Capítulo 34
Venetto Annunci, Palermo, Itália — Quarta-feira
Antonio ficou por último. Até mesmo Enrico, que insistiu em ficar para acompanhar o amigo, havia ido embora a pedido do próprio Antonio. Desde a hora em que havia se trancado no seu escritório, estava naquela vibe melodramática. As músicas iam de Enrico Sinatra a Mark Knopfler, com seus mais variados ritmos, toques de trompetes, solos de pianos e aquela voz clichê grogue e rouca de homem bêbado ou aquela voz grave, mas feminina, com leves vibratos e profundas pausas silábicas. Depois, vinham os solos de guitarra que pareciam ser infinitos. Esses solos deixavam Tony com uma estranha vontade de se mergulhar numa banheira de uísque.
Então, lembrou-se do que havia dito à Louise na última vez em que a viu. Lou, olhe pra mim...pare um pouco e me escute. Pare de torturar você mesma. Isso não é saudável, por favor! Relembrou. Notou que estava fazendo isso consigo mesmo e agora não tinha Louise por perto, para lhe dizer a mesma coisa. Aí alguém bateu na porta. Sim, às dez e meia da noite. Era ninguém mais do que Melinda Lefreve!
— Melinda?! — exclamou ele, mais do que surpreso.
— Posso entrar?! — questionou ela.
— O quê está fazendo aqui a essa hora?! Está tarde! — repreendeu.
— Vai me deixar entrar ou não?! — perguntou de novo, séria. Antonio deu passagem e deixou-a entrar.
— Agora me responda, o que você está fazendo aqui? — questionou, cruzando os braços.
— Primeiro, sente-se. — disse ela, tentando parecer calma.
— Estou bem de pé. Olha, seja breve, eu preciso ir embora para descansar. — retrucou, num tom calmo e brando.
— Antonio, eu... — Melinda balbuciou —... E-eu estou grávida.
Antonio ficou pálido. Sua boca secou. Ele engoliu seco. Suas pernas ficaram bambas fazendo com que se jogasse sentado no sofá do seu escritório. Seu coração estava aos pulos. As mãos começaram a suar, milhões de lembranças de Melinda competiam com as lembranças de Louise em sua mente. Seria óbvio perguntar a ela que essa criança era dele. Isso não pode ser verdade!
"Um bebê" pensou. "Um filho meu. Com Melinda", dizia pausadamente. Antonio ficou atordoado, atônito, como se alguém tivesse lhe dado um soco no rosto ou uma pancada na cabeça com um taco de beisebol. Depois da notícia, Melinda simplesmente foi embora. Naquele momento, ela estava fingindo bem até demais, tanto que no final de tudo, poderia estranhar de si mesma e provavelmente desenvolveria uma gravidez psicológica. Já Antonio, ainda estava sentado no sofá, com os cotovelos nos joelhos e o rosto enterrado nas mãos.
O relógio da cozinha de Dona Marie marcava meia-noite. Antonio ainda não havia chegado em casa e ela estava começando a ficar preocupada. Giulia havia deitado cedo, mas levantou-se alguns minutos depois, ao observar a mãe caminhar de um lado para o outro, com uma feição preocupada. Então, ela também notou que o irmão ainda não havia chegado em casa.
— Talvez ele esteja precisando de um tempo sozinho, mamma. — Giulia deu um beijo carinhoso na testa da mãe e a acompanhou até o sofá.
— Mas eu não estou gostando disso. Ele sempre avisa. — retrucou ela.
— Vou ligar para ele... — Giulia pegou o celular e quando ia clicar em "chamar", a maçaneta girou. — Tony! Aonde é que você estava?! — esbravejou a irmã.
Ele ficou mudo. Quieto e parado, encarando as duas com uma expressão que para elas, era estranha. Depois de trancar a porta, enfiou as mãos nos bolsos da calça, beijou a testa das duas e dirigiu-se para o seu quarto em silêncio. Ambas sabiam muito bem que havia algo errado naquele jeito dele.
— Tony, você está bem?! — perguntou a mãe, apontando a cabeça na quina da porta que estava entreaberta. Ele fez que não com a cabeça. — O que aconteceu? Que cara é essa, meu filho?! Não gosto de vê-lo assim! — dizia ela, entrando no quarto. Ela sentou-se ao seu lado e com as mãos frias e enrugadas, segurou as mãos de Antonio.
— Não se preocupe mamma, eu vou ficar bem. Eu acho. — disse, olhando no fundo dos olhos da mãe e sussurrou a última frase. — Preciso descansar. — ele deu outro beijo na testa enrugada da mãe.
— Tudo bem, meu querido! Descanse mesmo! Tenha uma boa noite e qualquer coisa que precisar, me chame, por favor! — disse ela, com aquele mesmo sorriso amoroso de sempre.
— Obrigado mamma! Eu te amo viu? Te amo muito! Obrigado por tudo! — Antonio conseguiu sorrir, mas depois ele se desmanchou de novo.
Dona Marie então sorriu, deu um forte abraço no filho, depois um beijo e saiu, fechando a porta do quarto. Quando ela saiu, as lembranças de Louise, e de Melinda dando aquela notícia assustadora, voltaram à tona.
