Prólogo (Linda Gowin)

A brisa fria bate contra os meus cachos enquanto observo o vasto jardim da casa de campo da minha família.Três batidas são desferidas contra a porta do meu quarto, as três seguidas, isso significa que quem está à minha procura é a bruxa da governanta, essa mulher me tira a paz.

— Senhorita Gowin, o seu padre está a sua procura — Sua voz moldada de sarcasmo alcança os meus ouvidos.

— Saia! — Ordeno ainda observando os jardineiros trabalharem no jardim— Acredito que sua idade avançada ainda não afetou sua audição.

Essa velha maldita já me chamou de procriação maldita, filha amaldiçoada de lilith e praga do demônio, então eu coloquei fogo no quarto dela enquanto ela estava dormindo, eu quis apresentar um pouco o inferno para ela.

Me viro sobre os meus saltos e observo a mulher de idade avançada, seus cabelos grisalhos com pouquíssimos fios ainda ruivos moldam sua cabeça desproporcional ao seu corpo pequeno e rechonchudo.

Ela permanece imóvel no mesmo lugar, reviro meus olhos e dou alguns passos em sua direção, mando beijos e passo por ela com um sorriso falso que se desmancha quando cruzo o limiar. Ando pelos corredores com decoração rústica, piso e móveis de madeira envernizada, os quadros pendurados na parede com fotos antigas dos meus pais. Abro a porta do escritório e o meu padre se vira enquanto ainda está sentado em sua poltrona.

— Hija — Se levanta com seu famoso entusiasmo, me aproximo e abraço apertado—Como foi a viagem?

— Ótima, porém o seu motorista, deixou minha bolsa cair e os meus perfumes se partiram em milhares de caquinhos— Desfaço o abraço e ele passa sua mão pelos meus cachos.

— Impressionante como são todos incompetentes.

— Hija, não quero que fale assim dos nossos funcionários, eles são extremamente competentes e acidentes acontecem —Beija minha testa e me afasto indo até o armário de fotos da minha madre.

— O papá irá comprar uma coleção inteira de perfumes para você.

— Obrigada, eu sinto que o senhor tem algo para me contar — Abro o armário pegando um porta retrato médio— Não me diga que irá viajar novamente.

— Impressionante como você pressente as coisas, hija — Me viro para o meu pai que parece envergonhado com algo.

— Diga padre, o que ouve? — Pergunto e a porta do escritório é aberta por uma empregada.

— Com licença queridinha, estamos conversando, depois você volta e limpa.

— Linda, na verdade é justamente sobre a Magda que quero conversar com você. 

Ele caminha até a mulher que está vermelha, a vejo sussurrar algo em seu ouvido e ele a acalma.

— O que foi? Ela pegou algo enquanto fazia a faxina? — Pergunto voltando minha atenção para o armário repleto de fotos da minha madre— Padre, tenho apenas quartoze anos, mas o senhor podia tanto me dar um carro, todas as minhas amigas já tem um.

— Hija—Me viro e apoio minhas mãos na cintura, desço meu olhar até a mão dos dois que estão entrelaçadas—Eu e a Magda estamos noivos, isso já faz seis meses.

— O QUE? — Pergunto desacreditada— Padre seu mentiroso, você prometeu amar minha madre para sempre!

—Hija..—Tenta se explicar, mas as palavras parecem fugir da sua mente.

— Faz quartoze anos que sua mãe se foi, e a Magda…

— É uma prostituta interesseira — A defino dessa maneira, pois é o que ela é, uma interesseira barata que está de olho no dinheiro do meu padre— ESSA É A CASA DA MINHA MADRE.

— Linda — Meu pai muda o tom de voz para um grave e autoritário— Hija, basta.

— Não! O senhor mentiu para mim, me enganou e agora está transando com uma puta barata—Viro meu rosto pelo impacto do tapa, apoio minha mão na minha face esquerda e respiro fundo, assustada.

— O senhor me bateu por causa dela?—Pergunto com a voz embargada— Eu odeio você. ODEIO! — Grito olhando para a mulher que tenta se aproximar.

—Querida eu não quero nada do seu pai—Tenta encostar em mim e lhe acerto alguns tapas—Eu nunca vou roubar o lugar da sua mãe.

— Não mesmo, sua porca, imunda, eu vou transformar sua vida em um verdadeiro inferno—Eu odeio você padre, DETESTO. 

Saio correndo do escritório, o meu padre nunca alterou a voz para mim, e hoje ele me agrediu por causa daquela vagabunda.

Entro no meu quarto, bato a porta e começo a quebrar todas as coisas que entram em meu campo de visão, o barulho dos espelhos se partindo, os frascos de perfumes, abajures e todas as coisas que ocupam minha escrivaninha. 

