CAPÍTULO VI: O GRANDE DIA
Meu trabalho na Diamante Negro continuou, assim como o treinamento com o Sr. Greenwood; como ele havia dito, eu realmente ganhei uma maior resistência física com o passar do tempo, não me sentia nem de longe mais tão cansado quanto nos primeiros dias.
Faltavam agora apenas uma semana pro campeonato de natação interescolar. Treinamos de segunda a quarta-feira, na quinta o Sr. Greenwood me liberou do treinamento pra descansar, me dando apenas a missão de dormir muito e me alimentar bem. Como se ele precisasse pedir, não é?
Marco também fez o favorzão de me dar folga da Diamante Negro no sábado e domingo.
— Tem certeza, cara? — perguntei quando ele me deu a notícia durante o jantar daquela quinta-feira. — Tipo, a competição é só no domingo, posso trabalhar no sábado.
— Não, você têm se matado de estudar, treinar e trabalhar já há um mês, precisa descansar agora ou não vai estar em forma pra competição.
— Sei que por você tudo bem, mas, e o seu irmão? Ele pode não gostar.
— Também sou dono da Diamante Negro, e você é meu funcionário, lhe dou folga quando quiser.
— Se é sua vontade, patrão…
Ele olhou pra mim com seriedade por um momento, então, lançamos a cabeça pra trás e rimos.
Na sexta, durante a aula de Biologia, o Sr. Yana fez algo interessante. Ele foi até minha carteira e fingiu estar me mostrando algo no livro.
— Se você vencer o campeonato… — ele fez uma pausa e olhou furtivamente pros lados — eu te pago um jantar em qualquer restaurante da cidade.
— Até naquele francês caro para um caralho? — perguntei.
— Você… você gosta de comida francesa?! — perguntou ele espantado.
— Não, mas você pagando, eu gosto.
O Sr. Yana sorriu.
— Tudo bem, vai ser uma facada na minha carteira, mas tudo bem, você merece… Quer dizer, se vencer é claro.
Quando o domingo (11 de novembro) chegou, eu me sentia tão cheio de energia quanto uma criança daquelas bem travessas, já fazia um longo, longo tempo que não me sentia assim.
O centro esportivo Plateias, local onde aconteceria o campeonato interescolar de natação, e que recebera esse nome em homenagem ao lugar onde os gregos antigos acabaram com os Persas em uma final e decisiva batalha sangrenta, ficava a pouco menos de dois quilômetros da casa do Marco, então fomos a pé pra lá e encontramos Chris e Tomas na entrada ao chegar.
Era umas seis horas da tarde quando entramos no local, e os últimos raios de sol tingiam o céu com um tom vermelho alaranjado.
Doze escolas da cidade, públicas e particulares, haviam enviado seus melhores nadadores pra representá-las no evento, um campeão pra cada escola, as chances eram as mesmas obviamente.
O evento teve início às sete e meia quando o locutor começou a chamar os nomes dos campeões e a escola que eles representavam. Senti um frio na barriga quando o ouvi dizer:
— E agora, representando a escola Hilston… Jayme Comak!
Ergui o braço e acenei, os alunos da Hilston que estavam nas arquibancadas foram à loucura em palmas e ovações.
Confesso que senti uma forte sensação de orgulho pessoal com aquilo, uma sensação de poder e grandeza que nunca havia sentido antes daquele dia. E eu poderia muito bem me acostumar com aquilo.
O Sr. Greenwood se aproximou de mim.
— Está vendo aquele ali de touca vermelha? — perguntou ele disfarçando. Assenti. — O nome dele é Edgar Marian, é o vencedor do campeonato do ano passado, ele é rápido, muito rápido. Mas pelo que vi do seu treinamento nesses últimos dois meses, sei que você pode derrotá-lo… Não, derrotá-lo não, quero que você ACABE com ele. Pode fazer isso por mim, Jayme? — assenti outra vez. — Boa, garoto, é essa a atitude que eu quero ver.
Nos posicionamos nos lugares. Minha raia era a número sete e por coincidência, acho eu, Marian pegou a raia seis bem ao meu lado.
Eram cinquenta metros livres, ida e volta.
Nos preparamos pra pular na piscina, dei uma última ajeitada no óculos enquanto fazia um exercício de respiração que me foi ensinado pra conter o nervosismo.
Então foi dado o sinal e saltamos na piscina, senti que minha largada havia sido boa.
Como de costume, ao emergir na água, senti toda e qualquer emoção se esvair e meu corpo ficar leve como uma pena. Apesar do meu estado, ainda podia ouvir, bem distante e abafado, por causa da água é claro, a voz do locutor narrando a disputa.
— Marian abre vantagem sobre os outros competidores, mas Comak está logo atrás dele e se aproxima rapidamente.
Me esforcei um pouco mais pra conseguir alcançá-lo, ainda guardando energia pra viagem de volta.
— Mariam faz a virada olímpica alguns segundos na frente de Comak. Será que o campeão da Hilston ainda pode vencer?
O Sr. Greenwood não estava brincando, o desgraçado realmente era rápido. Mas eu não havia guardado energia pra viagem de volta à toa, chegar à borda da piscina e realizar a virada olímpica, era uma das minhas artimanhas pra vencer, pode se dizer que aquela era a minha especialidade, e o Sr. Greenwood havia percebido isso, por esse motivo ele me fizera praticar tanto a virada olímpica a ponto de eu conseguir uma quase perfeição.
"Se prepara, otário", pensei. "O show de verdade vai começar agora!"
