Primeiro Capítulo
Annabelle revirou-se na cama. Que cama deliciosa. Era a melhor cama da vida dela. Os travesseiros estavam na maciez e altura perfeitas, os lençóis eram suaves e a aqueciam bem, apesar de ainda sentir um pouco de frio por seu corpo. A sensação de relaxamento de uma noite muito bem dormida espalhava-se lentamente pelo seu corpo. Sem nenhuma preocupação no mundo, ela poderia ficar daquele jeito para sempre. Experimentou virar-se para o lado, mas ao menor movimento sua cabeça doeu de um jeito incômodo e ela interrompeu-se.
Ressaca? Ela teria bebido tanto na noite anterior para sua cabeça doer a esse ponto? Pensando melhor, sua cama em casa não era tão confortável quanto esta que se encontrava agora, além de que o cheiro do quarto era muito mais gostoso. Estaria ela em algum hotel? O que fizera na noite anterior para estar em algum hotel?
Forçou a memória o máximo que pode. Lembrou-se de Madeline e Loren, suas duas amigas. Sim, elas estavam juntas na noite anterior. Em Vegas! É isso mesmo, ela estava no meio de deserto de Nevada, na famosa Las Vegas. Annabelle sorriu. Era a primeira vez nos seus vinte e três anos que ia para Vegas. Na verdade, nunca tivera a chance de viajar muito, sendo do interior do Colorado e estudando muito e trabalhando bastante desde que se formara na faculdade para ajudar os pais a manterem uma pequena loja de mantimentos. O motivo para tal viagem, ela conseguiu recordar-se, era sua promoção no emprego. Finalmente, depois de muito trabalho duro, conseguira um posto melhor, com um salário melhor. A primeira coisa que fez, obviamente, foi sair com as amigas em uma viagem de carro pelo Oeste americano. Como Colorado é vizinho de Utah, que é vizinho de Nevada, emendaram a festa até Las Vegas, onde ela se encontrava hoje, numa cama em um hotel maravilhoso.
O que Annabelle não conseguia se lembrar é como parara em tal hotel maravilhoso. Não tinha tanto dinheiro assim e não conseguia se lembrar de onde fizera a reserva. Ainda mais, bebera aos montes na noite anterior e estava com uma ressaca incrível, o que provavelmente indicava que ela não teria voltado para casa. Na verdade, devia estar agradecendo que ainda estava viva, considerando tudo que acontecia na cidade (tendo como referência, é claro, um dos seus seriados favoritos: CSI Las Vegas).
Abriu os olhos e encarou a parede em frente a ela. Era cor de creme e tinha uma porta branca nela, com enfeites dourados. Em cima de uma mesinha cabeceira ao seu lado havia uma chave, um celular, um pacote de balas aberto e um relógio eletrônico que brilhava em neon dourado o horário. Dez horas e quarenta e três minutos da manhã. Mas a coisa que mais chamou sua atenção na mesinha cabeceira foi a alça de um sutiã, muito provavelmente o seu, encaixada no puxador da gaveta. Fazendo um esforço para inclinar-se, enxergou o resto do sutiã pendurado ali - confirmando que era mesmo o seu - e de bônus encontrou no chão sapatos brancos de salto alto - que definitivamente não eram seus - próximos de um vestido volumoso e brilhante branco. Annabelle de fato estava nua, algo que havia notado há algum tempo, mas caso se recordava bem, na noite anterior tinha chegado a Las Vegas com um vestido preto curto com alças regata, além de uma sapatilha. Não tinha ideia de que vestido era aquele no chão do quarto, nem por que diabos estaria dormindo nua.
Ao mesmo tempo em que teve um súbito mau-pressentimento, ouviu algo atrás de si que causou-lhe arrepios pelo corpo todo. Um ressonar baixo. Annabelle, pela primeira vez desde que acordara, percebeu que o tempo todo não estivera sozinha naquela cama.
Annabelle sabia o que podia ter acontecido. Ela ouvira muitas histórias sobre bebidas e noites que falavam sobre isso. Só que ela recusava-se a acreditar que tinha acontecido com ela, não podia ser verdade. Enquanto virava-se, mesmo com a cabeça dolorida e o coração acelerado, seus pensamentos estavam a mil enquanto buscava uma sensação razoável para o que quer que tivesse acontecido na noite anterior. Porque o que era óbvio, na opinião dela, tinha que ser mentira.
Ao completar a volta em seu próprio corpo nu, Annabelle deparou-se com um homem adormecido ao seu lado.
Um homem completamente desconhecido.
