✶ . o enigma do cartão dourado.

O Jongyuu Coffee ─ uma pequena loja de cafés de esquina, era um refúgio discreto, um pedaço de tranquilidade em meio ao caos urbano que parecia nunca descansar, mesmo naquela pequena cidade. O lugar exalava um charme antigo ─ quase nostálgico, como se tivesse parado no tempo, resistindo às mudanças frenéticas do mundo lá fora. As paredes de tijolos expostos eram decoradas com quadros desgastados ─ com suas molduras levemente tortas e marcadas pelo tempo enquanto prateleiras abarrotadas de livros velhos ocupavam os cantos do ambiente, alguns dos livros exibiam as lombadas desbotadas e outros estavam cheios de anotações feitas á mão ─ como se cada um carregasse um pedaço da história dos clientes que já haviam passado por ali.

Do teto pediam luzes amareladas suspensas por cabos finos que lançavam um brilho cálido e aconchegante sobre as mesas de madeira escura, cada mesa contava sua própria história em forma de arranhões e manchas, marcas deixadas por conversas antigas, cafés derramados e encontros que transcediam o próprio tempo. A chuva que caíra mais cedo havia cessado, mas o aroma úmido de terra molhada ainda pairava no ar, misturando-se ao cheiro forte ─ e reconfortante, de café recém-passado. A combinação era perfeita, mostrando que cada suspiro era um convite para permanecer por mais alguns minutos no lugar. Os poucos clientes presentes falavam em sussurros, suas vozes abafadas pelo som suave de uma música instrumental que escapava de um rádio antigo posicionado no balcão.

Do lado de dentro, o tempo parecia desacelerar ─ como se o Jongyuu Coffee fosse um espaço à parte, onde o mundo lá fora não podia entrar.

Na mesa mais afastada do café ─ quase escondida em um canto onde a penumbra parecia abraçar o ambiente, os dois policiais estavam sentados. O local parecia ter sido escolhido com bastante cuidado ─ como um refúgio discreto, uma barreira implícita que os separava dos burburinhos do restante do mundo. A luz fraca da luminária acima deles desenhava sombras sutis em seus rostos, tornando difícil decifrar as expressões por completo, mas aumentando a sensação de isolamento que emanava daquele espaço. Jun-Ho estava inclinado para frente com seus cotovelos firmemente apoiados na borda da mesa de madeira envelhecida ─ as marcas do tempo sobre a superfície lembrando cicatrizes, em uma das mãos ele segurava uma colher pequena que girava lentamente dentro da xícara de porcelana branca, preenchida com o café preto. O movimento era sutil, o som do metal raspando contra a borda da xícara e criando um ritmo constante ─ e de certo modo, hipnótico.

Ele não tomava o café, limitando-se a observar o líquido que girava em redemoinhos preguiçosos ─ como se esperasse encontrar ali respostas ocultas ou consolo para pensamentos que ele não conseguia expressar.

A tensão em seus ombros era evidente, os músculos rígidos formavam linhas claras sob o tecido fino da camisa escura que ele usava. Apesar da aparente serenidade de seus gestos, havia algo inquietante na forma como seus dedos seguravam a colher com uma precisão mecânica, denunciando o peso que ele próprio carregava. Seus olhos insondáveis permaneciam atentos no café, mas sua mente parecia distante, presa à um lugar que apenas ele pudesse alcançar. Ao lado dele, Hye-Jin observava em completo silêncio, os braços estavam cruzados de modo protetor ─ como se tentasse se resguardar do ambiente, seus lábios estavam curvados em uma expressão que flutuava entre preocupação e expectativa, enquanto seu olhar oscilava entre o rosto do homem e o movimento repetitivo da colher. A energia entre eles era delicada, carregada de palavras não ditas e emoções que pareciam encontrar refúgio naquele estabelecimento, naquele canto isolado do mundo.

A mesa entre eles era pequena, um espaço estreito o suficiente para que seus braços quase se tocassem se ambos decidissem relaxar suas posturas rígidas, contudo, esse mesmo espaço parecia imenso ─ como uma fronteira invisível, construído não por uma distância física, mas por hesitações mútuas e palavras que permaneciam aprisionadas. O silêncio era denso, carregado de significados que pairavam no ar como fantasmas de uma conversa que jamais aconteceria, não era um silêncio vazio, mas sim um peso cruel como se cada um escolhesse minuciosamente evitar romper aquela bolha de tensão.

