Capítulo 26 - Eu prometo

Os seguranças conseguiram acalmar a multidão com a ajuda dos policiais que foram chamados com urgência. Os médicos entraram no prédio às pressas e finalmente foram levados para uma sala segura.

— Sinto muito por isso — Vanessa falou, depois de ver o estado que Gustavo ficou. Tinha restos de tomate por toda sua roupa, cascas de ovo espalhadas e restos de folhas de alface em seu cabelo. A coreana tirou os restos de folhas dele e suspirou, com pena. — Sinto muito...

Ele sorriu, orgulhoso, se sentindo o último romântico existente.

— Estou feliz que você está melhor do que eu — sorriu.

— Achei roupas da última coleção da empresa — Dali entrou na sala, segurando as roupas. — Achei que essa combina mais com você.

Ela escolheu uma calça de alfaiataria azul marinho, uma camisa social branca, um sobretudo marrom e um tênis branco. Vanessa olhou para a amiga e sussurrou:

— Você fez de propósito? — Apontou para os tons da própria roupa.

Dali soltou uma risadinha.

Nee, nee.

Vanessa revirou os olhos. Gustavo saiu da sala e só voltou vinte minutos depois, com a nova roupa e com os cabelos penteados e molhados. A coreana sorriu quando o viu, porque apesar de Dali ter feito os dois combinarem nos tons da roupa, as peças realmente ficaram boas nele.

— Está bonito — disse, se aproximando.

— Acho que a senhorita Choi tem bom gosto — falou, e depois agradeceu a Dali com um aceno de cabeça.

— Todos prontos? — Jeong-ho entrou na sala com um segurança.

— Vamos, mas antes, quero orar.

Eles confirmaram e fecharam os olhos, em seguida, ela começou a orar, dizendo:

Appa... Obrigada por nos salvar e por me ajudar a não morrer na caminhada até aqui. Entendo a frustração e nem consigo imaginar a dor que aquelas pessoas estão sentindo, e peço que o Senhor as conforte e me ajude a lidar com tudo da melhor forma, em nome de Jesus, amém.

— Amém! — falaram juntos.

Os médicos estavam prontos para a nova coletiva, desta vez, seria dentro da empresa. Os quatro saíram da sala e entraram no espaço onde a coletiva aconteceria. Quando Vanessa entrou no palco, o burburinho começou, mas ela ignorou e seguiu o roteiro.

— Senhoras e senhores — ela disse, depois de parar atrás do púlpito, de frente para a plateia.

Os flashes vieram em seguida. Vanessa não sorriu e esperou que parassem de tirar as fotos.

— Obrigada pela presença de todos — Começou a falar. O discurso estava pronto, mas a coreana sentiu que estava frio demais e resolveu mudar alguns pontos de última hora. — Existe uma "ORGANIZAÇÃO" mundial, e meu appa, Kim Yeong-gi, era o líder deles. A organização fez de tudo para conseguir mais poder e controle. Não se preocuparam com as vidas e nem com o povo da nossa nação. A "ORGANIZAÇÃO" era pioneira em ganhar dinheiro ilegalmente, ia desde tráfico humano a subornos. Foi assim que muitas famílias perderam seus entes e...

A coreana sentiu a garganta doer por estar segurando o choro. Ela buscou o rosto de Gustavo e quanto seus olhos se cruzaram, sentiu alivio. Ele sorriu e a incentivou a continuar, e foi o que Vanessa fez.

— Como dona da Empresa Korea And Word, — dizia, deixando as lágrimas escorrerem. — Quero pedir minhas sinceras desculpas. As vidas que foram perdidas, as mulheres que nunca mais serão as mesmas, as famílias que ficaram mais de duas décadas longe de quem ama, a toda a Coreia do Sul, minhas sinceras desculpas.

Vanessa fez uma reverência longa e demorada. Com a cabeça abaixada e olhos fechados, pôde chorar mais sem ficar preocupada com as fotos e fofocas que surgiram no dia seguinte. Suas desculpas eram sinceras e as lágrimas também. Ela sentia muito.

