capítulo 4

"Lamentar uma dor passada no presente é criar outra dor e sofrer novamente."

William Shakespeare

- Você o ama ainda? – perguntou Melissa.

- Não sei... Talvez não, talvez sim... Ele foi muito importante. Mas faz tanto tempo que não nos vemos... Nem sei como seria encontrar com ele de novo... Mas não quero falar mais disto. Tem comida? Estou com fome, acho que não comi nada durante o dia...

- Então venha que vou te alimentar... Quer feijoada?

- Você fez? – perguntei espantada.

- Claro... Que não... – e deu risada.

- Palhaça! – comecei a rir também.

Aquela noite foi muito difícil dormir. Revirei na cama a noite toda e acordei sobressaltadas várias vezes.

Quando meu celular despertou, eu queria continuar dormindo. Resolvi dar atenção ao meu corpo e continuei na cama.

- Eiê! Vai continuar na cama? – Melissa abriu a porta e perguntou.

- Traz um café pra eu acordar – falei sentindo o cheiro do café.

- Já está aqui, toma – ela estava com uma caneca na mão – dormiu bem?

- Que nada! – sentei, mal abrindo os olhos – tive um sono muito agitado.

- Eu falei para tomar um comprimido dos meus. Não quis... – disse ela sentando na cadeira a minha frente.

- Sabe Mel, eu tenho um pouco de trauma de remédios, sempre tomei muitas vitaminas, não sei como não sou gorda. E outra coisa, eu via minha mãe se entupindo de remédios a vida toda, me dava nos nervos. Era um para dormir, outro para acalmar, mais algum para não gripar, e mais um para isso, e outro para aquilo e mais outra coisa. – tomei café e conclui – sempre tive muita pena da minha mãe, às vezes penso que ela nunca foi feliz de verdade.

- Mas por quê? Vocês sempre tiveram de tudo.

- Pois é! Para você ver que dinheiro não é tudo. Viver feliz é que vale a pena.

- Sei! Você fala assim, porque sempre teve tudo.

- Por isso mesmo, sempre tive de tudo que o dinheiro pudesse comprar, mas minha liberdade eu conquistei há pouco tempo. Trabalhando e me sustentando.

- Não sei se concordo... Essa conversa está muito boa, mas o trabalho me espera, pois fico feliz com as contas pagas e o dinheiro no banco. – levantou caminhando para porta – vai ficar em casa?

- Não! Preciso ir à galeria e ao ateliê. Se eu vou viajar, preciso conversar com a Grace e Amber.

- E o Dominic? – perguntou ela já fora do quarto.

Esse era outro problema para eu resolver.

E o Dominic?

Nem pensara nele nas últimas 24 horas.

Dominic era um homem bonito, educado, cavalheiro, inteligente...

Tudo! Mas eu não era apaixonada por ele. Por mais que eu me esforçasse... Não havia aquela química da paixão.

Eu o conheci na galeria de Arte que eu trabalhava. Ele veio com uma decoradora comprar quadros e peças para a decoração de seu apartamento.

A Eleonora nos apresentou e disse que eu era uma pintora brasileira talentosa e ele quis conhecer meu trabalho. Acabei mostrando um pouco de tudo, tanto minhas como de outros artistas. No final, ele comprou várias peças minhas para seu apartamento e mais para sua empresa. Deixou também um convite para o coquetel de lançamento de um novo software da sua empresa, em um hotel charmoso de Londres, que aconteceria há um pouco mais de um mês.

Alguns dias depois ele voltou na galeria e comprou mais algumas peças e me convidou para um café. Depois para um almoço, jantar, mais café, teatro...

E quando eu percebi já estávamos saindo frequentemente. Ele me fazia bem, era uma ótima companhia.

Ah... Aquele coquetel eu não fui, e ele disse que esperou a noite toda por minha chegada.

Certo dia ele disse que estava apaixonado por mim. E num modo muito galante ele pediu-me em namoro, eu nem sabia que existia mais isso. Como eu demorei em responder ele me beijou. Foi à sorte dele, pois gostei muito do seu beijo e de sua pegada.

Depois disto eu venho tentando... Mas... Ainda não sentia que era ele, por mais galante, romântico e inglês que ele fosse, faltava alguma coisa... E toda essa conclusão ficou mais clara depois da minha conversa com o Maurício na noite anterior. Eu procurava alguém que despertasse em mim, aqueles mesmos sentimentos que um dia eu cheguei a sentir.

