Capítulo 23

Quando Victor entrou em seu quarto, viu Rafael parado no meio do cômodo com os braços ao redor do estômago de forma protetora. O rapaz mordia os lábios e parecia prestes a chorar. Victor sentiu seu coração pesar com a expressão no rosto do moreno, sobretudo quando este se esforçou para sorrir para ele.

— Sinto muito por isso – Rafael gaguejou um pouco.

— Você sente muito? – Victor balançou a cabeça descrente  – Nada disso é culpa sua, cara. Eu é quem devia me desculpar por não preparar você para isso, mas realmente não sabia que ele ainda ia estar aqui.

— Você não esqueceu de verdade de dizer a ele que eu vinha, né?

— Não – Victor bufou – Eu sabia que no momento em que eu dissesse que um cara vinha dormir aqui, ele ia surtar e desfazer as malas... E como ele acabou de dizer que desistiu da viagem, acho que eu estava certo.

— Sinto muito – Rafael apertou mais os braços ao redor de si parecendo ainda mais derrotado e Victor sentiu vontade de abraça-lo apenas para fazer aquele olhar triste desaparecer de seu rosto.

— Eu já disse: não é sua culpa – Em vez de abraçar Rafael ele acertou um soco leve em seu ombro – Ele está assim por causa da história de eu ter beijado um cara no carnaval e antes que você peça desculpas por isso – Acrescentou quando viu a boca do outro rapaz se abrir – Não foi você quem espalhou a fofoca, então, não é culpa sua também.

Rafael fechou a boca e engoliu o próprio pedido de desculpas, sabendo que o rapaz estava certo. Apesar de ter beijado Victor no carnaval, não foi esse o beijo que ganhou fama na escola, o que quer que tivesse acontecido no domingo de carnaval, ele não poderia estar envolvido, a menos que tivesse ido para a festa sob efeito de um transe hipnótico ou sonambulismo.

— Eu vou tomar banho – Victor falou, quebrando o silêncio desconfortável entre eles – Você vai tomar agora também? Se quiser pode usar o banheiro aqui do quarto e eu uso o lá de baixo.

— Não... Eu espero você tomar primeiro – Rafael respondeu, ele não queria que Victor precisasse deixar de usar o próprio banheiro por causa de estar ali e também não queria sair do quarto e se arriscar a encontrar o prefeito outra vez.

— Tem certeza? – Victor ergueu as sobrancelhas, ele acenou com a cabeça e foi recompensado com um sorriso que fez seu coração acelerar. – Tudo bem, eu vou terminar logo. – Ele escolheu uma troca de roupas e uma toalha em seu armário antes de caminhar para o banheiro – Pode se sentar e ficar à vontade.

Apesar das palavras de Victor, Rafael se sentou na beira da cama do rapaz de forma quase tão desconfortável quanto estivera sentado no sofá da sala, sua bunda mal encostando no colchão e seus braços apoiados sobre os joelhos. Ele permaneceu na mesma posição até o outro rapaz sair no banheiro cerca de 10 minutos depois.

— Quando eu disse pra você se sentar, eu quis dizer de um jeito confortável – Victor brincou quando viu a posição em que o moreno estava sentado – Não como uma prática masoquista. Minha coluna está doendo só de olhar pra você. – Rafael não disse nada, mas se ajeitou um pouco mais na cama, embora o seu desconforto ainda fosse bastante perceptível. – Sério cara, relaxa um pouco. Você parece mais nervoso perto de mim agora do que quando eu estava sendo um idiota com você.

— Eu tô tentando, só... – Rafael olhou para os próprios pés. – Eu não me sinto muito confortável na casa dos outros. Tenho sempre essa sensação de que tô incomodando.

Victor puxou a cadeira giratória da mesa do computador e a arrastou para mais perto da cama, sentando-se de frente para Rafael.

— Eu fui idiota com você mesmo sem ter motivo. Você acha mesmo que não ia dizer se você estivesse incomodando?

Apesar do tom brincalhão de Victor, Rafael podia sentir que ele estava falando sério e foi isso o que fez desviar seus olhos do chão e olhar para o outro. Victor estava muito perto... Não o suficiente para invadir o espaço pessoal, mas com certeza era perto o bastante para que ele sentisse seu coração acelerar.

— OK – Ele disse incapaz de pensar em uma resposta melhor, especialmente porque seu cérebro pareceu esquecer até mesmo qual era o assunto que eles estavam discutindo.

