𝐱. 𝘩𝘦 𝘸𝘢𝘴 𝘩𝘦𝘳 𝘣𝘦𝘨𝘪𝘯𝘯𝘪𝘯𝘨
CAPÍTULO DEZ
❝ ELE FOI O COMEÇO DELA ❞ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ ㅤ
━━━━━ i am your only
hope.
A LUZ DA LUA ADENTRAVA PELA JANELA, ILUMINANDO suavemente o cômodo. Ela mantinha os olhos fechados, sentindo aquela luz encostar em sua pele e aproveitando a sensação dos delicados beijos que Kirigan depositava em suas costas desnudas.
Ela estava coberto pela capa preta do Conjurador, enquanto os braços do General a envolviam em um abraço, a mantendo próxima dele. Seus toques, seu cheiro, sua voz, tudo sobre Kirigan era viciante para Anastasia. Era como se, depois que ela mergulhou em sua escuridão, ele se tornou a única coisa que ela precisava.
A tempestade havia amenizado, dando espaço para o frio que invadia o ambiente. Mas o vento gélido não provocava nada em Anastasia. Ela sentia como se cada centímetro de seu corpo estivesse em chamas. Era como se ele tivesse despertado algo nela, acordado algo no fundo de sua alma. Era como se ele fosse seu começo.
─ Você está bem? ─ A voz rouca de Kirigan soou em seu ouvido. A morena se virou para encará-lo, esbanjando um sorriso em seu rosto.
─ Sim. ─ Ela respondeu, tocando seus lábios com os dela. ─ Muito bem. ─ O General sorriu, dando um selinho em sua testa.
Kirigan se levantou e Anastasia ficou o observando enquanto o mesmo vestia suas roupas e, por último, ajeitava seu kefta. Ele encarou a paisagem noturna do lado de fora, se encostando na parede da cabana.
─ A tempestade passou. ─ Ele afirmou, voltando seu olhar para Anastasia. ─ Vamos poder partir pela manhã.
A Princesa suspirou, colocando seu vestido. Sua feição triste chamou a atenção do Conjurador. ─ Qual o problema? ─ Ele perguntou, notando a morena cobrir o machucado em sua perna com suas vestes. ─ É seu ferimento?
Anastasia negou com a cabeça, soltando uma leve risada. ─ Não é isso. ─ Ela disse. ─ Eu só não sei se estou preparada para encarar o que está me esperando. ─ A morena confessou.
Em Os Alta, uma vida diferente estava a esperando e, mesmo assim, continuava sendo a mesma. Ela ainda seria a Princesa de Ravka, mas agora ela não era apenas um título. Ela teria que encarar a realidade causada pela descoberta de seus poderes.
Ela teria que olhar nos olhos de seu pai sabendo, pela primeira vez, que não era filha dele. Ela teria que entrar pelas enormes portas do Grande Palácio não como a Princesa Frágil, mas como a Conjuradora do Sol, a bastarda da Rainha Tatiana.
Anastasia já sabia que o Rei não a amava, mas por que doía tanto descobrir que ele não era seu pai? Ela sentia que carregava um sobrenome que não era dela e uma coroa que não merecia.
─ Nós ainda temos essa noite. ─ O Darkling afirmou, se aproximando da Princesa e encostando sua testa na dela. ─ Vem. ─ Ele a chamou, segurando sua mão e a guiando para fora da cabana.
Do lado de fora ela encontrou a brisa fresca da noite e a vegetação simples que os cercava. O Conjurador se sentou, encostando suas costas na parede fina da residência e suas pernas na grama úmida. Ele fez um sinal com a mão, pedindo para que ela se sentasse e a Princesa o seguiu, ainda confusa com as intenções de Kirigan.
Ele apontou para cima, indicando para que ela olhasse para o céu. Sobre eles existia a imensa escuridão da noite sendo iluminada por milhares de estrelas. ─ Eu costumava fazer isso quando era mais novo. ─ Ele começou, mantendo seu olhar na paisagem noturna. ─ Fugia, ia para a floresta e ficava contando as estrelas. ─ Kirigan contou. ─ Me ajudava a pensar.