O café da mulher repousava intocado, a fina porcelana da xícara parecia frágil ─ incapaz de conter a intensidade de um momento que transcendeu a trivialidade do líquido quente. Os vapores subiam em espirais preguiçosas, dissipando-se lentamente no ar como promessas feitas ao vento, Hye-Jin não desviava o olhar da superfície polida da mesa, seus olhos estavam perdidos em um ponto invisível ─ um reflexo de algo muito maior se desenrolando dentro dela, o café era apenas um adereço no cenário, esquecido pelo peso de suas mãos entrelaçadas sobre o colo. Do outro lado, Jun-Ho também estava imóvel, seus dedos tamborilavam contra a madeira da mesa em um ritmo quase imperceptível, como se ele quisesse preencher o vazio sem quebrar a tensão.

─── Então, Jun-Ho.. ─ A voz da policial cortou o silêncio entre eles, precisa como o fio de uma lâmina deslizando no ar. Não era apenas controlada, havia ali uma nota sutil de provocação, algo quase imperceptível, mas que ressoou profundamente no homem. Seu olhar cravou-se nele como uma âncora, examinando cada nuance de expressão, cada movimento involuntário dos músculos faciais. Era como se ela estivesse desmontando peça por peça de uma máquina complexa, procurando pelas engrenagens que estivessem fora do lugar. ─── Por que continua insistindo em algo que claramente ninguém mais acredita? ─ As palavras saíram com tranquilidade, mas havia algo em seu tom de voz que parecia perigoso, como o fio agudo de uma faca oculta, não havia agressividade, mas um peso implícito, um convite ─ ou talvez um desafio, que deixava claro que qualquer resposta superficial seria insuficiente.

Hwang ─ até então absorto no café à sua frente, levantou o olhar com uma lentidão calculada, como se cada segundo estivesse pesando demais antes de enfrentar o questionamento. A expressão dele continuava um enigma, mas havia algo em seus traços rígidos que entregava uma tensão mal contida, ele apertou a colher que segurava ─ os dedos marcados pela pressão, antes de soltá-la de repente. O silêncio retornou, mas já não carregava a ─ desconfortável, neutralidade de antes, agora, era uma expectativa impregnada, densa como o vento antes da tempestade. Cada minuto parecia vibrar com a tensão crescente enquanto ela aguardava a resposta que sabia que viria ─ uma resposta que ele talvez não preferisse dar, mas que já parecia inevitável diante do peso de seu olhar.

─── Porque ninguém mais vai fazer isso por ele. ─ A resposta veio firme, mas por trás dessa fachada gélida, havia algo mais profundo ─ um fiapo de amargura que se infiltrava nas palavras, traindo a indiferença que ele tentava projetar. ─── In-Ho é meu irmão, fora minha mãe, ele é a única família que tenho de verdade. ─ A voz vacilou por um segundo, mas foi tempo o suficiente para deixar transparecer a tensão enraizada em sua melodia.

─── E isso justifica perder suas noites inteiras de sono? ─ Seu tom não era elevado, mas havia algo nele que parecia perfurar a alma do homem, era uma frieza controlada que amplificava o impacto da acusação. ─── Sabe, não é nenhum mistério o motivo de ninguém querer trabalhar com você. ─ A frase saiu com precisão cirúrgica, atingindo um ponto vulnerável que ela sabia que existia. Enquanto a última palavra ecoava, Hye-Jin manteve a postura, seu olhar desafiador ainda preso ao dele, o silêncio que seguiu não era vazio, estava repleto de uma tensão que parecia crescer a cada segundo como um elástico prestes a romper.

Ele respirou fundo antes de levantar o olhar ─ agora mais afiado, como uma lâmina desferindo um contra-ataque.

─── E você? ─ Disparou o mais alto, a voz carregada de desafio, mas tingida com um cansaço latente. ─── Parece bem confortável apontando os erros alheios.. ─ Inclinou-se para frente, diminuindo a distância entre eles, o tom endurecendo com a tensão acumulada. ─── .. Mas o que te trouxe até aqui? Porque não me parece que você faz isso por paixão à justiça. ─ Um brilho frio que parecia querer virar o jogo nasceu nas íris escuras dele, querendo forçá-la a encarar suas próprias contradições.

