Capítulo 1 - Preciso de uma governanta

Sasuke Uchiha corria em círculos pelo jardim em uma típica brincadeira de criança de sete anos. Permanecia com os bracinhos abertos e um sorriso largo na face alva enquanto sentia o vento balançar seu cabelo negro. Sentia que podia voar e adorava essa sensação, mas, acima de tudo, adorava ouvir a risada miúda de sua amiga de brincadeiras, Hinata Hyuuga, filha da governanta e do motorista da mansão Uchiha.

A pequena menina de cinco anos, pele alva, lábios rosados, cabelo azulado curto, olhos perolados e trajando um quimono branco com desenhos de flores lilases, se encontrava sentada sobre o assoalho de madeira da varanda e observava com fascínio o amigo rodar e rodar.

Vamos, Hina! É divertido — afirmou Sasuke efetuando mais um giro.

Não. Da outra vez fiquei tonta e caí — lembrou a menina, as bochechas levemente coradas por causa do calor primaveril.

Sasuke parou de rodopiar. Contrariado, subiu os três degraus que levavam à varanda e sentou-se ao lado dela.

Não tem graça sem você — resmungou fechando o semblante e arrancando um pequeno sorriso da amiga que, um pouco encabulada, colocou sua mão sobre a dele.

Os olhinhos negros de Sasuke admiraram o pequeno sorriso, a face corada e a beleza da Hyuuga. Ela parecia uma boneca de porcelana como as que sua mãe guardava na prateleira mais alta do quarto que dividia com seu pai. Branquinha e delicada. A diferença era que com Hinata tinha permissão para brincar. Mas a amiga muitas vezes recusava algumas brincadeiras, como subir na árvore a alguns metros dali, rodar pelo gramado e jogar bolas de lama um no outro. Mesmo assim, Sasuke gostava muito de Hinata e não cansava de dizer que seriam amigos para sempre.

Ouviu o som de vozes e, voltando sua atenção para o carro estacionado na lateral da mansão, viu sua mãe, Mikoto Uchiha, acompanhar seu pai, Fugaku Uchiha, até o carro onde o pai de Hinata, Hiashi Hyuuga, aguardava o patrão com sua costumeira tranquilidade. Sasuke sorriu quando sua mãe depositou um beijo nos lábios de seu pai antes de deixá-lo entrar no banco traseiro do carro preto. Toda manhã seus pais repetiam aquele gesto e Sasuke começava a se perguntar se era isso que fazia com que estivessem sempre juntos.

Voltou os olhos para a amiguinha, que também observava a cena, e sem pensar muito fechou os olhinhos e deu um beijo breve nos lábios da Hyuuga.

Foi então que tudo mudou em sua vida. Naquele breve instante, após aquele breve beijo.

Sentiu os lábios da Hyuuga se afastando e ouviu o som seco de algo caindo, abriu os olhos e viu assustado o corpo de Hinata deitado sobre o piso da varanda. Sua mãe apareceu de repente gritando angustiada por ver a Hyuuga inconsciente e Sasuke sentiu cada pequena fibra de seu ser congelar. Confuso, espantado e temendo que seu beijo houvesse ferido a amiga, chorou durante todo o tempo em que ela permaneceu desacordada.

O que demorou somente dois minutos parecera uma eternidade para o pequeno Uchiha, que teve a impressão que seu coração se aquecera quando os olhinhos perolados da Hyuuga se abriram e o fitaram extremamente arregalados.

Hinata não disse a ninguém o porquê de ter desmaiado, também não mencionou o beijo e tampouco voltou a ficar sozinha com o Uchiha.

Sasuke não entendia o que havia de tão mal em seu beijo, porém não teve coragem para perguntar ou reclamar da distância que Hinata impôs, ao invés disso passou a hostilizá-la sempre que a via. Sentia raiva da Hyuuga, de si mesmo e da péssima ideia de beijá-la para uni-los para sempre. O efeito foi justamente o contrário, a cada dia se afastavam, se ignoravam e com o passar dos anos o episódio no jardim foi empurrado para um canto obscuro de suas consciências e se tornaram dois estranhos que não sabiam explicar quando a amizade terminara e a aversão começara.