A morena sorriu. ─ Por que você fugia? ─ Ela questionou, arrancando uma leve risada nostálgica do General.
─ Eu tive dificuldade para aceitar quem eu era. ─ Ele confessou. ─ O que eu podia fazer. O legado que esse poder carregava.
─ Por isso se importa tanto com Ravka? ─ Anastasia perguntou, observando os traços de Kirigan.
O Conjurador suspirou. ─ Meu antepassado criou a Dobra. Desde então, se tornou dever de toda a minha linhagem destruí-la. É o meu dever agora. ─ Ele disse. ─ Aquele medo que você viu nos olhos do Drüskelle, eu tive que encarar aquele olhar a minha vida inteira. Dos otkazat'sya e até mesmo dos Grisha.
─ Os Grisha podem até te temer, Kirigan, mas eu vejo como eles te admiram. ─ A Princesa contou. ─ Você construiu um lar para eles.
─ Um lar cercado por muros altos, Ana, porque lá fora ainda existem várias pessoas que nos caçam. ─ Ele afirmou, fechando seu punho. ─ E, agora, os ravkanos, nosso próprio povo, estão se virando contra os Grisha, como seu antepassados, porque eles precisam de alguém para culpar por toda essa destruição. ─ As sombras começaram a surgir, conforme as palavras saiam dos lábios do General.
─ Eu tenho lutado essa Guerra sozinho por tanto tempo, Ana. ─ Ele continuou, algumas lágrimas se formavam em seus olhos. ─ Enterrei tantas pessoas boas.
Anastasia nunca tinha parado para pensar no fardo que Kirigan carregava. Ele teve que assistir gerações morrerem e conviver, diariamente, com o medo de que algum dia, seu povo passaria a ser perseguido de novo.
A Princesa tocou em sua mão e, no mesmo instante, sua luz começou a se misturar com a escuridão do Conjurador. Ele a olhou, seus olhos repletos de tristeza e sua feição admirada pelo seu poder. ─ Você não está sozinho. ─ Ela afirmou. ─ Não mais.
Kirigan colocou sua mão no rosto de Anastasia, a segurando e a puxando para mais perto dele. ─ Eu te esperei por tanto tempo.
Ele encostou seus lábios no dela, a beijando. Sua luz apenas se intensificava, assim como as sombras do General. Quando eles se separaram, em busca de ar, seus poderes cessaram. Suas testas se mantinham coladas e a mão de Kirigan permanecia nos cabelos da Princesa.
─ Eu queria que fosse possível ficar aqui. ─ Anastasia confessou. ─ Nessa cabana. Com você.
─ Então você aceitaria ficar comigo nessa cabana minúscula e velha? ─ Ele perguntou, sorrindo. ─ Só você e eu?
─ Sim. ─ A Princesa respondeu. ─ Sem pensar duas vezes.
Kirigan a observou por alguns instantes, seu olhar analisava cada traço de Anastasia, repetindo em seus pensamentos cada palavra que ela havia dito. Ele a pegou no colo, selando seus lábios mais uma vez e a carregando para dentro da cabana.
Naquela noite, Anastasia não teve pesadelos. Talvez ela estivesse certa sobre Kirigan. Ele era o que separava seu passado em que fragilidade era sua maior característica de seu futuro como a Conjuradora do Sol. Ele foi o começo dela. E ela sabia que nada seria o mesmo depois dele.
Naquela noite, Anastasia se apaixonou pela primeira vez. Naquela noite, ela soube que amava Kirigan.
Os primeiros raios solares começaram a aparecer, substituindo a singela iluminação do crepúsculo. Seus braços estavam em volta da cintura de Kirigan, segurando seu corpo no dele enquanto o General os guiava em cima de seu cavalo em direção ao Os Alta.