Hye-Jin arqueou uma sobrancelha, o sorriso que surgiu em seus lábios era discreto, mas tendencioso. Sem pressa, ela pegou sua xícara e tomou um gole pequeno, como se saboreasse mais o momento que a bebida em si, ao pousar o porcelanato novamente na mesa, seus dedos se moveram com cautela, enquanto seus olhos o avaliavam mais uma vez.

─── Eu já vi coisas que vocês, policiais de meia tigela, nem imaginam, Jun-Ho. ─ Ditou ela com uma pontada de tremor. ─── Enfrentei situações que destruiriam a sanidade da maioria dos oficiais dessa delegacia, trabalhei com operações de sigilo em Seul, missões de reconhecimento, contrainteligência e até mesmo aquelas operações que ninguém admite existir, mas que mantém o mundo funcionando nas sombras. ─ Ela recostou-se na cadeira, sem pressa alguma, assumindo uma postura relaxada e ao mesmo tempo vigilante. ─── Então, não.. não faço isso por paixão à justiça, faço porque sou boa nisso. ─ Uma pausa curta foi emitida. ─── E as vezes, ser boa é a única coisa que importa.

Jun-Ho não rebateu de imediato, seus olhos se desviaram para a janela onde as primeiras gotas começavam a dançar pelo vidro, prenunciando o retorno de uma chuva que parecia tão inevitável quanto o peso daquele diálogo.

─── Você é direta demais, sabia? ─ Pareceu mais um pensamento em voz alta do que uma resposta direcionada.

Hye-Jin deu de ombros, um gesto carregado de despreocupação.

─── Alguém precisa ser. ─ Respondeu ela, sua voz tão casual quanto seu movimento.

Hwang Jun-Ho ainda olhava para a chuva, tentando ignorar a sensação iminente que crescia dentro de si mesmo, sua expressão entregava que a batalha dentro dele estava longe de terminar.

Após a breve troca de palavras, Hye-Jin e Jun-Ho mergulharam em um silêncio constrangedor enquanto o carro seguia pela estrada, a atmosfera entre eles era densa ─ como se as palavras de momentos atrás continuassem a pairar pelo ar, com nenhum dos dois dispostos a quebrar aquela barreira. A mulher, sentada no banco do passageiro, manteve o olhar na janela, notando as luzes da cidade que passavam rápidas como borrões, o rádio ─ sintonizado em uma estação qualquer, preenchia o vazio com jingles comerciais monótonos, se não fosse por isso, o automóvel estaria envolto de um silêncio ensurdecedor.

Jun-Ho conduzia o veículo com a expressão séria e as mãos firmes no volante. A tensão era evidente em cada movimento, porém, ele não disse uma palavra sequer enquanto os levava de volta para a delegacia, ambos precisavam de um documento importante que ele havia deixado em sua sala para auxiliar na investigação do caso do seu irmão mais velho. Quando chegaram, a fachada da delegacia brilhava sob a luz dos postes ─ um contraste belo com o peso das emoções que carregavam, sem trocar olhares, os dois desceram do carro e entraram no prédio, o cheiro característico de café velho e papel os envolveu imediatamente. O policial virou-se para sua parceira e ─ com uma voz baixa e direta, instruiu-a a esperar na recepção enquanto buscava o documento.

Hye-Jin se apoiou na parede próxima à recepção, tentando aliviar a rigidez que sentia no corpo, no entanto, não teve tempo algum para relaxar. Do outro lado do cômodo, um homem começou a gritar, atraindo sua atenção. Ele estava visivelmente nervoso ─ quase em pânico, e discutia com um policial próximo ao balcão. O cidadão vestia um moletom bege amarrotado, calças jeans claras que pareciam gastas pelo uso e um boné azul-marinho que cobria parcialmente o cabelo desgrenhado, os fios longos escapavam pelas laterais, reforçando a aparência descuidada e desesperada. A mesma estreitou os olhos, interessada na cena, não era a raiva que transbordava dos poros masculinos, mas sim um desespero cru, como se cada palavra que ele dizia fosse uma súplica.

─── Então, deixa eu ver se entendi bem o que você acabou de contar: alguém te ofereceu dez bilhões de wons para participar de alguns jogos, você aceitou, jogaram batatinha frita, um, dois, três, e os perdedores foram mortos? E quando vocês decidiram que queriam sair, eles simplesmente deixaram? Você não sabe quem eram essas pessoas, nem onde fica o lugar para onde te levaram? ─ O policial repetiu a história com um tom cético, cruzando os braços enquanto olhava para o homem.

