15

Minha concentração estava totalmente focada naquele notebook.

Eu estava editando o vídeo que havia gravado na noite anterior e que por sinal, havia ficado muito engraçado. Simplesmente amava a nossa interação. Éramos a melhor rodinha do rolê com certeza. A cada palavra falada era uma nova risada.

Eu ia editando cada momento para não deixar tão grande assim. Fora quase meia hora de gravação e também havia algumas partes muito desnecessárias que perdíamos tempo conversando e tirando o foco do jogo completamente. Algumas coisas eram até besteira. Não era nada que alguém realmente clicaria para ver.

Eu já estava mais ou menos há umas duas horas ali editando pelo menos e não estava nem na metade sequer. Estava assistindo primeiramente para saber em que ponto eu editaria, fazendo-o em seguida. Seria mais difícil assistir tudo e depois sair procurando o tempo para a edição.

Continuei ali a manhã toda. Dei uma pausa para o almoço e em seguida prossegui na edição. Levava muito tempo para mim editar cada detalhe perfeitamente. Havia uma diferença entre uma edição e uma edição bem feita. Queria obviamente me encaixar numa edição bem feita, porque eu fragmentava o vídeo no segundo certo para não ficar parecendo que o vídeo foi bruscamente cortado.

Depois de horas editando tudo, finalmente estava chegando ao final. Estava assistindo para poder fazer os cortes finais e poder enfim, mandar o vídeo para a plataforma do YouTube. Um riso se formou no meu rosto com Jennifer me jogando para beijar Andrew. Ela era louca, mas não sabia da minha farsa com Andrew, por isso me forçou àquilo.

Voltei a sentir o embaraço ao assistir aquela parte do vídeo onde beijo Andrew mesmo sem ele estar. Não sei o que estava acontecendo, mas de qualquer forma, continuei assistindo. O mundo de repente pareceu fazer silêncio, enquanto via aquilo acontecer quase que em câmera lenta. Eu parecia realmente estar viajando ao assistir aquele beijo. Senti-me perdido entre 1 milhão de estrelas até voltar à mim de vez.

Não sei de verdade o que havia dado em mim. Eu havia sentido uma leve pontada no coração com aquilo. Senti meu coração pesar por algum motivo que eu não sei explicar. Senti um fundo de tristeza ascender no meu íntimo, mas nada que me fizesse chorar. Era simplesmente como se um vazio tivesse se instalado tão de repente que eu não sabia como lhe dar.

Faço as considerações finais no vídeo e ele simplesmente acaba. O silêncio preenche aquele apartamento e eu já não sei o que estou sentindo ou porque estou sentindo. Apenas fico parado por alguns momentos. Deixo os sentimentos dentro de mim voltarem a ser exclusivamente a minha ansiedade por acabar de editar o vídeo para postar. Ele demora um pouco a chegar, mas por fim chega.

Concluí que aquela situação se deu pelo fato de eu ter assistido ao meu beijo com Andrew. Não sei se o que eu senti dentro de mim fora culpa pela mentira que eu estava contando e por aquilo estar chegando longe demais, ou porque me sentia tão estranho pelo beijo. De qualquer modo fora uma sensação estranha. Me senti completo por apenas um mísero segundo e depois senti-me completamente vazio de novo.

Continuei a editar o vídeo. Já estava mais perto do fim do que nunca. Naquele final, faria apenas um pequeno corte, que seria o da parte constrangedora do meu silêncio com Andrew e da nossa conversa mental. Deixaria apenas a algazarra de Jennifer seguido pelo nosso beijo. Achava que seria uma coisa que o público queria ver.

Meu celular finalmente toca com o novo toque que eu havia baixado. "Seu celular tá tocando, atende logo essa porra!", tocava sem parar até eu finalmente pegar o celular na minha mão e atender a ligação. Era Jennifer, e pelo modo como sua voz estava, parecia bem eufórica.

Eu: "O que foi Jennifer?"

Jennifer: "Amigo é uma emergência!"

Eu: "Que tipo de emergência?"