~*S2*~

20 anos depois...

Massageou a têmpora para tentar amenizar as pontadas em sua cabeça enquanto ouvia entediado o que a morena, de olhos negros, cabelo marrom e que trajava um microvestido azul dizia. A voz dela era irritante, o cruzar e descruzar de pernas eram irritantes e as caras e bocas eram irritantes. Tudo naquela mulher o irritava, mas o principal era que ela o obrigava a perder seu precioso tempo para entrevistá-la quando era óbvio que queria muito mais que ser sua governanta. Era evidente no modo de sorrir, de fingir ter pudor ao puxar devagar a barra do vestido ultrajusto para cobrir — obviamente sem sucesso — as coxas grossas e no modo como se inclinava por qualquer motivo oferecendo ao Uchiha uma bela visão dos seios fartos.

Cerrou os olhos por um instante após a oitava vez que ela cruzou e descruzou vagarosamente as pernas desde que começara a entrevistá-la. Presumia que ela assistira Instinto Selvagem demais.

Não era a primeira entrevistada a se insinuar descaradamente para ele. E em outro dia, em outro local ou até mesmo ali, após uma noite produtiva na balada, Sasuke aceitaria com satisfação o convite daquelas mulheres. Só que, por uma questão de bom senso, não seria louco de contratar uma mulher que faria hora-extra em sua cama, jamais teria uma transa casual com alguém que possuísse total acesso a sua casa e que em um impulso de raiva colocasse fogo em tudo.

No momento, a única coisa que desejava era contratar alguém para deixar seu apartamento em ordem, suas roupas limpas e perfeitamente alinhadas no guarda-roupa, e garantir que quando chegasse, da balada ou do trabalho, tivesse algo para comer. Um desejo simples e prático, mas pelo jeito impossível de se obter.

— O senhor pode ter certeza que assim que começar a trabalhar realizarei cada uma de suas fantasias — a morena insinuou passando a língua pelos lábios de modo sugestivo.

Certo, Instinto Selvagem era um filme muito cabeça para aquela mulher, que com certeza vira a cruzada de pernas e o gesto libidinoso em algum filme pornô de quinta categoria.

— Senhorita Mamoto, procuro uma governanta, não uma... — freou a vontade de dizer vadia e se levantou. — Agradeço sua presença e, caso a escolha, irei lhe telefonar ainda essa semana. — "O que nunca vai ocorrer", completou mentalmente enquanto andava decidido até a porta do apartamento e a escancarava. — Tenha um bom dia, senhorita Mamoto.

— Aguardo ansiosa o seu telefonema, Sasuke.

Sasuke se perguntou em que ponto da entrevista dera tamanha intimidade àquela mulher para que ronronasse seu primeiro nome e o beijasse na face — e isso porque virara o rosto.

— Nova namorada, filho? — Ouviu alguém perguntar às suas costas.

Virou-se e viu sua mãe fitando com interesse a morena ao seu lado.

— Não, mãe. Acabei de entrevista-la para a vaga de governanta.

— Mesmo? — Mikoto olhou a mulher de cima a baixo, sorriu e comentou com ironia: — Na minha época as governantas vestiam mais roupa e não deixavam marcas de batom no rosto do futuro patrão. — Ignorou o palavrão que Sasuke soltou após passar a mão na bochecha e ver os dedos tingidos pelo batom vermelho, e completou sarcástica: — Novo tempo, novas atitudes, certo...? Qual seu nome, minha jovem?

— Nana Mamoto.

— Nana... Belo nome...

