Capítulo 10
- Você pegou? - Foi a primeira pergunta de Ane quando chegou na lavanderia no Sábado às 16:00.
- A Luciana vai me matar - Foi a resposta de Rafael enquanto jogava a peruca loira para a amiga.
- Ela nem vai saber - Foi a resposta de Ane arrumando a peruca sobre a cabeça - Droga eu deveria ter lavado isso antes de usar. Deus me livre de pegar piolho com isso.
- Não se preocupe com isso, Luciana cuida dessas perucas como se fossem filhas dela. - Rafael respondeu. Seus olhos foram para a sacola que Anelise estava segurando. - O que você trouxe?
- Sua fantasia... Bem, parte dela, minha esperança era que a freira Clara tivesse trazido a roupa pra lavar ontem.
- Você quer que eu vá vestido de freira?
- Não - A garota bufou - Mesmo achando que você daria uma ótima freira de Velhaco
- É Valak - O rapaz corrigiu sabendo que a garota se referia ao filme Invocação do mal.
- Que seja - Anelise fez um sinal de desinteresse - Mas acho que você seria um dementador ainda melhor.
- Tipo Harry Potter?
- Não, tipo Chapeuzinho vermelho - A garota revirou os olhos. - Ela trouxe ou não as roupas?
- Trouxe, mas eu não posso roubar as roupas de uma freira. Você sabe o tipo de merda em que eu vou estar se alguma coisa acontecer? Aquela mulher já não gosta de mim.
- O que ela vai fazer? Parar de trazer as roupas aqui pra lavar? - A ruiva bufou - Essa é a única lavanderia da cidade, sem contar que ela já não paga pela lavagem, já que a sua madrasta é tão atenciosa com os membros da igreja. - Ane fez uma cara de nojo fingindo enfiar o dedo na garganta.
- Tudo bem. Tudo bem. - Rafael concordou - Eu vou ver se acho.
Rafael entrou na sala das máquinas e saiu minutos depois segurando um pacote de roupas recém-lavadas.
- Ótimo - Exclamou Ane, tomando o pacote de suas mãos antes que ele pudesse fazer qualquer coisa. Ela praticamente forçou as vestes pretas por sua cabeça, deixando de lado todos os componentes brancos. O "véu" preto foi jogado sobre sua cabeça, mas ficou estranho devido ao quão espetado eram seus cachos.
- Isso não vai funcionar - Decidiu Rafael, olhando para si mesmo. - Eu pareço ter saído do filme mudança de hábito de Chernobyl.
- Homem de pouca fé - Ane Zombou antes de abrir a sacola que havia trazido - Nada que grampos alfinetes e dupla face não resolva... - Ela tirou tecidos sobressalentes e os grampos e fita que havia falado e começou a trabalhar.
Rafael se sentia cada vez mais impaciente, sobretudo porque cada vez que se mexia a ruiva o cutucava com um alfinete.
- Achei que a fantasia era de dementador e não de boneco voodoo. - O rapaz reclamou quando foi espetado pela vigésima vez.
-Eu não tenho culpa se seu fogo no rabo te impede de ficar quieto por cinco minutos. - A garota resmungou, sem se desviar da tarefa - Terminei.
Rafael olhou outra vez para a roupa que estava usando e ficou surpreso ao ver que de fato pareciam com as vestes de um dementador. Ane havia prendido pedaços de pano rasgados e amarrotados na barra e nas mangas do hábito, assim como de alguma forma tinha transformado o "véu" de freira em uma espécie de capuz bastante assustador e mais comprido, bom o suficiente para esconder seus cabelos rebeldes e boa parte do rosto.
- Caralho, isso ficou muito foda - Admitiu o rapaz, arrancando um sorriso da amiga.
- O melhor é que a roupa da chatonilda é totalmente recuperável. - A ruiva olhou para a porta - Eu vou me trocar agora. A Bianca deve estar quase chegando para fazer a maquiagem.
- Desde quando você usa maquiagem? - Rafael levantou as sobrancelhas.
- Hoje nós dois usamos - Ela respondeu com um sorriso malicioso.
- De jeito nenhum - Rafael protestou - Você sabe que eu sou alérgico a essa merda... - Mas Ane já havia corrido para o banheiro deixando o rapaz falando sozinho.