Jennifer: "Eu tenho um encontro com Giovanni!"

Eu: "Como assim? Mas tão rápido!"

Jennifer: "Olha, nem me julga. Vocês gays já trepam no primeiro encontro, então nem começa!"

Eu: "Não estou te julgando sua louca, apenas estou impressionado com a rapidez, achei que isso ia ficar para os últimos capítulos..."

Sorrio.

Jennifer: "Aqui não perde tempo não amor. Ontem mesmo já peguei o WhatsApp dele e já marcamos rolé para hoje meu amor!"

Eu: "Arrasou bi!"

Jennifer: "Amigo, a real é que estou precisando de uma ajuda para achar uma roupa para ir nesse rolé, já faz um tempão que não saio com um cara..."

Eu: "Relaxa amiga, já estou indo aí. Chego em poucos minutos, tchau!"

Jennifer: "Está certo amigo, tchau e beijos!"

Encerro a ligação.

Volto a por o celular em cima da mesa. Continuo a editar o final do vídeo. Em cinco minutos, o vídeo já estava completamente editado. Deixei enviando enquanto me arrumava para ir até à casa de Jennifer. Quando finalmente fiquei pronto, organizei tudo e saí.

Chegando lá em Jennifer, ela abriu a porta para mim entrar. Assim que cheguei na porta de seu quarto, vi um monte de roupas jogadas em cima da cama e algumas até no chão. O guarda roupa completamente aberto e mais de doze par sapatos enfileirados na frente da cama.

― Já vi que temos um grande trabalho pela frente! ― digo franzindo a testa e coçando a cabeça.

― Foi justamente por isso que te chamei amigo! ― diz ela. ― Confio no seu senso gay!

― Bem, então vamos lá!

Pedi a Jennifer que experimentasse alguns modelitos para mim para ver qual ficava melhor em seu corpo. Eu podia não ter um senso gay para moda tão bom quanto ela achava, mas eu sabia pelo menos combinar algumas peças e também tinha uma ótima visão para dizer o que havia ou não ficado bom no corpo dela.

Algumas pessoas acham que todo gay obrigatoriamente tem um senso de moda impecável. Alguns até têm, porque possuem um contato direto com a moda por um interesse pessoal, outros assistem esquadrão da moda e outros simplesmente nascem com este senso mesmo. Em todo caso, gays são gente feliz e não consultores de moda e isso nem sequer está implícito nas entrelinhas.

Depois de alguns modelitos que Jennifer desfilou para mim, cheguei à conclusão de qual ela deveria usar no encontro. Uma roupa bem básica que estaria ótima para qualquer ocasião, principalmente um rolê despojado de sexta à noite.

― Ai amigo, eu realmente estou segura agora! ― diz ela admirando sua imagem no espelho. ― Quando eu estiver completamente pronta vou estar vestida para matar. Hoje eu tiro as teias de aranha da minha perseguida, ah se tiro!

Dou uma risada.

― Credo Jennifer!

― O que foi garoto? ― pergunta ela me olhando pelo espelho. ― Até parece que você não transa com Andrew!

― Credo, mas é claro que NÃO!!! ― digo e logo me arrependo. Não havia raciocinando que Andrew e eu ainda estávamos fingindo ser namorados. Por um segundo aquilo escapou completamente da minha cabeça.

― É o quê??? ― Jennifer vira-se imediatamente na minha direção completamente estupefata. ― Como assim vocês ainda transaram?

― Não transando! ― jogo aquela resposta tentando pensar em algo melhor para dizer.

― Nem sequer cantaram no microfone um do outro ainda?

― Não!

― Mas como assim Andrew? ― Jennifer estava surpresa. ― Vocês moram na mesma casa e ainda não rolou uma trepada? Tem algo estranho aí meu colega!

Sinto um gelo percorrer meu corpo. A única coisa que se passou em minha cabeça, foi da minha farsa com Andrew. Será que Jennifer já estava começando a desconfiar? Meu coração estava acelerado e minhas mãos estavam começando a suar frio.

― Bem, eu sou da igreja! ― faço piada para desviar minhas tensões. ― Sexo só depois do casamento!

