23. Seu anjo da guarda
— Caralho, Emily! De novo esse papo de amigo? Cê é burra, ou o quê? Tá na cara que o mané está afim de você.
Já faziam exatos quatro meses que Emily e Ryan decidiram dar início a um namoro e tudo continuava da mesma forma desde então. Eles aproveitam o tempo juntos e na maioria das vezes se entendiam bem, mas a aproximação de Emily e Ian vinha deixando Ryan transtornado.
— Será que dá pra baixar o tom? — constrangida, Emily correu os olhos pelo restaurante onde almoçava com o Ryan — Tá todo mundo olhando pra gente.
— E será que dá pra você ficar longe do McGuire?
— Não, não dá! — Emily afastou a cadeira, jogou o guardanapo e deixou a mesa — E quer saber? Perdi o apetite.
Ela gostava muito da companhia de Ian, eles conversavam sobre tudo e não passava por sua cabeça a hipótese de deixar que o ciúme infantil de Ryan atrapalhasse a amizade dos dois.
— Emily! Emily! — insistiu o rapaz, vendo-a sair pela porta principal do restaurante.
Era quinta-feira e como de costume, Emily iria se encontrar com Ian na livraria do centro, após o almoço. Os dois gostavam de passear por entre as estantes, à procura de algo que pudessem ler e depois trocar. Era um ritual recente, mas que fazia estreitar ainda mais o laço que os unia.
Passaram algumas horas fazendo o de sempre, mas depois decidiram pegar o caminho mais longo e tomar um sorvete.
— Acho que vou trocar Olivia por você — Emily zombou, lambuzando-se com sua sobremesa favorita — Você gosta de ler, me paga sorvetes e não passa todo o tempo falando sobre a mudança drástica da Miley Cyrus.
— E eu acho que deveríamos nos sentar, antes que você derrube esse sorvete todo — ele riu apontando um banco próximo de onde passavam.
— Engraçadinho!
Emily andou cambaleando sobre o meio fio, para mostrar que conseguia equilibrar a casquinha, ergueu a sobrancelha divertidamente e sentou-se no banco de pedra conforme ele indicara.
— Como estão as coisas com Ryan? — Ian disparou, se acomodando ao lado da moça.
— Péssimas! — assumiu — Tivemos uma briga feia antes de nós nos encontrarmos na livraria. Ele não entende que somos apenas amigos.
— Ryan sempre foi um babaca! — Ian torceu o nariz.
— Ele diz o mesmo de você! — ela imitou a careta do garoto, antes de abocanhar o restante de sua bola de sorvete.
— Está suja! — Ian desconversou.
— Você também!
Emily passou o dedo no líquido que escorria pelos lados da casquinha e sujou-lhe o nariz. Os dois riram em meio ao parque, como crianças naturalmente livres e felizes.
— Sabe, Em — a face de Ian mudara em instantes, ganhando um ar mais sério, como se quisesse lhe dizer algo, mas procurava pelas palavras certas — Quando nós nos aproximamos, eu prometi ser cem por cento sincero com você...
— Sim, eu sei disso. Mas onde você quer chegar com isso, Ian? — ela o interrompeu, distraída e ainda com dificuldades em terminar sua sobremesa.
— É que eu gosto... — ele limpou a garganta, antes de completar — Eu gosto muito de você, Emily e precisava muito te dizer isso.
Ela continuava absorta,tentando equilibrar o sorvete sem se sujar, deixando de perceber os olhos dele a encarando, como os de Evan sempre faziam quando lhe falava de seus sentimentos.
— Eu também gosto de você, Ian!
— Não, você não entende! — ele coçou o queixo, aflito por não ser compreendido — Eu quis dizer que estou me apaixonando por você, Emily.
Os olhos dela subitamente se desviaram na direção do garoto e sua fala sincera a pegara desprevenida. Emily mal respirava, tentando processar o que Ian acabava de lhe dizer. Como poderia ele estar apaixonado por ela? Ian primo de Evan a quem seu coração verdadeiramente pertencia.
— Ian, eu tenho namorado! — foi só o que lhe ocorreu dizer.
— Eu sei — ele baixou a cabeça, como se tivesse cometido o maior dos pecados — Desculpa! Apenas aconteceu, não posso evitar sentir o que sinto e esconder isso de você não me parecia certo. Entende?
Os lábios dela se moveram, mas sem emitir som algum.
— Não diga nada — Ian empurrou-lhe o cabelo para longe do rosto e sorriu sem alegria — Só espero que entenda que não podemos mais nos ver.
— O quê? Por quê? Ian, somos adultos, podemos lidar com isso de outra forma.
