❪ 𝐎𝟒 ❫ ┆ ❛ 𝐓𝐇𝐄 𝐃𝐄𝐕𝐈𝐋 𝐈𝐒 𝐀𝐌𝐎𝐍𝐆 𝐔𝐒

CAPÍTULO QUATRO
o diabo está entre nós

               A CANOA SE ACOMODAVA NO CENTRO da névoa sútil daquela madrugada, Margareth mantinha os joelhos juntos e as mãos entrelaçadas, admirando o cenário que as envolvia, já Lizzie apenas guiava a embarcação, tentando não se distrair. O barulho da coruja e o silêncio seguinte ao redor durou pouco, a morena estava prestes a interrompê-lo, não sabia como, mas foi dizendo rapidamente assim:

── Está usando a flor que eu te dei. Bom saber que não jogou fora!

Experimentava um sentimento que jamais provou antes, doce e enlouquecedor, até mais do que as frutas que costumava saborear. Pela primeira vez, a única sensação no mundo que parecia deixá-la encabulada e ansiosa.

── Por que está fazendo isso? Sendo legal comigo? ── Magie não sabia até que ponto podia confiar nela e queria ter certeza de que não estava tirando proveito de si.

── Você merece alguém idiota que te faça rir de vez em quando. ── declarou.

Mas para Margareth, aquilo era uma completa novidade, ela nunca sentiu que alguém se importava de verdade, não até ver Lizzie atravessar pela porta de seu quarto naquela manhã, a abarrotando de expectativas. Por isso tudo aquilo tanto lhe assustava.

── Você não é nada idiota! ── respondeu com a maior simpatia que presenciara, porque embora considerasse que estavam se tornando amigas, Goode sentia que no fundo se tratava de muito mais.

── Não. Sou só estranha, como você mesma disse. ── retrucou um tanto brincalhona.

Lizzie também gostava de provocá-la, como se sempre quisesse colocá-la contra a parede, só para espreitar sua reação confusa ou zangada.

── Não é ruim ser estranho. É o que salva a gente de ser banal como os outros. ── retribuiu ── Então quer dizer que... Isso é a festa da colheita?

── Não. Na verdade, eu deixei a celebração de lado. Não tem nada de interessante lá quando você está aqui. ── admitiu ── E, pensei que não fosse gostar. Mas se quiser, eu te levo de volta... Então, você quer voltar?

── Não. Só quero que me leve para onde planejava me levar quando me buscou ainda a pouco. ── Margareth a incentivou, curiosa, afinal, haviam ido longe demais para retornar sem a aventura completa.

O pedido foi bem aceito por Lizzie, sua face radiava pleno contentamento como a muito não se via, cuidadosa em fazer a curva para o barco atracar na borda corretamente. E assim que Magie teve enfim coragem de olhá-la mais profundamente, foi como se cada traço de seu rosto se tornasse uma bela pintura que não gostaria de expor em nenhum outro lugar, que não fosse seu quarto; penas para poder olhá-la todas as manhãs, assim que acordasse. Poderia soar ambicioso e egoísta, mas ela não dava a mínima. Nunca quis tanto Lizzie, chegava a lhe ser tão mais nescessário do que viver.

O barco deu um pequeno solavanco e então não estava mais flutuando. A morena desceu primeiro e a outra, um pouco mais confiante do que no início do passeio, veio depois, escolhendo segui-la.

── Eu gosto desse lado, parece bem mais calmo. ── ela a ajudou a descer, próximo a margem ainda era possível ver uma espécie de celeiro, meio abandonado, do qual o seu pai parecia tomar conta ── O que você acha?

── Gosto da sua companhia. ── o tremor na voz foi inevitável, estava mesmo falando sobre algo que balançava o seu coração.

Foi assim que elas sentaram-se lado a lado perto ao rio, sentindo a água gelada bater próxima as suas botas.

── Você está com medo?

── Um pouco. ── Goode considerou. Era um mundo completamente novo para ela. Como se houvessem soltado uma ovelha acostumada a viver dentro de um cercado, num pasto imenso e repleto de perigos ── Mas eu não quero mais sentir isso. E quando eu olho nos seus olhos, ele vai embora. Se você ficasse comigo para sempre, eu sinto que não temeria mais nada... Nem mesmo a morte!