― Me diz que igreja foi essa para eu não pisar nem na calçada! ― ela entra na brincadeira.

― Foi a igreja da casa da moeda! ― digo rindo.

― Normalmente as pessoas pagam pra dar uma boa trepada, já você tá pagando pra não trepar amigo? Assim não dá né!

Rimos juntos.

― Mas falando sério amigo ― Jennifer retoma a palavra depois de finalmente ter parado de rir. ―, por que ainda não transou com o Andrew menino?

― Estou esperando em Deus! ― brinco novamente e percebo que mesmo que fosse Jennifer ali, não era o momento para mais piadas.

― Olha amigo, Deus não tá te impedindo de sentar naqueles cacete suculento do Andrew viu!

Tento inventar uma boa desculpa e por sorte consigo pensar rápido.

― A verdade, é que eu estou com medo sabe...

― Larga de fazer a sonsa que tu já deu essa raba!

― Mas é porque com o Andrew é diferente sabe... ― logo começo a executar minhas habilidades de atuação e peso minha expressão para parecer mais triste, como se realmente estivesse passando por aquele dilema. ― Eu realmente estou gostando dele, mas tenho medo que aconteça com ele o mesmo que aconteceu com o Ricardinho!

Começo a rebuscar minhas histórias do passado no intuito de criar algum trauma para explicar aquela situação na qual havia me metido por pura falta de atenção. Eu era um verdadeiro idiota.

― Foi logo depois que eu liberei a bundinha pra ele que ele me dispensou! ― concluo com uma expressão de desolação encarnando naquele falso trauma.

Jennifer mudou sua expressão. Ela franziu a testa como se estivesse reflexiva e fez um bico raso que logo fora substituído por uma mordiscada no lábio inferior. Pelo visto parecia que a minha pequena "mentira" estava funcionando e ela passara a acreditar nas tais palavras.

― Olha amigo, você conhece o Andrew desde a sua infância. Ele esteve com você há tanto tempo que diria que vocês se conhecem tão bem quanto eu conheço o meu clitóris. O que você tinha com o Ricardinho era totalmente superficial, mas o que você tem com o Andrew é real. Você já viu a maneira como ele te olha?

Balanço a cabeça em negativa.

― Os olhos dele brilham Max, só de te ver. É a maneira como eu queria ser olhada por alguém.

Nunca havia parado para reparar na forma como Andrew me olhava, mas nunca tinha visto nada demais. Ele me olhava como o amigo que eu era para ele. Havia um amor de irmandade entre nós, então é óbvio que Andrew ia me olhar com ternura e afetividade. Talvez Jennifer só estivesse vendo demais ou julgando mal o que via. Se toda forma, nada daquilo era real mesmo. Andrew e eu não estávamos apaixonados e talvez nunca estivéssemos.

― É óbvio que tem uma faísca entre vocês garoto, então vai lá e libera esse cú!

Eu achava incrível como num segundo Jennifer podia ser fofa e sensível, já no segundo seguinte estava falando putaria, mas também, se não fosse assim nem seria ela. Eu a adorava justamente por ser daquele jeito. Ela tinha o dom de me fazer rir por falar tanta besteira num minuto só.

Tudo que fiz foi rir. Não respondi mais nada. A conversa se deu por encerrada. Jennifer foi tomar um banho para começar a se arrumar de verdade enquanto eu fiquei ali mesmo no quarto esperando ela voltar para juntos arrumar àquela bagunça toda que Jennifer furacão tinha feito apenas para achar uma roupa para sair num rolê à noite com o Giovanni.

Quando Jennifer voltou arrumada do banheiro, arrumamos todo quarto como havia planejado e depois finalizou sua arrumação. Ela escolheu alguns acessórios para dar um realce ainda maior no seu visual completamente. Ela não costumava usar maquiagem, não por completo, então tudo que fazia era passar um delineador, máscara de cílios e um batom nos lábios apenas para dar uma cor à mais.