Toda a Coreia do Sul assistia e as mulheres que perderam seus maridos por culpa da empresa, choravam do lado de fora do prédio, enquanto acompanhavam a coletiva pelo telão que foi colocado. Era como se essas mulheres finalmente pudessem remover o peso e a dor que carregavam por muitos anos. Os filhos já crescidos que, na época, não entendiam porque as mães choravam de madrugada e que não entendiam por que o pai nunca mais voltou, agora compreendia a gravidade das coisas. Agora se sentiam em paz, assim como as mães.

Enquanto Vanessa fazia a reverência, fotos das pessoas encontradas nas prisões foram aparecendo. As fotos coloridas eram de pessoas vivas, as preto e branco, de pessoas que infelizmente foram mortas por causa da empresa. As fotos dos trabalhadores também foram exibidas e embaixo delas, havia o nome de cada trabalhador.

— As pessoas que foram resgatadas — voltou a falar depois de levantar. — Estão voltando pra suas casas agora, então, abram suas portas e esperem por elas. E sobre aqueles que não podem mais ver seus entes, estamos enviando seus pertences encontrados no cárcere. Senhoras e mães dos trabalhadores falecidos, a empresa está direcionando advogados até suas casas a fim de negociar as compensações. Os demais afetados direta ou indiretamente por nossas ações, receberão as compensações também. A empresa Korea And Word está oficialmente fechando suas portas hoje e, mais uma vez, peço desculpas a todos os afetados.

Vanessa fez mais um reverência, saiu do palco e o burburinho começou. Todo mundo queria fazer perguntas, mas ela saiu antes e deixou que a secretária Kim ficasse responsável.

[...]

Vanessa saiu da coletiva e foi direto para a mansão. Tinha seguranças por toda parte e Dali, Jeong-ho e Gustavo dormiram na casa, só assim se sentiram mais tranquilos. No dia seguinte, a coreana teve que resolver as coisas da empresa junto com Dali e Jeong-ho, por isso não falou direito com Gustavo. Porém, assim que chegou em casa às seis da tarde, correu até o quarto dele e o chamou para caminhar no jardim da mansão, afinal tinham muito que conversar.

Eles caminhavam pelo enorme jardim da Mansão Kim, em silêncio. O sol estava se pondo e seus raios alaranjados deixavam o céu mais bonito.

— É bonito, não é? — Gustavo perguntou, a olhando.

Nee — respondeu e cruzou os braços em seguida. Sem coragem para olhá-lo nos olhos, a coreana abaixou a cabeça e como costumava fazer, andou lentamente enquanto chutava o ar.

Gustavo sorriu assim que percebeu o que ela fazia.

"Como senti falta daquilo" pensou, sorrindo para ela.

Ele viu um banco acolchoado próximo e tinha uma árvore de cereja ao lado dele. O holandês lembrou de como aquela árvore era importante para Vanessa e resolveu perguntar se ela queria sentar ali. Naquele dia não estava fazendo tanto frio, o vento diminuiu e só por isso conseguiram sentar no banco.

Vanessa confirmou com a cabeça e mudou a direção. Em seguida, caminhou até o lugar e sentou.

— Ainda não quer perguntar? — A coreana quis saber, pois não entendia como ele conseguiu segurar a curiosidade sobre o que aconteceu.

— Não posso negar que me surpreendi com as revelações de ontem — comentou, e coçou os olhos com a ponta dos dedos, mesmo sabendo que não deveria, e os olhos coçando era um indicativo de que deveria voltar a usar os óculos de grau. — Como tudo foi revelado em coreano, não entendi tudo. Mas nem nos meus sonhos mais loucos imaginei isso.

Vanessa suspirou e olhou para o chão.

— Não tive uma vida fácil, e nunca pude escolher o que fazer. Meus pais sempre mandavam em tudo, por isso tentei fugir da Coreia várias vezes. Mudei de nome porque tudo que me lembrava a Coreia, me lavava a ter crises.

— Tem certeza de que quer me contar? — Gustavo segurou as mãos dela.

— Estou pronta pra te contar tudo, Gustavo.

— Tudo bem... — Ele deu um beijo na bochecha dela e deixou que a coreana continuasse.