── Posso fazer uma coisa? Se estiver confortável, é claro. ── e encostou suas costas contra o chão, vendo a loira fazer o mesmo e ambas olhando-se pela lateral, com parte do rosto voltado ao solo ── Só me diga se quer ou não...

E suavemente repousou os dedos sobre sua barriga, lhe provocando cócegas. Depois aguardou, esperando o que Magie faria com aquilo, enquanto o silêncio as abraçava lentamente.

── O que é?

── Posso... Te beijar? ── a proposta saiu num sussurro tímido e desconexo.

Apesar do choque, Margareth respirou fundo, focando em cada curva da sua expressão, aconchegando seu nariz ao dela e se aproximando dos lábios da menor, provocando um suspiro de alívio. Aquela súplica verbalizada foi exatamente o que seu coração andava lhe dizendo sem palavras, por um bom tempo. Os dedos se conectaram sutilmente e seu rosto se ergueu na altura da loira, Lizzie envolveu um de seus braços na cintura de Magie com mais precisão, o que a fez agarrar seus cabelos com certa firmeza, provocando uma sensação de tremor em sua espinha dorsal, a qual lhe arrepiou por completo. O som aprazível de seu respirar contra seus lábios... Aqueles lábios que se tocaram sem muito esforço.

Deslizando plenamente como numa valsa, tênue e firme, apenas a lua as espreitando. As línguas se acariciando no rodopiar perfeito da paixão, as mãos deslizando sobre a pele uma da outra. Ali tiveram a convicta certeza de que jamais se arrependeriam de tudo o que haviam feito, um breve beijinho selou a decisão. Se afastaram um tanto quanto atordoadas, ainda contemplando a expressão eufórica uma da outra.

── Eu pensei que isso fosse algo que duas garotas não pudessem fazer. Que não fosse o certo... ── mordeu os lábios, admirando Lizzie.

── Pareceu errado pra você? ── escorregou o indicador próximo a sua testa, ajeitando os fios dourados no canto de sua orelha.

── Não, de jeito nenhum. ── sorriu, se escondendo no ombro da outra ── Obrigada, por isso. Por tudo isso! Acho que é a única vez desde que nasci que me sinto tão viva...

── Eu tenho algo pra você... ── Lizzie pensou com sigo, prendendo os pulsos de Margareth contra a terra molhada, e colocando as pernas ao entorno de sua barriga, a mantendo embaixo de si.

── Mais uma surpresa? ── arqueou a sobrancelha, puxando sua barriga contra a dela, a respiração de ambas aceleradas.

A morena chacoalhou os bolsos, retirando algo escondido entre os dedos:

── Um pequeno fruto da terra, pra alegrar nossa noite. ── e o deslizou para a ponta de suas unhas, deixando em contraste com a claridade prateada do luar ── Não se preocupe! Não precisa morder tudo... Só um pedacinho. Não vai te fazer mal, eu garanto.

── É, tem razão. ── por um momento Goode havia se esquecido de quem realmente era, uma doente apática, sendo conduzida pela garota da vila que insistia em roubar sua consciência ── Quer saber? Talvez eu morra, hoje ou amanhã, ou... Depois de manhã. Então pra que adiar isso? Prefiro morrer em seus braços hoje a noite...

── É assim que se fala, linda! ── se encheu de orgulho, inclinando seu pescoço ao prender o fruto azulado nos lábios, chegando mais perto novamente, para que ela retirasse o seu pequeno pedaço dentre os seus.

O movimento dos dedos da loira acariciando seus seios fez com que ela fechasse os olhos, jurou estar nas nuvens... Magie mordeu a frutinha azulada, pegando sua parte ao esbarrarem de leve a parte superior de suas bocas. E no segundo seguinte, Lizzie literalmente despencou do céu, numa velocidade feroz que a despertou do transe, o medo e a estranheza a afligiram ao sentir sua garganta secar, o topo de seu cabelo foi puxado por uma mão maior e pesada que, com certeza, não era a de sua amiga. Com o impulso, foi jogada contra um pé de carvalho, para longe de Magie e erguendo os olhos repletos de lágrimas pela dor que sentiu, observou a Goode cuspir o alimento quando deu de cara com seu pai: Solomon Goode, ele estava ali. Parecendo um animal selvagem, bufando.