Já pronta, Jennifer viu no relógio que já marcavam quase seis horas da tarde e ela precisava correr para o encontro com Giovanni. Eles se encontrariam num ponto específico, mas ela precisava correr para não se atrasar. Meu trabalho por ali também já estava terminado, portanto voltaria para casa para jantar e depois responder os comentários de alguns inscritos no vídeo que eu havia enviado naquela mesma tarde à plataforma do YouTube.

Jennifer e eu descemos juntos até a portaria e foi ali que nos dividimos. Ela iria para seu encontro com Giovanni, que por sinal, era um ótimo partidão, enquanto eu voltava para o meu apartamento e para minha vida normalmente.

Assim que chego no prédio, vi quem eu menos esperava. Assim que a voz falou meu nome eu simplesmente congelei. Fiquei parado observando enquanto ele se aproximava de mim. Sim, Antônio falava comigo. Dei uma risada nervosa e também o cumprimentei educadamente, mesmo que no fundo da minha cabeça eu gritasse com ele.

― O que faz aqui? ― pergunto automaticamente e me sou conta de que não queria saber realmente. Simplesmente fiz no impulso.

― Não sabia? Minha irmã e a minha sobrinha moram aqui!

Finjo surpresa.

― Andrew não te contou? ― questiona. ― Eu já tinha dito isso à ele em nossos outros encontros aqui mesmo!

― Ah, ele deve ter comentado, só que minha cabeça é péssima! ― agora forço uma simpatia.

Ele ri como se aquilo fosse engraçado e eu o acompanho como se tivesse realmente contado alguma piada.

― E o Andrew? ― ele pergunta na maior cara de pau.

Traz o Óleo de Peroba aí!

― Ah, o Andrew está bem! ― respondo tentando soar o mais amigável possível. ― Na verdade está ótimo!

― Que bom! ― ele responde. ― Ele geralmente chega à essa hora né?

Minha vontade era de gritar ele, mas não o fiz. Eu nem o conhecia direito, mas só o modo como ele soava irônico em cada palavra me dava ódio de verdade.

― Sim, geralmente! ― forço um sorriso.

― Às vezes eu esbarro com ele aqui!

― É né!

― Mas hoje foi com você!

Aonde ele queria chegar com essa conversa toda? Estava fazendo muitas perguntas. Estava impaciente para ele naquele momento e talvez em todo o momento que ele dirigisse a palavra à mim.

Na noite em que Andrew me beijou repentinamente por causa dele, foi a primeira vez que eu o vi de fato. Naquele dia soube que eu o odiaria. Estava nítido na cara dele o quanto era sarcástico e falso. O tom dele sempre era de ironia, principalmente, quando se tratava de Andrew e eu.

Para falar a verdade, eu já o odiava por ter partido o coração de Andrew. Ninguém mais além de mim soube o quanto esse garoto sofreu com aquele maldito término. Eu estava de dentro e vi o quanto Andrew amava ele e o quanto o coração dele havia ficado destroçado. Aos poucos os cacos foram se juntando e quando finalmente Andrew está completamente curado, ele reaparece com o ar de "Te quero de volta". Só faltava o Rodrigo Faro agora.

― Você sabe dele? ― pergunta depois de um pequeno minuto de silêncio.

― Não! ― respondo voltando a me concentrar nele. ― Estou chegando agora da casa da minha amiga, então não sei se Andrew já chegou ou não em casa.

― Ah! ― sua expressão mudou de um ar interessado para um ar levemente decepcionado.

Mais um minuto de silêncio.

― Ele parece bem agora que vocês dois estão juntos!

É claro, depois que ele ficou mal por você...

― Ah, sim! ― falo balançando a cabeça afirmativamente. ― Andrew e eu nos damos muito bem mesmo!

― Estou realmente feliz por vocês! ― diz ele soando mais falso que os produtos da 25 de março e eu consigo ver isso nitidamente.

Sorrio forçado novamente em resposta e me despeço dele, subindo para o meu apartamento.

Não podia acreditar no que havia acabado de acontecer. Fora um tanto constrangedor, assim como no outro dia. Acho que nem beijar o meu melhor amigo havia sido tão constrangedor assim.

