63
Miguel
Hoje é o dia em que a Flávia vai embora. Eu queria poder fazer alguma coisa, mas eu não posso, não me atrevo a lhe telefonar e muito menos lhe mandar uma nova mensagem, sinto que não tenho mais esse direito, até porque mesmo se tivesse, levando em consideração ao fato de ainda sermos amigos — eu acho — aposto que ela não quer me ver mais nem pintado de ouro. Então a única coisa que eu vou fazer, aqui, dentro do meu quarto, deitado na minha cama, é tocar algumas notas em meu violão e imaginar a todos os momentos bons que passamos juntos, principalmente nesse cômodo da casa.
A solidão estava sendo a minha companheira desde aquela mensagem da Flávia, eu tentava me distrair, mas de nada adiantava. Tentava conversar com os meus amigos, mas quando eu dava por mim minha mente começava a divagar e eu já não estava mais prestando atenção neles, e sim nela, que havia se projetado ali, na minha mente, com os seus braços na frente de seu corpo para que eu pudesse os alcançar, enquanto sorria para mim.
E quando eu já estava perto de pegar em suas mãos...
— Miguel? — Jade bate de leve na porta do meu quarto e eu acabo saindo desse meu "sonho". Olho para ela, que ainda estava em pé, encostada na porta, esperando para ver se eu deixava ela entrar aqui ou não. Geralmente ela entra sem mais nem menos, mas como hoje é o dia em que a Flávia vai embora, penso eu, que ela quer me deixar sozinho.
— Pode entrar — dou um meio sorriso e com isso ela dar um passo, vendo mesmo se ela pode entrar, ao mesmo tempo em que pisa no chão como se fosse se queimar a qualquer momento, e eu dou uma risada por conta disso. Só a minha irmã mesmo para fazer um drama desses, para me animar.
Ela rir, caminhando para onde eu estou e se senta logo em seguida, perto de mim.
— Me desculpa te interromper — ela olha para o violão. — Mas eu só queria te avisar que eu vou no supermercado, comprar algumas coisas que estão faltando aqui em casa — comunica e eu acabo de me lembrar que hoje mais cedo os nossos pais tiveram que sair, ficando aqui em casa, só nós dois. Quando os seus olhos voltam a mim encarar vejo que ela está triste, assim como eu, e que suas mãos estão apertando umas as outras; ela quer me abraçar ou falar alguma coisa do tipo, referente a Flávia, mas ela não faz o que eu achei que faria, e eu a agradeço por isso, já basta os meus pensamentos dirigidos a ela.
— Tudo bem — mesmo que eu não precisasse lhe responder, já que ela só veio me avisar que vai sair, eu mesmo assim quis falar alguma coisa para ela, coisa essa que tanto pode ser por ela me deixar aqui, sozinho, como dizer que tudo bem a Flávia ir embora, pois se é isso que ela quer mesmo, eu vou deixa-la ir. Com isso ela se levanta da minha cama e bagunça um pouco os meus cabelos, lhe dou um sorriso tranquilizador por isso. E assim ela deixa o meu quarto, fechando a porta do mesmo.
Pego em meu violão e começo de novo a dedilhar algumas notas, só que as batidas incessantes na porta do meu quarto, me atrapalham.
A Jade só pode ter se esquecido de alguma coisa para bater desse jeito — penso enquanto me levanto da cama, indo em direção a porta para abri-la.
— Você se esqueceu de ... — quando vejo quem era realmente a pessoa que se encontrava a minha frente, paro de falar, não era a minha irmã que estava aqui, e sim a garota que eu menos queria ver nesse momento. Ester.
— Oi, Miguel — ela passa por mim, para poder entrar no meu quarto, nem se importando se eu vou deixa-la ou não entrar.
— Ester... — digo o seu nome pausadamente como para torna-lo real para mim, como para torna-la mais real para mim, não acreditando nem um pouco que ela teve a ousadia de entrar aqui, em casa. Como será que a Jade não viu isso? E o mais importante, o que ela pensa que está fazendo aqui? Deixo a porta aberta, para que ela perceba que a sua presença me incomoda e que saia daqui o mais rápido possível, enquanto me viro para encara-la, esperando saber quais são as suas reais intenções para se está, aqui.
— Eu soube o que aconteceu e eu sinto muito por isso, parecia que você gostava dela — diz cinicamente para mim, como se eu não conseguisse perceber pelo o brilho dos seus olhos e pelo seu sorrisinho que havia acabado de se formar em seus lábios só por conta disso, por conta de estar me vendo, solteiro. Já que era o que ela mais queria.
Só que eu vou dar a ela a devida resposta que merece.
— Não parecia, Ester, eu gosto dela — Cruzo os braços, a cima do peito, e vejo quando ela pronuncia um "ok". Reviro os olhos. Não estou muito para conversinhas, sem sentido, que veem da parte dela, hoje. — O que você veio fazer aqui? — Arqueio uma sobrancelha e espero que ela possa me responder a isso, de preferência uma resposta plausível.
— Eu queria conversar com você... — se aproxima de mim, ficando tão perto que eu consigo sentir até a sua respiração batendo em meu pescoço. Respiro fundo quando as suas mãos tocam o meu peito.
— Conversar comigo? — Não deixo me abater pelo seu toque em minha pele, invés disso cravo mais ainda meus olhos em seus olhos azuis, dos quais um dia cheguei a me apaixonar, loucamente.
— Sim — sussurra, continuando a olhar firmemente para os meus olhos, e ela até se aproxima mais de mim, com o seu dedo tocando em meus lábios enquanto o seu rosto se vira para o lado, seguindo em direção a minha orelha, só que antes que ela possa fazer qualquer coisa a seguir, que eu não me agrade num futuro próximo, eu a afasto. De mim.
