60
Flávia
— Ben? — O chamo.
— Só um minuto — Ele faz um "um" com o seu dedo indicador, pedindo que eu esperasse um pouco. Vou a caminho de sua cama, da qual me sento, e espero até que ele termine essa ligação e possa falar comigo. Depois de alguns minutos, ele se vira para mim. — Oi.
— Você estava resolvendo as coisas da viagem? — Pergunto, sabendo muito bem que era sobre isso, já que eu ouvi ele falando sobre o dia e a hora, mas eu tenho que lhe fazer essa pergunta, já que ela é o ponto essencial da nossa conversa.
— Sim — concorda com a cabeça, vindo se sentar na cama, ao meu lado. — Como eu vou embora nesse sábado, eu já estava comprando a minha passagem. Mas você queria me dizer alguma coisa? — Pergunta.
— Era sobre isso mesmo que eu queria te dizer — ele franze as sobrancelhas, não entendendo nada do que eu estou falando. — Eu quero ir com você. Eu quero ir para Natal — digo tudo isso de uma vez, com o meu irmão não precisa de enrolação, até porque uma hora ou outra ele iria perceber, isso se não já percebeu.
— Isso é ótimo, por que você não me disse isso antes? — Um sorriso maravilhoso logo se forma em seu rosto e eu me pergunto se ele entendeu o que eu quis dizer direito, pois eu estou achando que não. — Só tem um problema — será que ele entendeu agora o que eu quis dizer? — Nós iríamos juntos, mas você voltaria sozinha porque as minhas aulas já teriam começado.
Não, ele não entendeu...
Respiro fundo, antes de lhe falar qual é a minha real intenção com essa viagem, porque só ir para depois voltar, está fora de cogitação.
— Aí é que está, eu não quero voltar — espero que com isso agora ele entenda, porque senão eu já não sei mais o que lhe dizer para deixar isso de uma forma mais clara.
— Como assim, você não quer voltar? — Sua voz aumenta, e eu não esperava por isso, por esse tipo de atitude sua, e acabo me assustando. Ele prossegue, não ligando nem um pouco para como eu estou. — E a sua faculdade, os seus amigos e o Miguel? — Pergunta, me olhando nos olhos, visivelmente irritado, mas mesmo assim pedindo por respostas, uma explicação para isso que eu acabei de dizer.
— A faculdade eu posso fazer em Natal. Os meus amigos eu posso falar com eles pelo celular ou eles podem me visitar — também falo com o mesmo tom de voz que ele usou comigo, só que para o que eu vou dizer a seguir, a minha voz vai se abaixando aos poucos, quase não conseguindo sair pela minha boca. — E o Miguel... bom, não existe mais eu e ele — institivamente abaixo minha cabeça e os meus olhos começam a ficar marejados.
Na verdade, eu acho que nunca existiu.
— Como assim, não existe mais vocês dois? Vocês brigaram? — Mesmo estando bem perto do meu irmão é como se essas perguntas tivessem ao longe, consigo ouvi-las, mas não compreende-las muito bem. Aquela conversa me consome.
"Você sabe muito bem isso que começou assim, a partir do momento que você falou isso para mim".
"Só para ter a Flávia como um troféu, o seu troféu?".
O seu troféu.
Troféu.
Então nesse momento eu já não aguento mais segurar minhas lágrimas e livremente, deixo-as cair, porque além de me lembrar disso também me lembro de tudo.
No começo a gente se desentendendo. Depois ele querendo ser meu amigo. Nós dois cada vez mais próximos. O nosso primeiro beijo. Ele me pedindo em namoro. Foram tantas coisas que a gente viveu que no final das contas não passaram de nada.
Nada.
— Flávia, você está bem? O que aconteceu? — Segura o meu rosto com as suas duas mãos, fazendo me olhar bem para os seus olhos. Para os olhos que eu nunca escondi nada.
— O Miguel... — digo ao choro.
— O que foi que ele fez? — Ele queria estar com raiva, queria extravasar a sua raiva só por ouvir esse nome, sabendo que é o motivo por eu estar assim, mas que não faz nada por estar se contendo e querer saber mais detalhes.
— Ele me enganou, Ben — digo mais para mim do que para ele. — Ele nunca gostou de mim, ele só queria aumentar o seu ego porque foi assim que eu conheci ele, sendo um tremendo playboy, e eu que achei que ele tivesse mudado por minha causa, mas talvez eu só tenha sido mais uma da sua lista. Eu só não consigo entender uma coisa... se ele só queria ficar comigo, por que ele me pediu em namoro? — Eu tentava buscar respostas com o Ben, ele é homem, deve entender isso, mas ele só olhou para mim como se não soubesse me responder a isso. — A gente tinha uma amizade tão bonita e eu tive que estragar tudo, mais uma vez — dizer isso para mim, me destruiu por completo.
Porque eu sempre me apaixono pelos meus melhores amigos, mas no final eu só me ferro?
— Olha, fica calma. — Como ficar calma? Acho que você não está entendendo, irmão. — Você deve estar se precipitando, conversa com ele primeiro, vê se ele tem alguma coisa para dizer a respeito disso e depois você pensa o que vai fazer.
— Por favor, Ben — balanço minha cabeça para os lados, já pronta para chorar novamente. — Eu só quero sair daqui, quero morar em outro lugar. Não quero nunca mais olhar na cara dele!