Entro no apartamento e vejo que Andrew já chegou. A mochila dele está em cima só sofá, mas não o avisto. Talvez estivesse tomando banho ou algo do tipo. Chamo por ele. Ele grita em resposta e eu acompanho o som que realmente vinha do banheiro. Eu estava certo.

Eu estava faminto. Fui até a cozinha para procurar alguma coisa para comer. Comi as sobras do almoço. Era tudo o que tinha já pronto. Não estava à fim de preparar nada naquele momento. Coloquei minha comida e logo Andrew chega aonde eu estou. Ele está com a toalha na cabeça, sem camisa e usando um calção vermelho. A toalha de sua cabeça, coincidentemente também é vermelha.

― E aí, o que tem pra rangar? ― pergunta ele passando a mão na barriga e dando três tapinhas logo em seguida.

― Umas sobras do almoço na panela! ― respondo ainda com a boca um pouco cheia. Dou um gole no suco para desentalar.

Andrew pega um prato e alguns talheres no armário, colocando um pouco da comida. Ele se senta na mesa, me acompanhando e logo começa a comer também. Ele me encara enquanto dá a sua primeira garfada. Levanto as sobrancelhas num movimento continuo, dando um sorriso malicioso o que o faz rir e logo depois ele volta os seus olhos para o prato.

― Adivinha quem eu vi hoje quando eu vinha entrando no prédio? ― digo fazendo um bico e faço uma careta logo em seguida.

― Não sei, não faço a mínima ideia! ― ele nem sequer tenta adivinhar.

― Não mesmo? ― insisto para que ele se esforce um pouco mais. ― Acho que você sabe essa resposta!

― Sei lá! ― ele faz pouco caso, mas logo para e arregala os olhos, depositando o seu olhar em mim. Pude ver a resposta invadir a sua cabeça naquele momento. ― Antônio? ― indaga quase certo de que aquela era a resposta certa.

― Exatamente! ― confirmo com um gesto de cabeça e como mais um pouco da minha comida.

― Isso é sério? ― ele dá uma risada.

― Sim! ― afirmo. ― Acho que ele esperava ver você, pelo modo como perguntou de você, quase esperando que eu te tirasse do meu bolso.

Andrew enche a sua boca de comida para não ter que comentar nada sobre aquilo. Via um pequeno riso contido na sua expressão. Era quase como se ele tivesse gostado de ouvir aquilo. No fim das contas, acho que ele ainda gostava do Antônio, mesmo depois do período de trevas que viveu em sua vida depois do término deles. Talvez alguns corações não se cansassem de ser massacrados. Talvez até mesmo gostassem disso ou em outro caso, não cometeriam o mesmo erro com a mesma pessoa. Aquela foi a minha impressão, não que realmente fosse aquilo. Talvez Andrew só tivesse gostando de ver como Antônio estava parecendo um cachorrinho atrás da migalha do dono e se fosse o caso, não o censuraria, porque no lugar dele também estaria fazendo o mesmo.

― Bem, acho que alguém te quer de volta! ― digo esperando alguma reação por parte dele, mas tudo que obtenho é mais silêncio e uma garfada em seu prato. ― Agora que ele viu que você está finalmente desalavancando o seu canal, deve estar querendo voltar atrás!

― Olha, acho que realmente ele não está vindo nesse prédio só para me ver! ― ele diz finalmente balançando a cabeça negativamente e ondulando as sobrancelhas, voltando seu olhar para o prato e mexendo na comida com o garfo.

― É sério? ― dou uma risada sarcástica. ― Eu não acredito em coincidências!

― Bem, talvez seja um bônus, não sei. Tudo o que eu sei, é que outro dia o vi com a sua sobrinha. Ele, a sobrinha e a irmã dele iam sair. Ele realmente gosta daquela garotinha e parece um tio bem presente. Então, com certeza ele não vem à esse prédio só por mim! ― ele força um breve meio sorriso e volta sua concentração totalmente em seu prato com a comida ainda pela metade.

