Você acredita em milagres?
Abro meus olhos, é tudo tão escuro aqui, tão apertado. Eu não consigo me mexer mais que alguns centímetros. Não consigo me levantar. Não consigo respirar. Eu estou preso. Começo a entrar em desespero, não sei onde estou nem porque estou aqui. Por um momento entro em pânico "eu vou morrer aqui." Diz uma voz em minha cabeça, e é essa ideia que traz minhas lembranças de volta.
Eu não posso morrer.... Eu já estou morto, minha esposa, aquela vadia, ela atirou em mim. Inexplicavelmente eu não consigo sentir raiva dela, ou de qualquer outra pessoa. É estranho considerando a pessoa vingativa que costumava ser. Talvez isso seja apenas a falta de ar, a luta pela sobrevivência é mais forte que a mágoa. Mas eu também não estou respirando. "É claro que não, eu estou morto" diz a voz em minha mente e eu tenho que rir com isso.
Morto ou não, eu não pretendo ficar aqui para sempre. Empurro a madeira acima de mim. Ela demora um pouco mas cede sob minha força. Só deus sabe a quanto tempo eu estou aqui. Meu caixão deve estar podre, por isso foi tão fácil.
A tampa do caixão se parte, ela cai sobre mim junto com um monte de terra. Mesmo não precisando de ar, a sensação de ser soterrado é horrível. Eu luto com toda a minha força para escapar, cavo com minhas mãos até senti-las livres. Uso meus braços livres para me segurar e puxo meu corpo para cima. Não há uma lápide sobre minha cova e isso torna mais fácil sair.
Tomo um pouco de tempo processando tudo o que aconteceu, eu ainda não sinto raiva ou qualquer coisa do tipo. Não penso em me vingar de minha esposa ou de seu amante. Olho para cruz sobre minha cova e penso que talvez isso seja um presente de Deus, uma nova vida, sem mágoa ou ódio.
Sigo meu caminho entre as lápides para fora do cemitério. Perto de uma delas está uma garota com um buquê de rosas na mão, chorando. Eu me aproximo, ela ouve meus passos e me olha surpresa, parece enojada com a minha aparência. Mas não se afasta. Eu toco seu ombro e ela sorri para mim como se meu ato a confortasse.
Agora enquanto atravesso os portões do cemitério, rumo a um lugar que não faço a mínima ideia de onde seja, eu olho para trás. Para o lugar onde eu havia encontrado a garota.
Definitivamente um presente de Deus penso, olhando para o sangue que mancha a grama verde e a carcaça que restou da linda jovem.
Nenhum ódio, nenhuma mágoa, nenhuma vingança. "Apenas fome" digo a mim mesmo lambendo os lábios ainda tingidos de vermelho.
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