29 - Um novo dia

Embora Mackenzie tivesse acordado com suaves raios solares invadindo sua cabana, a temperatura não era tão receptiva. Era uma daquelas frias manhãs de fim de outono que fazia com rolássemos na cama.

Mackenzie precisou de um minuto para espantar o sono e depois disso, preparou-se para sua rotina. Ela direcionou-se ao campo aberto, onde habitualmente aconteciam as aulas de arco e flecha.

Seu professor, Alois, um velho druida com cara de poucos amigos para Mackenzie, aproximou-se e olhando-a de baixo a cima com uma expressão de julgamento e abominação antes de empurrar-lhe com brusquidão o arco e a flecha que segurava. Estava evidente que ele preferia estar em qualquer outro lugar, ensinando qualquer outra criatura. Mas mesmo depois de se passar tanto tempo, Mackenzie não havia se acostumado com esse tipo de tratamento e ainda retesava, paralisada, incapaz de desviar o olhar ou sair do lugar e por mais que tentasse impedir que o gesto impactasse boa parte da sua manhã, ainda impactava.

Alois lhe deu as costas e as mãos de Mackenzie tremeram quando encaixou a primeira flecha no arco e ergueu-o até a altura do rosto, suas pupilas se contraíram ao ar livre quando ela olhou ao longe, para o seu alvo, que se apresentava em um ponto vermelho em uma placa de madeira. Assim que ela ajustou a mira, a flecha foi lançada, viajando no ar até atingir a borda da placa. Tinha sido muito bom, embora não tivesse alcançado a marca desejada.

Ela soltou um suspiro, pegando outra fecha e depois de repetir o processo, dessa vez com mais precisão. Só que antes que a flecha fosse disparada, uma sombra havia se projetado ao lado dela. Olhando de esguelha, ela se sentiu mais tranquila quando se deparou com Edlyn e não com Alois e seu olhar impiedoso.

— Muito bom. — Ele disse com os braços cruzados diante do peito.

— Isso foi um elogio? — Mackenzie rebateu, tentando com fracasso concentrar-se em seu alvo.

Antes de puxar a flecha na corda, Mackenzie fitou-o de esguelha e viu o canto da boca de Edlyn repuxar, como se estivesse tentando conter um sorriso zombeteiro. As coisas estavam diferentes, mas mesmo assim ela procurou qualquer traço que demonstrasse irritação pela noite passada, e quando não encontrou, ela se sentiu muito estranhamente aliviada. Ela remexeu os ombros, sentindo-se estranha por tê-lo a observando. Seus olhos fixaram-se na ponta da flecha, e ela fez o melhor que pode para se concentrar no alvo. Sua garganta se apertou quando ela disparou e resmungou frustrada ao perceber que passara muito longe de seu alvo, acertando o chão.

— Ou a minha presença está te afetando — ele andou mais em direção a ela — ou a flechada anterior foi um belo golpe de sorte — acrescentou com um sorriso perspicaz que dava a ela uma amostra dos belos dentes do druida.

Mackenzie sentiu seu corpo ser consumido por um calor repentino que se instalou em sua face, e ela tentou manter seu rosto longe das vistas astutas de Edlyn, pois sabia que estava tão vermelha quanto um tomate maduro, por isso, voltando-o para o chão.

— Vai sonhando... — Ela se pegou respondendo fragilmente, enquanto ingenuamente, preferia acreditar que se tratava da segunda opção, embora soubesse que esse tinha sido um dos primeiros erros em muito tempo.

— Deixe-me ajudá-la. — disse ele, aproximando-se mais dela.

Mackenzie fitou-o com resguarda, mas não impediu que ele se pusesse atrás de seu corpo, sufocando-lhe o ar e corando quando ele a segurou pela cintura e puxou-a com um pouco mais de firmeza, fazendo-a corar. Uma sensação de formigamento surgia nos locais em que ele tocava e ela se desconcertou, como um torrão de açúcar desmanchando-se na ponta da língua. Ela não sabia exatamente o que estava acontecendo quando Edlyn se aproximava dela, mas a sensação se tornava ainda mais intensa com o passar do tempo, e ela sentia que se desgastava muito para manter a compostura.

— Ajuste a postura. Isso com certeza vai fazer a diferença. — Os lábios dele pairaram próximos à orelha dela, provocando arrepios indesejados nos pelos da nunca dela, ao explicar.

Ele fitou o flanco do rosto dela antes de repousar sua mão sobre a dela que firmava a flechava, melhorando a posição de disparo, sentindo a garganta se contrair, enquanto tentava conter aquela sensação que subia pela boca do estômago e fazia o coração bater mais rápido. O rosto dele encaixou-se à curva do pescoço dela e ele inalou suavemente o cheiro de jasmim que havia nos cabelos dela.

Ele coçou a garganta, tentando dispersar a distração e afrouxou a mão e Mackenzie permitiu que a flecha viajasse no ar, atingindo o centro do alvo.