Mikoto supôs que deixara evidente seu desagrado, pois Mamoto se despediu rapidamente deixando-a sozinha com seu filho metido a conquistador. Assim que Sasuke fechou a porta, perguntou:

— Pensa em contratar aquela mulher, Sasuke? Não falo nada da sua vida... Digamos incorreta. Mas contratar uma mulher oferecida é um perigo. Logo ela vai querer um anel de diamantes no dedo e um polpudo acordo de divórcio.

— Não se preocupe. Não pretendo contratá-la, e nem me casar com quem quer que seja.

Mikoto franziu o cenho.

— Fico feliz que ainda tenha uma parcela de bom senso, mas espero que mude de ideia quanto a casar.

— Hum... — Sasuke massageou a têmpora com mais força. Quando Mikoto enveredava pelo assunto casamento a conversa demorava horas para ter um fim, na qual ele sempre era o filho desnaturado, que não pensava no futuro e que morreria sem deixar descendência.

— Logo fará trinta anos, precisa começar a pensar em casamento, filhos, um lar. Preciso de netos.

— Ainda faltam três anos para que eu chegue aos trinta e o Itachi já te deu dois netos — resmungou.

— Sasuke Uchiha, só porque seu irmão tem filhos não quer dizer que não espere que você também os tenha — Mikoto retrucou. — Precisa procurar uma moça para constituir algo mais duradouro que relações relâmpagos.

— Sabe o que realmente preciso?

Sasuke se jogou no sofá em frente a sua mãe, a face esgotada devido às dezenas de mulheres que entrevistara.

— Preciso de uma governanta discreta, confiável, com um enorme senso de organização e que possa morar no meu apartamento sem me atacar durante a noite — disse cansado, para logo depois se lamentar. — Mas tudo indica que essa pessoa não existe.

— Conheço a mulher perfeita, querido.

Ignorando o enorme sorriso na face de Mikoto, o que normalmente representava uma ideia carregada de segundas intenções, Sasuke não pensou duas vezes antes de pedir:

— Então a contrate.

Era tudo o que Mikoto necessitava para entrar em ação. Virou e marchou em passos rápidos até a porta.

— Aonde vai?

— Vou falar para Kakashi preparar o contrato da sua futura governanta. À noite virei apresentá-la, querido — comunicou alegremente antes de sumir porta afora.

Sasuke chegou a se levantar e ir ao encontro dela, mas não deu tempo, só viu as portas do elevador se fecharem enquanto sua mãe acenava em despedida.

~*S2*~

Hinata chegou ao seu quarto e jogou a bolsa sobre a cama caminhando até o espelho para procurar alguma imperfeição no seu traje. Não que ele fosse sofisticado, longe disso, se tratava de uma saia longa e um terninho discreto, ambos na cor azul escuro. Queria parecer responsável e mais velha do que realmente era e o traje deveria fornecer essa imagem, mas pelo jeito não conseguira o efeito desejado.

O dia começara bem, mas foi anuviado no momento em que o selecionador do hotel, no qual desejava trabalhar como governanta, olhou-a de cima a baixo e torceu o nariz. Fora questão de minutos para ouvir o tão conhecido "a senhorita não corresponde ao perfil desejado". Era a terceira entrevista só naquela semana que tivera de ouvir "não corresponde ao perfil" e começava a se perguntar que maldito "perfil" era esse que todos diziam que ela não possuía.

O problema devia estar nela porque, em sua opinião, seu currículo era impecável. Desde a infância teve contato com essa profissão, pois acompanhava e ajudava sua mãe na administração da mansão Uchiha dia e noite. Quando Sora Hyuuga falecera, a cerca de onze anos, passara a acompanhar Kurenai Yuuhi, governanta que fora contratada para substituir sua mãe. Assim que saiu do colegial fez um curso para se aperfeiçoar na profissão, e durante os últimos dois anos trabalhou e morou na casa de uma senhora que falecera há três meses.

Talvez fosse o cabelo, imaginou ao olhar os longos cabelos azulados parcialmente presos por um laço. Devia ter feito um penteado mais elaborado, mais sofisticado, um coque talvez. Levou as mãos aos longos cabelos para fazer um coque improvisado, mas os soltou logo em seguida ao ouvir batidinhas na porta que se apressou a abrir.

