto assim que você passou pela porta do bar. Mas, mesmo que os seus joelhos estivessem quase cedendo, você ainda tinha muito trabalho para fazer.

O que mais deixava o seu coração em pedaços era saber que você não voltaria para casa para ter uma última noite com sua família.

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