Palermo, Itália — Quinta-feira 11:00h
No dia seguinte, Antonio acordou tarde. E mais tarde ainda deixou para se levantar. Seus olhos pareciam como os de uma coruja, mas estavam pesados por causa da noite mal dormida. Antes de ir tomar o café, tomou um banho demorado para tentar esfriar a cabeça e tentar relaxar um pouco, mas não teve sucesso. Para onde olhava, via o rosto de Melinda dando aquela notícia que parecia ser absurda. Giulia surtaria se soubesse disso. Terminou o banho e saiu com uma toalha enrolada na cintura como uma lesma, uma pessoa que não está nem um pouco afim de fazer o que lhe foi ordenado. Não escolheu muito a roupa que vestiria. Pegou qualquer uma, fez um esforço para observar bem se as peças combinariam, mas trocou de camisa três vezes até acertar. Optou por uma calça jeans, camiseta pólo preta e sapatos. Quando chegou na cozinha, Giulia, sua mãe e Fred tomaram um susto. Antonio estava parecendo um homem que acabara de chegar de um bar, onde tinha passado a noite. Fred quase fez uma piada.
— Bom dia... — resmungou.
— Bom dia. — disseram os três juntos.
— Vou só tomar um café e já vou descer... — Antonio olhou para o seu relógio de pulso — Estou atrasado! — disse ele, surpreso.
— Espera. — Giulia o puxou pelo braço, ficou nas pontas dos pés e ajeitou o cabelo do irmão. — Agora sim, está um pouco mais decente. — ela o encarou com aquela vontade de perguntar alguma coisa a respeito daquela situação.
— Obrigado. — ele deu um beijo nas bochechas da irmã e da mãe e cumprimentou Fred com um sorriso fraco. — Estou indo, não me espere para o almoço. — gritou ele.
— Alguém pode me... — Fred foi cortado por Giulia.
— Não, não sabemos ainda. Mas eu vou descobrir e isso me cheira a armação de Melinda! — esbravejou ela.
— Desse modo, acho que não vou precisar ir à feira hoje... — Dona Marie refletiu pensativa. —... Quando ele fala que não vem almoçar, ele não vem mesmo e ainda volta tarde pra casa.
— Fiquem tranquilas, vou dar um jeito de vigiá-lo. — disse Fred, tentando ajudar.
— Se eu fosse você não faria isso. Ele odeia ser vigiado ou seguido. — advertiu Giulia. — O jeito é esperar ele mesmo contar o que aconteceu, quase sempre ele faz isso.
— Vamos esperar. Fingir que nada aconteceu, se pressionarmos, pode piorar. — orientou dona Marie.
— Mas tenho certeza! Certeza que é armação de Melinda! — dizia Giulia fechando os punhos.
De volta à Agência, Antonio se enfurnou no escritório novamente. Quando passou pela recepção, a nova contratada não estava na mesa e isso o deixou nervoso. Ele se sentou na cadeira giratória, ligou o computador e se inclinou para trás, com os dedos das mãos entrelaçados sob a cabeça. Não levou mais do que cinco minutos para que o computador ligasse por completo. Então, clicou num arquivo, que seria a planilha de relatório de tudo o que Enrico havia feito na Agência na sua ausência. Não era muita coisa, porque afinal, Enrico não tinha experiência naquela área. Mas foi incrível a forma como ele havia conseguido manter a Agência em pé. Aí alguém bateu na porta. Uma mulher alta, de cabelos louros, olhos e pele claros parou na porta, segurando uma pasta vermelha sob o peito. Tony ficou surpreso e por alguns segundos pareceu estar hipnotizado.
— Sou Abigail Reichert, Sr. Sou a recepcionista temporária. — ela sorriu e quis estender a mão para cumprimentá-lo, mas não o fez, lembrando-se do conselho de Enrico. — Mas pode me chamar de Abby.
— A moça que faltou ontem. — respondeu ele um pouco seco e ao mesmo tempo desanimado. — Certo, Abigail, Enrico já deixou claro que não gosto de atrasos certo? — questionou, com os olhos atentos na planilha.
— Sim, Sr. Deluca. Prometo que isso não acontecerá de novo. — respondeu ela.
— Me chame de Antonio. — ele a encarou. — Não prometa o que não pode cumprir. — ela assentiu. — Veja com Enrico o que ele tem pra você hoje. Só me chame se for realmente necessário. E... — ele fez uma pausa fazendo um esforço para ser educado —... Seja bem-vinda.
— Sim Sr. Obrigada! — ela sorriu de volta e saiu, fechando a porta. — Oh, o meu currículo! — disse ela, antes de fechar totalmente a porta. Colocou duas folhas sob a mesa e depois saiu, voltando para a Recepção.
— No que está pensando? — perguntou Fred à Giulia, ao observá-la com os olhos distantes e bastante pensativos, com o queixo apoiado nas mãos.
— No que aquela vagabunda teve coragem de fazer! — exclamou ela.
— Ela quem? — questionou.
— Melinda. Sei exatamente o que ela fez. Ela pensa que eu sou boba, mas não sou! — ela bufou ironicamente.
— E você vai me contar o que você supõe que ela fez?! — Fred tinha 99% de certeza de que ela não falaria. Não ainda.
— Por enquanto não, preciso ter certeza absoluta. Preciso de provas. — retrucou.
— Lá vem você com as suas frases de detetives! — brincou Fred. Giulia o encarou seriamente.
— Isso não é brincadeira, Fred. É algo sério, que provavelmente pode parar na Justiça se esse plano dela funcionar! — disse ela, num tom incrivelmente calmo.
— Certo, e o que você vai fazer?! — questionou.
— Não sei ainda... Vou esperar mais um pouco, ver se descubro mais alguma coisa. — Giulia parecia bastante determinada a desmascarar Melinda.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top