Prólogo
A música estava contagiando o ambiente. A aglomeração de pessoas era legal, divertido, e por vezes necessário. Ela dançava animadamente na pista de dança. Ela ria, rebolava e gritava conforme a agitação penetrava em suas veias. Era uma vida que adorava. Ela era feliz. Tinha se formado em sua profissão dos sonhos, estava com um emprego que lhe pagava bem e proporcionava-lhe uma estabilidade que não permitia mais que seus pais contribuíssem em seus gastos mensais, e, para completar, ela tinha as melhores amigas do mundo.
Marianne Vielmond rebolava na pista de dança na companhia das outras duas, Caroline e Lyssa. É o trio desde a época do colégio. Inseparáveis. Se conheceram na infância, aprontaram na adolescência e aproveitam a juventude na melhor maneira possível, sem uma esquecer da outra, nem mesmo parcialmente.
— Esses sapatos estão me matando! Eu vou até ao bar pegar mais bebida — ela gritou, fazendo as outras duas assentirem.
Marianne sorriu e tentou desvencilhar o máximo que podia da multidão. Ela era bem pequena e desastrada. Não havia saltos que lhe proporcionavam um pouco de elegância. E ela ainda estava afim de passar vexame por querer beber mais uma dose de tequila.
— Uma dose, por favor — ela sorriu gentil para o barman, que assentiu educadamente, mas não deixara de notar no quanto aquela jovem de 1,60 de altura já havia enchido a cara, e no quanto ela estava cambaleante.
— Você costuma frequentar sempre aqui?
Se não fosse um muro em forma de homem, provavelmente Marianne já estaria no chão. Ela colidiu fortemente com aquele peitoral rijo, sentindo longas mãos envolverem o seu corpo antes mesmo dela trocar os pés e cair no chão acidentalmente, feito uma fruta podre.
— Estou ótima — ela respondeu e começara a rir descontroladamente.
O desconhecido esperou que a garota ao menos recuperasse de sua crise de riso, e resolvera manter as suas mãos ali, ao redor da cintura finíssima da pequena mulher, e levantou os seus olhos apenas para visualizar o barman depositar a tequila em direção da garota.
— Oh, como vocês são rápidos — Marianne parou de rir no mesmo instante, observando aquela dose de tequila com brilho nos olhos.
— Não acha que você já bebeu demais? — Aquela voz ainda continuava rondando, deixando-a devidamente zonza.
— Eu estou bem — Marianne respondera o rapaz com rispidez. — A propósito, o que você quer comigo? Já sei, vai me pagar uma bebida, não é?
Ela tentou focar os olhos no belo homem, mas, para ser sincera, focar a visão já exigia demais de Marianne. Em vez disso, fixou os olhos para qualquer ponto e sorriu, reluzindo aqueles dentes branquíssimos — que só ela tinha —, em torno dos seus lábios carnudos extremamente vermelhos, e levantou o pequeno copo em direção ao rapaz atrás de si, antes de virar aquela bebida inteira na boca.
O desconhecido assistiu aquela jovem garota virar a tequila de uma só vez, sem pegar o limão e o sal para ajudar aquele destilado descer melhor pela garganta. Seus olhos ficaram penetrantes na mulher do pescoço bonito, que ficaram vermelhos no instante em que a tequila passara pela garganta dela.
Marianne fez uma careta. Tequila ardia e a fazia pegar fogo sem realmente estar encoberta de chamas. Tentou segurar, mas o engasgo viera com tudo, devido ao incômodo que aquele destilado proporcionava. Mas era tão bom e ela era corajosa. Ela gostava de beber. Gostava de se divertir.
— Eu não vou lhe pagar uma bebida — o homem voltou a falar, fazendo que ela o fitasse no mesmo instante.
— Grosso! Nada cavalheiro você — ela resmungou, virando-se para o barman outra vez.
— Eu estou tentando ajudá-la. Estava de olho em você desde que cheguei aqui e vi você na pista de dança com outras duas mulheres.
— Minha nossa, você estava de olho em mim? — Marianne retrucou, irônica, mas sentiu o fisgar em seu ventre.
Aquele homem bem vestido e chato era bem atraente. Bem daquele tipinho que ela já estava acostumada e conhecia perfeitamente. Bonito, forte, muito cheiroso e devidamente sedutor, aquele que sussurra quente no ouvido e leva a mulher facilmente para a cama, come e depois desaparece.
O coração dela disparou e ela meneou a cabeça desesperadamente, afastando-se do balcão e do homem, cambaleante.
— Não vai rolar — ela gritou, correndo em direção das amigas.
