31. Raphael

Fazendo força para não desmaiar, e erguendo a cabeça com dificuldade, devido à extensão dos ferimentos, Raphael pode ver o professor caído, com os membros contorcidos e perdendo muito sangue, porém, não conseguia se mexer para ajudá-lo.

Quase sem esperanças, ele se lembrou do que lera na placa e pensou na possibilidade de ser um arcanjo. Estar vivo e consciente mesmo com o tórax aberto e os órgãos expostos, além de um pulmão destruído, e praticamente sem nenhuma gota de sangue já era um grande milagre, sem contar o que viu nas imagens do circuito interno do do hospital quando se regenerou após o arrebatamento do professor Thomas.

Lembrou-se então do que já ouvira falar sobre o arcanjo Raphael nas diversas crenças onde ele aparece. Raphael é conhecido como o arcanjo da cura, e isso o encheu esperança, e num último esforço ele sentiu um poder surgir, já não tinha dificuldades para respirar e viu a sala toda tremer, quando a mesma luz azul anil que vira antes em seus dedos, agora contornava todo seu corpo até envolvê-lo por completo, como em um casulo.

De dentro daquela crisálida, ele pode ver que algo semelhante acontecia ao professor, e que as informações sobre o estado de seus ferimentos chegavam em torrentes ao seu cérebro, e enquanto mentalmente ele o tratava, aquela luz cor de anil ia colando os ossos e fechando os cortes.

Quando terminou o tratamento do professor e constatou que seus sinais vitais estavam restabelecidos, ele se voltou para si mesmo, para ver que estava completamente recuperado, e sem uma marca sequer, com exceção da linda camisa que havia pegado emprestada no closet do sobrinho do professor, que estava destruída.

Quando o casulo de luz que o envolvia se desfez, ele pôde perceber pelo reflexo no espelho da cristaleira, que tinha agora um par de asas coloridas com a mesma cor que o casulo tinha.

_ Isso seria um arraso na balada! _ Ele disse para si mesmo, enquanto adimirava suas asas brilhantes. _ Eu sempre soube que tinha nascido para brilhar, mas não era bem isso que imaginava.

_ Isto é simplesmente incrível, Raphael! _ O professor disse, olhando para a sua transformação. _ Isso explica por que você consegue ler em enoquiano. Você é um anjo!

_ Arcanjo na verdade. _ Raphael corrigiu com tom divertido, estando mais tranquilo agora que o professor estava bem. _ Não me diminua, por favor.

Ambos riram, mas não podiam perder tempo, tinham sido atacados por um monstro que procurava pela placa. Instintivamente, correram até o escritório para verem que estava tudo destruído. O computador e os aparelhos que Raphael usara para sua tradução estavam derretidos como se tivessem queimado á uma temperatura absurdamente alta.

_ Não dá para aproveitar nada aqui professor! _ O jovem disse, vendo a desolação no rosto do professor. Todo trabalho foi perdido!

_ Aquele monstro maldito podia ter levado só a placa! _ Vecchio disse triste, enquanto revirava o escritório para ver se podia aproveitar algo. _ Mas tinha que destruir tudo!

Uma explosão vinda dos fundos da casa chamou-lhes a atenção. Da varanda do quarto do professor, escondidos atrás de uma parede, eles avistaram o monstro que os atacou, e que agora parecia ainda maior, e uma armadura que parecia feita de ossos cobria o seu tórax, bem como uma espécie de elmo com chifres que protegia sua cabeça, mas tanto a armadura quanto o elmo pareciam parte do seu corpo como se tivesse sofrido uma transformação para a batalha. Ele arremessava carros e outros objetos em algo ou alguém, e o que ele tocava se tornava incandescente imediatamente, assim como a barra que ele usou para prendê-lo à parede.

Viram que ele tinha alguns monstros menores com ele, porém esses eram mais deformados e grotescos como se fossem gárgulas, ou demônios.

_ Você precisa ver isso Raphael! _ O professor disse após chegar mais para o lado, para ampliar o seu campo de visão e ver quem ou o quê o monstro atacava.

_ Meu Deus, eles são como eu! _ O jovem disse depois de ver o que o professor lhe mostrava.

Pairando sobre a rua principal, dois jovens que aparentavam ter a sua idade esquivavam-se com maestria dos objetos lançados contra eles, ao mesmo tempo em que voavam e combatiam as gárgulas, desintegrando-as com suas chamas coloridas. Era um casal, ele com suas chamas azuis celestes, e ela com asas cor de esmeralda, e ambos pareciam bem à vontade com a batalha, como se não fosse a primeira vez que lutavam contra monstros daqueles.

Após destruir todos os monstros menores, o jovem voltou sua atenção para o gigante, e enquanto a garota terminava com os seus, ele empreendeu um vôo em direção ao inimigo num ataque direto. Raphael se encheu de esperança com aparecimento desses dois jovens alados que atacavam o monstro que roubou a placa, e mesmo sem saber se eram amigos ou inimigos, a intervenção deles veio a calhar.

