Feliz Jeitinho Brasileiro De Ser Feliz
O Natal, talvez por ser uma celebração com raízes capitalistas, falso-religiosas e frequentemente segregadoras, sempre me deixou melancólica. Desde a minha infância, mesmo sem entender plenamente o conceito de luta de classes, eu já observava com tristeza a desigualdade ao meu redor. Enquanto poucos tinham muito, as pessoas que viviam do outro lado do córrego mal tinham o essencial. Luzes coloridas, Papai Noel, árvores de Natal e presentes eram sonhos negados à maioria de nós.Nos anos 1990, algo começou a mudar. As "festividades natalinas" passaram a alcançar mais brasileiros. Não com o luxo e a fartura das elites, mas com pequenos sinais de inclusão. No primeiro Natal sob a presidência de Lula, vimos essas mudanças se tornarem ainda mais evidentes. Mesmo as casas mais humildes exibiam o brilho dos pisca-piscas e pequenas árvores de Natal. O peru, o Chester e o mítico tender ainda não estavam nas mesas das famílias mais pobres, mas havia churrascos no quintal, o salpicão da Dona Lília, a batatonese da Áurea e aquele porquinho à pururuca que fazia qualquer um salivar. Mais do que comida, havia risos, histórias e um sentimento que talvez fosse inédito para muitos: o de pertencer.Esse sentimento de pertencimento é algo que sempre nos faltou. Fazer parte da sociedade, ter acesso ao que nos é mostrado em propagandas e promoções de fim de ano parecia um sonho distante. Ainda assim, aprendemos a sonhar. Mesmo que nem todos os sonhos se realizem, o ato de sonhar, que nos foi tirado antes mesmo de nascermos, passou a fazer parte de nós.Sonhar em presentear os filhos como nos filmes de Natal. Sonhar em sentar-se à mesa com a família, com uma ceia decorada e iluminada. É claro que isso não é mais importante do que direitos, saúde, educação, segurança, moradia digna e emprego. Mas também é importante. Porque uma ceia de Natal, ainda que simples, é uma forma de desafiar o sistema, de mostrar que nossa alegria não pode ser manipulada.Comemos e rimos à mesa comprada em 24 prestações. Fazemos salada de frango e frango recheado com farofa e frutas. Não temos champanhe, mas brindamos com o espumante em promoção. Não damos presentes caros, mas nossos filhos sorriem ao rasgar o papel de presente comprado na lojinha da esquina. É pouco, mas é muito para quem nasceu na periferia e não conhecia nem isso antes de um maior acesso à educação e à inclusão social.Feliz Natal. Não o Natal vendido pelo mercado, mas o Natal que é só nosso. Um Natal que os mais ricos não podem ter, porque não entendem a garra de quem luta e faz o melhor com tão pouco. Essa garra não veio de bandeja, não foi fruto de uma meritocracia ilusória. Foi conquistada.Eu ainda não gosto do Natal. Se pudesse, apagaria essa "festividade" e seus significados do mapa. Mas fico feliz por todos os brasileiros que desafiam o sistema e encontram motivos para sorrir e viver esse dia à sua maneira.
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