Sua primeira reação, é claro, foi utilizar suas cordas vocais para soltar um grito rouco. Logo depois, ao notar que o homem abriu os olhos de súbito, puxou todas as cobertas possíveis para cobrir seu corpo enquanto recuava para longe do desconhecido. Suas ações não deram muito certo, pois, ao notar a garota em frente a ele, o homem também reagiu do jeito dela, puxando a coberta para si e, estando à beirada da cama, rolando para fora da mesma levando todos os pedaços de pano possíveis consigo. Annabelle, frustrada e nua da cabeça aos pés, avistou um roupão dobrado em uma cadeira e correu até ele para cobrir-se, enquanto o homem remexia-se em um embolorado de lençóis.
- Quem é você?! - ouviu uma voz rouca e grave vindo daquele amontoado. Era impressão dela ou ela acabara de ouvir um sotaque britânico? A cabeça do homem finalmente surgiu e ele a espiou, com um olhar desconfiado.
- Eu que devia perguntar isso! - ela apontou para ele, usando a mão esquerda, já que a direita estava ocupada segurando um cinzeiro que havia achado por ali. Apenas por precaução. Sua mira era melhor com a mão direita. Ela esperava.
O homem voltou a arregalar os olhos ao ver a mão de Annabelle apontada para ele.
- Você é casada?! - ele pareceu preocupado, e imitando o movimento dela, apontou seu dedo acusadoramente, como se isso fosse o maior problema ali. Annabelle, surpresa com tal ousadia, notou a mão do homem e com surpresa percebeu que, apesar do que ele a acusava, em seu dedo anelar também brilhava uma aliança dourada.
- Como é que você pode falar uma coisa tão acusadoramente, quando você também é?! - ela rebateu. Estava óbvio pela situação dos dois que eles haviam passado a noite juntos, mas se tivessem que encarar os cônjuges do outro, aquela situação se tornaria uma grande bola de neve. - Sua mulher deve vir atrás de mim com uma faca se descobrir que dormi com você! - afinal, esposas de caras tão bonitos como ele normalmente acabavam sendo possessivas e ciumentas. Annabelle não conseguia acreditar em como se metera em tal confusão em apenas uma noite.
- Como assim? Olhando pra você, seu marido deve ser um cara muito protetor! Eu nunca mais vou poder sair na rua! - ele reclamou, o rosto avermelhado. Ele levantou-se, ainda usando os lençóis como roupa provisória, passando a mão no cabelo loiro escuro.
Annabelle ia retrucar de forma ácida mas finalmente a voz da razão falou mais alto do que a dor de cabeça e ela percebeu toda a besteira que estava falando. Estava tão nervosa com a situação que demorou todo aquele tempo pra lembrar um fato muito importante sobre sua vida pessoal.
- Mas eu não tenho marido. - ela franziu a testa, olhando para o anel em sua mão esquerda. Era obviamente uma aliança de casamento.
- O que? Como assi...? - o desconhecido ia começar a rebater o que ela dissera de forma irritada quando interrompeu sua fala, o olhar perdido em algum ponto em cima da cabeça de Annabelle. Acompanhando os olhos castanhos do homem, ela encontrou uma grande faixa branca com os dizeres em dourado: "Parabéns pelo Casamento!". Nos pontos em que a faixa se prendia à parede havia bexigas douradas em formato de coração e o resto do quarto estava decorado com pétalas de rosas.
- Nós... nós... nós... - ele parecia não conseguir montar uma frase completa agora que a verdade estava exposta.
Annabelle mantinha-se quieta. O que era aquilo? Ela havia se casado? Ela ia passar uma noite em Vegas para aproveitar sua promoção e casara-se com um bonitão desconhecido? Recusando-se a aceitar a realidade, passou a observou o quarto e começou a preocupar-se com o preço do hotel. Ela havia sido promovida, sim, mas isso não significava que poderia arcar com as despesas daquilo tudo. Havia objetos no quarto que pareciam tão caros que ela achou que teria que pagar só de olhar para eles.
Apesar de tudo, não conseguia afastar nenhum pensamento. O que os pais dela diriam dela? Eles eram pessoas simplórias que acreditavam no amor e esperavam que ela encontrasse um homem bom e se casasse com ele quando quisesse. Como explicaria que ficara bêbada e se casara com um desconhecido? Como seria sua vida como divorciada aos 23 anos de idade? E suas amigas? Onde estariam suas amigas? Ela precisava saber se elas estavam bem também. E se todas houvessem se casado?! Talvez assim Annabelle se sentisse menos pior. Não! Não podia pensar dessa forma.