Hye-Jin ─ ainda encostada na parede próxima à recepção, observou atentamente a interação. Ela notou que outro policial mais ao fundo começou a rir, claramente debochando da narrativa absurda, o som da risada foi cortante e ela imediatamente limpou a garganta de modo audível o suficiente para chamar a atenção do risonho. O gesto foi acompanhado de um olhar frio e firme, o tipo de olhar que dispensava palavras, o policial ─ extremamente desconfortável, se recompôs rapidamente, soltando um suspiro pesado e assumindo uma postura mais séria. Embora a história do homem parecesse absurda e até mesmo delirante, Hye-Jin sabia que ridicularizar um cidadão ─ principalmente um que parecia estar em sofrimento, era completamente inaceitável. Ela manteve o foco no desconhecido à sua frente, ele tremia levemente, os ombros tensos e havia algo em seu olhar que a fez hesitar antes de descartar tudo como uma invenção. Ele parecia.. genuinamente aterrorizado.

Com a voz embargada, ele respondeu:

─── É isso mesmo.. eu achei que fosse só uma brincadeira, sabe? Tipo um reality show ou algo assim, mas aquelas pessoas.. ─ Ele parou, engolindo em seco como se revivesse as cenas em sua mente. ─── Eles morreram de verdade, eu vi! Não é mentira! Não tô bêbado!

O cheiro de álcool era inexistente no lugar, ele parecia mais abalado emocionalmente do que intoxicado com bebida.

A história parecia improvável, mas o desespero nos olhos do homem era difícil de ignorar.

─── Diga o seu nome, por favor. ─ O policial pediu com um esforço visível para manter um tom neutro, embora o ceticismo transparecesse em seu olhar. Ele segurava uma caneta sobre o bloco de anotações, pronto para registrar a informação.

O desconhecido parecia hesitar por um momento, como se ponderasse se deveria mesmo continuar, ele respirou fundo, a voz tremendo levemente quando finalmente respondeu:

─── Sou Seong Gi-Hun... Moro no bairro de Sangwoo-dong.

A resposta veio acompanhada de um olhar fixo, determinado a provar que sua história era verdadeira. Hye-Jin notou o desconforto de Gi-Hun, ele mexia as mãos de jeito inquieto, esfregando os dedos como se tentasse afastar um frio invisível, era evidente que ele estava abalado, mas havia algo em sua postura que demonstrava sinceridade, mesmo que a história parecesse completamente absurda. O policial fez uma anotação breve, sua expressão continuava sendo difícil de decifrar, apesar da neutralidade forçada, seu olhar carregava uma mistura de incredulidade e suspeita.

Após isso, Hye-Jin concluiu que não valia a pena prestar atenção na conversa, o homem ─ expressão transtornada, estendeu um cartão dourado ao policial ─ quase como se fosse uma tábua de salvação, e implorou com a voz trêmula para que ele ligasse no número impresso. As duas tentativas de ligação foram um fracasso, cada uma resultando em um misto de confusão do outro lado da linha, frustrado, o policial olhou para Gi-Hun com desdém, mas antes que pudesse dizer algo, um segundo oficial interveio. Ele segurou firmemente os ombros do sul-coreano e o arrastou para longe da delegacia, ignorando os protestos desesperados que se tornaram meros murmúrios no fundo da sala.

A mulher esperava tudo com uma expressão impassível, estava prestes a desviar sua atenção quando notou seu parceiro se aproximando. Ele carregava um envelope pardo em mãos, os olhos fixos nela com uma intensidade que a fez endireitar a postura instintivamente, sem trocar uma palavra, ele a entregou o documento, seus dedos roçando brevemente. Hye-Jin virou-se e caminhou em direção ao balcão, onde o mesmo policial sentado analisava uma pilha de papéis com a lentidão de quem já estava farto daquele turno, ela colocou o envelope sobre o balcão e viu Jun-Ho dirigir a palavra.

─── Quem era? Um bêbado? ─ Perguntou Jun-Ho com a voz arrastada pelo tédio. A postura relaxada ─ quase displicente, constratava com a energia agitada que parecia pulsar ao redor deles. A delegacia estava um caos do lado de dentro da recepção: telefones tocando sem parar, vozes se sobrepondo e o eco ocasional de passos apressados cruzando o corredor de azulejos gastos, mas Jun-Ho parecia alheio a tudo isso, envolto em uma bolha de indiferença que Hye-Jin começava a achar irritante.

