Capítulo LX

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A gratidão é uma dívida que os filhos
nem sempre aceitam no inventário.

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Quando Charlie chegou em casa, ele estava quieto. Sentada no sofá, o observei andando pela casa como se estivesse perdido, para no fim ir até a cozinha pegar uma cerveja e depois sentar ao meu lado. O silêncio foi horrível. Mas o alívio era maravilhoso. Vê-lo bem, vivo, mesmo depois de eu ter mandado ele para falar com Bella... Droga. Por que eu tinha que fazer as coisas no impulso? Bella estava errada, é claro que estava, mas aquela não tinha sido a melhor opção. A única que enxerguei no momento, mas não a melhor.

Respiro fundo, sentindo o cheiro dos vampiros nele. Sinto o nariz coçar com aquela fragrância irritantemente doce e incômoda, e os pelos do meu corpo se eriçam.

— Bella nunca vai voltar a ser o que era, não é? — A voz quebrada de papai ecoa pelo cômodo, chegando com facilidade até mim e sinto meu peito doer.

Papai sabia sobre os vampiros desde o acidente com as minhas pernas. Quando se desesperou, querendo saber o que tinha acontecido, foi Leah quem contou tudo. Sobre as lendas. Sobre os frios. Sobre os Cullen. Ele sabia, mas assim como o assunto lobos, ele deixou passar. Ou simplesmente o choque fez ele esquecer aquela informação. Eu não sei. Mas ele simplesmente não falava sobre.

Estalo os dedos da minha mão, o barulho quebrando o silêncio desconfortável e assinto, enquanto deslizo no sofá e vou até papai.

— Você também não, certo? — Ele volta a perguntar e assinto, incapaz de dizer em voz alta que tudo tinha mudado. Charlie suspira, dando um longo gole em sua cerveja e volta a olhar para a TV desligada. — Como vou conseguir voltar ao trabalho na polícia, sabendo que existem perigos maiores do que os que eu já conheço? Minhas duas filhas são perigos maiores do que os que conheço.

— Não somos perigos. — Murmuro, dizendo mais por mim do que por Bella, os olhos vermelhos acesos em minha mente como se fossem um letreiro de balada.

Mais um gole longo. Mais um suspiro pesado.

— Uma vampira e uma lobisomem. Deus, não sei o que fazer.

— Só seja o nosso pai. — O abraço de lado, apoiando minha cabeça em seu ombro. — Vampira ou lobisomem, nós ainda precisamos de um pai. E o senhor é o melhor que existe.

Ele deixa a cerveja na mesa de centro e recosta no sofá, retribuindo desajeitadamente o meu abraço e ficamos ali, naquele silêncio estranho mas ao mesmo tempo reconfortante.

— Preciso ficar um pouco sozinho, filha. — Papai falou rouco e eu assenti, dando espaço para que ele pudesse se levantar. — Vou estar lá em cima, se...

— Preciso ir na reserva. — Murmuro, olhando-o atentamente para me certificar que ele estava mesmo bem. — Vamos celebrar a gravidez da Emily. O novo filhote vai ser abençoado pelos ancestrais.

— Billy comentou algo sobre. Dê os meus parabéns ao Sam e à Emily, por favor.

Assinto, e antes que ele possa sair, seguro sua mão fazendo com que ele volte a me olhar.

— Eu te amo, pai.

Pela primeira vez naquele dia, ou em algum tempo, ele sorri. Um sorriso pequeno, cheio de preocupação em volta, mas também cheio de carinho. Aperta minha mão rapidamente, retribuindo o gesto.

— Eu também te amo, garota.

Chego na reserva de noite e estaciono meu carro em frente a casa de Sam. Aquela era a primeira vez que ia ali depois da batalha contra eles, e ainda havia um sentimento estranho no meio disso tudo. Leah está me esperando na frente da casa e antes que eu possa dizer qualquer coisa, sua mão gruda no meu braço assim que saio do carro e começa a me puxar para dentro da casa.

— Você está atrasada.

Sorrio com seu mal-humor, tentando acompanhar seus passos rápidos para o banheiro. Lá, havia um pote com uma tinta preta escura e espessa e um pincel fino. Também havia um pote com tinta vermelha. Franzi o cenho quando Leah me colocou sentada no vaso, vestindo uma tiara em mim e afastando meu cabelo do rosto.

— O que você está fazendo?

— É um saco que você não tenha crescido na tribo e eu preciso te explicar tudo. — Leah murmura, empurrando minha cabeça para trás e fazendo eu inclinar o rosto. — A mulher do alfa precisa se pintar, assim como o alfa, nas nossas cerimônias mais tradicionais. Zuimã é uma cerimônia tradicional pra caramba. Jacob não te explicou?

— Hm... Não. Ele só disse que eu precisava usar branco. — Olho para o vestido leve que escolhi, com as sobrancelhas franzidas. — Demora muito a pintura?

— Para sua sorte, não. — Ela pega o pincel, mergulhando na tinta vermelha e vem para a minha bochecha esquerda, traçando um risco em formato de pressa bem em cima do osso perto do olho. Depois, repete o gesto logo ao lado do outro. E então, vai para o lado direito.

Leah se afasta um pouco, olhando com atenção para ver se estava tudo certo, então lava o pincel e mergulha na tinta preta, logo traçando duas retas no meu queixo, uma ao lado da outra. Se afastou um passo para trás, conferindo mais uma vez e por fim deixou o pincel de lado.

— Pronta. — Ela me estende um espelho para poder olhar com mais atenção seu trabalho. Era uma pintura típica quileute, e estava linda, realçando ainda mais meus traços indígenas.