- Oi! Estou falando com você!! - seu "marido" encarava-a e ela percebeu que ele havia se aproximado enquanto ela pensava sobre tudo aquilo. Olhando de perto, mesmo com a barba por fazer e um olhar cansado de ressaca, ele era realmente bonito. Bom, um ponto positivo na coisa toda. Annabelle só torcia para ele ser rico também, senão aquele hotel seria um grande problema.
- D-desculpe. - ela murmurou, ainda chocada com tudo. O homem suspirou.
- Nós nos casamos. - ele disse, sério. Annabelle arqueou as sobrancelhas. O que ele era, burro?
- Ah jura? - retrucou, ironicamente.
- Olha aqui, você acha que pode ser engraçadinha? Isso é um grande problema! - ele reclamou.
- E você acha que é um grande problema só pra você, espertão? Se é tão burro pra eu ter que dizer isso, um casamento envolve duas pessoas e afeta a vida das duas. Eu nem ao menos sei seu nome!
- Quem você está chamando de burro?! - ele fez uma careta e segurou os braços dela, encostando-a na parede. Annabelle sentiu o coração disparar de medo ao vê-lo próximo daquele jeito, o aperto dele machucando seu braço.
- Me solta. - sua voz tremeu quando ela sussurrou e ele arregalou os olhos de leve, afrouxando o aperto até que suas mãos caíram na lateral de seu corpo seminu. Os lençóis ainda enrolavam-se em sua cintura e Annabelle notou uma ponta de tatuagem que aparecia próxima do pescoço dele, mas não conseguia ver nada mais do desenho. O que ele era, um delinquente? Ela havia se casado com um líder de gangue? Com um traficante? Como tal coisa podia acontecer para ela?
Antes que qualquer um pudesse falar outra coisa, ouviram um toque de celular que Annabelle reconheceu como seu. Esquivando-se do corpo do mais alto, correu até onde o som estava e encontrou o nome de Madeline na tela. Aliviada que a amiga estava bem e por estar longe daquele desconhecido, grudou o celular na orelha.
- Maddy! - grunhiu, sentando-se no chão ao lado da cama que dormira. Espiou o homem, para ver se conseguia enxergar sua tatuagem, mas ele estava de frente para ela, abaixando-se para pegar uma camiseta no chão.
- Ai meu Deus Belle, então você está bem! - a voz da amiga transbordava alívio.
- É, mais ou menos. - Annabelle respondeu, murmurando. - Você está com Loren?
- Estou, encontrei-a perdida um pouco mais cedo. Não sei como pudemos nos separar desse jeito ontem à noite! Nenhuma de nós tem ideia de onde você esteja!
- Pois é, você pode me incluir nisso. - ela soltou uma risada desanimada ao constatar que, além de estar com um homem que não tinha ideia de quem era, também não tinha a menor pista de que hotel estaria e onde ele se localizava em Vegas.
- O que você quer dizer? O que aconteceu? Você está bem mesmo? - Maddy começou o bombardeio de perguntas e a cabeça dolorida de Annabelle não estava pronta para responder tudo aquilo. Até porque ela mal digerira tudo aquilo que acontecera ainda.
- Maddy, escuta. Eu tenho que ver umas coisas aqui. Eu ligo mais tarde. - já sabia que as amigas estavam bem então agora era hora de se preocupar com ela mesma. Ignorando o que mais que Madeline estava falando, desligou o telefone e levantou-se, sentindo-se tonta. Como ela resolveria aquilo? Preferiu sentar na cama, de costas para onde ele estava de pé, e fechou os olhos.
- Howell Cardins. - ela ouviu e, abrindo os olhos, virou-se para encarar o homem. Deparou-se com ele todo vestido, uma jaqueta preta por cima de uma blusa azul marinho com gola em V, jeans escuros rasgados.
- Desculpe?
- Meu nome. Você disse que nem ao menos sabia quem eu era. Bem, meu nome é Howell. - ele deu ombros e passou a mão novamente no cabelo. - Todo mundo me chama de Howl, então você pode me chamar assim também.
- Certo. - ela disse e percebeu que deveria se apresentar também. - Sou Annabelle Gardens. Você pode me chamar como preferir.
- Tudo bem, Annabelle. - ele deu um sorriso mínimo e ela teve que admitir que gostava, mesmo que um pouquinho, do jeito que ele pronunciava seu nome.
- Você é britânico? - decidiu perguntar e ele colocou as mãos no bolso.
