Por volta de 2025, as coisas começaram a mudar em todo o globo, principalmente no Brasil. Doenças e vírus novos eram mais frequentes. As pessoas começaram a migrar para longe das cidades que eram mais afetadas economicamente, e assim algumas cidades e países estavam superlotados. A economia não era mais a mesma, e, por conta das novas doenças surgindo, muitos médicos foram levados à "loucura". Foi nessas circunstâncias que a família Caller conseguiu crescer mais ainda, e juntos construíram um império mundial.

A natureza também estava desordenada, fazendo com que as estações do ano ficassem fora de ordem. No verão fazia muito calor, e no inverno havia frio ao extremo. O Brasil, que era considerado um país tropical, enfrentava o maior inverno de todos os tempos. As estações duravam mais do que o esperado, e ninguém sabia se o planeta Terra aguentaria por mais tempo.

Por volta de doze anos depois que tudo mudou, naquela noite de inverno, Melissa permanecia sentada observando o caderno que tinha separado para escrever o roteiro do seu primeiro vídeo.

Havia passado aproximadamente trinta minutos que teve um encontro com Deus, e, depois de fazer a oração mais sincera que fez em toda sua vida, continuava sem inspiração para escrever o roteiro do vídeo. Chateada, levantou da cadeira e foi em direção à janela de vidro. Cautelosamente, levou as mãos até a cortina cor de pastel e a puxou para o canto, permitindo que o vidro ficasse aparente. Lá fora, a neve caía, deixando o chão totalmente branco, mas nenhum repórter arredou o pé do jardim da mansão. Melissa sentiu um calafrio correr por todo o corpo e logo puxou o casaco mostarda contra seu corpo. O casaco mostarda, o mesmo que Fernando lhe dera há duas semanas.

— Eles realmente não vão embora? — falou e balançou a cabeça.

Um repórter percebeu que a janela de Melissa estava aberta e rapidamente ligou a câmera, mas a médica fechou a cortina a tempo de não ser fotografada.

— Quando isso vai acabar? — perguntou e respirou fundo.

De volta à cadeira, Melissa resolveu gravar aquele vídeo mesmo que estivesse sem roteiro. Não tinha chegado até ali por nada, ia gravar e ponto final! Ela seguiu em direção ao cenário que havia preparado dois meses antes e sentou-se em frente à câmera que tinha comprado naquela semana.

— Oi... Vocês podem me ouvir? — Ela sorriu de canto e levou a mecha que caiu cobrindo seus olhos para trás da orelha. — Bem... Eu sou nova nisso e espero que tenham paciência comigo, ok? Sei que criei este canal há mais ou menos dois anos e... uau! Eu fiquei tão surpresa por ter mil inscritos mesmo sem nenhum vídeo por aqui. Parece que vocês querem mesmo que eu faça isso. Então, vamos começar!

Melissa puxou todo o ar que conseguiu para que tivesse energia para tocar naquele assunto tão complicado. Estava agindo com mais coragem do que em toda sua vida, não sabia se as pessoas iam gostar do que tinha que falar, mas ia falar mesmo assim.

— Quando eu era criança e saía de férias com o papai... — Ela coçou a garganta para limpar a voz. — Não queria começar com isso, mas eu quero dizer que, como toda criança, eu era muito infantil, sabe? Mas sempre quis levar esperança para as pessoas, queria congelar momentos. Acho que não fiz isso direito até agora. Talvez tenha gravado momentos ruins em minha mente depois desses dias, mas eu quero tentar de novo. Eu realmente acredito nisso, no que quero fazer.

Nesse momento, sem se dar conta, as lágrimas já escorriam pelo rosto de Melissa, e logo seu nariz ficou avermelhado. Sem conseguir continuar, ela baixou a cabeça, deixando os fios lisos e negros caírem sobre seu rosto. Alguns segundos depois, buscou voltar a falar, mas dividia sua atenção entre controlar o choro e usar bem as palavras.