O silêncio se instala ali pelo resto da refeição. Eu termino de comer antes dele e o meu primeiro impulso que tenho assim que encosto a colher no prato, é olhar Andrew comer. Ele parecia meio distante, de uma forma que nem ao menos percebeu que eu o estava observando comer. Parecia estar no mundo da lua. Acho que realmente estava. Seu olhar era vago e fixo. Não havia prova maior de que sua mente estava viajando por um universo paralelo. Ele não demora muito a voltar e quando volta, percebendo que o estou fitando e apenas desvia o olhar, voltando a dar mais uma garfada em sua comida.

Eu não precisava ser nenhum vidente ou mesmo um gênio para saber que havia algum problema com Andrew. Mesmo depois de ter voltado do seu universo distante, seu olhar ainda parecia distante. Lembrei que ainda não o tinha visto sorrir de verdade naquele dia. Não espontaneamente. Continuo a encará-lo, então ondulo a sobrancelha.

― O que foi que aconteceu hein? ― pergunto finalmente. ― Não foi só o meu comentário sobre o Antônio que te deixou assim não é mesmo?

Ele não responde nada, mas seu olhar lhe denuncia automaticamente.

― Anda, me conta o que é que está te incomodando! ― peço.

Andrew para de comer e olha fixamente para mim, totalmente sério e silencioso. Falei aquilo porque o conhecia suficientemente bem para saber que algo mais o estava incomodando. Eu era o melhor amigo dele. Quase um irmão. Crescemos praticamente juntos. Já havia tempo suficiente para nos conhecermos, além de mais dois anos em acréscimos convivendo juntos sob o mesmo teto.

― Bem, quando você falou sobre o Antônio e o meu canal, acho que não é bem assim... ― ele diz vagamente e sua expressão é melancólica.

― Não estou entendendo!

― Bem, talvez você tenha notado que eu não gravei mais vídeos para o meu canal nesses últimos dias...

― Notei! ― confirmo. ― Notei sim!

― Então, bem, eu não sei se consigo continuar sendo um youtuber.

― O quê? ― questiono tomado por espanto. ― Mas era o nosso maior sonho na adolescência!

― Talvez fosse apenas um sonho adolescente, um fogo jovem!

― Ah, nem venha com essa amigo, porque eu sei exatamente o que é um fogo jovem!

― Não é isso o que eu quero dizer!

― Então me fala o que você quer dizer, porque eu realmente não estou entendendo nada!

― Acho que não estou pronto de verdade para ser um youtuber, não consigo nem aguentar um hater...

― Então isso tudo é por causa de um hater?

― Não! ― ele responde rápido e depois faz uma careta. ― Sim! ― ele corrige forçando o sorriso.

― Olha Andrew, eu sei que é chato contar com haters, mas infelizmente eles existem e temos que conviver com isso.

― Eu sei, mas...

― Já tentou apagar os comentários como te sugeri da outra vez? ― pergunto. ― O que os olhos não vêem o estresse não sente!

― Já Max, mas esses haters pareçam duplicar depois que eu assumi esse namoro com você!

― Eu também tô tendo que lhe dar com haters, mas a gente ignora, porque mais forte que qualquer hater, é o retorno bom das pessoas que nos acompanham e que amam o que a gente faz. Quem são os haters na fila do pão?

― É, você tem toda razão!

― Eu sei meu anjo, porque acha que eu não passo frio?! ― nem sequer dou tempo para ele responder algo e em seguida já falo: ― Porque estou coberto de razão! ― logo gargalho bem alto como se aquela fosse a melhor piada do mundo que eu já contara, acontece que eu não sabia contar piada.

Andrew ri com a minha risada e em seguida o clima se torna mais leve. A expressão densa de Andrew já se fora e agora estava renovada, iluminada. Mesmo já tendo parado de rir, via em seus olhos um novo ar. Andrew pôs sua mão sobre a minha e em seguida levantou-se caminhando em direção a pia para lavar o seu prato. Ele também se ofereceu para lavar o meu. Eu não disse que "não". Entreguei-lhe o meu prato, mas não fiquei apenas sentado olhando. Andrew lavou e eu os enxuguei, guardando posteriormente no armário de louças.