"Como ele descobriu o lugar onde combinaram de se encontrar?", foi tudo o que não parava de se questionar

Tomando a filha por um dos braços, que mal teve tempo de compreender o que acontecia, apenas de sentir vergonha diante da situação em si. Segurando um livro em sua mão esquerda tinha a outra livre para lhe apertar, obrigando-a a segui-lo. O homem possuia os olhos mais sombrios que já se vira, cego pelo ódio que o consumia. Nunca imaginou ver tamanha profanidade vindo de duas garotas, especialmente de sua menina, mas já sabia quem a havia levado para o mal caminho, sim, ele havia visto tudo.

── Margareth! O que significa isso?!

Margareth segurou em seu punho, tentando amenizar a força com a qual a arrastava. E o timbre pesado ecoou na floresta, as veias esverdeadas pulavam por suas têmporas.

── Não machuque ela, por favor! ── Lizzie suplicou.

(...)

Naquela noite tão propícia a se ceder aos desejos da carne, Magie e Lizzie não foram as únicas. No ápice do anoitecer, dois corpos se envolviam na lentidão do momento, se amando com desespero sobre uma pedra íngreme de tamanho médio ao centro da floresta, em que flores de tom rubi se espalhavam. Haviam mãos se entrelaçando na árvore mais próxima, espiando, com um ar de arrogância e negação radiado nos olhos que se arregalavam. E pelo hálito de vodka barata e o riso afiado, notava-se que além da pele coberta por sujeira, havia também naquela mente, impureza, e certo grau de insanidade que o apartava dos limites morais. Voltando um passo atrás, Louco Thomas foi interrompido por um toque em seu ombro e um líquido amarelado manchou suas calças, urinando na própria roupa, de medo. Ele encolheu-se, desviando o olhar do casal, procurando por quem o interrompera.

── Solomon há de saber disso! ── ainda atônito, notou ser uma moça de capuz negro e cabelos cor de figo que pusera seus lábios no vão do seu pescoço.

Não assimilando uma palavra do que ela dissera, demorou a reconhecê-la, soltou a garrafa e inclinou a cabeça para frente, tornando a olhar mais a fundo para o casal se beijando sem fôlego, os dois corpos que se uniam como um peixe sendo fisgado pelo anzol tinham um formato ampulheta, o que significava que eram femininos. Duas mulheres! Então olhou mais uma vez para a jovem atrás de si, se lembrando de onde a vira, aquela era Nora Goode, voz encantadora e sobrenome de honra. Ela encarava as duas mulheres se acariciando com um nojo explícito em sua face. Aliás, mal podia crer no absurdo que assistia: Sarah Fier e Hannah Miller, a esquisitona da vila e a santinha, ambas se amassando feito dois animais. E também sabia da afeição de seu irmão por Fier, o que, deixava seu estômago ainda mais embrulhado.

── Sarah Fier devia ser enforcada... ── sugeriu ao bêbado, remoendo ao pecado que assistia ── Ela sim é o mal de Union!

── Pecadoras! ── Thomas repetiu com fúria nos olhos, se deixando levar pela opinião.

── Sarah roubou o meu irmão de mim. ── respirou fundo, lembrando-se do dia em que ele se mudou da casa da família Goode ── Solomon era um homem bom, temo que agora esteja sob algum feitiço maléfico... Se eu testemunhar, Thomas. Pela afeição que diz ter a mim, você também testemunharia ao meu favor?

Ele não disse nada. Mas sorriu como um pequeno diabo, encantado pela beleza de Nora, que estava disposta a comunicar tudo sem demora ao seu irmão.

E correndo até a casa do fazendeiro, bateu três vezes na porta, não sendo atendida, bateu uma quarta vez. Nada. Insistiu, mais uma vez. Até que o som de metal das trancas a fez cruzar os braços, imaginando que enfim seria recebida. Ainda ressabiada pela demora, ela aguardou quando a porta se abriu num soco que a fez esbarrar contra a parede interna da casa. Solomon apareceu ali, suado, com pequenos rasgos na lateral de sua roupa, ela o encarou sério, mas ele não esboçou uma mínima reação, mantendo uma de suas mãos atrás do corpo.

── Nora?! ── lambeu os lábios ── Que merda você tá fazendo aqui?

── Calma, meu querido irmão. Isso são modos? Não vai nem me cumprimentar?

Sua ironia o irritou ainda mais.

