Capítulo 5


Capítulo 5

Aparência que engana

Huma

Meus dias têm sido terrivelmente exaustivos. Uma reunião atrás de outra, agora que terminei o levantamento e o diagnóstico dos problemas da empresa. Eram reuniões intermináveis para expor as finanças, mostrar os gráficos e propor soluções imediatas de curto e longo prazo, não era fácil para um grupo fechado e com uma cultura tão diferente.

O grupo empresarial era composto de sete empresas espalhadas pelo Brasil. Sendo uma dela a "mãe", sólida no mercado, outras com altos e baixos, sem cair na área de risco. No entanto, uma, essa em questão, parecia despencar em queda livre há algum tempo, mas somente agora que a situação ficou insustentável é que o presidente procurou a assessoria de finanças da empresa-mãe.

Ao analisar a situação não foi difícil chegar à principal causa. A empresa se encontrava na mão de membros inexperientes da família. Os coreanos eram muito tradicionais no que dizia hierarquia familiar. Existe um termo, Chaebol, que define bem o funcionamento das empresas. Os cargos de presidente, gerentes e de homens de confiança são ocupados por membros da família, sendo o presidente, filhos.

Contratar brasileiros para trabalhar no "chão de fábrica" não era nenhum problema, ou seja, em funções operacionais, agora gerenciar setores importantes, há muita resistência. Uma Mulher? Assunto mais delicado. Por este motivo, eu sempre precisei manter uma postura muito firme e decidida na hora de colocar minha opinião. Estar atenta ao mercado e estudar a empresa era algo imprescindível.

O grupo WKK já se encontrava consolidados no mercado nacional, disputava o mercado de igual para igual, com os produtos nacionais e importados. O grande número de empregos gerado durante a implantação de uma nova fábrica era um atrativo às cidades, porque gerava um giro financeiro dentro da economia local, era um fator que não podia ser desprezado.

A empresa em questão, se encontrava com uma grave situação financeira. O que provocava burburinhos entre funcionários de demissão em massa e fechamento da fábrica. O motivo? Descapitalização. Os próprios donos, ou melhor, presidentes de outras filiais usava os recursos dessa para arcar com todos os pagamentos pessoais dos executivos. Não tinha como fechar as contas com tantas retiradas.

Em minha opinião, um erro que a cultura asiática comete, colocar os filhos, sendo muito jovem e sem experiência, à frente da empresa, claro que estes sempre amparados por um advogado ou administrador experiente. Os genros, cunhados e irmãos ficavam com os cargos de diretores. Outra concorrência entre eles nada saudáveis.

E o que era visível nesta empresa WKK-Curitiba má administração. Encontrei algumas movimentações financeiras incoerentes e as reservas da empresa esvaziadas. Após uma investigação, descobri que uma empresa de Santa Catarina, usava essa filial para pagar as dívidas pessoais do presidente, alguns gerentes e familiares. Pelo jeito sua implantação teve este propósito, a empresa servir como caixa para manter a renda do outro grupo. Deu certo até a crise financeira se abater sobre o país.

Levei algumas alternativas de gestão não familiar. A começar por tirar do cargo os envolvidos, subordinados, ao presidente da outra empresa. E ainda mandei um relatório a "empresa-mãe" expondo WKK-Santa Catarina a fim de abrir outra sindicância.

Final da tarde recebi uma ligação da minha amiga Josi.

— Como foi seu dia hoje?

— Se eu disser que foi tenso, estarei mentindo. — Respirei profundamente. — Ele, ou melhor, estes dias foram nebulosos.

— Tenho um convite que não pode recusar então. Venha almoçar conosco, assim esquece os problemas da empresa um pouco. — Fiquei pensativa. — Você não tem como negar. Vamos te esperar.

— Eu vou se você me garantir que não atrapalharei, justo no dia da folga de vocês.

— Claro que não. Será o maior prazer cozinhar para nossa amiga querida.

— Combinado. Às onze horas estarei aí. Posso levar a sobremesa?

— Nada disto. Não precisa se preocupar com nada.

Deitada em minha cama eu pensava. Estes dois deveriam ser malucos mesmo. Em pleno dia de folga iriam para cozinha cozinhar para mim. Mas, precisava sim levar alguma coisa de presente, mas o quê? O Renato como sempre reclamaria, com isto eu já estava acostumada.

Levantei tomei banho e troquei-me, coloquei um vestido simples e leve. A mulher executiva iria tirar o dia de folga.

Já perdera o horário do café, assim tomaria um vitaminado no shopping depois que comprasse os presentes.

A Bruna adorou mexer nas minhas maquiagens então levaria para mãe e filha algumas e para o Renato uma bebida.

Entrei em uma loja de cosmético e perfumaria de uma franquia conhecida e que particularmente gosto muito. E essa de Curitiba eu já era conhecida.

— Posso te ajudar? — Uma mocinha bonita, bem maquiada, veio me atender.

— Sim. Gostaria de algumas maquiagens, inclusive para criança, você tem?

— Qual idade?

Assim ela me mostrou e comprei várias, para Bruna, Josi e inclusive para mim, não resisti às novidades.

Andava pelo corredor a procura de uma loja de bebidas importadas ao me dar conta que o Renato era especialista em bebidas, seria uma gafe presenteá-lo com algo que eu não conhecia bem, neste caso o vinho.

Voltei à loja e comentei com a moça que me atendeu que havia esquecido de um presente masculino, então perguntei:

— Tem uma mocinha de cabelos escuros que sempre me atende aqui, não a vi hoje.

— Deve ser a Janaina. Ela virá aqui hoje, infelizmente, apenas para se despedir. Vamos almoçar juntas e fazer uma surpresa a ela.

