Capítulo 21


       Não tive mais sonhos como o da outra noite, mas pensar nele ainda me incomodava. Aqueles olhos não saiam da minha cabeça, castanho escuro quase preto. Era como se eu os conhecesse, mas não soubesse quem era o dono. Esdras e Nike não poderiam ser, seus olhos eram azuis. Tristan também não era naquela tonalidade e eu jamais sonharia com aquele idiota. Talvez Logan? Seus olhos sempre me foram familiares, mas ele disse que não me conhecia.

       Resmunguei frustrada e cruzei os braços.

       — O que foi dessa vez? — meu guarda perguntou já esperando uma reclamação de minha parte.

       Estávamos no pátio aproveitando o Sol, ou melhor, eu estava aproveitando o Sol enquanto Esdras me vigiava. Aquela era a melhor parte do dia para mim, sentir os raios solares baterem contra minha pele me lembrava de uma época muito distante, quando eu ainda era um anjo. Eu sentia falta das asas, dos poderes e até mesmo de alguns anjos que eu considerava amigos.

       — Eu só estou cansada de fazer nada.

       Era verdade, me sentia uma inútil naquele lugar.

       — Encontrou alguma coisa sobre Martha enquanto estive fora?

       Concordei movimentando a cabeça.

       — Entrei no histórico dela.

       Kalamari me olhou feio, ele não gostava de quebrar regras.

       — O que? Era o único jeito de encontrar mais informações.

       — Como você conseguiu invadir o sistema? — perguntou colocando as mãos na cintura e arqueando as sobrancelhas.

       — Tive uma pequena ajuda — respondi dando de ombros.

       — Nem me diga quem foi, prefiro não saber.

       — Eu não ia te contar mesmo.

       Seria melhor preservar a imagem de Logan, não queria trazer mais problemas para aquele garoto que já era complicado demais sem minha ajuda.

       — Mas enfim, descobri que está em branco. Ela não tem nenhum crime registrado.

       O guarda fez a mesma expressão que eu no dia em que descobri, completa confusão mental.

       — Isso não faz sentido, não pode estar certo.

       — Foi o que pensei! Como alguém é preso sem cometer crimes? Isso só concretiza minha suposição de que ela não é humana.

       — Devia ter um motivo para ela estar aqui — ele completou meu pensamento.

       — Laysa me disse que a Martha sofria de depressão e o reformatório não permitiu que ela continuasse tomando seus medicamentos. Mas e se os remédios fossem para outra coisa? Algo muito além de uma doença mundana.

       — Você acha que a Corte fez alguma coisa que a obrigou a se medicar?

       Assenti.

       — Cair... Isso mexe com a cabeça de um anjo. Podemos acabar cometendo loucuras. Se Martha for um anjo caído, ela pode ter sofrido demais e ido atrás da Corte para pedir perdão, já aconteceu casos assim antes.

       — O que a Corte faz quando isso acontece?

       — Piora a situação do anjo para mostrar que a culpa foi dele.

       Aquilo só havia passado por minha mente naquele momento. Poderia realmente ser culpa da Corte os medicamentos.

       — Antes de cair vi uma garota ser infectada com uma doença recorrente na época, tudo porque ela clamou perdão.

       — Isso é horrível.

       — Eu sei — admiti.

       Foi então que tive uma ideia da qual Esdras não iria gostar.

       — Você poderia ver as coisas dela que o reformatório guardou, aposto que ainda estão lá.

       Eu já esperava pela cara que ele fez em minha direção.

       — Você realmente quer que eu seja demitido, não é? — ironizou.

       — Claro que não. Quem eu vou incomodar se você for embora? — brinquei irritando-o ainda mais.

       Esdras revirou os olhos e segurou meu braço me puxando em direção à secretaria.

       — Espera aqui fora — disse entrando no prédio.

       Observei o guarda passar pelas portas de vidro e trocar algumas palavras com a mulher atrás do balcão da secretaria. Ela sorriu e mexeu no cabelo claramente dando em cima dele, apenas revirei os olhos e mudei meu foco de visão para outra direção.

       Alguns minutos se passaram até ele voltar a passar por aquelas portas com uma cara nada boa.

       — E então?

       — É mais complexo do que a gente imaginava — disse continuando a caminhar, o que me obrigou a segui-lo.

       — Por quê?

       — Ela usava Azatioprina e Prednisona.

       — E daí?

       Ele parou no meio do pátio e me encarou sério.

       — Minha mãe usava esses remédios, são imunossupressores.

       — Esdras, na minha língua por favor — falei ansiosa.

       — São usados para o corpo aceitar o órgão transplantado.

       — Espera... O que? Martha fez um transplante antes de entrar no reformatório?

       O guarda assentiu.

       Se aquilo fosse verdade, então poderia não ter relação com a Corte. Faria mais sentido Martha ser uma garota normal que por alguma fatalidade decidiu tirar a própria vida no banheiro feminino do reformatório.

       — Então eu estava errada esse tempo todo — disse desanimada.

       — Eu não acho — rebateu me pegando de surpresa — Martha morreu exatamente como dizia naquele livro macabro que você encontrou na biblioteca. Não pode ser coincidência aquelas marcas de garras.

       Eu tinha esquecido daquele fato. Foi então que lembrei de algo dos meus primeiros dias no reformatório.

       — Teve uma noite que vi alguém pulando pelo muro para dentro do reformatório. Quando fui ver quem era acabei encontrando Logan e esqueci totalmente disso — contei.

       — Quem é Logan?

       — Isso não vem ao caso. A questão é que alguns dias depois Martha foi encontrada morta. Não sei se isso tem alguma relação, mas é de se cogitar que a mesma pessoa que entrou naquela noite foi também a assassina de Martha.

       — Você sabe que devia ter contado isso para os policiais, não é?

       — E você sabe que eu não sigo regras.

       Se tivesse contado para os policiais naquela manhã, eu poderia ter me tornado uma suspeita na investigação. Eu não precisava de mais problemas na minha vida fora da lei.

       Kalamari respirou fundo e negou com a cabeça, o que ele sempre fazia quando eu dizia algo que não o agradava.

       — Isso pode sim ter alguma relação, mas precisamos descobrir quem era essa pessoa, o que não vai ser fácil.

       Ele estava certo, a única informação que eu tinha era que alguém pulo o muro. Não havia nenhuma prova concreta para descobrirmos quem era.

       — Ainda bem que temos bastante tempo para descobrir, eu não vou a lugar algum nos próximos meses.

       E não iria mesmo.




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Então... kkkk

A história da Martha é mais complexa do que a gente imaginava, mas o que vocês acham que tudo isso significa?

Quero muito saber a opinião de vocês <3

Bjs e até o próximo capítulo. 



Vi Mello

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