— De verdade? – Victor parecia preocupado – Porque você ainda está um pouco vermelho.

— Sim, eu só... Acho melhor eu ir tomar banho agora – O moreno desconversou se levantando e pegando uma sacola com roupas na mochila. Ele lançou apenas um último olhar nervoso para o outro rapaz antes de entrar no banheiro.

Victor deu de ombros para atitude estranha do rapaz e girou algumas vezes na cadeira, antes de se levantar e se jogar na cama para alcançar seu celular. A primeira coisa que ele fez foi verificar o Instagram e não pôde deixar de ficar desapontado quando percebeu que não havia nenhuma nova mensagem de Alec. Ele não havia sido respondido desde a tarde anterior, e mesmo que sua última mensagem fosse só um vídeo do Reels, ele estava ficando cada vez mais ansioso por uma resposta.

Ainda emburrado, Victor procurou o número de alguns deliveries da cidade. Ele e seu pai costumavam pedir comida nos finais de semana quando a empregada não estava e, como tinham preferência por tipos diferentes de cardápio, faziam seus pedidos separados.

— Vou pedir comida, você prefere lanche ou pizza? – Victor gritou para moreno que ainda estava no banho.

— O quê? – Veio a voz abafada pela água do chuveiro.

— Você prefere lanche ou pizza? – Ele repetiu.

— Tanto faz – Rafael respondeu previsivelmente e Victor revirou os olhos.

— Acho que não tem essa opção em nenhum cardápio – Ele respondeu irônico – Quer tentar de novo?

— Pode pedir qualquer coisa – O moreno insistiu quando a água parou fazendo o outro rapaz bufar em resposta, mas antes que Victor pudesse dizer algo mais a porta do banheiro se abriu e Rafael colocou a cabeça cheio de cachos molhados para fora. – Você pode me arrumar uma toalha?

Victor prontamente se levantou da cama e foi até o armário. Ele pegou uma toalha azul marinho, mas antes que tivesse entregado, uma ideia veio a sua mente e ele parou à uma distância segura do banheiro e sorriu malicioso.

— Vou te entregar a toalha assim que você disser o que quer comer.

— Eu realmente preciso da toalha, Victor – Rafael se espremeu um pouco mais na porta e estendeu o braço revelando o ombro e parte do tórax nus, sua pele branca salpicada por marcas de nascença. – Sem brincadeira.

— Então é bom você decidir logo – Victor balançou a toalha provocativamente – Pizza ou lanche?

— Pizza – Rafael cedeu com um suspiro.

— Ótimo – Victor sorriu e deu mais um passo na direção do banheiro antes de parar outra vez – Sabor?

— Marguerita – O moreno respondeu ainda contragosto. Se antes ele estava apenas envergonhado em ter que escolher a comida, agora estava principalmente irritado com a chantagem – Se você não entregar logo essa toalha...

— Você vai sair daí pelado? – Victor sorriu malicioso ainda balançando a toalha fora do alcance. – Não tenho nenhuma oposição a isso.

Rafael sentiu seu rosto esquentar, ele tinha certeza de que suas bochechas estavam vermelhas. Victor pareceu finalmente ter pena dele e se aproximou para entregar a toalha. O moreno a pegou depressa antes de desaparecer outra vez dentro do banheiro sem nem mesmo agradecer. Quando voltou a sair, ele viu que o outro rapaz estava deitado de costas na cama mexendo no celular.

— Eu pedi a pizza. – Ele declarou sem desviar o olhar da tela. Rafael pôde ver de relance que era o chat de Alec que estava aberto e se sentiu um pouco mal por não ter respondido. – Também pedi uma pizza doce. Ia perguntar se você tinha alguma preferência, mas tive a impressão de que a gente ia voltar pro mesmo ciclo e não tinha nada pra te chantagear dessa vez.

Rafael apenas resmungou em resposta e Victor se virou para ele, deixando o celular com a tela para baixo ao seu lado na cama. O que quer que ele fosse dizer fugiu da sua mente assim que ele viu o moreno parecendo mais fofo do que nunca sob os cachos úmidos espalhados em direções aleatórias.

— O que foi? – Rafael se assustou com o olhar fixo do outro para seu cabelo – Tem alguma coisa na minha cabeça? – Ele começou a bater as mãos sobre os cachos antes mesmo de receber uma resposta.

— Não – Victor o tranquilizou – Eu só gosto dos seus cachos.