— Espero que saiu por algo melhor. — Elas se entreolharam e não disseram sim ou não.

— Mas vamos todas ajudá-la para não deixar de voltar — comunicou a outra se aproximando.

Estava rodeada pelas funcionárias quando uma mulher entrou na loja feito um furacão. Olhou-as e falou:

— Por que estão paradas sem fazer nada?

Olhei-a espantada, as moças se espalhavam feito pérolas caindo ao chão. Ao perceber minha presença, mudou a fisionomia.

— Desculpe-me, — começou a dizer, mas foi interrompida por mim.

— Quem é você?

— Sou a gerente. — Arrumou a postura. — Precisa de alguma coisa?

— Sim. Que você trate bem as funcionárias.

— É que elas...

— Elas me atendiam, muito bem por sinal, até que a senhora se rompeu, não sei de onde e, atrapalhou nossa tranquilidade.

— Mas... — Não deixei que falasse. Olhei as meninas recuadas e perguntei:

— Desde quando ela — Apontei com a cabeça para a gerente. – tem este tipo de comportamento com vocês?

Ninguém respondeu e procuravam desviar os olhos de mim.

— Que absurdo! As meninas estão acuadas e com medo. Agora entendo a demissão da... Como é o nome da mocinha? – perguntei.

— Janaina. – Alguém pronunciou.

— Isto, Janaina, ela com certeza, não deve ter mais suportado este tipo de tratamento e pressão.

— Olha aqui — A gerente se aproximou de mim. — Quem é você para supor este tipo de coisa? Eu trato mal alguém aqui? — perguntou alto passando o olhar para as funcionárias.

Ninguém falou emitiu nenhum som.

— Faça a pergunta ao contrário. Ela trata bem vocês? — O silêncio permaneceu. — Você acha mesmo que alguém arriscaria o emprego? Por pior que seja, ter o salário no fim do mês é o que conta. Afinal, nesta crise financeira que se encontra o país não se pode dar-se ao luxo de ficar sem emprego, não é mesmo?

Ela me olhou de cima a baixo, creio que para me analisar, porque não possuía nenhuma maquiagem, um vestido simples e uma rasteirinha no pé. Empinou o nariz e falou:

— Até parece que você sabe o que fala. Desemprego, recessão e viver de salário, me poupe. — Ela ia se afastar quando voltei a falar.

— Prazer, sou Humália Albuquerque Turolla, economista, com especialidade em recursos humanos e doutora e finanças. Uma avaliação minha ao dono da franquia, a senhora estaria na rua, ou no mínimo fazendo treinamento de vendedora ou uma boa reciclagem.

— Faça! — uma voz surgiu entre as meninas.

Sorri.

— Quem gostaria que eu fizesse, sejam corajosas e levantem a mão?

Tímidas, mas criando coragem, aos poucos as mãos foram sendo levantadas. Sorri para elas e olhei a gerente e conclui.

— Chegou sua hora. É melhor atualizar seu currículo. — Voltei-me a funcionária que me atendia. – Embrulhe este para presente.



Minha tarde foi maravilhosa. Comida e companhia boa era uma dupla que nunca dava errado.

Cheguei ao hotel final da tarde, um rapaz veio ao meu encontro, disse que tinha uma encomenda para mim na recepção. Uma cesta com flores, bombons e vinho. Claro, um cartão que dizia:

Começamos errado. Mas como diz o poeta Fernando Pessoa: "Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca. Mas, se o achar, segure-o." Aceite jantar comigo. Kim Kool (011 99834 0444)

Era só o que me faltava! – pensei. — Um coreano recitando Fernando Pessoa. A internet é uma mãe mesmo.

Depois de conversar com meus amigos e o Renato contar algumas fofocas que envolvia a tal banda e a filha de um funcionário, eu queria distância de um relacionamento complicado. Já bastava minha vida. Olhei para cesta e para a funcionária do hotel, então falei:

— O que dizer de tamanha ousadia?

Ela olhou para os lados e abaixou o tom de voz.

— É de um dos integrantes da banda coreana? — Confirmei com um gesto de cabeça. — Primeiramente quero dizer que não li o seu cartão. Mas ele ligou aqui ontem e queria o número do seu apartamento. Não passei é claro, temos normas, mas ele foi insistente.

— Imagino. Ele deve ter falado — mudei a voz — eu sou o... — Olhei o cartão – Kim Kool.

— Exatamente! — Sorriu. — Esses rapazes jovens e famosos acham que podem tudo.

— Bem disse – falei – Jovem! Estrelismo e falta de bom senso. Aceita esta cesta? — perguntei.

— Mas a senhorita não vai querer?

— Não. Aceitá-la seria como comprometer-me com o convite dele.

— Mas então não é melhor devolvê-la?

— Talvez — Pensei. — Faça o seguinte. Diz que não aceitei o presente e mandei jogar fora e, que depois me arrependi e ofereci a você. Tenho certeza que ele não pegará de volta.

— A senhorita é quem sabe. E se ele a quiser de volta eu entrego sem problemas. Mesmo assim, muito obrigada.

— Eu que te agradeço pelo seu profissionalismo.

Fui para meu quarto trabalhar um pouco. Uma hora mais tarde alguém bateu em minha porta.

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E aí Hangul, como vocês estão? Gostaram de conhecer um pouco mais a Huma?

Até mais.

Beijos



Chaebol — é um termo utilizado para definir um aglomerado de empresas coreanas grandes e famosas dirigidas por famílias

Chão de fábrica — colaboradores que trabalham nas indústrias, geralmente em nível operacional.

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