― Sabe de uma coisa? ― Andrew falou enquanto eu guardava o último talher no seu devido lugar. ― Você é o melhor namorado que eu já tive, mesmo que de mentirinha!

― Olha, modéstia à parte, mas eu sei disso! ― digo num tom brincalhão e dou uma risada em seguida.

― Olha, eu falo sério mesmo! ― Andrew está sorrindo.

― Então porque você está sorrindo seu bobo?

― Porque eu sou um bobo!

Rimos juntos. Depois de algum tempo, finalmente paramos de rir.

― Agora eu estou falando sério! ― diz ele se esforçando ao máximo para não rir.

― Se eu contar até três você vai rir de novo! ― digo voltando a rir.

― Não vou não!

― Vai sim!

― Não senhor!

― Então prove! ― falo semicerrando os olhos. ― Vou contar agora. ― Levanto o dedo indicador e começo a contagem. ― 1... 2... 3...

Mesmo no três Andrew ainda não havia caído na gargalhada. Ele se esforçara o máximo para não rir, então gritei o número o que fez Andrew se assustar e cair na gargalhada.

― Viu? Eu falei! ― digo apontando para ele rindo consequentemente.

― Você disse no três e eu só ri no quatro!

― Mas ainda sim riu na contagem!

― Você roubou!

― Não roubei não! Ninguém mandou você ser tão besta assim para rir.

― Talvez você me dê motivos para isso!

― Não sou nenhum palhaço!

― Você é um youtuber, o que é muito mais idiota que um palhaço!

― Você também é um youtuber, não se esqueça disso!

― É justamente por isso que eu posso falar!

Rimos mais um pouco e aos poucos vamos baixando o riso até por fim extinguí-lo naquele momento.

― Agora vou falar sério de verdade! ― o tom de Andrew agora é firme e brando. ― Você realmente é um ótimo namorado. Você é um ótimo companheiro, sabe aconselhar quando necessário, sabe ouvir muito bem, além de que não se conforma com a derrota de quem ama. Você tem piadas extremamente horríveis, mas compensa tudo com a sua risada espalhafatosa. É a melhor risada que alguém poderia ter. Certamente faria o seu verdadeiro namorado muito feliz!

Não falei nada. Estava completamente mudo e estático. Aquelas palavras haviam me invadido como uma onda. Não sabia o que dizer. Talvez não precisasse. Sentia o meu coração correr como em uma maratona, mas não estava indo à lugar nenhum. Sentia que minha mente podia girar mesmo eu não estando em movimento. Era tudo uma questão psicológica.

Tudo ficou quieto tão rapidamente. Achava aquilo tudo meio constrangedor. Foi algo tão repentino e espontâneo que não saberia como qualificar. Fui pego totalmente desprevenido. Tudo o que eu fazia era olhar fixamente para Andrew que também fazia o mesmo em total o tal silêncio. Por algumas vezes mexi meus lábios levemente à fim de dizer alguma coisa, mas meu corpo e meu cérebro pareciam trabalhar totalmente antônimos naquele momento.

― Bem, acho melhor eu ir dormir! ― disse Andrew depois de um longo período em total silêncio. Por isso todo o constrangimento. ― Tenho que ir trabalhar logo cedo amanhã! ― ele completa. ― Boa noite!

Tudo que consigo sentir são as fortes batidas do meu coração num compasso marcante. Não sei dizer o porquê de eu estar daquela forma, mas nada sai de mim, mesmo que eu quisesse e eu queria. Observo Andrew se afastar lentamente. Meu coração sente um breve vazio ao vê-lo ir. Sinto que estou franzindo a testa vendo a imagem dele se afastando cada vez mais. Sinto um novo sentimento brotando aos poucos naquele momento e não saberia descrevê-lo com palavras. Sinto-me vivo e é tudo o que eu consigo descrever.

― Boa noite! ― respondo por fim mesmo aquilo não sendo tudo o que eu queria dizer afinal.

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