2. Turbilhão

Ouço a voz de Aug assim que abro a porta do banheiro.

- Vó, avisa a Cal que vamos sair hoje a noite, tá?

Sair hoje a noite...

Há muito, deixei de ser uma pessoa religiosa, do contrário, já estaria rezando três terços daqueles da minha avó. Nesse caso, não posso estar certa da cabeça. Nunca fui de sentir esse tipo de atração instantânea, um encantamento, feitiço; eu sei lá que porra estava acontecendo comigo! E isso tudo é por Augie! O mais próximo disso foi com o próprio Travis. E ainda assim, nem foi tão rápido. Demorou toda a festa de formatura da Violca pra gente dar uns beijinhos - o que valeu imensamente a pena e estamos juntos até hoje. Bom lembrar que nada muito sério, pelo menos da minha parte, mas existe uma espécie de compromisso, não posso negar.

- Sua mãe deixou este quarto pra você usar o tempo que precisar. Você já decidiu se voltará pra casa, minha filha?

- Não, vovó. Eu tenho um bom emprego, estou terminando um curso bem difícil e eu gosto muito de Londres. Não me sinto mais sozinha como antes. Também sinto a presença do meu pai lá, tem as coisas da minha tia, meus amigos... Acho que encontrei meu lugar.

- Sempre achei linda a ligação de vocês. Bem, descanse, tome um banho, e... o banheiro é ali como você se lembra - ela aponta para o fim do corredor - se precisar de qualquer coisa não exite em me chamar! Eu vou aguar algumas plantas lá no fundo.

- Vó, ela ainda chega hoje?

- Sim, meu bem, mais tarde. E teremos um jantar maravilhoso!

***

Depois de um banho relaxante, eu não conseguia pensar em mais nada além de dormir. Milagrosamente todos aqueles problemas com minha mãe, meu reencontro insólito com o Augie, o calor infernal de Orphelin Bay... Nada daquilo se prendia a meus pensamentos. Coloquei um shorts e uma regata, liguei o ar condicionado e entrei num sono intranquilo demais pro meu cansaço. Acordei num sobressalto me deparando, para o meu espanto, com o Augie sentado ao pé da cama me observando.

- Porra, o que você está fazendo aqui? - pergunto ainda ofegante.

- Menina, eu entrei aqui pra te chamar e você falava umas coisas meio estranhas, eu até...

- Falava o quê? Que coisas estranhas? Fala Aug! O que eu falava?

- Calma, calma! Não sei! Não entendi... Só quando falou meu nome eu sentei aqui e comecei a te chamar. Calma, Cal. Está tudo bem, tá? Você lembra do que estava sonhando?

Suas mãos na minha perna me fez fechar os olhos e voltar para os meus sonhos, quer dizer, pesadelos, quando Aug me segurava contra a parede e eu sentia fortemente o tamanho do seu desejo. Abro os olhos e ele já está em pé virado de costas com os braços erguidos e as mãos na cabeça. Me ajeito na cama e me sinto sufocada. O que está acontecendo? Isso é insano demais! Pareço um bicho no cio, sem controle, sem pudor. Engulo a saliva que enche minha boca e me preparo para me desculpar, tentar explicar essa loucura que recai sobre mim, ou até mesmo tentar entender o que é isso que está acontecendo!

- Aug... Tem alguma coisa muito estr...

- Cal, meu docinho, se vista bem a vontade hoje, porque vou te levar num Luau maravilhoso. Vou pegar a Adrielle e... Você lembra da Adrielle? Então, nós estamos saindo. Parece que pode ser uma coisa séria. Pois é, então, nós já tínhamos combinado há bastante tempo e agora que minha irmãzinha está aqui vou aproveitar e te apresentar um cara incrível e super legal, o Colton. Esse você não conhece porque ele mudou...

Aug dispara a falar e não para mais. Fica dez minutos falando do Colton, depois volta pra Adrielle, depois fala do Corey e do Lamar. Depois fala da Adrielle de novo e dessa vez ele apela, porque começa a falar da intimidade dos dois.

