14 - "BOA NOITE"
Foi muito difícil Eleonor dormir naquela noite. O sono estava passando longe... e bem longe mesmo.
Seus olhos não desgrudam do teto do seu quarto.
Ora ela pensava no livro e sua terrível coincidência temporal - Apesar de que a cada minuto que passava, Eleonor acreditava cada vez menos na tal coincidência. -, ora pensava em Rafael e de quebra, estava se lembrando do incidente com Victor.
Tudo isso que aconteceu transitava rapidamente em flashbacks paulatinamente desorganizados, como se fossem uma radiola de ficha acionada por uma mão invisível que tira e coloca discos dessincronizados, para serem ouvidos.
Eleonor, olha para o livro que está abandonado em sua mesa de estudos, deseja pega-lo novamente, mas, o calafrio que corre pela sua espinha quando pensa que um novo capítulo estranhamente (no mínimo) passou a existir no lugar do que ela leu a faz recuar.
— Vamos Eleonor, vamos pegar esse livro.
A jovem fala para si mesma em voz alta. A provocação não surte nenhum efeito. Ela continua estática.
— Você é uma mulher que nunca abaixou a cabeça para nada ou ninguém. — Eleonor esfrega as suas mãos uma na outra enquanto continua conversando consigo. — Eu sei que você está com medo! E quem também não estaria? Porém, sou mais você! Vamos, garota! Se levanta daí!
O comando dado novamente para si mesma continua sem ser obedecido e Eleonor fica sentada na cama.
O celular bipa informando que há uma nova mensagem, deixando-a curiosa. Haja vista, Eleonor não é de receber mensagem de WhatsApp.
Poucas ou quase nenhumas amigas ou amigos para sair ou conversar.
"Você está acordada?"
A cara que Eleonor faz, jogando a boca para o lado esquerdo por causa da pergunta, soa como uma cantada mal dada, e isso a faz abrir um sorriso logo na sequência.
"Não, dormindo."
Pausa do outro lado.
"Ops... mancada. Fui."
"Rarsrsrsrsrsrsrsrs"
Logo em seguida, Rafael manda um emoji com o homenzinho com as mãos para cima, como se perguntasse "O que foi?" Ou "O que perdi?"
Rafael, parece que não entendeu a brincadeira.
"Foi uma brincadeirinha."
"Pensei que estava importunando."
"Não deixa de ser."
"Caramba, na lata!" Seguido pelo emoji de dois olhos bem abertos. Surpresos.
"Sinceridade é o meu forte."
Emoji sorrindo e piscando um olho.
"Tô vendo."
Eleonor, sabe que precisa ter calma nas suas relações pessoais, de qualquer tipo, mas, ela sente algo de bom no rapaz... Algo diferente e novo... como se valesse a pena investir na amizade.
Essa novidade, que é responder desarmada, a um rapaz que mal conhece, traz um leve sentimento de liberdade... até porque Eleonor é sempre muito fechada e trancada às novas conversas ou pessoas.
A jovem passa diariamente por várias situações difíceis, intragáveis e sempre recebe a mais pura e verdadeira raiva transfóbica.
Por isso, nunca despreza o máximo cuidado dos alertas que a vida lhe proporciona. Eleonor, mesmo sem querer ou desejar, criou estratégias de auto-preservação que a mantém viva.
"Posso te fazer uma pergunta?"
O coração dela bate mais forte.
"Lógico!"
Responde seca.
"Você curte cinema?"
"Sim!"
Alívio por causa da pergunta.
A demora em digitar acontece por causa da resposta curtíssima.
"Eleonor, uma excelente noite pra você. Mas, amanhã acordamos cedo e não vou tomar mais seu tempo."
"Eu amo o cinema de ação."
Agora é a vez de Rafael ficar em silêncio.
"Eu não gosto de filmes de terror."
Eleonor, também não explica o motivo de não gostar, e Rafael também não refaz a pergunta.
"Eu curto Romance, novela brasileira e documentário."
Eleonor, mesmo não sentindo "alertas" de perigo, a estudante de medicina mantém o cuidado e digita:
"Desculpa não ter ou parecer que não quero conversar com você, mas, preciso conversar olhando nos olhos."
"Entendo... e pessoalmente você vai me dizer que é uma vampira tricentenária, e que Anne Rice contou sua história em Contos Vampirescos."
Eleonor, sorri. Mas, digita:
"É mais ou menos isso... errou somente na idade. Tenho um pouco mais de 300 anos."
As piadas parecem fluir fácil para Eleonor quando conversa com Rafael, e isso a deixa bem consigo mesma.
Esse sentimento de sentir-se bem enquanto conversa com as pessoas, deveria ser uma constante, mas, não é.
"Até amanhã."
"Até amanhã."
Olhando ainda para a tela do Iphone, Eleonor percebe que aquela resistência à nova leitura do livro desapareceu.
Levantando da cama, Eleonor cata o livro que está a dois braços de distância, coloca-o sobre suas pernas e abre o livro, sem perceber que 1 par de olhos vermelhos reluzentes a observa durante a leitura, mesclada na escuridão.
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