── Vá embora!

── Tenho algo que você vai gostar.

── Você conseguiu o que te pedi? Sei que conseguiu. Não enrole! Onde está a poção? ── aquela corrida contra o tempo para salvar a filha nunca lhe pareceu justa, mesmo o fato de ter que se humilhar para sua irmã, julgava ser culpa do divino.

Nora podia ser jovem, mas era astuta. Por isso não hesitou ao questionar o irmão quando começou a ouvir um som de fundo: um choro abafado, um grito que se partia ao meio, olhou para as janelas trancadas por persianas. Ela imaginou que vinha lá de dentro.

── Mas que chororô todo é esse? É a Magie?... Ora, seu monstro! O que você fez com a minha sobrinha?! ── a indagação, ao contrário do esperado, estava repleta de ironia, ela realmente não se importava, mas qualquer coisa que tivesse acesso para manipular Solomon, seria de grande valia.

── Eu não fiz nada! Ela que me desobedeceu... ── respondeu num tom firme, insinuando que a filha lamentava apenas o castigo que recebera.

── Ah, bem se vê que puxou a teimosia da mãe... ── resmungou.

── Lave essa boca imunda pra falar da minha esposa! ── ele se zangou e Nora reconheceu que falou demais, quando sua mão direita agarrou seu pescoço frágil, quase impedindo que ela respirasse.

Seus olhos então se abriram, implorando por misericórdia.

── Ex... Esposa. ── reafirmou, com a voz craquelada ── Você ainda não aceitou que a perdeu para a morte, não é?

── O que veio fazer aqui, Nora? Eu não estou com tempo para brincadeiras! ── ele passou a mão pelos cabelos, ansioso. A soltando.

── Limpar sua bagunça, como sempre! Parece que você deixou algo cair pelo caminho, Solomon... ── se afastou, pretendendo que ele olhasse em direção ao chão.

Talvez a fofoca devesse ficar para um outro momento.

── Do que você está falando, sua megera? ── e pela primeira vez, Goode, estava verdadeiramente confuso.

(...)

NA MANHÃ SEGUINTE

Constance não dormiu bem durante a noite e logo pela manhã, seu sono foi interrompido por um relinchar rude de algum cavalo que perambulava pela vila misturado a sensação incomoda de que o vidro de seu quarto estava se partindo ao meio.

Abrindo os olhos lentamente para entender o que era aquele barulho, esgueirou-se da cama, conferindo num breve pestanejar a sequência de pedrinhas que cabiam entre um dedo e outro da sua mão sendo atiradas contra a janela ao lado de sua cama. Esperou a sequência de batidas cessarem e se debruçou ao parapeito, observando atentamente a jovem de cabelos negros que lhe encarava lá debaixo. Suas tranças um tanto desorganizadas e seu dedo em riste, acenando para que a mesma lhe acompanhasse. Então prestou atenção no vulto de seu vestido quando esta começou a correr. Evie Lane parecia desesperada.

A ruiva pensou rápido e pulou intrigada, deslizando pelo telhado baixo que dava para o quintal. A perseguindo, ouvia o galo cantar a certa distância conforme acompanhava o barulho de seus passos, avançando há dois metros da residência.

── Está bem. Já posso admitir que, estou surpresa? ── sua voz oscilou.

── Devia se sentir segura. Está a salvo agora.

── Ah, claro! ── sorriu ── Vindo da pessoa que todos dizem ser o anticristo que vai disseminar a nossa vila. Bom, com sinceridade, o mínimo que eu posso achar disso tudo é... Estranho.

── E você sempre acredita assim em tudo o dizem? ── parou, Constance recuou um passo atrás ao encarar o furor em seus olhos, assustada.

── Talvez eu devesse agora. ── aumentou o tom, demonstrando coragem, embora estivesse tremendo de medo.

── Péssima hora. ── sacudiu a cabeça ── Sacrifiquei o que minha mãe acreditava por você.

── Você é doida! Quase nunca entendo o que diz, mas... E então? Está melhor? ── a alcançou, prestando atenção nos seus lábios sempre juntos e os olhos cobertos por cílios longos que, quase nunca piscavam.

── Melhor? De quê?...

── Ontem, se lembra? ── tocou em seu braço ── Você desmaiou!