Fosse qual fosse a resposta que Rafael esperava, não era essa. Ele podia sentir seu rosto esquentando outra vez e se sentiu ridículo pelo número de vezes que estava ficando vermelho na presença de Victor. Se continuasse assim o outro não ia demorar para perceber o quanto Rafael estava caído por ele.

— Obrigado? – O agradecimento do moreno saiu mais como uma pergunta, ainda incerto de que Victor estava sendo sincero e não apenas brincando com ele.

— De nada? – O negro replicou o tom interrogativo como uma forma de brincadeira.

— Eu sabia que você tava me zuando – Rafael bufou e, antes que Victor tivesse a chance de corrigí-lo, continuou – Acho que a gente já pode começar o trabalho então.

— Sempre é o trabalho com você – Victor revirou os olhos, Rafael abriu a boca para corrigir, mas ele foi mais rápido – Já sei, já sei, seria uma vergonha reprovar em sociologia. – Victor se sentou na cama e se ajeitou apoiando-se nos travesseiros.

Apesar de suas palavras Victor se levantou e foi até sua mochila que estava pendurada atrás da porta, enquanto Rafael pregava seu caderno e celular na que havia deixado no chão ao lado da mesa do computador. Victor voltou para cama depois de pegar o caderno e o estojo e se sentou com as costas apoiadas na cabeceira e pés em cima do colchão com os joelhos dobrados pra servir de apoio ao escrever. Rafael, por sua vez, ficou em pé ao lado da cama se sentindo um pouco desconfortável, olhando entre a cadeira e a cama e tentando pensar em que lugar seria menos estranhos sentar.

— Você sempre pode sentar no meu colo – Brincou Victor esticando as pernas sobre a cama e batendo sobre as coxas.

O comentário fez o coração de Rafael dar uma guinada assustadora em seu peito antes de tentar voltar ao ritmo normal, seu rosto ficou em um tom brilhante de vermelho enquanto ele se atrapalhava para alcançar a cadeira e vira-la.

— Então vamos começar pelas músicas, certo? – Rafael tentou disfarçar o nervosismo voltando seu olhar para o caderno. – Qual sua música preferida?

— O quão sincero eu tenho que ser sobre isso? – Essa resposta realmente chamou a atenção do moreno que desviou a atenção de seu caderno e olhou para ele – Quero dizer, qual as chances de a Celeste olhar para o relatório e dizer "Não, Victor, sua música preferida não é Baby do Justin Bieber".

— Sua música preferida é Baby? – Rafael ergueu as sobrancelhas para isso.

— Não – Victor fez uma careta e balançou a cabeça – O que eu estou dizendo é que eu não tenho que te contar a verdade, né? Nenhum de nós vai saber se o outro está mentindo e a professora também não.

— Sua música favorita é tão ruim que fez Baby parecer um exemplo bom?

— Eu não preciso te dizer.

— OK. – Rafael suspirou, mas tentou não parecer tão magoado quanto se sentia. Ele tinha que se lembrar que não era tão próximo de Victor e o negro provavelmente não confiava nele o suficiente para contar sobre assuntos pessoais. – Apenas, pode ser uma que você goste de verdade? A gente tem que ouvir a música preferida um do outro e não quero que você coloque alguma merda só para me sacanear.

— Mas seguindo a minha lógica a gente nem ia precisar... – A expressão no rosto de Rafael foi o suficiente para  fazê-lo interromper a frase – Tudo bem. – Ele suspirou antes de murmurar um "nerd" entredentes.

Victor procurou entre sua playlist até encontrar uma das músicas que não tinha vergonha de admitir que gostava. Quando finalmente encontrou o que procurava deu play e um toque animado que parecia misturar samba e rock preencheu o quarto.

"Eu não pedi pra nascer
Eu não nasci pra perder
Nem vou sobrar de vítima
Das circunstâncias"

— Essa é a versão do Sambô de Toda forma de amor – Explicou Victor para que Rafael pudesse anotar.

— Eu conheço,– Disse Rafael escrevendo em seu caderno – Acho que era a abertura de uma novela ou algo assim. – Victor concordou com a cabeça e eles ficaram em silêncio ouvindo o refrão

"A gente vive junto
A gente se dá bem
Não desejamos mal
A quase ninguém

A gente vai a luta
E conhece a dor
Consideramos justa
Toda forma de amor"

— Eu nunca tinha prestado atenção na letra. – O moreno admitiu.

— Eu também não tinha. – Victor concordou – Não até... – Ele fez uma pausa tentando decidir se poderia ser aberto sobre sua sexualidade com o rapaz a sua frente – Até me descobrir como Bi.