Me jogo na cama sentindo um ódio crescer dentro do meu peito, não acredito que ele teve essa audácia de trazer sua prostituta particular para dentro da casa que a minha madre amava, tudo que tem nessa casa, reflete a imagem dela, eu não tive a imensa sorte de conhecer minha madre, mas sou apaixonada por ela, eu a amo mesmo sem a conhecer e essa pouca vergonha, fere a imagem da única pessoa que não tive o desprazer de conhecer o pior lado.

Levanto minha cabeça enquanto as lágrimas caem sem piedade alguma, meus olhos ardem pelo tenebroso ódio, me levanto fazendo meus pequenos saltos se firmarem sobre o piso de madeira. Se ela pensa que ficará com algo, está muito enganada, ela jamais terá o que é de Sarah Gowin, mi madre.

Vou até o meu closet jogo as minhas roupas, malas e lençóis sobre o chão, pego o frasco com álcool em gel e jogo sobre todas aquelas coisas.

— Eu vou fazer você se lembrar de mim, Magda— Saio do meu quarto segurando um frasco de vidro repleto de álcool.

Desço os degraus e vejo as malas da cachorra entrando na casa sendo carregadas pelos seguranças.

— Psiu, vocês — Chamo a atenção deles que se viram para mim— Podem deixar a mala ali — Aponto em direção às cortinas e eles se entre olham.

— Mas o senhor Gowin mandou levá-las para a suíte—O fuzilo com o olhar e eles me obedecem.

— Deixem as malas próximas às cortinas— Me empreste seu isqueiro — Estendo minha mão para um dos seguranças fumantes que pega o isqueiro em seu bolso e me entrega— Saiam e levem os outros funcionários.

— O que? — Ele me pergunta e jogo o frasco de álcool sobre o chão a centímetros das malas, aperto o pequeno botão vermelho fazendo a chama sair por entre o buraco duplo— Adeuzinho — Jogo o isqueiro em direção à poça de álcool e em segundos o fogo se alastra por todo o lugar— Magda.

Abro um sorriso quando o fogo passa para as cortinas, os seguranças tentam se aproximar, mas o fogo se espalha por todas as enormes cortinas brancas as queimando como uma alma que acaba de chegar ao inferno.

Saio saltitante da sala de estar, ouço os gritos desesperados, abro a porta da saída e saio do imenso casarão da casa de campo. Pego meu óculos escuro que está no topo da minha cabeça e o coloco.

— Bonito, não?— Pergunto quando a bruxa da governanta para ao meu lado, abaixo um pouco meu óculos, ela franze o cenho e balança a cabeça em negação.

Se a minha mãe não teve tempo de aproveitar a sua residência, prostituta barata nenhuma fará isso. Pelas imensas janelas vejo o fogo passar de cômodo para cômodo, balanço levemente meus cachos enquanto vejo as pessoas saírem de dentro da casa em chamas.

— Bonito, não? — Ouço a voz insuportável da governanta e meus passos vacilam enquanto caminho em direção a onde meu padre está desacordado.

— Padre — Meus passos se intensificam e quando me aproximo puxo uma respiração longa o vendo ficar pálido— Não…meu padre — Tento me aproximar, mas a Magda me empurra.

— Isso é sua culpa — Acabo caindo no chão, desvio meu olhar do meu padre, para a mulher à minha frente—VOCÊ MACHUCOU SEU PRÓPRIO PADRE!

— NÃO! — Nego em um grito angustiante— É sua culpa, você é a culpada— Me levanto e passo por ela— Padre, deixa ele, solte ele— Digo já entre o choro.

— Ele está respirando, precisamos levá-lo ao hospital — Alguns dos seguranças afastam as pessoas da casa em chamas—Pegue o carro

— Senhorita Gowin, acho melhor ficar — Uma das cozinheiras diz tranquilamente, nego vendo eles se afastarem com o meu padre desacordado—Os bombeiros estão a caminho.

— Eu não queria machucar ele— Nego cobrindo meu rosto com minhas mãos— Por que eu tenho que ser assim?

Sinto apenas quando a mulher me abraça, deito minha cabeça em seu ombro ouvindo a sirene dos  bombeiros e o carro ser acelerado.

— Sempre brincando com fogo — A governanta se aproxima e meu choro se intensifica— Você acabou queimando seu próprio papá.

(...) Horas Após

Abraço meu próprio corpo pelo frio, o incêndio foi dado como um acidente, meu padre está no quarto descansando, ainda não foi permitida a minha entrada. Eu fiquei cega pelo ódio, eu jamais iria querer machucar meu padre, eu queria machucar ela, Magda, ela está roubando meu padre de mim, eu não quero estar sozinha, apenas em pensar nisso me sinto sufocada.

— O seu padre está chamando por você — Levanto minha cabeça vendo a cara horrenda da Magda— Não diga nada para o aborrecer, ele já está muito cansado.

— Cale essa sua boca — Paro a sua frente e a encaro— Nunca mais dirija a palavra a mim.