─── Era só um maluco. O dia hoje está uma loucura! ─ Respondeu o policial com uma risada curta, embora o cansaço em sua voz fosse evidente. Ele ajeitou os papéis sobre o balcão, como se quisesse encerrar rapidamente aquela conversa. O sul-coreano abaixou o olhar distraidamente, mas algo chamou sua atenção, um pequeno cartão dourado reluzia contra a superfície do balcão, emitindo um brilho sutil sob a luz fria da delegacia. Seus músculos ficaram tensos, um aperto estranho tomou conta do seu peito ─ como se aquele objeto carregasse um presságio. Por um breve momento, ele ficou imóvel, os olhos fixos no pequeno cartão como se tentasse desvendar um mistério invisível.

─── Bom, vamos indo, então. Até mais. ─ Com um leve balançar de cabeça, Hwang afastou os pensamentos intrusivos, voltando à realidade. Inspirou bem fundo, deixando o ar escapar lentamente pelos lábios, como se aquilo fosse suficiente para dissipar a sensação desconfortável. Durante esse breve momento, Hye-Jin permaneceu em silêncio, observando tudo com seu olhar sereno e reservado, sem dizer uma única palavra, ela seguiu Jun-Ho para fora da delegacia, os passos ecoando no corredor vazio até alcançarem a saída.

Já era noite quando chegaram ao dormitório que Hwang In-Ho chamava de lar. O céu escuro parecia pesar sobre eles e a iluminação fraca das ruas lançava sombras alongadas nas paredes do prédio desgastado. Antes de seguirem para o apartamento, Hye-Jin insistiu em revisar o caso mais uma vez, queria entender melhor o relacionamento entre seu parceiro e o homem que estava desaparecido. Sentaram-se no carro por alguns minutos, as pastas espalhadas entre eles enquanto ela folheava os documentos com cautela, as informações sobre In-Ho eram surpreendentemente banais. Nenhum registro criminal, nenhuma dívida significativa, nenhum histórico de comportamento suspeito, apenas um homem comum levando uma vida discreta, ele parecia tão normal quanto o policial ao lado dela, cuja expressão permanecia neutra enquanto observava a rua pelo para-brisa. Jun-Ho não ofereceu muito sobre sua ligação com o desaparecido, apenas respostas curtas que indicavam mais impaciência do que vontade de colaborar.

Ele parecia absorto e Hye-Jin optou por não pressioná-lo naquele momento.

Ao entrarem no prédio, foram recebidos pela proprietária. Era uma mulher de meia-idade com um olhar severo e um tom de voz que denunciava tanto cansaço quanto impaciência, ela os levou ao dormitório de In-Ho, mas não sem mencionar o atraso no aluguel e insinuar ─ de forma pouco sutil, que aquilo precisava ser resolvido. Jun-Ho a respondeu de modo breve, sem dar margem para mais conversa, a mulher abriu a porta do quarto com um movimento rápido e saiu sem se despedir, com seus passos ecoando pelo corredor vazio. Hye-Jin a observou desaparecer antes de entrar no dormitório, o espaço era pequeno ─ quase claustrofóbico, com um ar frio e parado que parecia denunciar a ausência de vida. Os móveis eram simples e tudo estava organizado de forma quase obsessiva, como se In-Ho tivesse seguido uma rotina rígida até o último momento.

Havia uma cama perfeitamente alinhada que ocupava uma das extremidades do quarto com lençóis esticados e sem um único vinco, alguns casacos estavam pendurados em suportes de parede, sugerindo que In-Ho fosse um homem prático ─ talvez até previsível, um pequeno armário que dominava o restante do espaço, sobrecarregado com pilhas de livros organizados em pequenas estantes improvisadas. No canto do armário, um aquário sujo chamou a atenção de Hye-Jin, a água estava turva ─ quase opaca, e os dois peixes amarelos jaziam no fundo, mortos há dias pela evidente falta de alimento, a cena parecia contradizer a ordem do restante do quarto, como uma fissura em uma fachada cuidadosamente mantida.