── Ah! Não. Isso? Já passou... ── empurrou a saliva guela a dentro, ignorando a visão que tivera ── Nem me lembrava mais....

── Que bom... Eu acho.

── Olha! ── Evie paralisou, após cruzarem por terrenos de algumas casas e se depararem com o quintal dos Fier ── É o Henry!

Ali um menino meio gordinho de cabelos encaracolados, irmão mais novo de Sarah, surgiu curvado com uma imensa decepção sobre os olhos, mantinha sua concentração no pequeno chiqueiro em que um porquinho de pelo negro se acomodava, do qual ele tomava conta. Aquele era o animal de estimação da família, mas não apenas isso, também era a fonte de renda dos Fier.

── Henry?... ── Elvira chamou sua atenção, se colocando mais perto passo após passo.

── Não olhem agora! ── ele avisou, meio sobressaltado.

Coçando a testa, se afastou do lugar, confuso.

── O que aconteceu? ── mas Constance, curiosa como sempre, se atreveu a pôr a cabeça para dentro do pequeno paior e segurou a respiração.

Não era apenas o cheiro da lama que afetou seu paladar, havia igualmente um gosto peculiar de sangue e corpo em decomposição misturados entre as palhas.

── Os filhotes morreram! ── declarou, apoiando suas mãos trêmulas sobre os joelhos. Assim que Lane deu a volta em Berman, conseguiu analisar para próprio espanto: a cria da porquinha estava toda triturada e, aparentemente, o sangue saia do estômago deles ── Ela comeu todos. Todos eles!

Pôde ouvir um suspiro embasbacado nato vindo da ruiva que apertou o coração, com suplício. Porém, Evie foi mais objetiva:

── Aquele machado é de vocês? ── caminhou até o objeto em pé ao canto do cercado, pedindo permissão ao dono do quintal.

── Evie? ── Constance lhe chamou atenção, adivinhando o que viria em sequência.

── Ou! Você endoidou? ── Fier arregalou os olhos.

── Isso é bem irônico! ── a ruiva sorriu, levando em conta o histórico dela.

── É o único jeito, Henry! ── deixou claro, os olhos negros circulares cravados no animal que grunhia.

── Você não está pensando?...

── Eu vou... ── ela interrompeu o garoto.

── Aí meu Deus! Eu não posso olhar para isso... ── Berman correu para fora do lugar, dando a volta, acelerou até uma estrada de terra que passava em frente ao casebre.

As botas de Lane formaram um rastro na lama rasa, ao tempo em que se aproximava dos animais, empunhando o machado mediano contra o corpo gordo da porca que, continuava a saborear o intestino dos pobres porquinhos recém-nascidos. Ela impulsionou o objeto para trás e depois, prendendo a respiração, o acertou no pescoço, dilacerando uma das orelhas junto. Sentiu um leve palpitar no peito, mas não uma angustia, nem ansia, era mais como uma certeza de que havia feito o certo: cortar o mal pela raiz, era do que sua mãe chamaria. Ao contrário de Henry que, vomitou quando viu a lâmina cortando a cabeça do animal maior, Evie não esboçou qualquer reação, apenas sentiu o sangue espirrando em seu rosto cor de oliva, a fazendo fechar os olhos.

Assim que Constance ouviu o grito do bichano e o gemer de seu amigo, tentou ignorar, mas sabia o que havia acontecido. E nem precisou se esforçar muito, logo uma movimentação atípica se espalhou pela vila lhe prendendo a atenção, então se misturou a multidão, queria ficar a par de tudo, quando uma voz masculina se sobressaiu às demais:

── A escuridão chegou! Para colher o fruto amargo do diabo que nós semeamos... ── era Thomas quem discursava, cheio de coragem e um brio de insensatez, gesticulava com os braços.

Constance olhou de canto e viu seus amigos juntarem-se a ela.

── Para se deleitar com a nossa maldade... E ainda assim, vocês sorriem?... ── refletiu, num tom bastante amargurado.

── Henry! Fica com ela...

── O quê? Por quê?... ── questionou a Evie, toda a vida tão imprudente.

── A onde você vai?

── Eu já volto! ── assegurou, apertando a saia.

Toda a confusão se parecia em muito com a sensação de fim de mundo que experimentara durante suas visões e pesadelos, aquela que os religiosos sempre disseram que ela seria responsável por disseminar. E quem sabe também fosse uma boa hora para experimentar o sentimento de pânico? Ele era um ótimo conselheiro em situações de perigo, e se sentia em uma dessas situações agora.