- Ela é boa, Cal. Boa meeeeesmo, sabe? A garota sabe das coisas, sabe fazer os paranauê, entendeu? Não que isso seja o mais importante, mas... confesso que isso me pegou. Fiquei louco. Tô louco por ela, já te falei? Tô muito louco nela.

Ele coloca as mãos na cintura e está ofegante. Dá um sorrisinho constrangido tenta falar de novo e para. Sua respiração está tão acelerada que mais parece que chegou agora correndo 10 quilômetros. Meu irmão olha nos meus olhos, pisca, pisca, olha pro meu decote, pisca, pisca, olha pras pernas, pisca e fica com os olhos fechados...

- Pronto? Acabou? Jesus, Aug! Parece que vai tirar o pai da forca! Se fosse a mãe podia deixar...

Ele me olha e caímos na risada. O clima começa a ficar um pouco mais leve.

- Ok. Já entendi que você está apaixonado pela Adrielle e...

- Apaixonado não, também não é assim.

- Bem, foi o que pareceu com... Deixa pra lá. Agora sobre seus amigos super legais, infelizmente terei que recusar. Eu já tenho namorado.

- Já? Como assim?

- Como assim o quê?

- Namorado? Namorado mesmo? Coisa séria?

Ele parece surpreso e até um pouco perplexo, como se eu tivesse falado que era uma sereia.

- Sim, August! Namorado. Sério. Compromisso. Fidelidade. Qual a porra da surpresa? Acha que ninguém ia querer namorar comigo, seu babaca?

- Não! Não! Claro que não! Não é isso... É só... Ah sei lá, eu só não esperava. Talvez porque nunca tenha pensado sobre isso. Nunca consegui acompanhar você desde que se mudou. Eu tentei te mandar algumas cartas, não te achei em nenhuma rede social... Você parecia que não queria mais saber da gente e nem que a gente fosse atrás de você. Eu... Senti sua falta... De verdade.

Era um muro que começava a ser quebrado. Já estava na hora de falar sobre isso, pois logo minha mãe chegaria com suas mentiras.

- Me desculpe, eu... Fui infantil e pra punir a mamãe acabei por descontar em você. Eu tenho pavor de redes sociais. Não gosto. E... Fiquei arrasada quando ela me obrigou a ir embora em 2009 quan...

- Obrigou? Como obrigou? Ela disse que você quis mudar pra casa da tia Genoveva!

- Ela disse... Era o que eu imaginei...

- No começo fiquei com raiva por você ter ido embora sem se despedir, era recente a perda do papai, mas com o tempo respeitei seus motivos e tentei contato, mas... Nunca deu certo.

- Meu Deus, ela é pior do que eu imaginava! Eu jamais iria embora sem me despedir, você não entende? A gente era... Era amigo... éramos próximos... E agora você mais parece um estranho, e-e.... desde o momento que eu cheguei.... eu to sentindo umas coisas...

- Cal, não. Por favor, não.

Me levantei e caminhei até ele. Passei a mão pelo seu rosto e aquelas sensações voltaram com agressividade. Augie tirou minha mão e a beijou. Depois me abraçou e afagou meu rosto em seu peito. Seu perfume era perturbador. Minhas mãos passeavam pelas suas costas e comecei a sentir as suas percorrerem as minhas com certa intensidade. Começamos um roçar de corpos e sua ereção era nítida. Eu não queria pensar em nada além daquele prazer gigantesco. É como se eu me colocasse numa bolha enorme de desejo e ficasse ali curtindo cada segundo. As batidas na porta nos despertaram pra realidade repulsiva do vexame e constrangimento.

Augie ficou apoiado atrás da cômoda e eu me sentei rapidamente na cama abraçando o travesseiro, tentando respirar com mais calma - missão que não parecia nada fácil.

- Entra - grito.

- Oi, minha filha... Ah! Você está aqui!Que bom, assim dou o recado de uma vez só. A mãe de vocês ligou dizendo que não vai conseguir chegar hoje. Como ela não gosta de dirigir a noite, vai dormir em algum hotel na estrada e chega amanhã cedo. Quer a família reunida para um delicioso café da manhã!

Absorvo cada palavra, principalmente a parte "a mãe de vocês". 

Merda! Merda! Merda! Porque isso tinha que acontecer logo comigo? Porque, desgraça!

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