— Talvez você possa — ele levantou-se do banco — Mas eu não consigo mais controlar a vontade que tenho em te beijar toda vez que me conta coisas sobre sua vida, ou fala com entusiasmo sobre um livro que acabou de ler e seus olhos brilham quando me escuta falar sobre a França ou sobre qualquer país que sonha visitar — deu as costas para ela, evitando o contado visual — É quase uma tortura psicológica.
Impulsionada pela raiva, Emily arremessou o que sobrara do sorvete no chão, desatando a chorar ali mesmo, em um banco velho da praça, vendo Ian se afastar, sozinha e sem saber o porquê de sentir-se tão culpada.
No dia seguinte ao seu desentendimento com Ian, Emily evitara sair de casa para não ter que esbarrar com o garoto pela rua e também não foi a escola por estar sentindo-se um pouco enjoada.
Levantou-se apenas para preparar um café e voltou para a cama, ficando por lá até perto do meio dia depois, ainda de pijamas, deitou-se no sofá da sala, assistindo ao canal de filmes, enquanto esperava pela mãe.
Imersa na história, ouviu o barulho da campainha soar. Pensou ser Elizabeth que poderia ter esquecido as chaves, mas quão grande foi sua surpresa ao se deparar com Ryan, sorrindo e segurando um enorme buquê de rosas vermelhas nas mãos.
— Oi, namorada! — tentou entrar, mas ela o empurrou de volta para a varanda.
— O quê faz aqui, Ryan? Já disse que não quero arrumar mais problemas com os meus pais e ainda estou chateada com seu ataque de ciúmes durante o almoço de ontem.
— Ei, calma aí, nervosinha! Eu vim só fazer as pazes — entregou-lhe as flores e deixou um beijo despretensioso no canto da boca dela.
— Podia ter ligado. Minha mãe já deve estar chegando — ela tentava afastá-lo para longe da casa, sem sucesso — É sério, Ryan. Você precisa sair daqui agora!
— Tá bem! Tá bem! — ele finalmente cedeu, saindo de frente da casa e caminhando até seu carro — Mas antes me diga, vem comigo hoje à noite até uma boate nova que abriu no centro?
— Você só pode estar pirado. Eu não posso ir a uma boate com você, Ryan. Só tenho quinze anos.
— Arrumo uma identidade falsa pra você — instigou — Não vou embora sem ouvir um sim — cruzou os braços numa tentativa de chantagem — Você quem sabe!
Sem escolha e temendo a chegada da mãe, Emily concordou — Tá, tá... Mas agora vai embora e nos falamos mais tarde.
— E o meu beijo?
Seus olhos giraram nas órbitas, mas novamente ela cedeu, beijou-lhe os lábios com pressa e o empurrou para dentro do carro, vendo-o se afastar e podendo enfim respirar aliviada.
Voltou para dentro de casa, pensando em como faria para sair sem que os pais desconfiasse de para onde estava agindo. Bolou então uma mentira sobre ir visitar o pai de Olivia e ligou para a amiga, para que fosse seu álibi. Tal foi sua surpresa quando a mesma pediu-lhe algo em troca.
— Quero ir com vocês! — foi direta, enquanto aguardava a resposta da amiga — Vou te acobertar e em troca você me acoberta.
Emily pensou por alguns segundos.
Aquela era a única forma de sair sem ser descoberta — Ok! Vou pedir que Ryan arrume uma identidade para você também.
— Nos vemos mais tarde! — A voz de Olivia estava estranha, seca e ríspida. Mas Emily fez o que havia prometido e solicitou a identidade a Ryan que disse não ter problemas em conseguir.
Escolheu um vestido azul brilhante, sapatos altos e ousou na maquiagem. Em poucos minutos estava pronta, mas nenhum pouco animada. Lugares como aquele, não eram muito sua praia.
Ryan combinou de buscá-las na casa de Olivia, já que a mãe da menina saíra cedo e elas decidiram arrumarem-se lá, para não levantar nenhuma suspeita. Emily estava insegura com a situação. Nunca havia burlado normas daquela forma. Usar identidade falsa nunca passara por sua cabeça, já Olivia parecia bem entusiasmada em curtir uma noite diferente das festinhas em sua casa, controladas pelo irmão mais velho.
Algo parecia diferente na amiga e Emily teve de perguntar — Liv, ainda está magoada por causa do Ryan?
A amiga lhe encarou por um segundo, desviando o olhar em seguida — Ryan? Sério isso? Você passou as últimas duas semanas pendurada em meu primo Ian, me deixou totalmente de lado, isso foi o que realmente me incomodou.
Emily pode então entender a cara fechada da garota — Não se preocupe, não estamos mais nos falando.
Olivia franziu o cenho — Por quê?
Ouviu-se a buzina no lado de fora dá casa.
— Longa história, mais tarde te conto.
Olivia deu de ombros, pegou sua bolsa de sobre o sofá e andou em direção a porta, sem insistir na pergunta.