Se eu não conhecesse, talvez pensasse que ele não existisse, mas eu sabia que não era verdade. Mas onde estava? Com certeza não estava no Dominic.

Agora eu precisava falar com ele que eu estava voltando para o Brasil.

- Beijos... – falou Melissa entrando no quarto – resolveu ficar na cama?

- Não! Você me deu motivos para pensar, pensar...

- Sobre o que? Domi?

- Sim, nem sei como falar com ele. Nunca falei muito da minha família... – saí da cama e estremeci – nossa que frio!

- Agasalhe bem, hoje o tempo está estranho...

- E quando não está? – perguntei.

- Te vejo a noite, qualquer novidade me liga ou passe uma mensagem. – depois de um beijo ela saiu apressada.

Estávamos no outono, mas com a chuva dos últimos dias esfriara bastante.

Assim que estava pronta para sair o interfone tocou. 'correio'. Já desci com minha bolsa, pronta para não voltar mais no apartamento.

- Outro telegrama daquele advogado de porta de cadeia, que saco! Será que ele não conhece e-mail?

Agora era uma carta. Assinei o documento e coloquei a na bolsa, somente com uma olhada constatei que era do Brasil.

No caminho eu lembrei e pensei que tinha algo diferente dos outros. Peguei para olhar o remetente: Marta Dumont Guarnielle, mamãe?

Abri com as mãos trêmulas.

Dentro do envelope estava um papel que parecia ter sido arrancado de algum caderno e estava escrito com uma letra não muito firme.

Minha amada filha,

Mais um dia que se passa.

Hoje eu escrevo mais um pouco para você.

Quero começar como sempre, te pedindo perdão por todo excesso de zelo que tive com você em toda sua vida. É amor demais.

Meu medo de perder você como eu perdi todos os meus bebes sempre foi muito grande.

Nunca conversei com você sobre isso, mas eu sempre sofri muito todas aquelas perdas. E com você eu sempre sofria por antecipação. A ansiedade sempre foi um problema na minha vida. E para me sentir segura eu precisava de você por perto e do seu pai.

Seu pai... Sempre foi um bom homem, mas acho que eu não fui uma boa esposa, sempre os meus medos e problemas... As vezes eu tinha medo dele me abandonar por não ser a esposa que ele esperava.

Eu não estou bem de saúde, nunca estive...

E tenho medo de Deus me levar e eu não ter tido a oportunidade de falar mais uma vez como eu te amo e quero te ver feliz.

Sei que você nunca me perdoou das minhas atitudes em relação ao Maurício Pilar. Eu achava que poderia te encaminhar melhor, hoje sei que erramos. Ele é uma pessoa maravilhosa e excelente médico.

Estou escrevendo esse diário para você saber como me sinto.

Te amo, Marta.

O que era aquilo? Que problema ela estava tendo, que eu não sabia? Fechei a carta e coloquei na bolsa e caminhei até a galeria.

Quando entrei no escritório Grace estava ao telefone com alguém. Sentei e peguei a carta de novo e comecei a reler. Estava tudo muito estranho. E essa agora de falar que nunca foi uma boa esposa? Ela fazia tudo por meu pai, eu acho até que ela se anulou em função disto, sempre viveu para ele e por mim.

E que diário era esse?

Tudo estava muito estranho...

- [Oiê!! Estou falando com você e parece que está em outro planeta]. – falou Grace.

- [Oi desculpe. Outro planeta eu não digo, mas em outro país sim, e mais precisamente no Brasil].

- [Não está tudo bem por lá]?

- [É isso que não sei... Tem algo acontecendo que minha família está me escondendo. Mas não sei o que é. E agora quando estava vindo recebi uma carta estranha da minha mãe... Mas tudo bem, vou resolver isso. – levantei e encostei a mesa dela – estou aqui para te dizer que estarei indo ao Brasil o quanto antes].

- [E a exposição]?

- [Eu volto a tempo. Acho... Grace eu preciso ir. Tem algo muito grave que não sei o que é. Mas sei que preciso ir].

- [Quando está pensando]?