Não se surpreendeu com a figura de Mikoto Uchiha — dona da mansão em que Hinata voltara a residir juntamente com seu pai e sua irmã cinco anos mais nova — parada à sua frente. Apesar de ser rica, Mikoto tratava seus funcionários e os filhos deles como se fossem parte da família, principalmente ela e sua irmã.

— Oi, querida, como foi à entrevista? — Mikoto perguntou, entrando sem cerimônia no pequeno quarto que a Hyuuga ocupava.

— Não muito bem — confessou entre triste, pela perda da oportunidade de trabalho, e compadecida pela consideração da bondosa Uchiha, isso até ouvi-la exclamar satisfeita:

— Ótimo!

— Perdão?

— Desculpe querida, deixe-me explicar. — Mikoto segurou suas mãos entre as dela. — Encontrei o trabalho perfeito para você. Paga bem e se aceitar já pode se considerar contratada.

— Que tipo de trabalho? — perguntou curiosa. Até onde sabia a mansão não necessitava de mais nenhum funcionário.

— Sasuke está à procura de uma governanta que possa trabalhar e dormir no apartamento dele. O salário é praticamente o mesmo que pago ao seu pai e tem vários benefícios.

— Mas... Trabalhar no apartamento do senhor Sasuke... E ter de dormir lá... Eu?

Diante daquela informação o salário alto e todos os possíveis benefícios haviam desaparecido. Não que Sasuke Uchiha, filho mais novo de Mikoto, fosse uma pessoa ruim — pelo menos não totalmente —, porém se havia alguém no mundo que representava muito bem tudo que abominava era ele. Ele era arrogante, prepotente e durante muito tempo fizera piada da vida sexual dela, ou, como ele adorava ressaltar, a falta de vida sexual.

— Querida, seria tão bom ter alguém em quem confio cuidando do meu bebê, zelando pelo bem estar dele.

Bebê? Sasuke podia ser denominado de várias coisas, menos de bebê.

— Não posso, dona Mikoto. Sabe que Sasuke não gosta de mim. — "Nem eu dele", completou em pensamento. — Seria um desastre.

— Ah, lembro que eram amigos quando pequenos. — Mikoto soltou uma risada baixa. — Sora e eu passávamos longas horas fazendo planos para vocês... Acho que podem retomar a antiga amizade.

Hinata não se lembrava de ter sido amiga do Uchiha, mas não via motivos para Mikoto mentir àquele respeito e ainda envolver sua mãe. Não que o passado pudesse modificar o presente.

— Pelo menos tente, Hina — pediu Mikoto apertando suas mãos entre as dela. — Caso não goste é só pedir demissão, não haverá multas nem nada do tipo. Mas por favor, tente, por mim.

Às vezes, como naquele momento, Hinata se condenava por ter um coração tão mole. Era fácil para as outras pessoas conseguirem dobrá-la.

— Tudo bem, dona Mikoto, mas é por você que aceito.

Mikoto a envolveu em um abraço apertado.

— Obrigada, filha. Tenho certeza que não se arrependerá de sua decisão.

Hinata duvidava dessa afirmação, mas não disse nada, se limitou a aceitar o abraço caloroso da Uchiha que de certa forma lembrava o abraço de sua falecida mãe.

~*S2*~

Sasuke saiu do elevador e andou apressado em direção ao seu escritório, ignorando todos à sua volta, principalmente sua secretária Sakura Haruno. Não que adiantasse, assim que passou pela porta do escritório Sakura apareceu em seguida, a agenda aberta em uma mão e uma caneta na outra.

— Pensei que o senhor não viria hoje.

— Pensou errado — respondeu ainda sob o efeito da dor de cabeça. Não que fosse gentil com a espiã de sua mãe.

— Já contratou a governanta?