_ Esse rapaz parece ser muito poderoso! _ Ele pensou, enquanto o jovem das chamas azuis partia na direção do monstro numa velocidade incrível, mas que ele pode acompanhar.

A esperança de Raphael começou a se esvair quando viu o monstro interceptar o ataque do jovem com facilidade e contra-atacar com um golpe potente, lançando contra o muro de uma casa, atravessando-o como se o mesmo fosse de papelão.

_ Gabriel, não! _ Ele ouviu a jovem gritar, enquanto ela destruía o último adversário e voava rapidamente até onde o jovem havia caído.

_ Seus vermes alados! _ O monstro gritou, fazendo uma pausa e soltando uma gargalhada infernal, enquanto a jovem ajudava seu parceiro nos escombros. _ Não achei que voltaria a ver vocês dois!

_ Como assim voltaria, demônio? _ O jovem disse, saindo dos escombros amparado pela companheira, e parecendo estar meio grogue. _ Nós nunca vimos essa cara horrorosa antes?

_ Pelo visto vocês não se lembram, não é? _ O monstro que eles chamaram de demônio provocou, com outra gargalhada. _ Vocês foram descartados aqui pelo papai para morrerem como os humanos. Eu reconheço o espírito de vocês, mas nessa casca de carne e osso vocês estão fracos.

_ Não sabemos do que está falando demônio. _ A garota retrucou, intensificando suas chamas, e partindo para o ataque enquanto o companheiro dela se recuperava. _ E também não nos interessa! Nós vamos destruir você como fizemos com seu exército!

_ Vocês realmente não se lembram de quem eu sou! _ O demônio disse em um tom presunçoso, enquanto se defendia dos ataques dela, com apenas uma das mãos, já que a outra segurava a placa. _ Esses demônios que vocês enfrentaram não eram nem um por cento do meu exército! Eu sou Abigor, o primeiro em comando no exército de Lúcifer, conhecedor de todas as artes marciais e estratégias. Como vocês poderiam me vencer?

Raphael viu quando a expressão prepotente de Abigor mudou para surpresa após ser atingido no rosto por um golpe dela, e começar a ser atacado ferozmente pelos dois ao mesmo tempo, sendo forçado a recuar, e vibrou quando o demônio foi atingido por um golpe que o fez cair.

O jovem que Abigor chamou de Gabriel, estendeu a mão direita espalmada na direção do demônio e lançou um feixe de suas chamas na direção do inimigo, que começou a gritar de dor, enquanto os dois o olharam triunfantes.

_ Eles venceram! _ O professor disse, após observar em silêncio a batalha que seus olhos humanos mal pôde acompanhar. _ Derrotaram o monstro!

_ Eu acho que não será tão fácil assim professor! _ Raphael disse enquanto via o monstro mudar a expressão de dor e o grito para uma gargalhada de escárnio.

_ A inocência de vocês me diverte! _ Abigor gritou enquanto os jovens o olhavam com o olhar incrédulo, parecendo não acreditar que ele sobreviveu às chamas. _ Vão precisar de mais do que isso para derrotar um demônio de elite!

Levantando-se, o demônio colocou a placa ainda coberta em uma abertura na armadura, na altura do seu peito, e partiu num ataque tão veloz que pegou os jovens desprevenidos. A garota que foi chamada de Raguel se protegeu com suas asas, mas com o impacto foi arremessada uns quinze metros até atingir vários carros que estavam estacionados, gerando uma grande explosão. Gabriel conseguiu se esquivar por pouco do primeiro golpe, mas foi pego em um aperto forte daquela mão que envolvia todo o seu pescoço, e apertava com força praticamente ignorando os seus golpes tentando se libertar.

_ Abigor é forte demais, professor. _ Raphael disse, agora quase sem esperança.

_ Sempre há um ponto fraco, meu jovem! _ Disse o professor. _ Mas parece que eles não terão chances de descobrir.

A situação era terrível, eles não sabiam se era possível a jovem ter sobrevivido aquela explosão, e o companheiro dela estava vulnerável nas mãos do demônio que apertava seu pescoço e ria de suas tentativas vãs de se libertar. Abigor começou a se mover até próximo ao muro de uma casa vizinha da casa do professor, fazendo com que Raphael recolhesse suas asas e seu brilho quase que completamente, e se escondesse para que não fosse visto,
já que agora estava a menos de três metros da varanda onde estavam.

Uma aura negra e fúnebre envolvia o demônio, como uma espécie de névoa, parecida com a luz que envolvia os jovens, mas sem brilho, e com uma violência inimaginável ele bateu o jovem contra o muro de pedra fazendo com que suas asas desaparecessem, e erguendo a outra mão agarrou a barra de ferro de uma grade próxima, arrancando-a facilmente. A névoa começou a se mover e envolveu os braços do jovem, que mesmo lutando não pode evitar de ter seus braços completamente abertos e encostados no muro.