Durante toda a trajetória, era possível observar as ruínas de uma Guerra que não chegava ao fim. Inúmeros vilarejos abandonados, as famílias costumavam deixar tudo que tinham para trás em busca de proteção e alimento na Capital.
Mas Anastasia sabia que a realidade que eles encontravam quando atingiam seu destino era bem diferente do que haviam sonhado. Os Alta era a perfeita demonstração da desigualdade que se estabeleceu nas raízes de Ravka.
Quanto mais se aproximavam do Grande Palácio, mais sua respiração se tornava falha e seu coração parecia querer sair de seu peito. Kirigan, notando a inquietação da Princesa, achou uma maneira de distraí-la.
─ Eu não consegui te perguntar antes. ─ Ele começou e a atenção de Anastasia se voltou para o Conjurador. ─ Por que você se importa tanto com Ravka?
A Princesa esbanjou um pequeno sorriso. ─ Quando éramos crianças, o Rei costumava dizer que nós seríamos os futuros governantes de Ravka. ─ Ela contou, lembrando-se de sua infância no palácio. ─ Então, seria nosso dever proteger nosso povo.
─ Eu não era a herdeira como Vasily, nem esperta e forte como Nikolai para ajudar no exército, então eu decidi ajudar da única forma que eu podia. Eu pensei que se eu estudasse muito eu poderia ajudar a acabar com essa Guerra. ─ A Princesa confessou.
─ Mas então o Rei se tornou alguém que acredita que meus conselhos não valem nada, Vasily não se importa com seu país e eu nem tenho certeza se sei onde Nikolai está. ─ Ela afirmou, notando os soldados da Guarda Real aparecendo cada vez mais em seu campo de visão, demonstrando que o Rei aguardava a chegada deles.
Por alguns instantes, momentos de sua infância invadiram seus pensamentos. Ela se lembrou das promessas feitas quando era só uma criança. Os Irmãos Lantsov prometeram que governariam juntos, lutariam juntos e sempre cuidariam um do outro. Mas parecia que seus caminhos diferentes os separaram, ela só esperava que, no futuro, o destino deles fosse o mesmo.
─ Isso vai mudar a partir de agora, Ana. ─ Kirigan afirmou, parando seu cavalo em frente a enorme estrutura da família real. Ele desceu, oferecendo sua mão para a Princesa. ─ Tenho certeza disso. ─ Ele disse enquanto a ajudava a descer.
Os soldados os cercavam, fazendo uma reverência. Ela começou a caminhar ao lado de Kirigan, analisando os olhares que recebia. A pena havia sido substituída pelo medo, admiração e até mesmo curiosidade.
O caminho até a sala do trono pareceu uma tortura. Sua chegada foi anunciada e ela se deparou com o Rei e a Rainha, sentados em seus respectivos tronos, e Vasily logo atrás, a observando.
Ela começou a se mover na direção dele, queria abraçá-lo, dizer que o amava e que estava feliz por ele estar bem. Mas seus pés travaram quando ela viu seu irmão abaixar seu olhar, como se ela não estivesse ali.
─ Obrigada por trazer a Princesa de volta para casa em segurança, General. ─ O Rei se pronunciou. ─ Mas agora eu preciso falar com ela. À sós. ─ Kirigan encarou Anastasia, que apenas assentiu e o Conjurador deixou seu lado, saindo da sala do trono.
O Rei se levantou, sendo seguido pela Rainha e seu filho, ordenando que seus soldados permanecessem naquele lugar. Anastasia foi atrás deles, entrando em um cômodo menor. Era a sala que o Rei utilizava para falar com seus Conselheiros.
A Rainha não tirava os olhos de sua filha e a Princesa mantinha seu olhar em seu irmão, tentando entender porque ele parecia ignorá-la.
─ Nós vamos dizer que seus poderes sempre foram de nosso conhecimento. ─ O Rei começou. ─ Te mandamos embora para que pudesse treinar e criamos a narrativa da sua doença para que nossos inimigos não a perseguissem.
