| C a p í t u l o 2 |

Tentei mais uma vez. Sem resposta.

Liguei de novo. E de novo.

Nada.

Desisti. Pela milésima vez nos últimos dois dias. Por alguma razão, ele não atendia o celular.

Talvez, tivesse meu número salvo. Àquela altura, era bem possível. Pelo que eu sondara a seu respeito, não ficaria surpresa se tivesse pegado com seu amigo. Eu devia estar na lista de contatos bloqueados.

Filho de uma mãe.

Respirei fundo e fiz uma nova tentativa.

Inútil.

Revoltada, decidi procurar por "Ramiro Biazate" nos contatos.

Ouvi o primeiro toque. E outro. Mais um. Tocou, tocou, tocou e caiu na caixa-postal.

Não tinha jeito. Teria que ligar para meu irmão. Fiz isso e, após inventar uma desculpa fajuta, que ele só engoliu por estar ligeiramente bêbado, consegui o endereço.

Depois, apanhei a chave, agarrei o capacete e saí do jeito que estava.

Não havia uma estrela no céu. Nuvens escuras tingiam tudo de um preto acinzentado quando montei na garupa e acelerei rumo à casa de Braz Belmonte.

O espesso manto monocromático que encobria a lua desabou, e a chuva torrencial me pegou no caminho. Não me importei. A fúria da tempestade não se igualava à minha.

Diante da residência, firmei o pé no passeio, saltei da moto e toquei o interfone.

Pelas grades altas do portão majestoso, avistei o carro na garagem, aclarado pela iluminação do vasto jardim. O proprietário estava lá dentro, mas não aparecia.

Apertei o botão cinco vezes, esperando um pouco a cada dedada, como uma pessoa sensata faria. Então, comecei a cutucá-lo ferozmente, feito uma criança malcriada.

Depois de uns bons segundos de ruído ininterrupto, o homem surgiu sob a luz da varanda, descabelado e aparentemente furioso.

— Isso é hora de perturbar os outros? Vai tocar a teta da sua mãe, moleque! — berrou, fuzilando meu capacete.

Comecei a rir, o temporal abafando as risadas que ecoavam contra a viseira.

— Ô arrombado, vai falar o que você quer ou não? — A voz masculina rivalizou com o som do aguaceiro que escorria pelas minhas peças de moletom.

Tirei o capacete e revelei meus fios soltos e curtos, que pingavam na altura da nuca. Se isso não servisse para alertá-lo de que eu era alguém do gênero feminino, o rosto evidenciado pela claridade do poste mais próximo provavelmente serviria.

Funcionou, porque os olhos que antes me fulminavam arregalaram-se repentinamente.

— Você é uma menina?!

— Mulher — corrigi. — Preciso falar com você. Abra.

— Não te conheço, garota! — Ele riu. — Está tarde! Vá dormir e deixe os adultos... se divertirem em paz. — Virou-se e saiu andando.

O sangue ferveu, e a raiva pulsou em minhas têmporas.

— Não conhece a mãe do seu filho? — Soltei uma risada lunática.

Não queria usar o bebê assim, mas acabei perdendo o controle por causa daquele fodido!

Ele estacou. Vi os músculos das costas nuas se retesarem. O pescoço se moveu, e um par de olhos atônitos me fitou.

Então, a perplexidade cedeu espaço à cólera.

— Você é a pilantra que anda perturbando os caras da suruba?

— A própria. — Abri um sorriso debochado. — Adivinha? A sua vez chegou!

Odiava tratar as coisas com tanto escárnio, mas aquele imbecil merecia cada gota de ironia.

Sem pensar muito, ele caminhou às pressas até o portão.

Enquanto o corpo imergia na chuva espessa, eu contemplava o largo peitoral desnudo e as ondulações do abdome definido, que culminavam em duas linhas insinuantes, albergadas pelo cós da calça jeans.

Era bonito. Muito. E gostoso. Demais, até. Parecia um guerreiro prestes a enfrentar um combatente inimigo sob uma tempestade em alto-mar.

Mas não me impressionei. Já tinha visto melhores.

— Escuta aqui... — começou.

— Escuta aqui você! — cortei, elevando meu topete imaginário, o que provavelmente me garantiu uns cinco centímetros extras.

Em comparação aos prováveis mais de cento e oitenta dele, eram nada. Mas, somados aos meus aproximados cento e sessenta, representavam uma boa vantagem.

Estupefato, ele me encarou.

— Quem você pensa que é?

— A mãe do seu filho, eu já disse — respondi, com premeditada tranquilidade.

— Ficou louca? Eu nunca te vi, menina! E, mesmo se tivesse visto, jamais transaria com você! — bradou.

Gostaria de dizer que as palavras certeiras, proferidas em alto volume e com nítida convicção, não me abalaram. Mas ouvir aquilo doeu.

Um pouco.

Não deixei que ele percebesse, é claro.

— Mas transou. Estou grávida há dois meses, e você é o pai.

O infeliz soltou uma risada.

— Jura? — ironizou.

— Juro. — Ignorei o sarcasmo. — Os outros já fizeram o teste, e os resultados deram negativo. Só falta você. Use seus dois neurônios, junte dois mais dois e descubra o que isso significa.

Ele ficou subitamente sério e, devo dizer, ainda mais bonito.

Aproximou-se do portão. As palmas grandes se ergueram, e os dedos sufocaram as grades.