— Foi por mudar de nome e deixar minhas notas caíram na escola que fui punida, tendo que ir estudar em Harvard. Antes de começar, ganhei uma viagem para a Holanda e lá te conheci. Depois, tive que ir estudar em Harvard e conheci a Melissa e os outros. A amizade era ótima até a Melissa contar ao reitor o que eu passei com o appa...

Nesse momento, Gustavo a olhou, mas quando a fitou, percebeu que seu rosto era sereno, e o olhar carregado de paz. Por um tempo, Vanessa beirou o ódio e quase se perdeu em si mesma, porém, com o poder de Deus, ela foi percebendo que não precisava carregar muitos sentimentos e traumas, que estava tudo bem deixar ir. Ela fez isso com o passado e acabou perdoando Melissa Caller.

— Sei o que está pensando, mas estou bem... — Ela sorriu e repousou a cabeça no ombro dele. — Eu te disse, estou pronta pra contar tudo.

Ele confirmou e passou o braço pelo ombro dela, a puxando para mais perto.

— Certo... Só queria ter certeza. Pode continuar...

Ela balançou a cabeça rindo e voltou a falar:

— Depois que Melissa contou tudo, o appa descobriu, me fez sair do alojamento da faculdade e voltei a ficar sozinha. Me formei, lutei contra o appa, mas acabei passando os próximos seis anos fazendo tudo que ele queria, até que recebi sua ligação me dizendo que precisava morar no Brasil, trabalhando no hospital Caller. Eu enlouqueci, mas tive que ir, afinal Yeong-gi sempre conseguiu o que queria. Assim, fui trabalhar no hospital, te conheci e essa parte você já sabe.

— Sim...

— Então tudo mudou quando o Yung-ji se demitiu e me alertou sobre a Kézia. Fiquei preocupada, busquei investigar e só me dei conta de tudo ao chegar na Coreia, depois de sobreviver ao desastre natural. A ideia do appa era me mandar para o Hospital Caller pra usar minha influência pra comprar o Hospital, porque o Senhor Min...

— Ouvi você chamá-lo de tio, — franziu o cenho. — Então ele é ou não?

— Ele foi adotado — Vanessa saiu do abraço. — mas meu avô nunca quis lhe dar o sobrenome da família. Ele trás problemas pra nossa família desde então, por isso meus pais se afastaram. Ele só trabalha na empresa porque o vovô deixou, isso depois dele quase enlouquecer a família toda. Então apesar de ser meu tio, só o chamava assim na frente da mídia pra evitar problemas.

— Entendi... Pode continuar.

— O senhor Min estava chantageando o appa. Ele descobriu que o appa estava doente e se isso fosse vazado a empresa ia perder muito dinheiro, mais do que ele roubou. Então o appa cedeu, escondeu a doença, tentou continuar no poder da "ORGANIZAÇÃO" que controlava a Coreia. Mas eu não queria mais viver controlada por ele, precisava ser livre. Mudar de visual foi o primeiro passo, então abri o celular que Yung-ji escondeu as provas, pedi a ajuda de Jeong-ho e juntos, denunciamos tudo. Claro que o senhor Min não ia ficar quieto e tentou me parar, forjando o acidente que te fez machucar o braço, e foi por conhecê-lo muito bem que precisei ficar longe de você todo esse tempo. Tudo que carreguei com ajuda de Deus foi porque te amo demais pra vê-lo ser destruído por essas pessoas gananciosas. Eles não fariam nada comigo, mas com quem amo.

Gustavo suspirou e a puxou para um abraço. Em seguida, ficou em pé de frente para ela.

— Não fazia ideia do peso que você carregou durante esse tempo inteiro. Enquanto eu ficava chateado por você não estar pronta para me dizer o que sentia, você provavelmente chorava sozinha no apartamento ao lado.

Vanessa umedeceu os lábios e passou as mãos pela franja, as bagunçando. Na verdade, a coreana nem fazia ideia de como era corajosa e forte. Porém, ao ouvir o comentário de Gustavo, percebeu que era uma grande mulher. Se deu conta de que apesar de amá-lo com todo coração, ele não foi o responsável por sustentá-la durante o período negro. Foi seu Appa, Aquele que fica perto dos que estão desanimados e salva os que perderam a esperança, que a salvou e sustentou. Foi Deus que a tornou naquela grande mulher.