A reação de Rafael não foi a que Victor esperava, ele nem mesmo piscou para processar a nova informação antes de falar:

— Entendo totalmente. Quando descobri que era gay fiquei um tempo focado nessas coisas. Obcecado mesmo, – Confessou o moreno com um sorriso suave e um pouco triste – Procurando músicas e qualquer outro tipo de mídia que pudesse me garantir que eu não estava doente e o que eu tava sentindo era normal. – Quando sua confissão foi recebida com o silêncio, Rafael desviou o olhar do caderno e olhou diretamente para Victor que parecia um pouco atordoado. – O que foi?

— Nada, é só que você não parece surpreso em saber que eu sou bi.

— É porque eu já sabia – Rafael disse com naturalidade antes de perceber que na verdade era "Alec" quem sabia, ele deveria ter fingido algum tipo de surpresa quando Victor contou – Quer dizer. Imaginei. Sabe, a coisa do gaydar e tudo.

— Gaydar? – Victor bufou para a explicação e levantou as sobrancelhas – Isso é ridículo – Então uma ideia assustadora o atingiu – Meu Deus, a Laura te contou. Não, pera, ela não gosta de você.

— Obrigado por me lembrar – Rafael respondeu em um tom sarcástico – E não, ela não me contou.

— Então você ouviu ela contar pra alguém?

— Não – Ele tentou ser direto, mas era evidente que Victor queria permanecer no assunto. Para evitar a cometer outro deslize de fala, o moreno voltou sua atenção para seu celular e deu play na música que já tinha escolhido para mostrar.

Os acordes da música não eram tão tristes quanto Victor esperava, mas a voz do cantor definitivamente soava melancólica, apesar disso ele se pegou murmurando junto quando chegou ao refrão

"But I wanna feel all that love and emotion
Be that attached to the person I'm holding
Someday, I'll be fallin' without caution
But, for now, I'm only people watching"

— Eu não entendo uma palavra do que ele tá dizendo, mas até que é legal – O negro comentou quando a segunda parte da canção começou – Essa é mesmo sua música preferida?

— Eu não tenho uma música preferida – Rafael ignorou a descrença no rosto de Victor quando continuou – Costumo ficar obcecado com algumas músicas e ouvir elas muitas e muitas vezes até enjoar e depois esqueço.

— Isso é sério? Você não tem nenhuma música que significa algo para você? Sei lá, uma memória de infância, seu primeiro beijo?

— Nenhuma música em especial – O moreno deu de ombros – Eu não ouvia muita música quando era criança e tenho quase certeza que a música que tava tocando durante o meu primeiro beijo com um cara era "Malandramente" não acho que teria criado um clima legal.

Parte de Rafael queria que a última frase trouxesse alguma lembrança do beijo deles no carnaval, mas a careta de simpatia e a falta de reconhecimento em seu rosto revelaram que não era o caso.

— Ei, como é o nome da música? – Em vez de responder, o moreno entregou o celular para Victor aberto na playlist para que ele pudesse copiar.

Um segundo depois ele se arrependeu de sua decisão ao se lembrar de que suas redes sociais e aplicativos não eram protegidos por nenhuma senha. Ele prendeu a respiração durante todo o tempo que o outro rapaz levou para anotar o nome da canção, dividido entre desejar que o rapaz descobrisse tudo e o medo de que isso acontecesse.

Assim que Victor estendeu a mão para devolver o aparelho, – sem mexer em nenhum outro aplicativo que não fosse o reprodutor de músicas – Rafael deu um bote e praticamente abraçou o celular como se estivesse protegendo uma criança de um possível sequestrador.

— Prontinho: Piu-piu atchim do Corno Gay – Victor brincou fingindo ler o que tinha acabado de escrever, ele não parecia ter notado nada de errado no comportamento de Rafael, pelo menos até olhar para seu rosto – O que foi?

— O que foi o que? – O moreno tentou disfarçar, embora seu tom só deixasse claro que algo estava errado.

— Você tá estranho – Victor acusou estreitando os olhos. Rafael foi poupado de responder quando o celular do outro rapaz ganhou vida, fazendo com que ele soltasse um silencioso "Graças a Deus" quando Victor atendeu – Tudo bem, estou descendo – Ele não perdeu tempo em explicar nada para Rafael antes de saltar da cama e correr para fora do quarto.