— Alguém te contou sobre aquela orgia. — Um olhar minucioso vasculhou meu rosto. — Tenho certeza de que você não estava lá. Primeiro, porque sei que nunca te vi na vida. Segundo, porque Ferrão jamais deixaria uma garota tão nova participar de uma suruba na casa dele.

— Tenho vinte e cinco anos. — Mantive os olhos fixos, mirando as íris que, à meia-luz, aparentavam uma tonalidade escura.

— Nunca! — Ele riu. — Deve ter uns dezesseis, o que enfraquece ainda mais a sua mentira. Não transo com menor de idade.

— Acredite você ou não, tenho vinte e cinco — repeti.

— É mesmo? — O tom irônico triunfou novamente. — E o que você faz da vida? Tem um emprego?

— Neste momento, não, mas...

Ele gargalhou.

— Eu sabia! É o clássico golpe da barriga! — Balançou a cabeça, rindo. — Aqui, não, minha filha! Vá procurar um idiota para sustentar você e sua cria. Se é que tem mesmo um moleque aí dentro!

Enquanto fitava aquele babaca, tive a impressão de ver um vulto. Olhei adiante e, na varanda, avistei uma loira de calcinha, com os seios grandes e aparentemente naturais expostos.

Logo atrás, vinha outra, longilínea, negra e seminua, balançando suas longas tranças coloridas. Ao lado dela, uma morena provavelmente siliconada caminhava sobre um par de saltos altíssimos, exibindo compridas madeixas onduladas.

Quando achei que não me surpreenderia mais, divisei uma figura ruiva, alta, esbelta e completamente pelada, exceto pelas botas que iam até os joelhos.

Meu assombro, manifesto por olhos arregalados, alertou o homem, que olhou para trás.

— Você chamou mais uma? Assim a gente vai ficar com ciúme, gato... — A mulher de cabelo acobreado enrolou uma mecha no dedo.

— Ah, não, gostoso... Não te divido com mais ninguém. — A que ostentava dreads de todas as cores forçou uma voz manhosa.

— Fiquem tranquilas, ela já está indo embora. — Seu rosto voltou-se para mim, e o volume da voz baixou. — Ou prefere ficar? Não vou perder meu tempo com você, mas, talvez, uma delas aceite te dar uns beijos. — Curvou os lábios, me mostrando um sorriso cínico.

Ele não sabia com quem estava lidando. Mas não tinha problema. Eu ia mostrar àquele escroto.

Comecei a chorar. O pranto ruidoso e simulado logo despertou a atenção das quatro mulheres.

— Eu tenho dezesseis anos! Ele me engravidou e não quer assumir a criança! — Baixei a cabeça, fingindo soluçar. — Eu era virgem... — Abri o berreiro. — Ele disse que estava apaixonado por mim, eu acreditei e entreguei meu tesourinho — completei, chorando convulsivamente. — Meu pai me espancou e me expulsou de casa, e o pai do meu filho não quer me socorrer. Eu só preciso de um lugar pra dormir... Tudo dói, tudo dói... — Caí de joelhos na calçada, em uma atuação digna de uma estatueta de ouro.

— Você vai deixar a menina desamparada? Na rua? Na chuva? E grávida? — Pura indignação escapou da boca de uma delas.

— É tudo mentira! Eu nunca vi essa garota! — Braz tentou se defender.

— Ele disse que me amava, disse que eu era linda... — choraminguei.

— Homem é tudo igual mesmo! Não salva um! Lixo! Você é um lixo, cara! — Uma voz exasperada ecoou.

— Broxei completamente! — alguém declarou.

— Eu, também! Vamos nos vestir e voltar para o bar, meninas! — A morena comandou as demais.

Ergui os olhos e as vi atravessando as portas da varanda, os passos determinados ressoando com perfeita nitidez, graças ao abrandar do dilúvio.

A força da chuva reduzira bruscamente. Mas a intensidade do olhar que caía sobre mim aumentou quando abri um sorrisinho maquiavélico.

— Sua... — Ele apertou os lábios.

— Cobra? Víbora? — Fiquei de pé com um movimento único.

— Medusa! — As íris dele chisparam.

— Cuidado... — Arregalei bem os olhos, desejando que fossem tão letais quanto os da Górgona amaldiçoada por Atena. — Posso te transformar em pedra...

— Algumas mulheres conseguem me transformar em pedra com facilidade, querida. Mas você? — Examinou minha baixa estatura e minha compleição franzina. — Acho que não — escarneceu, deixando uma risada escapar.

Olhei bem na cara dele e, naquele instante, o odiei com todas as minhas forças. Mirando sua expressão desdenhosa, jurei que aquele homem mesquinho, frívolo e vil nunca chegaria perto do meu filho.

Eu tinha um trunfo, e Braz Belmonte não fazia ideia disso.

Logo teria que usar a carta escondida na minha manga. E, quando esse dia chegasse, seria divertido.

Sorrindo ao imaginar o momento, virei as costas.

Cruzei a calçada, subi na moto, finquei o capacete na cabeça e ganhei a rua, acelerando até o fim sem olhar para trás. 

Gostaram do capitulinho?

Espero que a história esteja agradando vocês! 

Já querem matar o Braz? Hahahaha!

O que acharam de Leona?

E que trunfo será esse, gente?

Descobriremos loguinho, nos próximos capítulos!

A gente se lê em breve!

Mil beijos!

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