Todavia, o que realmente prendeu a atenção da mulher foi um detalhe curioso: uma pequena caixa preta com um laço rosa delicadamente amarrado, ela estava escondida entre os livros de uma das prateleiras, mas a cor vibrante do laço se destacava em meio à monotonia do quarto. A policial hesitou por um momento, então lançou um olhar para Jun-Ho que observava a cena com atenção silenciosa. Com cuidado, ela pegou a caixa e desfez o nó, sentindo uma estranha mesclagem de curiosidade e apreensão, quando a abriu, seus olhos se arregalaram instantaneamente, como se não estivesse preparada para o que estava vendo. Dentro da caixa havia um objeto que irradiava uma estranha familiaridade, algo que parecia carregar um peso maior do que seu tamanho sugeria.

Jun-Ho ─ percebendo a reação de sua parceira, aproximou-se e se inclinou para olhar dentro da caixa. Sua expressão mudou instantaneamente, os traços de tédio e cansaço deram lugar a uma surpresa que ele raramente demonstrava.

─── Esse não é aquele... ─ Começou ela, mas sua voz falhou com a frase ficando suspensa no ar.

─── Cartão da delegacia? ─ Interrompeu ele, inclinando-se para enxergar melhor o objeto dentro da caixa. Seu tom era de surpresa contida, mas seu olhos refletiam uma perplexidade crescente, ele pegou o cartão com extremo cuidado, segurando-o entre os dedos como se estivesse manuseando algo frágil ou muito perigoso. O brilho dourado do material reluzia sob a luz fraca do quarto, confirmando suas suspeitas. ─── Parece que sim.

O silêncio pairou por alguns segundos, Jun-Ho continuou encarando o cartão, perdido em pensamentos que martelavam em sua mente com uma voracidade implacável. O que aquele cartão estava fazendo ali? Era o mesmo que o homem na delegacia havia entregue horas antes, mas agora parecia carregar um peso ainda maior. Qual era a ligação disso com o desaparecimento de In-Ho? E pior ainda, o que isso tinha a ver com o irmão que ele não via há anos? Hwang fechou os olhos por um instante ─ como se buscasse organizar o turbilhão de perguntas que surgiam, Hye-Jin observava-o em silêncio sentindo a tensão irradiar dele. Com o pouco tempo que estavam trabalhando juntos, ela havia notado que Jun-Ho não era um homem de revelar suas emoções facilmente, mas algo naquele momento era diferente.

─── Gi-Hun, de Sangwoo-dong... ─ Murmurou Hye-Jin de jeito quase inaudível, mas o suficiente para captar a atenção de Jun-Ho.

─── O quê? ─ Perguntou ele com a confusão estampada em seu rosto.

A morena não respondeu de imediato, seus olhos estavam perdidos em um ponto distante como se tentasse conectar todas as peças de um quebra-cabeça que finalmente começava a fazer um pouco de sentido e então, repentinamente, ela se moveu com a urgência de quem sabia que o tempo estava contra si.

─── Cadê a chave do carro?

Jun-Ho ─ pego de surpresa, levantou as chaves em um reflexo impressionante, antes que pudesse dizer ou fazer qualquer coisa, Hye-Jin as pegou de sua mão com um gesto rápido.

─── Leva o cartão, vamos atrás daquele cara esquisito.

Jun-Ho guardou o cartão dourado no bolso interno do casaco, sua expressão apática enquanto seguia os passos determinados de sua companheira de trabalho, ele sabia que o apartamento de In-Ho poderia guardar ainda mais perguntas do que respostas, mas não esperava que algo tão pequeno como aquele cartão dourado os levaria de volta àquele homem da delegacia, cujas palavras haviam soado desconexas e irreais horas atrás. Do lado de fora, o ar gélido da noite os envolveu enquanto Hye-Jin ligava o carro com uma pressa febril, Hwang sentou-se no banco do passageiro, lançando um último olhar ao prédio silencioso. Ambos sentiam que algo estava prestes a mudar ─ como se estivesse seguindo uma trilha que poderia desvendar muito mais do que esperavam, e talvez mais do que estavam prontos para enfrentar.

─── Estamos criando uma rota para o bairro de Sangwoo-dong, siga reto e vire a primeira direita.

A voz robotizada do GPS se fez presente no automóvel e logo a norte-coreana deu partida no carro.

Eu sou suspeita a dizer que amo a Hye-Jin e o jeito como ela é direta com tudo! Uma patroa, uma diva, eu deixaria pisar em cima de mim e ainda pediria desculpas por respirar o mesmo oxigênio dela 🛐 gostaram do capítulo? votem e deixem um comentário para ajudar no engajamento da história, até uma próxima vez < 3

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