Prólogo


"O Reino dos céus é como um tesouro escondido num campo. Certo homem, tendo-o encontrado, escondeu-o de novo e, então, cheio de alegria, foi, vendeu tudo o que tinha e comprou aquele campo". Mateus 13.44

Mateus finalizou a leitura e viu a dúvida preencher a expressão de Débora.

— O que foi? — resolveu perguntar, visto que ela parecia não ter compreendido.

— Sua parábola favorita é essa? — A garota riu, encabulada. — Só achei muito curtinha para ser a favorita, sabe? Tão resumida e direta.

— Eu não entendo a surpresa, Débora — O homem fixou os olhos nos dela. — Você também é uma mulher direta nas palavras, e também é a minha favorita.

— Uau! — Ela suspirou, encantada.

Os dois sorriram um para o outro, envolvidos numa agradável harmonia, uma sensação de acolhimento e satisfação apenas por estarem juntos. Algo que não poderiam descrever em palavras, mas que era transmitida em seus olhares.

Já passava um pouco das 21h. Mateus fechou a Bíblia e a depositou ao lado, no banco de madeira disposto na varanda da fazenda. Ao som de grilos, o casal observou o verde da grama se misturando ao do mato que beirava o outro lado da estrada e fazendo um belo contraste com a escuridão celeste. Débora tomou a liberdade de encostar a cabeça no ombro dele, que ficou um pouco desconfortável com o gesto, até porque dona Amélia balançava deitada em uma rede ali próximo, atenta a vídeos de receitas no celular, mas também de olho na filha.

— Não vai me explicar o motivo de sua parábola favorita ser a do tesouro perdido? — Débora se afastou um pouco para encará-lo com atenção.

— Ah, claro. — Mateus pigarreou. — Eu gosto dessa parábola porque ela mostra o valor do reino dos céus, e que ele é mais precioso do que tudo o que temos.

— Sim, isso é verdade. Tanto que o homem que encontra esse tesouro, que é o reino dos céus, troca todos os seus bens por ele.

— E é isso que me chama a atenção. — Mateus cruzou os braços e observou o horizonte, meditativo. — Eu não vou negar que por muito tempo busquei ter uma vida boa Terra, e para mim uma alta renda era o essencial. Gastei minha juventude trabalhando como um louco para isso, sabe? Mas o Senhor sempre me chamava a atenção com essa pequena parábola.

— Ele realmente não nos deixa tranquilos em nossos maus caminhos, não é? — A mulher suspirou, tocada com o testemunho do noivo.

— Não mesmo! — Mateus estreitou os olhos, ainda perdido em sua reflexão. — Em muitos momentos eu priorizei o meu trabalho, tentando prosperar. Muitas vezes tive bons motivos para colocar isso em oração, queria ter recursos para ajudar a igreja a crescer, por exemplo. Mas meu coração às vezes foi movido por ganância, e essa parábola chamou a minha atenção de volta para o reino.

— Mateus! — Ela exclamou, o que o fez encará-la. — Eu realmente não consigo imaginar você autoritário ou ganancioso.

Ele sorriu com doçura.

— O Senhor a poupou de me conhecer nessa época — respondeu o empresário. — Eu tive que sofrer muitas frustrações para ser moldado, e sei que ainda tenho muito o que aprender para ser como o nosso Senhor Jesus Cristo.

— Nós temos!

Débora encostou outra vez a cabeça no ombro dele.

— E agora podemos nos ajudar nessa luta — ela constatou, aquecendo o coração do amado.

Mateus acariciou o cabelo da noiva e desfrutou do apoio dela expresso em seus gestos e palavras. Porém, ainda temia decepcioná-la, visto que não se sentia tão distante assim daquele homem de outrora. Sua luta contra o antigo Mateus era constante, sabia disso. Sua forma de agir, por vezes contrária ao esperado, era impulsionada por este propósito, a mortificação da sua carne. Ele odiava estar na zona de conforto e entregava-se com afinco ao serviço do seu Deus, a começar pela obra em desenvolvimento dentro dele mesmo.

Os dois permaneceram em silêncio por um tempo, imersos em suas próprias reflexões sobre o reino. A presença um do outro lhes trazia uma alegria imensa; as palavras ajudavam, mas pareciam quase desnecessárias naqueles momentos compartilhados. Para Mateus, Débora se tornava uma fonte de inspiração para ser um homem melhor em todos os aspectos, e ela vinha conquistando seu coração de maneira natural e suave, aparentemente sem fazer esforço.