Rafael se recostou um pouco mais relaxado na cadeira, mas assim que ouviu o som da porta se abrindo voltou a posição anterior com as costas curvadas e cotovelos apoiados sobre o caderno em seu colo.

— A pizza chegou – Anunciou Victor, equilibrando duas caixas e um par de pratos em uma mão e segurando uma sacola com duas garrafas de refrigerante e uma de catchup na outra.

O rapaz colocou tudo sobre a mesa do computador antes de começar vasculhar a gaveta do armário e tirar um notebook de aparência gasta. Ele o colocou sobre a cama conectado ao carregador e ligou, torcendo para que ainda estivesse funcionando. Desde que seu pai havia lhe dado o PC gamer – provavelmente porque se sentia culpado em esquecer seu aniversário três anos seguidos – ele não utilizava o notebook e isso já fazia quase dois anos.

Victor bateu palmas animado quando o notebook ligou e a tela de início apareceu. Ele correu até o armário e pegou uma toalha que colocou no meio da cama com as pizzas e as garrafas de refrigerante em cima, em seguida se sentou com as pernas apoiadas sobre o colchão e as costas contra um par de travesseiros na cabeceira.

Rafael se sentiu mais desconfortável ainda com o arranjo, sobretudo porque do lugar onde estava sentado ficava difícil ver a tela do notebook da forma como Victor havia posicionado. É claro que, tímido como era, o moreno não disse nada sobre isso.

— O que você está esperando? – Rafael piscou confuso para palavras de Victor até que este bateu a mão no lado vazio do colchão como um convite.

O moreno sentiu as borboletas em seu estômago ficarem totalmente alvoroçadas a ponto de sentir que poderia vomitar ali mesmo.

— Eu... Eu estou bem aqui – Ele mentiu mexendo no cabelo, tentando disfarçar o nervosismo, mas conseguindo apenas deixar mais evidente.

— Vai logo, cara – Victor revirou os olhos – Até onde eu sei você não é uma coruja pra conseguir virar tanto o pescoço sem conseguir um torcicolo.

Rafael teve que admitir que isso fazia sentido. Ele se levantou lentamente e sentou na cama no lado oposto do ocupado por Victor, suas costas apoiadas contra a cabeceira e um dos pés sobre a cama enquanto o outro continuava no chão servindo de apoio, já que apenas metade de sua bunda estava apoiada no colchão.

— Você pode chegar mais perto, eu não mordo – Victor piscou para ele antes de continuar – A menos que você queira.

A cantada clichê saiu antes que o Victor pudesse se conter. Não era que ele quisesse envergonhar Rafael, era apenas que, apesar de todos seus ficantes e namoradas – Porque ele nunca havia estado em um relacionamento sério com um cara – serem do tipo extrovertido, Victor gostava de flertar com as pessoas tímidas, as bochechas vermelhas e o sorriso tímido, mexiam com ele de uma forma diferente do que qualquer contato físico poderia.

— Eu estou brincando. – Esclareceu quando os olhos de Rafael se arregalaram e o rapaz parecia prestes a saltar para fora da cama outra vez.

Rafael lançou um olhar desconfiado para ele, ainda sentindo a mistura de euforia e ansiedade que o atingiu com o comentário, mas se obrigou a permanecer na mesma posição na cama, embora sua perna direita já tivesse começado a doer.

Victor não fez mais nenhum comentário ou piada sobre isso, com medo de que pudesse assustar o outro rapaz de verdade, e eles voltaram a falar sobre o trabalho enquanto comiam pizza.

Os dois rapidamente descobriram que falar sobre filmes e séries era um tópico bastante confortável para ambos e logo depois de discutir seus gêneros preferidos – Rafael gostava de terror e suspense com plot twists chocantes e Victor de comédias "besteirol" e ação – cada um finalmente escolheu um filme e um episódio de série que o outro deveria assistir.

A série escolhida por Rafael foi Black Mirror com o episódio "Black Museum" e foi muito divertido para o moreno ver o choque no rosto de Victor quando a reviravolta do episódio aconteceu. Demorou pelo menos dez minutos para que Victor parasse de falar sobre como tudo havia sido bizarro e como ele nunca permitiria que outra pessoa vivesse em sua cabeça, não importava quem fosse ou qual a circunstância.

Quando o negro finalmente se cansou de falar sobre Black Mirror, colocou um dos episódios de Halloween de Brooklin 99 para rodar. Enquanto o episódio passava, Victor explicava brevemente sobre cada um dos personagens. Rafael gostou. A série era leve e divertida e em alguns momentos ele teve que se conter para soltar um riso abafado ao invés da "risada de hiena" que só usava perto de seus melhores amigos.