── ... Cego aos horrores à nossa volta! Mas estão vendo agora, não estão?

A jovem Lane encarou a roda de homens ao redor do poço, todos se esforçavam para puxar o balde empacado nas pedras para a superfície. O cenário feliz das crianças rodando e brincando ali havia ficado para trás, agora o sofrimento dominava aquelas pessoas. E bem, as plantações nas laterais das casas eram corroídas por uma espécie de praga que surgira do dia para noite, assim como a morte ceifando os humanos ocasionalmente. Um cavalo marrom rodopiava ao centro do pasto e relinchava descontrolado, se negando a obedecer seus donos, como se estivesse possuído por espíritos.

É, o cenário por si só já amedrontava, não era um dia como outro qualquer. Para uma vila tão calma, o desespero se entranhou rápido no peito de cada morador.

── O que aconteceu? O que está havendo? ── Sarah, a muito tempo assistindo tudo a certa distância, correu até o poço, questionando Abigail, que acompanhava a cena desde o começo.

── O balde emperrou em alguma coisa... ── relatou.

── Não finja que não sabe de nada, Sarah Fier! ── intrometeu-se Nora, com seu vestido pomposo e uma voz enojada.

Já a Fier que sequer havia notado sua presença atrás de si, franziu a testa ao encará-la, parecendo apreensiva o bastante, um pouco mais do que todos ali presentes. Por um instante considerou se a Goode não teria razão... Ainda se lembrava do que havia feito noite passada.

E enquanto os homens giravam a corda, ouviram o destravar da manivela. Com a surpresa do que estava por vir, observaram precisamente e notaram um cachorro negro ser retirado do local sobre o balde, gélido e rígido, com a língua para fora. O motivo de estar tão pesado. Uma gritaria se iniciou, o bichano estava desfigurado, sem vida, impossível de não se surpreender com a morte tão próxima.

── Tem um cão morto no poço! ── alguém gritou.

── Nossa água está envenenada! ── uma das senhora mais velhas se manifestou, aterrorizada.

── Não... Marryboy!... ── Sarah lamentou tremendo os lábios.

Ela reconheceu o animal, era o seu cachorrinho de estimação, ele havia sumido de sua casa pelo amanhecer, mas negava-se a crer que agora tinha o encontrado de tal maneira, morto!

── Isso é obra do diabo! ── Louco Thomas continuou ── Ele veio tomar nossas terras! Quem aqui trouxe o diabo para Union? A luxúria de quem? O pecado de quem?...

Fier desviou o olhar, atônita. Queria crer que a culpa não era sua, mas dentro de si, aquele beijo que dera em Hannah Miller, ainda reverberava... De maneira doce, de maneira culposa. Ela sabia que Deus ou qualquer coisa que estivesse nos céus agora, acima dela, jamais a perdoaria!

── Tola Union! O diabo chegou. E lançou suas trevas sobre nós. E suas trevas crescem, dentro de cada um de nós. Como a podridão...

── Agora estamos perdidos! ── Elijah resmungou para a irmã mais nova, então Nora entrelaçou seu braço ao dele, recebendo um leve tapinha sobre os dedos, em forma de reconforto.

── Não pense assim, Elijah. Talvez ainda haja misericórdia para nós... ── suspirou.

Nora podia tentar se enganar o quanto quisesse, mas bem, os pesadelos que a rodeavam... Esses jamais a deixariam ficar ilesa por tanto tempo. Então seu corpo estremeceu quando viu Solomon aparecer na vila, entre o horizonte e aquelas pessoas correndo, se sentindo grata por ele estar a salvo.

₍ 001 ₎ FOI UMA ETERNIDADE
PRA ATUALIZAR AAAA!
MAS FINALMENTE POSTEI!!!
nossa, que saudades que eu
tava disso aqui! Sério, que
saudades de vocês!!!
Mas e aí? O que acharam
do capítulo? ♡♡

₍ 002 ₎ Não esqueçam de
favoritar e comentar. E, me
digam o que acharam do
cap aqui!

₍ 003 ₎ Tô ansiosa pra trazer
mais capítulos, então nos
vemos em breve. Bjnhs! ♡

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