Capítulo 20
Andrew
- Não sou o monstro que pensa que eu sou Joane. - Digo baixinho.
- Eu nunca disse que o senhor é um monstro. - Joane fala.
- Pode não ter dito em voz alta, mas com toda certeza já pensou.
- Assumo que te acho chato, arrogante, mandão, sem coração...
- Ainda não terminou? - A corto.
Joane fica toda sem graça, pois eu acho que ela acabou falando isso sem perceber.
- Me desculpe. - Ela pede.
- Se eu não tivesse te interrompido teria ainda mais coisas não é? - Questiono.
- Teria sim, não vou mentir. - Ela assume. - Apesar de pensar muitas coisas ruins a seu respeito, não acho que seja tão ruim a ponto de ser um monstro senhor.
Joane é sincera demais para mentir para mim. Ela não tem trava na língua, e se ela achasse que sou um monstro ela falaria.
Na verdade até eu não me reconheço mais, e sei que ela está errada a meu respeito. Faz tempo que perdi minha humanidade, e sinto que a cada dia que se passa me afundo ainda mais no meu mundo de escuridão.
Quando me olho no espelho não sei mais quem sou. O Andrew de antes sumiu definitivamente, e apesar de não me importar muito com isso no passado, estou começando a ficar incomodado com isso.
Comecei repensar minhas atitudes depois da convivência com Joane, mas eu ainda não sei se isso é uma coisa tão boa.
Não sei se quero baixar minha guarda e deixar alguém se aproximar, porque eu sei que no final das contas todos mentem.
Joane não seria diferente, ou seria? Ela demonstra ser uma boa pessoa, mas nunca se sabe o que realmente se passa na mente de alguém.
Olhando para ela tão frágil sobre a cama, me faz sentir culpado por ter sido tão idiota com ela esse tempo todo.
Eu nunca me importei muito com a opinião alheia, mas por alguma razão eu não gosto do que vejo em seu olhar quando ela demonstra repulsa por mim.
A culpa é minha por tratá-la tão mal, por isso não deveria esperar nada diferente vindo dela, mas apesar de tudo, sua raiva sobre mim não parece durar muito tempo.
Joane me trata melhor do que deveria, e isso não é somente porque sou seu chefe, mas porque ela tem um bom coração.
Quando Joane começou a trabalhar em minha casa eu achei que ela estava tramando alguma coisa, já que havíamos nos encontrado antes, mas conforme o tempo foi passando comecei a perceber que talvez eu esteja errado.
Uma pessoa não consegue fingir tão bem o tempo todo. Em algum momento ela faria alguma coisa que entregaria sua real intenção, mas até agora tudo o que ela tem feito é trabalhar e aguentar minhas grosserias.
Pesquisei sobre sua vida e descobri que seu pais faleceram, e agora Joane é a responsável por sua irmã caçula.
Ela poderia estar tentando ter uma vida fácil, mas esse não é o caso. Eu mesmo sou a prova viva de que sua vida não é nada fácil por minha causa, e mesmo assim ela continua firme e forte.
Eu não sei se ela é muito burra ou muito determinada, mas de uma coisa eu sei, Joane está fazendo eu me sentir culpado cada dia que se passa.
Eu a maltrato, na tentativa de não baixar minha guarda, mas isso está me deixando cada vez mais incomodado.
Tenho a sensação de que o Andrew do passado está retornando aos poucos por causa dela, mas eu realmente não sei se isso é uma coisa boa.
Eu posso apenas estar sendo cego, e sendo iludido por seu jeito de boa moça. Joane pode ser igualzinho minha ex-noiva, mas de todos os ângulos que eu a observo isso é impossível.
Ela é educada, gentil, trabalhadora e esforçada. É amorosa com todos os empregados, a até mesmo é comigo em alguns momentos, mesmo eu não merecendo isso.
Já a humilhei de várias formas, e ainda assim Joane continua me tratando como um homem decente. Parece ter esperanças que nem eu tenho sobre mim, e isso me faz eu me sentir balanceado.
No seu lugar eu já teria quebrado a minha cara e ido embora, mas ela continua aguentando tudo porque depende do trabalho para sustentar a irmã.
Tenho certeza que o que não falta é vontade de me socar, mas Joane é educada demais para perder tempo com uma pessoa como eu.
Apesar de eu complicar sua vida ela não desiste. Parece que quanto mais a maltrato, mais força ela tem para superar tudo.
- Por que está tão quieto? - Ela questiona. - Está pensando em várias formas diferentes para me matar?