Vinte minutos depois o episódio acabou e Rafael pediu para que ele colocasse outro, dizendo que "por causa da diferença de duração dos episódios isso era justo". Victor sabia que não era esse o motivo real, mas não discutiu e colocou outro, e depois mais outro e depois mais outro. Quando eles terminaram o episódio de Halloween da 5ª temporada – em que eles realmente cantaram "I want it that way" junto com Jake Peralta e os suspeitos – decidiram que tinham que prosseguir com o trabalho, já que tinham que ver dois filmes ainda e já eram quase 23:00.

Victor, não queria dizer a verdade sobre seu filme preferido para Rafael e optou por escolher um em seu "top 10" que era uma comédia de ação chamado "A espiã que sabia de menos" o filme era engraçado, apesar da linguagem muito mais obscena que Brooklin 99, o único problema real foi Victor ter esquecido de uma cena em que várias fotos de pênis eram mostradas, o que foi um grande constrangimento para ambos.

Apesar de ser um filme divertido, o cansaço do dia foi atingindo Rafael aos poucos. Começou com alguns bocejos e quando ele quase caiu da cama, aceitou que era melhor se ajeitar melhor no colchão que partir a cabeça na próxima vez que cochilasse. Antes que percebesse também estava abaixando para uma posição mais deitada. Seus olhos piscando cada vez mais demoradamente e trechos inteiros dos diálogos e dos comentários de Victor, até que ele adormeceu completamente.

— O que você achou? – Victor perguntou assim que os créditos começaram.

Sem ouvir uma resposta, o rapaz olhou para Rafael e bufou ao perceber que ele estava dormindo. A posição não parecia muito confortável, ele estava deitado de costas com parte da cabeça ombros ainda apoiados na cabeceira.

Balançando a cabeça, Victor desligou o notebook e deixou os pratos e as caixas de pizza com o que havia restado e as garrafas vazias de refrigerante sobre a mesa do computador decidindo que levaria para baixo na manhã seguinte.

Após jogar as migalhas que haviam caído na toalha e guardar o computador de volta no armário, o negro lançou um novo olhar para Rafael, notando pela primeira vez que seus lábios estavam entreabertos. Apesar de seu plano inicial ser acordar o moreno e mandá-lo para o quarto de sua irmã, do outro lado do corredor, ele simplesmente não tinha coragem de fazer isso, sabendo o quanto o outro devia estar cansado.

Exasperado com seu próprio coração mole, Victor separou um dos cobertores do armário e pegou seu travesseiro favorito na cama antes de apagar a luz, sair de seu quarto e ir para o da irmã. A cama de Vivian era muito menor que a sua inclusive no comprimento, ele sabia que ficaria com os pés para fora do colchão.

Ele estava prestes a deitar quando se lembrou que não tinha dado nenhum cobertor para Rafael usar. Não era uma noite muito fria, mas também não era quente o suficiente para passar sem pelo menos algo para se cobrir.

Batendo as duas mãos contra o rosto em frustração e desejando poder ignorar isso. Victor se arrastou de volta para o próprio quarto e acendeu a luz outra vez. A iluminação súbita do ambiente fez Rafael se mexer, mas ao invés de acordar, ele apenas se moveu para ficar em uma posição mais confortável.

Victor pegou outro cobertor no armário e jogou sobre o corpo de Rafael sem muita cerimônia. O moreno quase imediatamente se enrolou com ele, se transformando em uma espécie de casulo, deixando de fora apenas seu rosto e seus cachos. Olhando para ele assim, o negro não podia ignorar o pensamento intrusivo de que Rafael era bonito... E fofo.

Ele observou Rafael dormir por mais alguns momentos antes se afastar e apagar a luz, voltando para o quarto de sua irmã, pensando que se não fosse por Alec – ou qualquer que fosse o nome do cara no carnaval das bruxas – ele realmente gostaria de chamar Rafael para sair.

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NOTA DA AUTORA

Quase um mês sem atualizar, vários bloqueios, vários surtos por causa dos bloqueios, novos bloqueios por causa dos surtos, mas finalmente o capítulo novo saiu.

Espero que tenham gostado, apesar da enrolação entre os dois. Porque aparentemente a história passou de Slow burn pra "three legs turtle burn".

Até o próximo capítulo meus clichezudos 🏳️‍🌈

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