- É bem fácil de notar, não é? - o sorriso dele alargou-se um pouco e ela reparou que ele ficava mais bonito assim. Annabelle, isso não é coisa para se reparar quando se está envolvida nesse problemão, pensou. - Desculpe por ter te segurado. É só que... - ele soltou o ar e esfregou as mãos no rosto. - Isso é péssimo. Esse é um problema dos grandes.
- Tudo bem. - apesar de que ela ainda se sentia um pouco assustada em relação a ele. - Eu sei que é. - cansada de olhar para trás, voltou seu rosto para frente. - Mas tenho certeza que se conseguirmos um bom advogado e explicarmos a situação, podemos resolver o divórcio o mais rápido possível. - ela falava aquilo, mas na verdade na inocência de seus vinte e três anos, não tinha ideia de como documentação de casamentos funcionava, ainda menos como a documentação de divórcio seria. E como os casamentos em Vegas funcionavam? Ela não tinha nem ideia disso.
- Sim. Vamos dar um jeito. - ele contornou a cama e sentou-se ao lado, entregando-lhe um pedaço de pano preto. Annabelle reconheceu seu vestido, e perguntou-se como ele estaria ali. Será que vestira o vestido de noiva por cima dele? Talvez fosse melhor assim.
- Obrigada.
- Quem era no telefone? Sua amiga? - Howl perguntou, encarando-a.
- Sim. Vim com duas delas, mas não sei onde elas estão nem como nos separamos na noite anterior. Mas estão bem. Você está sozinho? - Annabelle sentia-se envergonhada com tal conversa superficial. O que eles estavam fazendo?
- Não, vim com dois amigos também. Talvez eles estivessem conosco quando... a gente... sabe... - ele resmungou a parte final. Annabelle suspirou. Antes que pudessem continuar a conversa, foi a vez do celular de Howl tocar e ele saiu do lado dela para atender. Levantando-se, Annabelle caçou sua roupa íntima jogada pelo quarto e dirigia-se ao banheiro para se trocar quando Howl, em um meio grito, falou um palavrão e se jogou na direção da TV.
Assustada com a reação do rapaz, Annabelle parou e observou até que ele parou num canal americano de fofoca, em que cenas confusas e gravadas de telefone apareciam na tela. Howl soltava um palavrão atrás de outro, mas a garota ainda não tinha entendido a situação. Focou-se menos nas imagens - que pareciam de um casamento - para prestar atenção à voz nasalada e irritante da narradora, que explicava aquilo tudo.
- OH-MY-GOD! Como vocês podem ver nas imagens submetidas por telespectadores do I!Gossip, mais um dos nossos queridinhos foi vítima de um inesperado casamento! O alvo da vez visto ontem por fãs, casando-se com uma completa desconhecida, em Las Vegas, é Howl, sim, o nosso Howell-deus-Cardins! Coitadas das fãs de Compass~, que nunca esperavam algo assim do bom moço da banda! Que dor no coração!
Howl, que aparentava estar solteiro todos esses meses, e sendo o mais comportado da banda, casou-se ontem com uma garota de identidade ainda desconhecida, completamente bêbado (mas feliz) na Capela Tru Luv em Las Vegas! Você pode ver algumas fotos e vídeos do nosso ídolo pop com a garota, que até que não é de se jogar fora hein! Que menino safadinho!
Mas é mesmo uma pena! Será que a imagem do Compass~ será afetada por esse deslize de Howl? Será que foi um casamento intencional, ou uma catástrofe resultada de muito álcool? Depois dos escândalos dados por Chad Lynn e Mitch Jones que têm mantido o grupo em alta, mas trazendo várias dores aos corações das fãs, será que acabaram as esperanças, agora que Howl rendeu-se? E essa garota desconhecida, será que é uma fã que planejou algum golpe para conquistar o ídolo, ou há toda uma melancólica história de amor por trás de tudo? Continuem ligados na I!Gossip que traremos todas as informações assim que possível!
Howl ainda falava muitos palavrões e algumas outras palavras para quem quer que estivesse do outro lado da linha telefônica, mas Annabelle mal conseguia se mover. Ainda segurando as roupas, ela encarava a TV que mostrava mais e mais fotos e repetia várias vezes o mesmo vídeo curto de - agora ela enxergava bem - ela e Howl se casando na noite anterior.
- MAS QUE BOSTA! - Howl gritou, levantando-se e jogando o celular com força na cama. Annabelle assustou-se com a reação dele e encarou-o. Howl também olhou para ela e soltou um suspiro.
- Você... - a voz de Annabelle mais uma vez falhou e ela apertava com força as roupas em seus braços. - Você é... famoso?
Houve silêncio por alguns longos segundos e então Howl respondeu.
- Eu te disse que era um grande problema.
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