— O que mais você gosta na parábola? — indagou Débora, como que para quebrar o silêncio.

Mateus tentou formular mais alguma frase romântica em conexão com a pergunta dela, pois gostava de vê-la suspirar. Porém, a criatividade não apareceu de imediato, e ele teve que dar uma resposta mais precisa:

— Gosto de saber que é "tomado de alegria" que o homem vende tudo o que tem para conseguir este tesouro.

A moça se distanciou mais uma vez para encará-lo e, com um sorriso, declarou:

— Eu amo você, sabia?

O casal se entreolhou com o sentimento mútuo lampejando em suas retinas.

— Eu também amo você, Débora.

A conexão de olhares foi interrompida pelo exagerado pigarro de dona Amélia. Mateus entendeu o sinal de imediato.

— Eu tenho que ir. — Ele consultou o relógio de pulso. — Seus pais dormem cedo.

— Ah, é verdade! — Débora murchou. — O tempo passou tão rápido!

Os dois se levantaram, e ele seguiu em direção à sala, despedindo-se rapidamente do senhor Geraldo, que estava assistindo TV. Dona Amélia abraçou o futuro genro e desejou-lhe uma boa noite, em seguida liberou Débora para acompanhá-lo até a porteira da fazenda.

Ao chegar ao ponto de despedida, Mateus segurou a mão dela e massageou o dorso com carinho. Esse gesto era a maneira mais segura que encontrou de expressar fisicamente seus sentimentos, mas, por algum motivo, parecia insuficiente. Embora não tivesse coragem de confessar ainda, desejava se casar o quanto antes; aquelas despedidas eram um rompimento abrupto do conforto que sentia ao estarem juntos. A cada encontro, sua ansiedade crescia, e ele sonhava com o dia em que poderiam viver sob o mesmo teto, sem longos intervalos para se reencontrarem.

Por outro lado, para Débora tudo parecia pleno. Mateus era um homem extraordinário, e ela agradecia a Deus pela dádiva de estar comprometido com um verdadeiro "príncipe", como ele era descrito em seus pensamentos. Ter um noivo piedoso era uma bênção, mas para ela o presente veio até com brindes — o romantismo que predominava suas interações, por exemplo. Mateus falava e agia como um homem perfeito. De fato, ela não conseguia enxergar defeitos.

— Até amanhã, meu amor — murmurou Mateus.

Em um gesto ágil, ele segurou a outra mão dela, ergueu as duas e as beijou suavemente, antes de puxá-la para um abraço.

— Até amanhã, meu namorado perfeito — Débora cochichou sorridente ao ouvido dele, que riu.

— Perfeito, é? — Mateus acariciou o cabelo dela e aproveitou para provocar. — Isso é uma blasfêmia. Quando casarmos, você verá quão chato eu posso ser.

— Ah, mas isso eu já sei!

Débora se soltou do abraço e falou divertida:

— Eu até gosto das suas chatices, Mateus. Continua sendo perfeito para mim.

O empresário ficou sério e desviou o olhar, incapaz de esconder o incômodo causado pela afirmação, embora achasse que deveria se sentir feliz por ter o coração da amada repleto de amor por ele.

— Não, Débora, eu não sou perfeito. — Achou necessário esclarecer. — Você está apaixonada por um pecador. E eu sei que vou decepcioná-la em algum momento.

— Uau, você está mesmo preocupado! — A garota riu com a seriedade dele. — Eu sei, bobinho! Mas me deixe curtir essa sensação, por favor. Você é meu primeiro namorado e, se Deus quiser, será o único. Quero aproveitar a "magia" dessa fase, entende?

Mateus assentiu, mas ainda ressaltou:

— Só tome cuidado com suas expectativas, por favor.

— Tudo bem! — Ela bateu uma continência. — Vou ficar lembrando das suas chatices para poder equilibrar.

O noivo riu da capacidade dela de encarar com leveza aquelas questões que para ele eram tão complexas. Porém, não havia tempo para prolongarem o assunto, então despediram-se logo, deixando um ao outro cheio de amor e saudade. 

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