Mas onde será que elas estavam? Onde diabos se meteram? Marianne quase sentou no chão, no meio daquela gente toda, sentindo a derrota invadir suas entranhas. Enquanto ela fugia, Caroline e Lyssa se divertiam horrores, afinal nenhuma das outras duas tinham problemas como ela. Elas se jogavam e pronto. Não tinham preocupações ou distúrbios psicológicos como ela tinha. Culpa daquele filho da mãe.
Ela engoliu em seco e girou seus pés, ainda cambaleante e um forte enjoo batera em seu estômago. Havia bebido demais, ela sabia disso, e agora as consequências estavam batendo na porta. Custavam esperar ao menos chegar em casa?
— Mari! Estamos aqui — ela escutou um zumbido, mas estava certa de que eram alucinações.
Estava devidamente bêbada, e naquela ocasião, já havia enlouquecido por ter visto um muro humano completamente cheiroso e sexy. Ela desvencilhou para outro lado da boate, esbarrando-se em pessoas nada gentis e, como imaginou o previsto, tropeçara com os saltos de seus louboutins e só não colidira no chão porque um outro muro resolvera ampará-la.
— Você tem problemas de equilíbrio ou realmente é um ímã para acidentes? — Marianne tentou focar a sua atenção no muro falante, mas apenas suspirou, dando um sorriso desengonçado.
— Eu tropecei — ela disse, sussurrando, com a língua embolada. — As minhas amigas foram embora, acredita nisso? Me deixaram sozinha.
— Isso não é nada legal. Você está péssima!
Ela gargalhou.
O homem a segurou firmemente outra vez, completamente paciente com aquela garota bêbada, sozinha e indefesa.
Ele estava achando graça, mas queria ajudá-la. Deixá-la em casa, sã e salva. Afinal ele era um homem de princípios, que gostava de aproveitar a vida de solteiro após sair de um relacionamento complicado e fracassado.
— Onde você mora? Está em condições de responder? — ele perguntou suavemente.
Marianne o observou atentamente, antes de ser puxada por ele até o lado exterior da boate. Ela sentiu a brisa fria de Toronto bater em seu rosto, estremeceu de frio e tudo girou ao seu redor.
O muro andante simplesmente suspirou e retirou o seu casaco, colocando sobre os ombros da jovem de cabelos longos e castanhos.
— Obrigada — ela murmurou, tentando não pensar muito na vertigem que acabara de sentir, e, ao respirar fundo, não conseguira controlar.
Tudo acontecera em questão de segundos. Os sapatos caríssimos e novos do muro andante ficara todo vomitado, assim como aquela camisa que ele comprara na tarde de hoje. Marianne tentou se levantar e se recompor, para dar o fora dali, entretanto, as coisas só pioraram. Ela tombou o seu corpo e se sujou inteira de seu próprio vômito, quer dizer, ela sujou o casaco novo do seu muro protetor.
— Me desculpe! — ela balbuciou, completamente apavorada.
— Tudo bem — ele respondeu, torcendo um pouco o seu nariz. — Venha, vou te ajudar a chegar em casa. Tem condições de me responder aonde mora?
Marianne suspirou de tédio. Ela havia acabado de vomitar e seus sentidos pareciam querer ficar aguçados de novo. Ela já não se sentia tão zonza quanto estava. Seus olhos e sua cabeça ergueram-se para o rosto do grandão.
Ele era bem mais alto que ela e esse detalhe fizera aqueles olhos castanhos enormes arregalarem ainda mais. Ele era bonito. Não, bonito era uma denominação muito modesta para descrevê-lo. Aquilo parecia ter sido desenhado por pincéis de pontas finas e delicadas, traçado minuciosamente.
Ele era lindo! Minha nossa, como ele era perfeito!
Marianne apertou os olhos e soltou uma outra risada, desta vez seca. Ela só podia estar tendo alucinações. Bebera praticamente todo o estoque de tequila do bar, e vomitara em cima de seu muro grande, vivo e completamente quente. Desta forma, ela estava convicta de que estava enxergando coisas de sua imaginação.
— E então? Você perde a voz quando bebe?
— Você falou comigo? — ela indagara, a confusão evidente.
O tal do muro bonitão e quente bufara, impaciente, repousando as suas mãos na cintura e abaixando os seus olhos para aquela sujeira em suas roupas, antes de retornar a sua atenção à mocinha bêbada e irritante.
— Eu perguntei aonde você mora. Eu preciso levá-la para a casa antes que passe mal — ele respondeu, sendo devidamente educado, ainda que, no fundo, estivesse irritado e impaciente.
— Eu moro na Queen Street East, número 302, apartamento 1 — ela disse com dificuldade.
— Ótimo — ele balbuciou, estendendo a sua mão enorme em direção à ela. — Venha comigo, eu não vou fazer nada de errado contra você.
— O muro poderia me sufocar e quebrar em cima de mim.