Olhou irritado para a rósea.

— A senhorita nem ao menos se dignou a entrevistá-las antes de mandá-las ao meu apartamento, não é?

— A agência para a qual telefonei disse que mandaria as melhores de acordo com perfil do senhor — defendeu-se Sakura, imaginando que o mau humor daquela vez tinha sido por causa das entrevistadas. Não que ele fosse gentil com ela.

— Que perfil?

Sakura procurou lembrar o que dissera ao telefone.

— Solteiro; vinte sete anos; empresário renomado, dono da empresa de publicidade Yoshiaki, herdeiro das empresas petrolíferas Uchiha...

— Não pensou em contar quanto tenho no banco? — resmungou, imaginando que as funcionárias da tal agência fizeram fila para encontrá-lo, sedentas pela oportunidade de botar as mãozinhas em sua fortuna.

— Isso ajudaria? — quis saber com interesse.

— Claro que não! — quase gritou, encarando a Haruno com raiva. — Da próxima vez diga a minha personalidade, não minhas qualidades financeiras.

Mentalmente Sakura se perguntou quantas pessoas aceitariam trabalhar para ele quando o descrevesse como: Grosseiro, mal-humorado e exigente ao limite. Provavelmente ninguém. Por fim ofereceu:

— Posso telefonar para a agência e refazer o perfil.

— Não é preciso, minha mãe já escolheu uma governanta.

— Dona Mikoto? O senhor tem certeza que não quer que refaça o perfil?

— Não é preciso — repetiu com irritação.

Sakura se perguntou qual seria o interesse da Uchiha agora. Afinal, fora contratada por Mikoto para informar tudo que Sasuke fazia dentro da empresa que ele montara com um amigo a cerca de dois anos. Será que agora queria uma espiã dentro do apartamento? Mas se queria por que não a contratara para o cargo? Mesmo tendo milhões de defeitos, alguns que se sobressaíam quando era contrariado, Sakura achava o patrão o melhor partido do mundo, além de ser lindo e atraente. Não seria nenhum sacrifício largar o cargo de secretária para morar debaixo do mesmo teto que o Uchiha, ao contrário, seria maravilhoso poder vê-lo desfilar com o peito nu pela casa, entrar no quarto dele...

— Haruno, escutou algo do que acabei de dizer? — perguntou Sasuke, estranhando o sorriso enorme, a face corada e o fato dela não ter se retirado. Ela piscou rapidamente, o semblante confuso. — Quero comprimidos para dor de cabeça — repetiu com o desagrado vibrando em sua voz.

— Ah, me desculpe — pediu, tensa com o rumo que seus pensamentos tomaram. — Volto em um instante, senhor.

Sakura saiu apressada do escritório quase se chocando contra o sócio e diretor da empresa, Gaara Sabaku. Lançou um rápido pedido de desculpas para o homem alto de cabelo ruivo e continuou seu percurso.

— O que fez com a garota agora? — Gaara perguntou ao fechar a porta.

— Nada. E olha que me sinto tentado — resmungou antes de sentar em sua poltrona giratória de couro preto. — Acredita que ela deixou que enviassem várias ninfomaníacas para o meu apartamento?

— Com o seu histórico deveria estar feliz — gracejou o Sabaku se sentando de frente para o Uchiha.

— Meu histórico não é diferente do seu, então me diga, ficaria feliz?

— Não. — Gaara fixou os olhos verde-água no amigo. Sasuke parecia prestes a explodir. — Pelo jeito foi muito ruim.

— Pior, se soubesse que seria assim teria deixado nas mãos da minha mãe antes.

— Mikoto?! Deixou que ela contratasse alguém para trabalhar para você de novo? — Gaara o encarou com um pequeno sorriso descrente. — Vive reclamando que tem de aguentar a Sakura e repetiu a dose?

— Sakura é uma secretária eficiente, mesmo ajudando a minha mãe a controlar meus passos e sendo desatenta com detalhes.