— Sinto muito, Vanessa... — confessou, a fazendo despertar dos pensamentos.

A coreana não percebeu o momento que Gustavo Mark ficou de joelhos, mas lá estava ele, ajoelhado na grama úmida enquanto o céu escurecia.

— O que está fazendo? — arregalou os olhos e tentou fazê-lo levantar.

— Eu sinto muito por não te proteger — falou e segurou as mãos dela. — Você sofreu sozinha e não teve com quem contar. Eu falei que te protegeria, mas fui tão ingênuo...

Vanessa balançou a cabeça, ela sabia que algumas decisões são tomadas de longe e afetam aqueles que estão "perto". Então, querendo ou não, por ser filha de Kim Yeong-gi, sentiria o impacto de suas decisões. Não era culpa de Gustavo.

— Ninguém é culpado... — sussurrou, dando um meio sorriso.

Gustavo levantou e a envolveu em um abraço quente e acolhedor.

— Eu sei que se pudesse ajudar, você me ajudaria, Gustavo — ela alisou os cabelos dele. — Não foi sua culpa, e mesmo demorando a entender, agora sei que também não foi minha. Só aconteceu, não vamos nos culpar, nee?

Vanessa Kim se afastou do abraço e o fitou.

Miane... — fez uma reverência. — Eu podia contar a você como estava me sentindo, mas escolhi segurar tudo. Achei que assim todo mundo ficaria bem, mas compliquei as coisas que poderiam ser mais fáceis e leves. E... — ela fez uma pausa e segurou o rosto dele com as duas mãos. — Prometo que nunca mais vou tentar levar tudo sozinha. Não vou esconder o que estou sentindo, mesmo que seja a emoção mais assustadora do mundo.

Gustavo sorriu, satisfeito com a promessa.

— Eu também prometo me importar mais. Você não quis me contar o que estava acontecendo e mesmo assim, eu deveria ler os sinais. Mas agora isso passou e quero ficar com você para sempre...

O médico a puxou para outro abraço apertado. Nessa altura, o céu escureceu dando lugar aos astros cintilantes. Apesar de a capital da Coreia do Sul ser bem poluída e iluminada, o raro evento pôde ser visto por eles. A chuva de meteoros deu ao momento um ar mais romântico e tranquilo.

Assim que saiu do abraço, Vanessa olhou para o céu e ficou de boca aberta enquanto apontava para os meteoros. Gustavo sorria como bobo vendo a animação de sua pequena coreana. Foi naquele momento que ele teve a mais absoluta certeza de que ela era a mulher mais incrível que conheceu! Eles entenderam que podiam passar o resto de suas vidas unidos.

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Oiiie, faz tempo que não venho aqui, mas tenho informações novas. 

1 - Só restam 3 capítulos + epílogo pra Woori ser finalizado. 

2 - O primeiro livro de Woori - Caminhos novos, foi revisado e sairá na amazon dia 15/12 de graça. Sei que já leram, mas podem ver a nova versão, com ilustrações e diagramação, e podem fazer avaliação tbm, ajudaria muitooooo. Além disso, o livro 1 está melhor dividido, e em breve, quando eu acabar de publicar esse ultimo livro Woori começará a passar pela nova roupagem e ficará no padrão do ebook. Os capítulos estão mais fluidos e curtos tbm, o que vai ajudar bastante na leitura. 

3 - Depois de publicar o última capítulo, deixem o livro na biblioteca ou me acompanhem pelo instagram @mirlie_hellen pois vou estar atualizando vocês sobre o último livro da série que já está sendo escrito. Ou seja, no final do primeiro trimestre do ano que vem talvez vocês já possam ler Te Entreguei Meu Tudo... 

4 - Muitoooooooo obrigada por acompanhar o livro até aqui, o apoio de vocês foi essencial, saibam disse. <3

Espero vocês no sábado que vemmmm. Deixa a sua estrelinha, tem ajudado muitooo. 

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