— E sobre o que seria a nossa conversa? — Percebi que havia passado dos limites a encarando desse jeito, e ela por sua vez se aproveitou disso, porém sou eu quem tenho mais culpa, pois ela só fez o que fez porque eu deixei.
— Eu não sei — dar de ombros — pode ser das coisas que estão acontecendo agora ou do passado. Do nosso passado — sua mão segura a minha e eu institivamente olho em seus olhos por conta disso.
Eu não vou mais cair nesse seu joguinho, Ester. Não vou!
— Eu não quero falar do nosso passa... — retiro minha mão da sua e com isso eu tenho uma ideia.
Eu queria entender o que a Flávia estava pensando ou passando para fazer o que fez comigo, e nada melhor do que a Ester para mim dizer isso. Sei que elas são completamente distintas uma da outra, mas cada uma me mandou uma mensagem para o término do namoro. Uma sendo curta e direta e a outra longa e explicativa.
Agora seria a hora de botar as cartas na mesa.
— Eu posso te fazer algumas perguntas? — Ela fica confusa com isso eu acabei de lhe dizer, já que eu havia me afastado dela, retirado a minha mão da sua e principalmente tinha deixado a porta aberta para que ela se retirasse, mas aqui estou eu, puxando conversa com ela. Só que ela parece não se importar nem um pouco com essas coisas que eu mencionei, já que logo balança a sua cabeça, dizendo que vai sim responder as minhas perguntas. Então eu prossigo: — Mas eu quero que as respostas sejam as mais sinceras possíveis — recomendo e ela novamente balança a sua cabeça, afirmando.
— Claro, Miguel, é justo que tenhamos essa conversa, já estava mais do que na hora — me dar um meio sorriso, e ainda bem que ela sabe exatamente qual o tipo de conversa que nós vamos ter agora.
Então eu a levo para a minha cama, do qual ficamos sentados, um ao lado do outro. E eu me preparo para lhe fazer as devidas perguntas.
— Por que você terminou comigo? Eu não era bom o suficiente para você? — Eu queria muito ficar de cabeça baixa, queria não olhar em seu rosto e em seus olhos, mas eu não conseguia, eu tinha que olhar para eles para saber se ela também ficava triste, como eu sempre ficava, quando eu me lembrava desse episódio.
— Não é isso, Miguel — balança a sua cabeça para os lados, negando. — Você é o suficiente, sempre foi mais do que o suficiente para mim, só que eu percebi isso tarde demais — e eu comprovei, ela ficou triste com isso, até mesmo abaixou a sua cabeça para não me olhar nos olhos.
— Então você não estava mais gostando de mim? — Eu queria que ela conversasse comigo olho no olho, mas se ela não faz tal coisa é porque deve ter os seus motivos; se para ela já é triste, imagina para mim, que fui o traído da história.
— Eu até gostava, mas eu conheci outro rapaz e achei que... achei que ele era o certo para mim. Só que mais uma vez eu estava enganada — levanta a sua cabeça e eu vejo que as lágrimas já caiam de seus olhos, e nelas eu noto todo o seu arrependimento, de tudo o que ela me fez passar.
Ficar triste ou com raiva dela já não vai mudar nada, isso tudo já é passado, mas eu estou feliz, dela enfim, está se abrindo comigo, sobre isso.
— E por que quando você terminou comigo, você preferiu me mandar uma mensagem do que falar comigo pessoalmente?
Eu queria que essa resposta fosse a mais sincera de todas, pois só assim eu conseguiria entender a Flávia. Ou pelo menos um pouco dela.
— Eu achei que seria mais fácil. Foi mais fácil. — Limpa os seus olhos com o dorso da sua mão enquanto olha para mim como se estivesse me pedindo perdão.
Só que por essas suas palavras ditas agora, isso está bem longe de ser perdoado.
— Foi mais fácil? — Arqueio uma sobrancelha, não acreditando que eu ouvi isso sair da sua boca — só se foi para você, porque para mim foi horrível. — a olho, incrédulo. — Eu fui na sua casa, você não estava mais lá. Lhe mandei várias mensagens e ligações, e você não me respondia nem uma. E então, no final do dia que talvez você já estivesse com pena de mim, é que você me manda uma mensagem, porque foi só isso que você deixou para mim. Uma mensagem. — Faço um "um" com meu dedo e em seguida passo as mãos em meus cabelos. — Meu Deus Ester, eu te amava — confesso. Talvez eu esteja confundindo as coisas, mas se eu estava tendo essa conversa, eu queria que ela servisse para os dois lados.
E então, num passe de mágica, a Ester se aproxima de mim e me beija.
Foi estranho, mas foi aquele estranho bom, a Ester ainda tinha o mesmo gosto, pude perceber isso quando a sua língua se enroscou na minha. Involuntariamente pego em seu rosto para receber mais o seu toque em mim. Lembranças rápidas aparecem na minha mente: quando eu a conheci, o nosso primeiro beijo, a primeira vez em que fizemos amor, até que eu me lembro daquele dia. O dia em que tudo desandou. Instantaneamente essas memórias desaparecem dando lugar as minhas experiências com a Flávia, dos nossos momentos juntos e mais que especiais, então eu penso: O que eu estou fazendo?
Me deixando ser beijado pela a minha ex-namorada enquanto deveria estar assim com a pessoa que eu mais tenho pensado ultimamente, da qual me tira o sono todas as noites. O que eu estou fazendo agora não é certo, e eu sei disso.
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