Pedro e Bianca chegaram cerca de cinco minutos depois. Bianca estava vestida com um vestido vermelho provocante, uma parte de seu rosto estava pintada como um demônio, mas na maior parte a maquiagem apenas ressaltava sua beleza. Pedro por sua vez se vestia com beca e capelo preto, uma maquiagem branca e uma peruca branca armada.
- Que diabo de fantasia é essa cara? - Rafael questionou o amigo.
- Professor Tibúrcio, duh.
- Eu não acredito que você se vestiu como o personagem infantil dos anos noventa.
- Eu acredito - Bianca revirou os olhos enquanto colocava sua mochila de maquiagem sobre o balcão - Era isso ou aqueles anjos de pedra do Doctor Who e eu não tinha maquiagem o suficiente pra pintar ele todo de cinza.
- Eu achei que a ideia eram personagens assustadores... - Rafael zombou e Pedro espichou a lingua para ele.
- Vai dizer que você não tinha medo dele quando era criança?
- Um pouco. Mas sério, porque isso? Se a intenção é pegar alguém, duvido que vá rolar...
- O que? E essas coisas de fanfic? - Pedro perguntou indignado - As mina pira num professor.
- Num professor gatão interpretado pelo Henry Cavill, com certeza - Corrigiu Bianca - Em um magricela vestido como o pesadelo de todas as crianças dos anos 90, acho que não.
- Não liga pros dois idiotas não, eu achei a fantasia ótima - Veio a voz de Ane
A garota tinha acabado de sair do banheiro e usava um vestido branco justo na cintura e que parava um palmo acima do joelho, ela também usava coturnos pretos. O vestido tinha uma aparência rasgada nas bordas e estava manchado de vermelho para representar o sangue.
- A sua também - Pedro respondeu ligeiramente embasbacado com a aparência da amiga. Rafael e Bianca concordaram, menos com a parte da fantasia que ainda não estava completa e mais pelo fato de que a garota ficava muito bem de vestido e com os cabelos soltos. - Porque você não usa vestidos mesmo?
- Porque essa porra é muito desconfortável - Respondeu Anelise - Agora cadê a minha peruca?
- Falou igualzinho a Luciana - Brincou Rafael recebendo um gesto obsceno da amiga como resposta.
- Deixa eu fazer sua maquiagem primeiro - Bianca Interrompeu, ela não esperou uma resposta antes de começar a maquiar Ane.
- Acho que esqueci de perguntar - Rafael se dirigiu a Bianca, - mas sua fantasia é de que?
- Luxúria ou succubus, como preferir - Pedro às suas costas fez uma careta, indicando que claramente não concordava com a escolha da irmã. - Pronto - Bianca se afastou de Ane para ver o resultado, a ruiva estava com o rosto tão branco quanto o de pedro e rímel pintando suas bochechas como se a maquiagem tivesse se desfeito com o choro, seus lábios estavam azuis fazendo com que realmente parecesse um cadáver. - Agora só falta a peruca, mas acho que seu cabelo natural seria melhor.
- Não existe uma ruiva do banheiro - Ane protestou antes de prender o cabelo com alguns grampos e colocar a peruca. - Como estou?
- Ótima - Pedro se apressou em responder - De uma maneira totalmente assustadora. - Acrescentou, recebendo um sorriso de Ane em troca.
- Ficou ótimo, Ane - Rafael concordou.
- Fica quieto, porra - Bianca deu uma cotovelada no amigo, tentando terminar a maquiagem em seu rosto. - Tá perfeita, Ane. - Depois de mais alguns momentos ela acrescentou - E graças a minha genialidade, agora o Rafa tá perfeito também. - Ela entregou o espelho de mão para Rafael poder ver a maquiagem. Sua pele estava coberto por uma camada de tinta cinza e sua boca redesenhada para parecer maior e assustadora.
- Caralho... Ficou bom mesmo. - Ele teve que concordar - Só me diga que essa merda é antialérgica. Não quero ficar espirrando a noite toda e com meus olhos lacrimejando.
- Ui, ele é sensível. - Bianca riu ignorando o resmungo de "Eu vou te mostrar o sensível" do amigo - Fica tranquilo que não vai fazer mal pra você não. Eu acho - Ela acrescentou baixinho.
Marina escolheu esse exato momento para entrar na lavanderia. Ela sorriu para o grupo de amigos e colocou sua própria bolsa sobre o balcão.