— Sim, mas para isso eu tenho que te entender, para depois poder te ajudar — ele fala isso com toda a calma do mundo, querendo botar na minha cabeça que eu devo pensar mais. Mais eu já pensei, só que parece que ele não concorda com isso.
Pelo visto essa conversa não vai me levar a lugar algum.
— Eu já decidi o que eu vou fazer e vai ser sair daqui! Ir para outro lugar — digo bem determinada enquanto limpo meus olhos para que ele consiga entender, que o que quer que ele venha falar comigo não vai adiantar de nada. — Eu queria morar com você, mas se você não me quiser tudo bem, eu moro em outro lugar.
— Ok, eu compro a sua passagem e você vem morar comigo — ele abaixa a cabeça não concordando muito com o que acabou de mim dizer. E quando ele a levanta de novo, prossegue: — Mas primeiro nós temos que falar com os nossos pais, para ver o que eles dizem sobre isso. Pode ser assim? — Arqueia uma sobrancelha.
— Pode — concordo com a cabeça e ele deixa enfim, de segurar o meu rosto. Pega em minha mão e saímos de seu quarto, para encontrar os nossos pais, na sala.
— Mãe, pai, eu preciso falar uma coisa para vocês — me sento no sofá, ao lado deles, atrapalhando ao que quer que fosse que eles estivessem assistindo a esse exato momento. — Não sei se vocês vão me entender, mas é o que eu preciso no momento — sou bem franca.
— Pois nos conte então, minha filha — meu pai diz, esticando o seu braço para pegar o controle da televisão, que estava em cima da mesinha, e desliga-la. Agora sinto que terei a total atenção deles. O silêncio da casa me incomoda ao mesmo tempo em que me alivia. Vou poder colocar meus pensamentos em ordem para poder me expressar melhor, com eles.
— Me conte meu amor, você está me deixando preocupada — minha mãe olha para mim com uma certa preocupação em seu olhar. Ela deve estar imaginando mil coisas em sua mente, então para não preocupa-los, mais ainda do que já fiz, começo a contar tudo para eles do começo ao fim, assim como eu havia contado para o Ben, sem deixar nem um detalhe para trás.
— Então você quer ir morar em Natal, com o seu irmão? — Papai pergunta e eu concordo com a cabeça.
— E você quer fazer isso para esquecer o Miguel? — Mamãe pergunta e novamente eu concordo.
Eles ficam por algum tempo sem falar nada, talvez processando o que eu tinha acabado de falar, até que pôr fim, com o silêncio já voltando a me incomodar, mais os olhares deles direcionados um ao outro como se conversassem pelos olhos, eu pergunto querendo saber o que dizem sobre isso.
— O que vocês dizem a respeito? — Com essa minha pergunta a conversa de olhares entre eles é acabada, e quando eles olham para mim, eu não sei se eu respiro ou prendo a respiração.
Chegou a hora da resposta deles.
— Por mim tudo bem, você vai estar com o seu irmão, não tenho porque ficar preocupado — papai comenta.
— E você mãe, o que diz? — Olho esperançosa para ela. Papai já foi, só falta ela.
— Você sempre quis morar novamente com o seu irmão e se você acha que esse lugar é bom para esquecer o Miguel, por que não tentar? — Mamãe me dar um meio sorriso. Então eu me levanto e abraço a ambos.
— Eu sabia que vocês me entenderiam — digo assim que me afasto deles e depois me viro para falar com o Ben. — Temos que comprar a minha passagem — eu estava muito animada por isso.
— Você vai embora quando, filho? — Mamãe pergunta a ele.
— Nesse sábado, mãe — Ben a responde ao mesmo tempo em que se levanta do sofá.
— Então temos que aproveitar bem muito esses últimos dias juntos, porque agora não vai ser só um filho que vai ficar longe de nós, e sim dois — mamãe olha para nós dois e eu vejo tristeza em seus olhos, o que já era de se esperar. Ela vai ficar triste? Vai. Ela é muito apegada a gente, mas mesmo assim ela está feliz por nós.
— Benjamin, é para você cuidar da sua irmã, ouviu? — Nosso pai diz para afastar o clima de tristeza e ao que parece, funciona.
— Pode deixar, pai — um sorriso travesso aparece no rosto do meu irmão. — Eu vou cuidar muito bem dessa dorminhoca — me puxa para os seus braços.
— Agora vamos comprar a minha passagem — o puxo pelo braço enquanto subíamos as escadas.
Ao chegarmos em seu quarto ele logo disca alguns números, leva o seu celular para a orelha, mas então se vira para mim.
— Você tem certeza disso, Flávia? — Ele olha para mim, na esperança de que eu mude de ideia. Mas eu não vou mudar! — Eu já vou comprar a passagem...
— Sim, eu tenho — ele continua a ligação, ainda olhando para mim, como se eu fosse mudar de ideia a qualquer momento e que ele não precisasse mais prosseguir com isso.
Minutos se passam, até que ele fala comigo.
— Eu acho melhor você já ir começando a arrumar as suas malas, pois você viaja comigo, sábado — sorrio com o que ele acaba de me dizer. Ia até lhe abraçar novamente, se não fosse o meu celular apitando. O retiro do bolso e vejo que era uma mensagem do Miguel.
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