— Desculpem por isso — falou, limpando as lágrimas. — Não deixe que ninguém arranque seu sonho. Por muito tempo, eu não corri em direção ao meu sonho por causa das pessoas, tinha medo do que elas poderiam falar. Sempre me perguntei se eu realmente tinha que fazer isso, gravar vídeos. Mesmo que muitos de vocês só estejam aqui por causa de uma polêmica, eu ainda quero tentar de novo, só que dessa vez é por mim e por Deus.

Ela respirou fundo e ficou em silêncio por alguns segundos enquanto deixava as lágrimas saírem. Nunca foi capaz de fazer algo tão errado em toda sua vida. Sentia vergonha do que as pessoas podiam falar dela, mas já tinha começado a gravar e não ia parar logo ali. Então depois de encontrar as melhores palavras, ela voltou a falar:

— Então, mesmo que seu desejo seja tão estranho para as pessoas ao seu redor, mesmo que seu sonho seja tão impossível olhando daí de onde você está. Mesmo que... Mesmo que ninguém acredite em você, se é o que te faz ter esperança, se é isso que move sua vida, tente realizar. Faça por você!

Ela sorriu e olhou fixamente para a câmera.

— Eu comecei hoje e quero dizer a todos que estão tentando realizar seu grande sonho: tudo é possível! Se tentarem, se confiarem em Deus e se esforçarem muito, pode dar certo. Pode dar certo mesmo! Eu comecei e não pretendo parar agora. Este é meu começo. Então é isso, obrigada por me ouvirem até aqui, pessoal.

Melissa levantou-se e desligou a câmera. Foi até a mesa do computador e subiu o vídeo sem edições ou trilha sonora direto para o YouTube. Depois de finalizar, caminhou até a cama e se jogou nela como se tivesse finalmente completado uma grande missão. Ela respirou fundo, encarou o teto branco do quarto e novamente chorou.

Lembrou que ela e Fernando tinham o hábito de antes de dormir ligarem um para o outro e, durante a chamada de vídeo, falavam sobre o dia, sobre seus medos e problemas. No final sempre oravam, liam a Bíblia e, antes de finalizarem a ligação, diziam aquelas palavras. As que eram carregadas de emoções e sonhos. Elas devolviam a energia do relacionamento e os lembravam do amor puro e verdadeiro que tinham um pelo outro. O amor puro e verdadeiro que ela acabou destruindo com as próprias mãos.

Ainda deitada, decidiu que ia dizer aquelas palavras mesmo assim, mesmo que não fosse digna delas...

— Juntos, contra tudo — disse a primeira parte da frase.

— Contra todos — Fernando completou a frase do outro lado da cidade.

— Em amor — ela voltou a falar.

— Em amor... — novamente, Fernando disse, ainda que estivesse do outro lado da cidade, sem ela.

— Em amor! — declararam juntos.

[...]

Fernando tinha acabado de dizer a frase que sempre falava com Melissa, fez isso porque mal conseguia cochilar. Ele seguiu até a geladeira e retirou de lá uma garrafa de suco. Depois de abrir e beber um pouco do conteúdo, foi até a janela do seu apartamento e olhou para a Lua.

— Está tudo tranquilo por aí, Deus? — Ele sorriu de canto. — Por aqui nada está bem... Eu só queria que tudo passasse.

Distraído, enfiou a mão no bolso do sobretudo azul-marinho que usava e sentiu o anel que havia guardado lá há quase três semanas. O fato é que aquele objeto estava ali porque o médico vinha se preparando para pedir a Melissa em casamento. No entanto, quando finalmente sentiu que estava pronto, Melissa escolheu encontrar um amigo na cafeteria. Ele voltou para casa desanimado, mas sabia que talvez não fosse o melhor momento, só que agora entendia que realmente não era.

Fernando deixou o anel em cima de um vinco que tinha entre as janelas de seu apartamento. Enquanto olhava para o objeto de prata com uma pedra de diamante solitária no meio dele, lamentou-se. O médico permitiu que as lágrimas voltassem a umedecer sua pele morena e pensou que definitivamente não estava pronto para sentir aquele tipo de dor, a dor da traição.

Oie oieee, capítulo novo pra vocês!!

Eu estou sofrendooo com Fernando, e vc?