- Não estava pensando nisso, mas você me deu uma boa ideia. - Sorrio de canto.
- Você não seria capaz. - Ela semicerra os olhos. - Você pode ser rude, mas não acho que seria capaz de matar uma empregada incrível como eu.
- Como tem tanta certeza?
- Eu acho que eu estive errado ao pensar que você jamais seria capaz de mudar senhor. - Joane me encara com esperança. - Apesar de tudo, acho que perdido em algum lugar ainda exista um bom homem, só precisa deixar ele aparecer novamente.
Joane é boa demais para acreditar na minha mudança, quando até eu eu já perdi as esperanças.
No passado não mudei porque não quis, mas agora que uma parte de mim deseja isso, não sei se eu seria capaz.
- Pessoas boas só sofrem Joane.
- Você está completamente errado. - Ela balança a cabeça em negação. - Pessoas amarguradas, sem amor e felicidade que sofrem.
- Talvez você tenha razão. - Assumo.
Me sento na beirada da cama, e ao olhar para ela vejo que ela não demonstra nenhuma reação com a minha atitude.
- Sofri muito e ainda sofro até hoje com a perda dos meus pais. - Ela começa a falar de repente. - Do nada perdi as pessoas que mais amava no mundo, tive que ser responsável por uma criança quando eu não sabia cuidar nem de mim mesma, e fui obrigada a abandonar meus sonhos por um tempo indeterminado. Desde então minha vida não tem sido fácil, e apesar de ter todos os motivos para ser uma pessoa amargura e reclamona, eu decidi não ser assim. Para mim todos os dias são de lutas, mas mesmo não tendo motivos eu ainda sou tão feliz com o pouco que eu tenho. - Joane sorri abertamente. - Depois de conhecer sua mãe eu percebi que sua vida também não deve ter sido nada fácil, mas você ainda pode fazer uma escolha senhor. Passar o resto da sua vida sendo uma pessoa amargurada e infeliz? Ou dar uma chance a si mesmo de ser feliz? Só você pode escolher o que fará com sua vida.
- Não acho que eu seja...
- Se você desejar você consegue. - Ela me corta. - Tudo é questão de escolha senhor.
- Por que acredita tanto na minha redenção? Por quê quer tanto que eu mude?
- Você é feliz assim senhor? - Ela retruca. - Se me disser que sim, esse assunto acaba agora.
Eu estaria mentindo se dissesse que sim, porque uma coisa que não sou a muito tempo é feliz.
- Não. - Nego com a cabeça. - Não me lembro qual foi a última vez que experimentei da felicidade verdadeira.
- Então dê uma chance a si mesmo. - Ela fala. - Basta querer.
Não sei por qual motivo estou me abrindo tanto com Joane, mas ela tem o poder de me fazer falar demais.
Eu deveria continuar sendo o chefe mau, mas por alguma razão eu não quero mais ser assim.
Posso estar sendo idiota por deixá-la ver esse meu lado mais frágil, e tenho que assumir que estou com um pouco de medo das consequências disso.
- A vida é tão curta senhor. - Ela fala. - Então não perca tempo sendo uma pessoa odiosa. Seja apenas você mesmo, e tenho certeza que será questão de tempo até ser feliz novamente.
- Talvez você tenha razão. - Dou de ombros.
Joane começa sorrir, e tenho que assumir que gostaria de congelar esse momento. Seu sorriso tem o poder de fazer meu coração se acelerar mais rápido, mas eu continuo dizendo a mim mesmo que não é nada.
- Não é estranho? - Ela questiona.
- O quê? - Pergunto.
- Nunca achei que teríamos uma conversa tão séria. - Ela me responde. - Fico esperando por seus gritos e ordens, e vê-lo me tratando com educação me deixou muito surpresa.
- Me desculpe. - Peço.
- O quê?! - Ela arregala os olhos. - Acabou de me pedir desculpas?!
- Retire o que eu disse. - Reviro os olhos.
- Meu chefe malvado acabou de me pedir desculpas, já posso morrer em paz. - Ela se joga na cama e permanece inerte.
Me aproximo dela quando sinto uma sensação ruim ao vê-la fingir que está morta, e então a pego pelos ombros e a levanto.
- Não brinque com isso Joane. - Digo com seriedade.
- Não vai se livrar de mim tão fácilmente senhor. - Ela sorri largo.
Mesmo que ela esteja sorrindo, continuo a encarando com seriedade pois não gostei da sua brincadeira.
Apesar de querer lhe dar uma bela lição, quero ainda mais beijá-la, e em um momento de loucura é exatamente isso que faço.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top