Passo por ele e entro no quarto correndo, vou até o meu pai e me jogo sobre ele.

— Perdoe-me padre — As lágrimas novamente inundam meus olhos—Eu não queria machucar o senhor.

— Hija, eu sei que não tinha a intenção de me machucar — Sua mão passa pelo meu cabelo e respiro aliviada.

— Prometa que não me odeia — Levanto minha cabeça o observando— O senhor é o amor da minha vida.

— Eu sou incapaz de odiar a luz da minha vida, pois é isso que você é Linda, minha pequena hija, você é o grande amor da minha vida, e sempre será — Limpa minhas lágrimas e seguro em sua mão beijando o dorso— Mas você deve confessar, que desta vez você passou de todos os limites hija.

— Sim papá, eu reconheço — Ele acaricia minhas bochechas e respiro fundo— Ficarei sem mesada?

— Também — Diz e maneia a cabeça, me sento e ele hesita um pouco, mas respira profundamente— Você irá para um colégio interno em Bogotá.

— O senhor me detesta — Me levanto e ele se senta sobre a cama— Está me afastando pois está com medo.

— Hija, não é isso, você precisa de limites, o colégio San Carlos é o melhor para discipliná-la — Apoio minha mão em meu peito e sinto como se o mundo se abrisse abaixo dos meus pés.

— Ela colocou isso na sua cabeça, não foi papá? — Pergunto entre dentes e ele me olha com desconfiança— Por favor, eu não posso ficar em um lugar, reclusa, como um animal.

— Linda, está decidido que você irá amanhã mesmo para a capital, sem choros, dramas, falsos desmaios ou qualquer coisa que envolva um crime — Aponta para mim antes que eu finja um desmaio.

— Isso não é justo — Bato meu pé no chão em forma de protesto— Estou passando por um trauma — Começo a chorar e ele se levanta.

— Você terá apenas um cartão de crédito com um limite – Se aproxima e abro minha boca para dizer algo e ele nega— Para que você gaste aos finais de semana.

— Eu não voltarei para casa nos finais de semana? — Ele nega com um balançar de cabeça— Padre, por que está me torturando?

— Preciso responder, hija?--- Pergunta e para a minha frente— Você vai sobreviver querida, é forte e inteligente—Beija minha testa e passa por mim me deixando sozinha dentro do quarto gelado e silencioso.

Nos deslocamos para a nossa casa de Medellín, onde eu e meu padre moramos durante dezessete anos, não acredito que irei para Bogotá sozinha, meu padre nunca me deixou sozinha na vida. 

Tomo um banho quente, enquanto minhas malas são arrumadas, desta vez não a escapatória Linda, você está totalmente ferrada.

(Dia Seguinte)

Olho para frente vendo o meu pai dirigir o carro enquanto a Magda está ao seu lado sentada no banco de passageiro. A viagem foi uma tortura, eu tenho nojo de casais ainda prematuros, eles são tão melosos e vivem se beijando, isso me dá repulsa.

Bufo em irritação ao ver a fachada do colégio, e os diversos carros parados na entrada do imenso portão de ferro. O carro do meu pai passa pelo portão e observo o campus do colégio San Carlos, a grama verde e os vários alunos sentados em suas rodinhas de amigos.

Olho para trás vendo o carro dos seguranças, o carro para em uma vaga ao lado esquerdo do colégio, coloco meu tablet dentro da minha mochila e bufo em irritação. A porta é aberta, retiro o cinto de segurança e saio do carro, retiro meu óculos escuro observando o prédio da escola, algo mais antigo e rústico, bem parecido com um castelo que foi abandonado e eles invadiram.

— Hija — Me viro para o meu pai que abre os braços, deixo meus ombros caírem e vou até ele o abraçando apertado— Aproveite filha, faça amigos e viva intensamente.

— Você é o meu melhor amigo — Digo e ele me abraça ainda mais apertado— Tem certeza que um desmaio não funcionaria?

— Tenho certeza — Me afasto e olho para trás vendo minhas malas serem tiradas do porta malas— Precisamos ir — Olha em seu relógio e faço um biquinho.

— Eu amo você padre — Ele sorri e passa sua mão pelo meu cabelo— Por favor, aumente aquela merreca de limite.

— Boa sorte, hija — Beija os dorsos das minhas mãos— Padre ama você, muito.

— Adeus papá — Aceno para ele e solto suas mãos, sorrio para ele e o observo entrar em seu carro, buzina duas vezes e aceno com as duas mãos.

Respiro fundo e me viro para o colégio, analiso a estrutura e arqueio minhas sobrancelhas.

— Precisa aceitar seu novo lar, Linda Gowin.

*Mais uma personagem apresentada a vocês. (Deixando claro, que Linda foi para o colégio, três anos antes que as outras meninas)

*Capítulo escrito por AutoraEstelar

*Quinze comentarios e liberamos o próximo prólogo 🫶

(Linda Gowin)

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