— Comak chega a borda da piscina e… MEU DEUS DO CÉU, O QUE FOI ISSO QUE EU ACABEI DE VER?! Comak faz simplesmente a melhor virada olímpica que esses olhos já tiveram o prazer de ver! A vantagem de Marian cai pra quase zero agora, não dá pra saber quem vai vencer!
Eu não estava nem aí pro fato de estar ou não impressionando os espectadores, tudo que eu pensava era nas mil libras de premiação pro primeiro lugar.
"Essa grana é minha!" pensei, e dei tudo de mim, levando meu corpo ao limite.
— Comak dá uma arrancada incrível agora! Esse garoto tem talento, senhoras e senhores. Mas Marian não se deu por vencido ainda e arranca também! Realmente não tem como saber quem vai vencer! Eles chegam a etapa final agora. Quem vai tocar a borda da piscina primeiro, Comak ou Marian?
Comak! Marian! Comak! Marian! Comak!… Deu Comak! Jayme Comak, o campeão da Hilston, vence por muito, MUITO pouco, senhoras e senhores! Sem sombra de dúvidas essa foi uma das melhores disputas desse campeonato nos últimos dez anos!
Tirei os óculos, olhei pro lado e vi Marian me olhar. Ele tinha um olhar frio, mas respeitoso, o olhar de alguém que sabe perder.
— Você é bom desgraçado — resmungou ele.
— Eu digo o mesmo — respondi estendendo o punho em sua direção.
Ele sorriu e então tocamos os punhos.
Quando saí da piscina, senti minhas costas estalarem sob o abraço orgulhoso do Sr. Greenwood.
Depois veio o pódio, a entrega das medalhas…
Às oito e vinte, quando já havia colocado minhas roupas de volta, pedi licença ao Sr. Greenwood pra falar com os Untochers. A primeira coisa que meus amigos fizeram foi me abraçar e desejar parabéns.
— Que tal nos reunirmos na casa do Marco pra comemorar hã? — perguntou Chris animado. — Fazemos uma vaquinha e compramos uma porrada de comida, daquela que causa infarto, tá ligado?
Todos riram.
— Vocês podem comemorar se quiserem, estou cansado e a fim de dormir a noite toda — respondi.
— Ahh, sem você não seria a mesma coisa, Jayme — protestou Chris. — Se você não vai participar então melhor deixar pra uma próxima então.
— É, melhor mesmo.
— Bem, já que o evento acabou, tô voltando pra casa — disse Tomas. — Cê vem comigo, Chris?
— Vou — respondeu ele.
— E você, Jayme, vai pra casa agora? — perguntou Marco.
— Ainda não — respondi com certa tristeza. — Prometi pro Sr. Greenwood que iria com ele falar com o prefeito e outros políticos. Mas você pode ir na frente se quiser.
— Sério mesmo?
— É, temos aula amanhã, não quero que você vá dormir tarde por minha causa. Sei que você precisa do seu soninho de beleza.
— Vá se foder — disse ele sorrindo. — Falou então, eu vou nessa.
Nós quatro tocamos os punhos e eles foram embora.
O Sr. Greenwood só me liberou pra ir pra casa depois de uma conversa extremamente chata com o prefeito, um esquerdista gordo, calvo e claramente corrupto, que adorava usar ternos de risca de giz.
Aquela conversa durou cerca de um milhão de horas. Era como ser pego na porra de um tsukuyomi.
Saí do ginásio onde aconteceu a competição, a apenas dois quilômetros dali ficava a casa do Marco, então segui a pé. Ventava um pouco, um vento frio e úmido, e o céu acima estava completamente negro.
"Vai chover logo", pensei. "Preciso me apressar ou vou me molhar."
Então segui em frente. O risco de acabar me molhando era bem mais agradável do que passar a noite naquele lugar comemorando com todas aquelas pessoas chatas e aqueles políticos.
*******
Quando eu completei o primeiro quilômetro de caminhada, de repente, um raio cortou o céu seguido de um trovão furioso e de uma onda de vento ainda mais frio; e então, pra finalizar o combo, grossas gotas de água despencaram do céu. A chuva estava fria, muito fria, quase como se tivesse acabado de sair da geladeira.
"Se tivessem me avisado eu teria trazido um guarda-chuva", pensei.
Não parei de caminhar, pus as mãos nos bolsos do jeans, me encolhi feito um filhote de pássaro e continuei a andar.
— Só falta um quilômetro, só um quilômetro — sussurrei, fazendo água voar de minha boca.
A chuva engrossou se transformando em um toró e raios rasgavam o céu em ziguezague. A água fria escorria por meu corpo derrubando o cabelo sobre a testa, lembrei que se ainda usasse franja minha visão teria sido ligeiramente bloqueada por ela, e senti saudades do meu antigo corte de cabelo.
Faltavam pouco mais de quatrocentos metros pra chegar à casa do Marco agora, eu estava tremendo de frio, mas continuava a caminhar.
Foi aí que aconteceu.
De repente, eu ouvi uma voz atrás de mim que se sobrepôs ao barulho alto da chuva. Uma voz feminina que me soou familiar, um pouco como uma lembrança da época de infância de um senhor de mais de setenta anos de idade.
— Jayme!
Surpreso e confuso, parei, franzi a testa e me virei pra ver quem era a pessoa que havia me chamado.
Meu coração bateu no pomo-de-adão quando vi o rosto da tal pessoa, e por um instante eu fiquei completamente imóvel, boquiaberto… Diante de mim, usando roupas encharcadas, com o longo cabelo negro caído no rosto escorrendo água, estava a pessoa que eu esperava nunca mais ter que ver novamente pelo resto de minha vida… Kelly Pricel.
Por favor votem e comentem para eu saber se estão gostando.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top