A barra de ferro nas mãos do demônio se acendeu, tornando-se incandescente como a que atingiu Raphael mais cedo, e com um golpe certeiro ele a cravou em um dos pulsos do jovem, atravessando-o e enterrando-a no muro, fazendo com que ele soltasse um grande grito de dor. A mesma névoa que segurava os braços de Gabriel, trouxe outra barra até a mão do demônio, e a exemplo da primeira ela se acendeu com o toque. Sem misericórdia o demônio repetiu a ação, agora cravando a barra incandescente no outro pulso do jovem, para ouvir outro grito de agonia.

Agora Gabriel estava preso ao muro pelos pulso como se estivesse crucificado, mas a luz que cobria seu corpo não deixava o ferimento sangrar. Soltando o pescoço dele, Abigor começou a desferir golpes violentos com o punho no seu rosto.

_ Essa luz irritante do seu espírito está reduzindo os danos ao seu corpo! _ Abigor disse enquanto o socava. _ Mas será que se enfiar uma barra no seu coração ou na sua cabeça ela desaparece?

Enquanto via aquele massacre sem saber o que fazer, Raphael pensou em Mikael e se entristeceu por tê-lo conhecido só agora nesse mundo onde demônios como aquele existiam. Queria abraçá-lo e beijá-lo mais uma vez, mas não podia ficar parado vendo Abigor matar Gabriel, tinha que ajudar, mesmo que significasse morrer também.

_ Você está bem, garota? _ Ele pensou olhando para as chamas da explosão que envolveu vários carros, e lançava uma fumaça preta aos céus. _ Alguém precisa ajudar seu amigo!

_ Eu estou bem. _ A voz da garota que foi lançada na explosão ecoou em sua mente, no momento em que ele pensou nela, pegando-o de surpresa. _ Meu nome é Raguel, e se eu posso ouvir seus pensamentos, você também tem poderes como nós, e deve ser o Raphael!

_ Como isso é possível? _ Ele disse ainda em pensamento. _ Telepatia?

_ Eu creio que sim. _ Ela respondeu. _ Não sei explicar, mas parece que temos alguma ligação.

_ Quem são vocês? _ Ele perguntou ainda confuso.

_ Somos amigos do Mikael e do pai dele. _ Ela respondeu. _ E viemos para levar vocês até eles.

_ Mick e o pastor estão bem? _ Ele perguntou enchendo o coração de alegria ao ouvir o nome de Mikael, agora falando telepaticamente e também em voz alta, pegando o professor de surpresa.

_ Estão sim! _ Ela respondeu. _ E estão te esperando, mas antes preciso que ajude o Gabriel. Eu gastei muita energia para me proteger da explosão, e estou me recuperando. Ganhe algum tempo para mim, por favor!

_ Vou fazer o que puder! _ Ele respondeu enquanto saia até a varanda no momento em que Abigor pegava outra barra e caminhava até Gabriel.

_ Ei feioso, você está com algo que nos pertence! Ele gritou da varanda, fazendo com que eles voltassem a atenção para ele. _ E queremos de volta!

_ Você deveria estar morto, seu verme! _ Abigor gritou, surpreso ao vê-lo. _ E deve ser o que está querendo para me encarar ao invés de fugir.

_ Talvez você não bata tão forte quanto pensa. _ Raphael provocou com sua ironia. _ Você diz que foi o líder dos exércitos de Lúcifer, mas as escrituras falam que você foi derrotado. Acho que o grande Abigor, é na verdade uma fraude de elite!

_ Desgraçado, como ousa zombar de mim! _ O demônio gritou com uma voz poderosa e monstruosa, e tomado pela ira arremessou a barra de ferro como uma lança em uma velocidade que Raphael não pode sequer esboçar uma esquiva, de modo que a lança atravessou totalmente o seu corpo na altura do peito e indo parar na parede da sala, e deixando um buraco no corpo do rapaz por onde ela passou. _ Vai morrer por sua insolência!

Raphael não se mexeu, apenas olhou para o buraco em seu peito e depois para a expressão de surpresa de Abigor e também de Gabriel, enquanto olhavam o buraco em seu peito se fechar quase que instantaneamente.

_ Até dói um pouco Aby, mas não mata! _ Raphael disse com um sorriso irônico triunfante, que fez o demônio se irar ainda mais. _ Quer tentar outra vez?

Raphael se mostrava confiante, mas estava apenas ganhando tempo, sabia que mesmo que pudesse ser praticamente imortal com seu poder, ele era um poder de cura e não de ataque. Precisava continuar tirando a atenção do monstro de Gabriel, para dar tempo de Raguel se recuperar, e pensarem em um modo de vencer Abigor.

_ Não sei quanto tempo mais eu consigo. _ Ele disse telepaticamente para Raguel. _ Vou fazer o que eu posso, mas venha logo!

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top