─ Vamos dizer que você ter nascido na família Lantsov é um sinal. ─ Ele continuou. ─ É o sinal que nós seremos os responsáveis por salvar todos os ravkanos.
Anastasia gargalhou, chamando a atenção de todos os presentes na sala. ─ Eu realmente pensei que teria uma conversa sincera com você. ─ Ela afirmou. ─ Que você me contaria a verdade. É o que eu mereço depois de todos esses anos.
─ Você quer a verdade? ─ O Rei perguntou, sua voz era carregada com raiva. ─ A verdade é que eu me arrependo de não ter enfiado aquela faca mais fundo no seu coração.
Assim que essas palavras escaparam da boca do Rei, seu filho o olhava em choque, a Rainha correu na direção dele, chorando, batendo em seu peito. ─ Você tentou matar minha filha? ─ Ela escutou sua mãe dizer.
Anastasia ainda estava parada, sua mente ainda tentava processar a fala do Rei. As lágrimas que haviam se formado em seus olhos começaram a escorrer. ─ Você... ─ Ela começou, falhando na sua tentativa de dizer algo. ─ ... Você fez isso comigo? ─ Ela apontava para seu peito, onde, em baixo das vestes, havia uma cicatriz. ─ Por que? O que uma criança pode fazer de tão ruim para você odiá-la desse jeito?
O Rei empurrou sua esposa, fazendo com que ela caísse no chão. Vasily foi de encontro a sua mãe, a consolando. ─ Eu sempre soube que você não era minha filha. ─ Ele afirmou. ─ Mesmo assim, eu te criei, eu te aceitei! ─ Ele exclamou, batendo na mesa de madeira. ─ Mas então eu vi o que você era capaz de fazer, eu vi quem você era de verdade e isso eu não ia aceitar.
─ Você sabia todo esse tempo? ─ Ela questionou, se aproximando do Rei. ─ Me fez acreditar a minha vida inteira que eu era doente, que meus dias estavam contados. ─ Ela disse, suas lágrimas já embaçavam sua visão. ─ Fez eu me odiar, achar que eu era a culpada por você não me amar.
─ Eu preferia te ver em um caixão do que como Grisha. ─ O Rei disse, levantando sua mão para atingi-la no rosto.
Mas, antes que ele conseguisse, Anastasia segurou seu punho, o apertando com força. ─ Você nunca mais vai erguer sua mão para mim.
─ O que você disse? ─ Ele perguntou, tentando soltar seu pulso. ─ Como ousa falar assim com o seu Rei?
─ Rei? ─ Ela riu. ─ Você é só um homem covarde em um trono. ─ Ela disse. ─ E agora eu sou a única coisa que mantém essa coroa na sua cabeça. ─ Ela apertou o punho do homem com mais força. ─ Eu sou sua única esperança.
Ela sentiu quando Vasily segurou seu braço. ─ Solte ele, Anastasia. ─ A voa de seu irmão fez com que ela o soltasse. Ela viu o medo no olhar do homem que um dia chamou de pai.
─ Não sei o que ele te disse, Vasya. ─ Anastasia parou na frente de seu irmão. ─ Você pode me ignorar o quanto quiser, pode me odiar, pode escolher acreditar nele, mas eu sempre vou te amar. ─ Ela confessou. ─ Você é meu irmão.
Ela esperou uma resposta, um sinal que Vasily ainda era seu porto seguro. Que eles ainda eram os Irmãos Lantsov. Mas tudo que o Príncipe fez foi recuar e permanecer ao lado de seu pai.
Ela deu as costas para a família real, caminhando para fora daquele lugar. Ela saiu de lá chorando, destruída, com o coração partido, determinada a colocar um ponto final em seu passado.
Foi assim que Anastasia Lantsov começou a quebrar. Foi assim que a Conjuradora do Sol começou a ruir.
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