— E qual é o nome dela?

— Não sei. Ela disse que conhecia a pessoa certa e saiu apressada antes que pudesse perguntar nomes.

— Pelo menos sabe quando conhecerá a sua futura governanta?

— Hoje à noite.

— Se fosse você, telefonava e exigia nome. Nunca se sabe que tipo de pessoa é "certa" na mente de Mikoto Uchiha. Além disso, o que ela fazia em seu apartamento hoje?

— É provável que Sakura tenha lhe informado.

— Nesse caso, creio que Mikoto já tinha pensado em alguém para o cargo.

— Será?

Sasuke sentiu um estranho frio na espinha. Tinha imaginado que Mikoto tinha planos muito mais ousados que lhe fornecer uma governanta adequada, mas ouvir outra pessoa dizer o mesmo tornava tudo pior. Não que sua mãe fosse fazer uma escolha ruim... Pelo menos esperava que não fizesse.

~*S2*~

Hinata olhava meio aturdida e confusa para cada canto da sala do advogado dos Uchiha, Kakashi Hatake. Não pela elegância do local e sim por estar prestes a assinar um contrato para trabalhar para a pessoa que mais abominava no mundo. Tudo bem, não chegava a tanto, mas havia somente uma linha tênue para que isso ocorresse. Imaginava que debaixo do mesmo teto essa linha seria passada em questão de minutos, assim que o Uchiha insistisse em tirar sarro de sua vida "sem sal".

Tinha péssimas lembranças da época em que moravam na mansão e das vezes que visitara seu pai. Praticamente se sentira pisando em ovos, temendo encontrá-lo pelos corredores, ver o sorriso cínico e ouvir uma piada sem graça. Hinata não era uma pessoa que arranjava briga, nunca sequer levantara a voz para alguém, por isso em todas as vezes que Sasuke fizera um comentário idiota sobre a vida que ela levava ou sobre seu namorado, Naruto Uzumaki , somente respirava bem fundo, abaixava a cabeça — mais por vergonha do que raiva — e se limitava a ouvir em silêncio. Mas uma coisa era aguentar a implicância do Uchiha de vez em quando e outra era tolerar todo dia.

— A senhorita só tem de ler e assinar nesses locais em ambas as vias — informou Kakashi apontando as linhas pontilhadas.

Hinata pegou a folha e deslizou os olhos pelas palavras, às vezes tendo de voltar ao princípio, pois não conseguia enxergar nada do que havia escrito.

Tamanha hesitação para somente ler e assinar algumas linhas fez Mikoto perguntar preocupada:

— Hina, se sente bem? Está tremendo.

— S-sim... É que... — engoliu em seco. — Dona Mikoto, tem certeza de que Sasuke vai me querer como governanta?

— Claro que vai, meu amor. Ele concordou na hora quando disse que você seria perfeita para o cargo.

— Concordou?!

— Sim. Jamais contrataria alguém sem antes perguntar se ele aceitaria.

Do outro lado da mesa, Kakashi agradecia pela máscara que usava, devido a uma alergia, e que cobria seu rosto do nariz até o queixo, evitando que a Hyuuga visse o sorriso em seus lábios.

No momento em que a Uchiha lhe pedira por telefone para redigir aquele contrato, havia imaginado que havia uma intenção oculta por trás daquilo. Primeiro porque conhecia a inimizade entre Sasuke e Hinata. Era impossível não notar visto que o Uchiha mais novo fazia questão de dizer na frente da jovem que não entendia a mania de santa dela, entre outros comentários que faziam a Hyuuga corar e desviar os olhos para um ponto entre os próprios pés. Segundo porque Mikoto nunca dava um passo sem imaginar como lucraria com isso.

Observou a Hyuuga assinar apressada todas as folhas. Seu sorriso se alargou ao imaginar que era uma questão de tempo para saber se os planos da matriarca Uchiha eram o que suspeitava.