- [Eu acho que o quanto antes melhor. Falei com dois grandes amigos e eles foram claros que não poderiam entrar neste 'assunto de família', mas que era para eu voltar. Se não fossem essas pessoas para me falar isso, talvez eu ponderasse... E sabe o que mais está me afligindo, eu não consigo falar com minha mãe. E agora recebo uma carta dela dizendo que está doente... Está tudo muito estranho. Eu preciso saber a verdade].

- [Querida, faça o que seu coração está dizendo, nestas questões de família nada como nossa presença. Se sua mãe está doente, ela vai gostar de te ver... Mas as vezes... Verdades são secretas...]

- [Obrigada Grace. – abracei minha amiga e sócia – e onde está a Amber]?

- [Está com uma enxaqueca daquelas, disse que se melhorar vem à tarde. – fez sinal para mim e falou mais baixo – eu acho que ela bebeu além da conta ontem, pois saiu com o cara da internet].

- [Ou tomou mais um fora gigantesco e bebeu para esquecer – brinquei - acho que não! O cara deve ser tão feio que ela teve que beber para esquecer].

- [Eu perguntei na hora que ela ligou...]

- [E o que ela disse]?

- [Conto pessoalmente, essas coisa não tem como explicar por telefone].

- [Então não foi coisa boa].

Levantei e fui saindo rindo da situação.

- [Estarei no Ateliê, vou ver o que preciso fazer antes de viajar].

- [Tudo bem. Tem telas para terminar]? – ela perguntou.

- [Não! Somente preciso mandar os desenhos para o catálogo e as telas já foram fotografadas. O Toss veio ontem e terminou].

- [Isto é muito bom].

As minhas 'sócias' eram duas 'peças' únicas no mundo. A Grace é toda profissional dedicada e responsável. Ela tem 45 anos, casada e dois filhos. Já a Amber é 'destrambelhada', tem 29 anos, está em um ponto da vida que precisa firmar compromisso. Está sempre na internet marcando encontros que nunca dão em nada. Eu acho que ela gosta mais de namorar pela internet que pessoalmente. Toda vez que marca um encontro, ela chega decepcionada no dia seguinte. Ela fala quase todos os dias que não vai chegar aos trinta sem nenhum compromisso.

Eu as conheci através de um professor de artes, ele disse que era um local bom que eu poderia colocar meus quadros e desenhos para serem vendidos.

Fazer curso de artes tem certo problema... O que fazer com suas peças? Virar vendedora de telas eu nunca tive essa pretensão.

Então um dia eu fui até a galeria para conversar com elas. E acabei descobrindo que estavam com problemas na galeria.

Estavam quase fechando as portas. Por dois motivos, a casa antiga que era instalada a galeria estava para ser derrubada e transformada em várias lojas pequenas. Segundo, era a falta de um capital para a nova instalação e um 'upgrade' nos negócios.

Voltei triste para casa.

Quando contei ao professor, ele disse que ficara sabendo que elas estavam tentando um financiamento ou uma nova sócia. A antiga sócia queria vender a parte dela e as duas compraram, e logo em seguida veio o pedido do imóvel. Elas estavam descapitalizadas.

- [E se eu entrar de sócia]? – falei.

Ele me olhou espantado. Eu não devia ter aparência de quem tinha dinheiro pelo tamanho do seu susto.

- [É muita grana].

- [Quanto]?

- [Não sei te falar, mas não deve ser pouco não]!

- [Você acha que elas me aceitariam]?

- [Joana, eu vou te fazer uma pergunta muito pessoal, e peço desculpa já com antecedência. Você tem capital para esse investimento? Tem pretensão de morar mesmo em Londres]?

- [Eu aqui no banco não tenho, mas minha família no Brasil sim].

- [Tem certeza]?

- [Sim. Eu prefiro ter parte de uma empresa que ficar trabalhando para outras pessoas. E tenho certeza que meus pais acham a mesma coisa. Escutei toda minha vida papai falar sobre isso].

- [Veja isso direito e depois conversamos. Posso ir com você conversar com elas, a Grace é muito amiga da minha esposa, nossa madrinha de casamento.Se der certo isso, eu ficarei contente de estar ajudando ela e você. Apesar de que eu achava que você estivesse precisando de grana, por isso a indiquei vender suas telas... Como enganamos... – foi pensativo - Os seus pais trabalham com que no Brasil]?