- Suas fantasias estão ótimas - Ela declarou apesar de franzir a testa para roupa de Pedro. - Bianca, Ane, vocês estão lindas. - Bianca respondeu ao elogio com um "obrigado" presunçoso enquanto Ane sorria envergonhada e se encolhia um pouco. - Vocês já vão?
- Sim - Respondeu Rafael - O ônibus vai passar daqui a uns dez minutos. - Tem certeza que está bem ficando no meu lugar? Você não deveria trabalhar no sábado.
- Nem você, criança - Ela sorriu para Rafael - Eu tenho certeza. Agora vão e se divirtam. Cuide dele pra mim, OK Ane?
- Pode deixar - A garota deu um tapa exagerado nas costas do amigo enquanto Bianca já começava a arrastá-lo para fora.
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Quinze minutos depois os quatro amigos estavam sentados no último assento do ônibus que ia para o centro. Eles não eram as únicas pessoas fantasiadas e algumas das outras já estavam meio bêbadas.
- Então, como vai o trabalho de sociologia com o "Senhor popularidade"? - Bianca perguntou, não conseguindo ficar em silêncio por muito tempo.
- Tô desde segunda mandando mensagem para aquele imbecil. A única resposta que tive até agora foi "Estou ocupado agora, falamos depois" e isso foi há dois dias. E vocês?
- Tô bem com a Sandra - Respondeu Bianca - mas ela é meio esnobe, tá tentando me ensinar aquela coisa de etiqueta pro trabalho... O que é totalmente uma perda de tempo da parte dela. Eu tô tentando ensinar ela a dançar... O que é totalmente uma perda de tempo da minha parte.
- Tô tentando ensinar a Barbara a jogar GTA - Falou Pedro e recebeu um olhar descrente dos outros. - O que? Não é como se eu tivesse outras coisas pra ensinar.
- Balé - Sugeriu Rafael. Pedro havia contado a ele sobre as aulas depois da conversa com Ane.
- História da arte... - Acrescentou Bianca.
- Como contar piadas ruins e estragar as boas... - Pedro deu um soco de brincadeira no braço de Anelise.
- Minhas piadas são ótimas. E você, loirinha? - Ele provocou a amiga - O que tá ensinando pra Ely?
- Tentei ensinar ela a lutar, mas não deu certo - Ane bufou - Ela teve um ataque de pânico e chorou por quinze minutos depois que conseguiu acertar um soco no meu estômago. Ela tá tentando me ensinar Esperanto. Esperanto, mano. Quem é que fala Esperanto?
- Pelo visto a Shamaelly. - Rafael cutucou a amiga de brincadeira.
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O bom humor de Rafael não durou muito tempo depois que ele e os amigos chegaram na festa. Bianca, como já era esperado não ficou muito tempo por perto, aceitando o primeiro convite para dançar no meio da massa. Pedro e Anelise ficaram por mais um tempo, até que alguém vestindo uma fantasia de rainha de copas (Rafael achava que fosse Flávia) arrastou o rapaz para longe de seus amigos. Ele suspeitou que Ane não tivesse deixado ele sozinho de propósito. Apenas algo que tinha acontecido por causa do fluxo de gente andando pela praça, mas isso não mudava o fato de que ele tinha ficado sozinho.
Ele procurou Ane por cerca de quinze minutos e chamou por ela até ficar rouco. O que foi totalmente inútil, porque parecia impossível ser ouvido sobre toda aquela algazarra.
Rafael se afastou da multidão procurando um canto mais silencioso. Talvez quando Anelise ou um dos outros saísse do meio da massa de gente, ele pudesse vê-los. Ele ficou sentado em um banco de pedra quebrado sob uma das árvores da praça. Ele pegou seu celular e enviou uma mensagem para Ane dizendo onde estava.
Sua atenção foi atraída por uma jovem usando uma fantasia de bruxa, que parecia estar completamente bêbada e segurava alguém com uma fantasia de príncipe como se estivesse tentando beijá-lo. A outra pessoa não parecia tão interessada, mas a garota parecia muito insistente. Rafael não sabia se deveria interferir ou deixar que o casal se resolvesse sozinho. Isso pelo menos até reconhecer a voz da garota. Era Letícia.
NOTAS DA AUTORA:
Agora sim o bicho vai pegar
Até o próximo capítulo. 👀🤟🌈
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