— O quê?!
— Nada! — Marianne engoliu seco.
Ela sabia que era extremamente arriscado entrar em carros de estranhos, principalmente de um homem que mais parecia um muro grande, a qual ela esbarrara quando tomou a sua última dose de tequila. E, mesmo estando pouco recuperada, ela ainda não estava bem o suficiente. O correto seria Marianne tirar o celular de sua pequena bolsa e ligar para Carol ou Lyssa, mas ela estava tão absorta e atônita que simplesmente confiou a sua vida, preciosa vida, em um muro sexy.
O muro sexy transpassou o seu braço forte e quente na cintura da jovem, ajudando-a caminhar até o seu carro. Quando abrira a porta do carona para ela entrar, praguejou mentalmente por permitir que seus bancos de couro na cor marfim fossem sujos pelo vômito da baixinha indefesa. Ele a colocou sentada no banco do passageiro e fechou a porta atrás de si, andando rapidamente para o outro lado e assumindo, enfim, o seu posto de motorista. Antes de dar partida, ele inclinou o seu corpo e colocou o cinto de segurança na bela garota, que o encarava com os olhos arregalados. Ele deu um sorriso discreto antes de colocar o seu cinto e dar partida.
O trajeto inteiro fora feito em silêncio. Marianne já estava sofrendo com os efeitos da bebida em seu organismo, uma delas é a falta da memória atiçada e aguda, porque era evidente que ela já não se recordava daquele vômito na camisa cara de seu muro salvador.
Quando se aproximou do prédio em que a dona dos cabelos castanhos mais lindos que ele já vira e que sequer sabia o seu nome, olhou de soslaio para o seu lado e flagrou a jovem ressonando. Marianne havia apagado dentro do carro daquele sujeito.
Ele suspirou e piscou lentamente os seus olhos, observando aquele rosto calmo e extremamente angelical enquanto dormia.
Que mulher linda, ele pensou.
Aliás, ele já havia reparado nesta maluquinha que carinhosamente o denominou de muro. Deu uma risada curta. Nem em seus momentos insanos imaginaria alguém idealizando-o com esta metáfora. A altura do homem sempre fora notada, o seu 1,90 chamava a atenção de todos ao seu redor, e, caramba, fazia um contraste muito interessante com aquela garota pequena. Ele riu de novo, meneando a cabeça.
Ele queria a moça da tequila mas ela escapou dele, e ainda por cima vomitara nele inteiro, em suas roupas caríssimas e que havia comprado na tarde de hoje. E agora, ela estava ao seu lado, apagada no banco do passageiro, e ele mal sabia dizer como conseguiria entrar no apartamento dela.
— Mocinha — ele murmurou baixo e cutucou o ombro dela bem devagar. Ela resmungou. — Acorde. Já estamos em frente ao seu prédio.
Mesmo caindo de sono, ou não tendo a noção do que estava acontecendo, Marianne abriu os seus olhos, acreditando piamente que visualizava um anjo à sua frente. Ela suspirou e sorriu, assentindo.
— Espere aqui. Vou ajudá-la a descer do carro — o muro anjo falou antes de abrir a porta e sair do veículo, enquanto ela suspirava e virava a sua cabeça para o outro lado, no instante em que ele abrira a sua.
Marianne não estava em condições de falar alguma coisa, na verdade, ela nem fazia ideia do que estava acontecendo. O seu corpo arrepiou violentamente no instante em que o muro anjo inclinou-se sobre ela com cuidado, para não sujá-la com aquela mancha de vômito ainda úmida, ela inalou o cheiro que sentia ao seu redor, misturado com aquela coisa nojenta e azeda, e, mesmo estando em outra dimensão, Marianne constatou que aquele muro enorme cheirava deliciosamente bem.
Ao destravar o cinto, o homem ficara ereto e estendera a mão para ajudá-la a descer do carro. Ele a levou até ao seu apartamento, sendo completamente gentil e cuidadoso.
— Consegue se virar sozinha agora? — ele indagou, enquanto abria a porta do apartamento 1.
Marianne sorriu, deixando aquele resto de batom manchar os seus dentes, e se inclinou, cruzando os seus braços ao redor do pescoço do muro gigante e cheiroso, puxando-o para um beijo. Um super beijo, devidamente ousado, que deixara a boca do homem totalmente suja de vermelho.
— Eu gostei de você, muro sexy — ela murmurou no instante seguinte, após interromper o beijo e desaparecer pelo outro lado da porta, dentro de seu apartamento.
Muro sexy? Ele franziu o cenho antes de dar meia volta e chamar o elevador e acabou gargalhando, rouco e balançou a cabeça, rumando, finalmente, para o seu costumeiro destino.
Personagens:
Marianne Vielmond
Dave Russell:
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