- [São produtores de café].

- [Grande]?

- [Médio para grande].

Ele ficou quieto... Com certeza pensando o tamanho do meu patrimônio. Eu nunca fui uma garota que ostentava o que tinha, muito pelo contrário. E depois de adulta muito menos. Sempre pensei que as pessoas teriam que gostar de mim pelo o que eu era, e não por aquilo que eu tinha.

Afinal quando eu decidi pela arte quase fui deserdada mesmo.

Depois de conversar sobre o assunto com meu pai ele pediu para eu contratar um advogado para fazer por mim essa negociação, verificar a legitimidade da empresa e todas as questões burocráticas, afinal eu era uma estrangeira e ainda por cima brasileira. E ele não manifestou nenhum impedimento sobre o que eu queria fazer, o que me causou certa estranheza. Em menos de dois meses eu era legalmente a sócia de uma galeria de artes em Londres.

Quando estávamos a procura de outro imóvel, Melissa comentou sobre um espaço perto de onde ela trabalhava que estava alugando. Era um galpão antigo, onde havia sido uma fabrica de tecido por mais de um século. Os proprietários não queriam se render a modernidade e vender para uma construtora o imóvel, eles queriam ver funcionar ali algo que fosse dar valor a beleza do prédio antigo, preservar a história daquele lugar. E nós surgimos para atenderem ao pedido deles.

Era perfeito para nossa galeria, amplo para exposições, com o pé direito bem alto e com salas grandes que dariam ótimos escritórios. Sem contar um local nos fundos que daria para ser meu ateliê totalmente independente da galeria.

Disseram que antigamente era a casa onde o dono da fábrica morava com a família durante a semana, e nos fim de semana eles iam para uma casa ao redor de Londres, uma casa de campo.

Perfeito para mim que estava a fim de um lugar tranquilo para pintar e desenhar. Outra paixão que eu estava levando mais a sério, era a fotografia. Fiz vários cursos e comprei alguns equipamentos incríveis.

Mas no último ano eu entrara na faculdade de administração, a realização de um sonho dos meus pais, e que eu estava preparando para fazer uma surpresa. Agora ficava pensando se já não devia ter contado.

Eu tentei concentrar no meu trabalho, mas estava difícil. Precisava deixar tudo em ordem para poder viajar.

Estávamos preparando uma exposição, e era em especial muito importante para mim. Iria expor meus trabalhos em grande estilo pela primeira vez. Pretendia trazer meus pais e minha amiga Denise para esse dia especial. Mas agora...

Abri meus emails e lá estava mensagem do escritório de advocacia, que agora eu sabia ser do Marco Antônio. Estava reforçando a importância da minha presença o quanto antes para resolver vários assuntos do meu interesse.

- 'Que saco!' – pensei – 'esse cara vai começar a me encher de novo'.

Fiz umas pesquisas de vôo para o Brasil,ida e volta, com permanência de 15 dias. A única opção que encontrei era ir para São Paulo e depois pegar outro vôo para Vitória. Sem pensar muito eu comprei as passagens

Lembrei que precisava conversar com o Dominic. Passei uma mensagem para ele convidando para almoçar comigo. Ele respondeu em seguida que já tinha um compromisso na hora do almoço, mas passaria logo depois para um café. Respondi que estaria no meu ateliê.

Passei uma mensagem para Denise avisando que estava com as passagens compradas. Perguntei se ela queria alguma coisa especial de Londres. Ela respondeu.

"Um Londrino, lindo de morrer, podre de rico e que ficará apaixonado por mim assim que me ver."

Eu somente podia rir dela, em seguida tocou a mensagem de novo.

"Nada de trocar as coisas mocinha, trazer um Londrino podre, que vai morrer assim que me ver."

Escutei uma batida na porta e ela foi abrindo, era o meu inglês.

Prontas para conhecerem o inglês bonitão?

Quero agradecer as leituras que a cada dia vem aumentando. 

Agradecer o carinho que sempre tem com meus livros. Toda sugestão será bem-vinda, e acolhida.

Por isso comentem, participe do nosso grupo, deixe o telefone número do celular para o whatSAp se quiser entrer no grupo.
Então participem, deixe suas estrelinhas, ela são nosso canal.
Beijos e até semana que vem. Ou até qualquer hora.

Lena Rossi

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