~*S2*~

Com o celular contra a orelha, Sasuke sentia que teria uma nova dor de cabeça se Mikoto não atendesse. Telefonara para a mansão e fora informado que Mikoto não se encontrava, então passara as últimas quatro horas ligando para o número de celular dela e nada.

— Senhor Sasuke, há uma ligação na linha três...

— Da minha mãe? — interrompeu ansioso.

Sakura o encarou tensa, estava ciente do estado de nervos que Sasuke se encontrava por não ter conseguido obter contato com Mikoto.

— É do senhor Naruto Uzumaki da empresa Namikaze — respondeu devagar, colocando um pé para trás para facilitar a fuga caso o chefe tivesse algum acesso de raiva. — Solicita falar diretamente com o senhor.

— Sobre o quê? — perguntou com raiva no olhar.

— Ele não disse...

— Porque passou uma ligação sem saber o que querem falar comigo?

— Eu perguntei, mas...

— Esquece, pode sair que atendo a porcaria dessa ligação.

— Sim, senhor! — Sakura praticamente correu porta afora.

Sasuke voltou sua atenção para o telefone sobre sua mesa onde o número três piscava sem parar. Depois da seção de sedução barata, de esquecer que sua mãe nunca tinha ideias inocentes e de não conseguir saber a droga do nome da nova espiã de Mikoto, agora seria obrigado a ouvir a voz insuportável do sedutor de empregadas alheias.

Pegou o fone e apertou com força o botão três.

— Sasuke Uchiha, com quem falo?

— Oi, Sasuke, sou eu, o Naruto. Há quanto tempo não nos falamos?

"Não o suficiente", respondeu em pensamento.

— Creio que desde o Natal — informou afundando o corpo na poltrona. — Mas não ligou para isso, correto? — Se fosse, Hinata podia se considerar viúva antes de casar. Se é que ela pretendia casar com aquela mula em forma humana.

— Não! — respondeu o Uzumaki, transbordando alegria pela voz, o que só fez aumentar a irritação do Uchiha. — A empresa Namikaze pretende lançar uma nova linha de perfumes e maquilagem, então pensei... — "Mula pensa?", Sasuke se perguntou sorrindo com cinismo enquanto o ouvia sem o menor interesse. —... em contratar os serviços da empresa Yoshiaki.

— Hum, estamos com a agenda cheia para esse mês, não sei se poderemos conciliar. — Em parte era verdade, a agenda da empresa estava lotada, mas recusava simplesmente porque não gostava de se imaginar trabalhando para aquele idiota.

— Será lançada em dois ou três meses, até lá...

— Não sei, tenho que falar com meu sócio — interrompeu-o para evitar se estender no assunto. Não aceitaria e ponto final.

— Posso falar com o Gaara e...

— Não se preocupe, avaliarei pessoalmente a possibilidade, não precisa incomodar o Gaara — mentiu para evitar que Naruto falasse com o sócio, que com certeza aceitaria a proposta.

— Ótimo. — Sasuke achava impressionante o quanto era fácil enganar o Uzumaki. — Seremos como nos velhos tempos, três amigos trabalhando juntos...

— Nunca trabalhamos juntos, só estudamos, é bem diferente — Sasuke recordou querendo acrescentar que não eram amigos.

— Eram ótimos tempos, lembra?

Não, ele não lembrava.

— Foi graças a você que conheci a Hina, o meu anjinho. — Naruto riu com felicidade, enquanto Sasuke sentia uma vontade enorme de perguntar quando o imbecil pararia de dizer baboseiras e encerraria a ligação. — Sabe, agora que assumi a empresa da família penso em pedi-la em casamento e gostaria que fosse meu padrinho...

— Olhe, estou ocupado no momento, podemos conversar a esse respeito outra hora. — "De preferência nunca, que é quando vou aceitar suas propostas", acrescentou em pensamento.

— Sim, claro. E quando poderemos falar do contrato?