Assim que adentraram a boate, Emily foi se acalmando. A pior parte já havia passado, agora era só relaxar e se divertir. Olivia logo sumiu na multidão, como se quisesse ficar longe do casal, Emily a viu no bar, conversando com um rapaz, que parecia ter pedido algo para ela. Uma bebida. A amiga parecia decidida a ter uma noite animada e Emily não podia estragar a sua, para ficar de olho na menina.
Ryan a puxou para a pista de dança, fazendo-a desviar a atenção do que lhe preocupava — Você está linda! — sussurrou em seu ouvido, enquanto sacudiram o corpo pela pista — Estou louco para te ver sem esse vestido.
Ela foi pega de surpresa. Eles ainda não haviam falado sobre sexo e Emily nunca se entregara a outro que não Evan. Sentiu-se pressionada e intimidada pelas palavras do garoto.
— Eu não sei se quero fazer isso essa noite, Ryan.
— Relaxa, gata! — ele a beijou de maneira provocante — Vou pegar uma bebida para você, isso vai te deixar mais tranquila.
Emily se manteve pensativa, enquanto via Ryan cruzar o salão em busca das bebidas. Decidiu que precisava tomar coragem, afinal eles estavam namorando a um tempo e sabia o quanto ele deveria estar se controlando todo aquele tempo. Virou-se para, com o olhar, tentar encontrar Ryan, mas ao invés do atual namorado, Emily avistou o ex.
Evan estava encostado em um balcão, perto do bar e ao seu lado, alguns amigos que também estavam em sua festa de aniversário, com exceção de uma moça loira, essa Emily nunca havia visto. Nem ao menos sabia que Evan havia voltado. Desviou o olhar, assim que encontraram os dele.
— Aqui, gata! — Ryan a alcançava uma dose de alguma bebida diferente, da qual ela nunca havia provado antes — Beba!
— O que é isso? — ela questionou, tentando ignorar Evan e a loira incrivelmente linda os seu lado.
— Apenas beba! - Ryan ordenou — Vai ajudar você a se soltar mais.
Ela obedeceu, bebendo o conteúdo do copo de uma só vez. Seus olhos encheram-se de lágrimas e teve que se controlar para não cuspir o líquido ardente — Isso é forte!
Ryan riu com a reação da menina — A próxima fica mais fácil.
Depois de duas ou três doses de tequila, Emily ria de tudo, completamente bêbada. Ryan aproveitou-se da situação, puxou-a para um canto, a beijando de maneira afoita. Suas mãos percorriam o corpo da menina que tentava impedí-lo, sem sucesso. Estava bêbada e mesmo querendo, não conseguia livrar-se das investidas do garoto.
— Vamos embora? — as palavras dele saíram carregadas de malícia.
— Para aonde? — ela ainda lutava contra as mãos dele em seu corpo.
— Meu apartamento — falou enquanto a beijava por toda extensão do pescoço — Terminar o que você começou.
— Eu não comecei nada! — ela o empurrou, mas as doses altas de álcool em sua corrente sanguínea não lhe davam a força necessária para lutar. As pessoas ao redor pareciam não notar que a menina não estava de acordo com as tentativas do namorado, que a girou nos braços, fazendo-a nausear — Para de se fazer de difícil, Emily — ele forçou um beijo — Olha o meu estado. Seja boazinha comigo hoje.
Emily, meio zonza, girou a cabeça para trás e só conseguiu ver Evan beijando a garota que antes estava ao seu lado no bar. Era bonita, magra, alta e com cabelos dourados, extremamente brilhantes. Sentiu vontade de chorar e sair correndo, mas Ryan ainda a segurava.
— Eu não posso ir com você — Emily não conseguia disfarçar sua atenção voltada unicamente para Evan e sua parceira — Preciso sentar, estou me sentindo mal.
O garoto contrariado, seguiu o olhar da menina e finalmente entendeu — É por causa dele que você não quer ficar comigo? - deu as costas para a garota - Pois então fique com ele, vou achar quem me queira.
Emily ainda sentia-se tonta, mas tentou levantar-se e impedir que o garoto se afastasse - Espera! Como é que eu vou embora?
- Isso é problema seu - ele desvencilhou-se dela - Pede pro o Evan. Se bem que acho que ele também arranjou alguém com quem se divertir.
- Ela começou a chorar e a percorrer o local em busca de Olivia, mas parecia que a loira havia evaporado. Todos a olhavam, o choro era constante e ela nem notava os risos de deboche das pessoas ao seu redor.
Sentou-se num canto da boate e com a cabeça entre os joelhos tentava fazer com que o efeito da bebida passasse para que pudesse achar uma forma de ir embora. Não conseguia levantar-se, estava completamente bêbada e sozinha, rezava para que um anjo a ajuda-se. Seus pedidos foram atendidos.
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