Levanto e ajeito meu vestido, deixando os bordados de um jeito que não parecesse amontoado e, no fim, eu estava simples mas bonita.

— Obrigada Leah. Ficou tudo lindo. — Deixo o espelho de lado, procurando sua mão para dar um aperto carinhoso. — Foi uma merda tudo o que aconteceu, mas me sinto contente por estar tudo se resolvendo agora.

Leah retribui o carinho, mas antes que possa falar qualquer coisa Angela passa pela porta, também com um vestido de cor clara mas o rosto sem nenhuma maquiagem quileute, assim como Leah. Aparentemente, aquilo era algo apenas para os alfas.

— Leah, está todo mundo esperando... — Se interrompe quando me vê e sorri. — Ada! Você está tão linda.

— Obrigada, Angela. Você também está. Vocês estão, aliás!

Ela agradece de um jeito tímido enquanto vem até Leah, passando o braço pelas costas da namorada e apoiando o rosto no ombro dela.

— Está todo mundo esperando lá. Emily já está com a pintura pronta, também. Se a barriga dela estivesse maior, ia ter ficado ainda mais incrível!

— A barriga vai crescer, e quando estiver perto de nascer vamos ter outra cerimônia. — Dou de ombros, lembrando-me da cerimônia antes do nascimento. — É para a criança poder encontrar o caminho sem dificuldades.

— Eu acho tão lindo essa religião de vocês. Como conseguem lembrar de todas essas coisas? — Angela pergunta, tirando os óculos e o limpando na barra do vestido. — São tantos nomes, tantos detalhes...

— Qualquer religião é assim, amor. Você sabe todos os nomes dos livros da Bíblia, e todo o resto. Se me perguntarem sobre, sei que tem Jesus no meio e só.

— Realmente. — Aponto rapidamente para Leah. — Tente crescer no meio das duas religiões. É confuso!

— Não vá fazer seus pirralhos com o Jacob ficarem confusos nas religiões. — Leah alfineta.

Reviro os olhos e olho para fora, vendo todos se encaminhando logo atrás da casa de Sam e Emily. Aponto para as meninas e elas assentem, dizendo para que eu vá na frente e logo se encontram comigo lá.

Quando coloco meus pés na grama do lado de fora e olho ao redor, encontro Jacob indo para o centro das pessoas. O peito descoberto, com as pinturas de lobo sobre a pele fazendo ele parecer ainda mais com um alfa. Um lobo de respeito, que esbanjava autoridade e eu sinto o peito se encher de orgulho e amor, de uma forma que só ele conseguia me deixar.

Tiro as sandálias e deixo junto dos outros sapatos ali, seguindo o exemplo das pessoas e indo descalça até eles. Jacob me vê e estende sua mão para mim, e eu logo vou de encontro à ele.

— Nervoso? — Pergunto em voz baixa, seus sentimentos vindo até mim de uma forma ainda mais intensa. O nervosismo, o temor, vergonha, se misturando com a felicidade, o amor e, ainda melhor, o orgulho. Sobre toda a situação que ele passou, era normal que estivesse assim, e tudo o que eu fazia era apoiar. Apoiar ele com todo o meu amor.

— Pra caralho. — Ele respira fundo, baixando seu rosto para colar o nariz ao meu. — Acho que só ficaria mais nervoso se fosse o nosso Zuimã.

— Daqui uns dois anos, três no mínimo. — Dou risada, nervosa com o pensamento. Eu, grávida, andando com a barriga pintada no meio da tribo para mostrar que mais um filhote vinha para o mundo.

— Preciso me casar com você antes de termos nosso filhote. — Jacob me olha de cima abaixo, um fogo subindo nos olhos. — Mas confesso que seria divertido tentar mesmo sem estarmos unidos pelo matrimônio.

Sinto minhas bochechas queimarem e olho ao redor, vendo os lobos ali nos olhando com a cara mais deslavada do mundo. Eles estavam ouvindo, o que era péssimo, pois além de tudo eram fofoqueiros e logo toda a tribo acharia que estávamos tentando ter um filho.

— Para de graça, cabeção. Meu Deus.

Suas mãos me envolvem, mas ele não encosta o peito em mim para a tinta não manchar o vestido branco e agradeço por isso, sentindo o calor dele se misturar com o meu.

Olho para frente, para onde Emily vinha caminhando no meio de todos e suspiro. Ela estava linda, sua pequena barriga não era tão chamativa mas com as pinturas nós sabíamos que uma nova vida estava ali, e o sorriso em seu rosto dizia que ele seria muito bem-vindo. Atrás dela, Sam vinha na forma de lobo, representando que estaria ali para cuidar do seu filho e sua mulher. Ser a segurança e apoio para todas as horas.

Normalmente, aquele rito era feito apenas na forma humana, já que nosso povo ficou anos sem se transformar, desde que os frios tinham deixado nossas terras. Papai fez esse rito na forma humana, e foi Billy quem chefiou o ritual. Tinham fotos desse dia, da barriga de mamãe pintada, do vestido branco e leve e de papai parecendo quase parir gêmeos de nervoso.

Suspirei novamente, Jacob desfazendo nosso abraço e ficando numa pose séria e de autoridade, assumindo seu papel como Alfa ao receber o lobo de sua tribo. Ao receber o futuro de sua matilha.

[ n o t a s ]

sim, eu demorei aaaa!
sinto muito MESMO
prometi capítulo ontem, mas não deu, então tô postando hoje. CAPÍTULO SAIU só com atraso KKKKKKK
amo vocês e até o próximo!

Zuimã é uma palavra indígena, que significa "criança". Eu procurei sobre rituais de nascimento, ou de vinda de bebês, mas não achei nada então resolvi fazer o meu próprio. Então é isso!

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