— Te ligo assim que resolver com o Gaara — respondeu encerrando ele mesmo a ligação. Apostava que Naruto ficaria pendurado na linha durante horas se deixasse. — Só mesmo a virtuosa Hinata para aturar essa anta — disse com desdém após virar sua poltrona para fixar os olhos negros em um ponto qualquer da vista que a janela de seu escritório fornecia. — Se merecem.

— Quem merece o quê?

Voltou sua poltrona para o lugar e observou o sócio se aproximar.

— Ninguém em especial.

— Acabei de falar com a Sakura que me disse que o Uzumaki telefonou. O que ele queria?

— Relembrar os velhos tempos — respondeu desejando que a secretária mantivesse a língua grande dentro da boca. — Veio aqui só pra saber disso?

— Não. — Gaara tinha vontade de perguntar mais sobre a ligação do amigo, mas conhecendo o estranho ódio que o Uchiha adquirira pelo Uzumaki resolveu abordar o assunto que o levara até ali. — Temari nos convidou a uma festa de uma de suas amigas. É em uma danceteria aqui perto.

— Sinceramente, não terei cabeça pra festas enquanto não souber quem minha mãe contratou.

— Ainda não conseguiu arrancar a informação?

— Quando Mikoto quer ninguém consegue falar com ela — resmungou olhando de esguelha para o celular sobre a mesa de mogno. — Daqui vou direto para casa esperar minha mãe aparecer com a bendita governanta.

~*S2*~

No fim de tarde, enquanto arrumava o que levaria, Hinata se perguntava se havia tomado a decisão certa. Seu pai dissera que sim; Mikoto e Fugaku pareciam tranquilos com a possibilidade do filho ter alguém "ajuizada" por perto; e até sua irmã mais nova, Hanabi, suspirou por imaginar como seria conviver com Sasuke.

— Já imaginou. Você arrumando a cama dele, de repente ele aparece só de toalha e...

Balançou a cabeça diante das lembranças do que a irmã dissera que conseguia fazer com que suas bochechas ficassem quentes. Nunca imaginara que Hanabi pudesse ter pensamentos tão... Nem conseguia descrever.

— Pronta, Hina?

— Sim, dona Mikoto — respondeu fechando a pequena valise.

Mikoto olhou para a valise e franziu a testa.

— Só isso?

— Si-sim... — gaguejou constrangida. Havia decidido levar poucas roupas, já que era possível que pedisse demissão naquele mesmo dia.

Sem dizer nada, Mikoto a levou até o carro onde Hiashi aguardava para levá-las ao prédio em que o Uchiha morava, cerca de duas horas da mansão. Mesmo assim o caminho foi rápido, até demais na opinião da Hyuuga.

— Pode se despedir do seu pai, Hina. É provável que só o veja nos fins de semana.

Hinata abraçou seu pai, que se surpreendeu com a atitude, afinal desde que a esposa falecera, talvez até antes, não demonstrava carinho por nenhuma das filhas. Isso o preocupou, principalmente em perceber que Hinata se segurava para não chorar. Podia ler nos olhos dela que queria desistir, o que jamais permitiria.

— Sei que irá honrar o sobrenome Hyuuga. — Aquilo era tudo que precisava dizer para que Hinata não cometesse qualquer desatino.

Hinata encarou Hiashi em choque. Conseguia ler nas entrelinhas que se não passasse o ano todo como governanta de Sasuke seria para sempre sinônimo de fracassada para seu pai. A decisão que tomara não tinha volta, era isso que podia ler nos olhos perolados de Hiashi.

— Nã-não o de-desapontarei — garantiu insegura ao se afastar de cabeça baixa, a franja espessa cobrindo sua fronte e evitando que seu pai visse seus olhos marejarem.

Como um robô encaminhou-se para o lado de Mikoto e a seguiu rumo ao apartamento de Sasuke. Mentalmente dizia como um mantra: "Papai, Hanabi, Fugaku e Mikoto acreditam que conseguirei, então conseguirei".

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