— Oh meu Deus! — ela sorriu abertamente, explodindo em alegria e dando pulinhos ao se dar conta de que pela primeira vez a flecha havia encontrado o centro do alvo. — Obrigada! — disse, quando se viu com os braços envoltos em Edlyn.

Ele hesitou um pouco em abraçá-la, mas quando se deu conta, suas mãos já estavam sobre as costas dela e a apertou o corpo miúdo contra seu. Aos poucos Mackenzie foi recobrando a noção, repentinamente consciente da proximidade dos dois, e à medida que isso acontecia, mas os seus braços afrouxavam-se ao redor de Edlyn.

Desconcertada, ela passou a mão pela testa, ajeitando os cabelos no lugar, os olhos sem saber para onde exatamente olhar e Edlyn divertindo-se com toda a agitação da garota, principalmente porque ela ficava ainda mais bonita naquele estado.

Mackenzie desconcertou-se ainda mais ao ver a linha dos lábios dele se curvarem em um sorriso e ela perguntou:

— O que foi?

Ele deu um passo a frente, o sorriso sumindo gradualmente à medida que suas pupilas se dilatavam, fitando-a com uma intensidade que fez Mackenzie se sentir como se estivesse em uma de suas visões.

— Nada. — Ele disse muito suavemente, deixando que outro sorriso relanceasse, fazendo Mackezie deglutir, enquanto fitava seus olhos acinzentados profundos que pareciam que lhe sugariam para algum lugar desconhecido. — Eu preciso ir. — Acrescentou, erguendo a mão para passar uma mecha de cabelo que voava por seu rosto para atrás da orelha. — Mas continue praticando.

O resto do dia passara como um sopro à medida que Mackenzie revivia a noite passada e os acontecimentos dessa manhã e sorria absorta em lembranças que não queria esquecer.

Naquele fim de tarde, Mackenzie dirigiu-se a caverna do grifo sozinha à passos vagarosos, mas conforme se aproximava da caverna, mais ela podia ver as penas cor de âmbar das asas do grifo abanarem no ar. Muito entusiasmada em vê-lo pela primeira vez depois de ser aprisionado, ela se apressou em se aproximar e maravilhou-se com o esplendor da criatura.

Ela não podia acreditar.

O vento de final de tarde soprou, agitando e levando os cabelos de Mackenzie para a frente e o grifo agitou suas asas, batendo-as e granando estridentemente ao perceber a presença de alguém se aproximar. A garota recuou por um instante, mas tomada pelo fascínio, continuou a se aproximar e parou diante das grades que aprisionavam o animal, perscrutando-o de cima abaixo. Assim, diante de animal tão grandioso, a presença de Mackenzie era tão pequena quanto insignificante e ela piscou demoradamente, a fim de verificar se não era sua imaginação mergulhando em uma ilusão de pelos e plumas, mas quando abriu os olhos e deparou-se com as enormes patas falconiformes da frente e as felinas da parte de trás, ela teve certeza de que não estava enlouquecendo. Ela ergueu o queixo e mirou a cabeça branco de falcão e as penas iam matizando-se em tons de âmbar e castanho-escuro à medida que se aproximava do peito. Ela nunca tinha visto criatura como essa em seu castelo e pela primeira vez na vida, ela se flagrou perguntando sobre quantos momentos como esse ela havia perdido aprisionada em seu castelo, quantas coisas incríveis ela deixara de ver e viver?

Os olhos vítreos em tom de dourado repousaram sobre ela de uma forma selvagem, para então recolher as asas ao lado do corpo e sentar-se sobre as patas felinas, enquanto o rabo chicoteava à sombra da caverna.

— Você não se parece com o grifo que estava me caçando. — Mackenzie comentou, vendo mais tranquilidade e piedade do que ameaça nos olhos do animal.

— O que você fez com ele? — Alguém perguntou por trás dela e Mackenzie não precisou se virar para saber que era Edlyn que estava ali.

— Nada... — ela respondeu com bastante ressalva, virando-se para Edlyn.

Edlyn se aproximou e o grifo abriu as asas, eriçando-se e grasnando selvagemente ao abandonar o comportamento manso.

— Eu não diria isso. — Edlyn ponderou, analisando a hostilidade do animal e a ingenuidade da garota. — Já faz algum tempo que tento domá-lo e ele permanece ...

Os olhos do druida iluminaram-se como duas luas cheias em extremo esplendor enquanto a criatura bestial grasnava incansavelmente para ele.

— Eirin me garantiu que vocês não o subjugariam... — ela disse com nítido tom de reprovação.

— Eu não estava subjugando...

Mackenzie não se atentou ao fato do que estava fazendo era muito arriscado, mas ela ergueu um dos braços e passou a mão pela grade, levando a mão até o torso do animal, que não ofereceu resistência alguma ao toque.

Edlyn sorriu como se tivesse feito a descoberta do século.

— Você não tem ideia do que ele acabou de fazer,tem? — Edlyn questionou-a muito maravilhado ao vê-la acariciar uma besta comoquem acaricia um cavalo dócil.

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