10 - Longe de casa
Eles nadaram contra a correnteza até alcançarem a borda do canal do rio Cinzel. O druida saiu primeiro da água, e da roupa ensopada escorria água. Mackenzie tossiu enquanto saia, um pouco depois, e a capa encharcada de água pesava em seus ombros, até que ela a tirasse, sacudindo-a em uma bola de pano e água, como se aquilo fosse o bastante para secá-la.
A margem do Cinzel era uma belíssima praia de areia branca com pedras espalhadas, o vento chicoteava forte naquela região e os cabelos molhados de Mackenzie era sacodidos, mesmo pesados por conta da água e batiam em sua pele. Ela andou um pouco, mas foi na areia fofa que Mackenzie desmoronou com um suspiro de fadiga, soltando a capa que agora não passava de amontanhado ao chão, sentindo um misto de preocupação e alívio, porque ela não fazia a menor ideia de como faria para sair deste lugar e ainda mais, chegar a tempo de sua coroação. Ela avaliou o cenário ao redor. O penhasco um pouco a sua esquerda, o canal de água corrente a frente, e a direita a estratificação de praia em primeiro plano e a floresta densa e escura ao fundo.
Era assustador pensar que poderia ter morrido duas vezes em apenas uma noite.
De repente ela se viu exausta e abatida de tanto correr do urso e sentia que as pernas não aguentariam dar sequer míseros passos.
O puro-sangue do druida surgiu como um ponto negro e brilhante no horizonte, a crina contra o vento enquanto trotava na direção deles.
Mackenzie fechou os olhos com frustração e jogou o corpo para trás, a areia encaixando-se ao redor do corpo miúdo enquanto pensava no milagre que a tiraria dali.
O cavalo relinchou de súbito tão perto que ela pode sentir o calor do corpo dele frente à sua face, e ela abriu os olhos de pressa para se deparar com a fronte negra e as grandes narinas macias do animal.
— Minelau... — O cavalo recolheu a cabeça depois que o druida pegou a rédea, ao dizer e desta vez a cabeça do druida cobriu o céu a sua frente.
— Agora você deve seguir para lá. — O druida informou, dessa vez apontando para noroeste. — Pelo menos, está mais perto daqui.
Mackenzie se levantou abruptamente da forma mais digna que podia, sacodindo a roupa para repelir a areia.
— Pela floresta? — Ela parecia desapontada com a nova informação.
— Passar por Angora é muito mais rápido. Se partir agora, chegará a sua terra ao alvorecer.
Mackenzie analisou o caminho que deveria seguir e se sentiu desencorajada. Será que não tinha outro jeito? E parecendo ler os pensamentos da menina, o druida acrescentou olhando pela orla de areia extensa que margeava as águas agitadas.
— Você também pode contornar a praia, é mais seguro — ele admirou ao observar as ondas espumosas que iam e vinham da borda — mas levará três vezes o tempo.
— Três dias? — Mackenzie retrucou com descrença? — Preciso chegar a minha terra amanhã. Você conhece este lugar — ela começou a pensar — se eu pagasse a você uma quantia generosa, você poderia me levar de volta em segurança?
Ele a encarou.
— O que te faz pensar que eu quero o seu ouro? — O druida retrucou com perspicácia, recuando um pouco.
Mackenzie engoliu em seco desviando o olhar dele para a praia.
— Eu não sei. — Ela respondeu. — Se não for isso, peça o que quiser e eu garanto que minha família pagará. Eu só quero voltar para minha casa em segurança. — Ela praticamente implorava, mas não era disso o que se tratava.
Naquele momento, o druida não sentiu tanta pena da pobre garota, porque como os outros humanos, ela também pensava que tudo tinha um preço, inclusive ele.
"Ela tinha que se parecer com eles em algum aspecto." Ele concluiu com desdém.
Só que, de qualquer forma, ele tinha outras obrigações com seu povo e a floresta, porque não eram somente os humanos que se viam em apuros. No caso dos druidas, o problema estava há meio dia, depois das montanhas Marve. Seu povo estava prestes a entrar em uma guerra com o exército da rainha Europa, que queria tomar o governo das mãos dos Druidas, e ele, que era o filho mais velho do comandante, deveria encontrar uma das poucas feiticeiras com poder o bastante para enfrentar a rainha Europa e, finalmente, encerrar o conflito.
— Você precisa chegar a sua terra até amanhã. Eu preciso chegar a minha ainda hoje, e por causa de uma humana molenga — ele apontou para ela, porque ela era a única humana molenga por toda Angora — sequer encontrei o que buscava. — O druida resmungou, segurando as rédeas de Minelau.
— O que você está procurando? — Mackenzie se atreveu a perguntar, acompanhando o druida que começava a andar ao lado do cavalo.
— Espera... — Mackenzie pegou-se desapercebida. — Do que você me chamou?
Ele não deu ouvidos a ela, e continuou a andar, guiando o cavalo pela rédea. Então Mackenzie correu, passando a dianteira e andando de costas para o caminho para ficar de frente para o druida. O vento provocando o belo efeito de tentar levar a barra rodada da camisola dela e os cabelos dourados a seu favor. O druida não pode deixar de perceber isso.
— De humana molenga. — Ele repetiu, momentos depois, o cavalo tentando virar a fronte para o outro lado, teimando contra a rédea. — E procuro por uma bruxa poderosa. — Ele disse, simplesmente, prestando mais atenção no cavalo do que em Mackenzie.
— Mas elas estão mortas... — ela observou em resposta, sem se dar conta da besteira que havia feito, e ele não pode deixar de assumir uma postura ressentida e defensiva.
Mackenzie parou, cruzou os braços diante do corpo e encolheu-se entre os ombros com pesar. As bruxas era criaturas como o druida e elas morriam sempre que tinha o desprazer de serem encontradas em sua cidade. Talvez, se ele fosse achado, também correria o risco de perder a cabeça.
— Estão mortas porque o seu povo — o druida virou-se de repente e apontou para ela em tom acusatório — as encontram e as matam... mas espero que ainda possa encontrar alguma, porque Angora depende disso. Tem uma rainha, a rainha Europa, ela está lutando contra meu povo, para nos derrotar e assumir o controle da floresta.
— Eu sinto muito. — Mackenzie disse com sinceridade, os braços caindo ao lado do corpo sem muita expectativa. — Talvez eu possa ajudá-lo...
O druida soltou uma lufada de ar de desdém, voltando a andar com Minelal ao seu lado.
— Uma coisinha assim tão minúscula como você, me ajudar? — ele revidou, mas Mackenzie não se ofendeu.
— Existem muitas vantagens em ser pequena. — Mackenzie fez questão de contestar.
— Realmente — ele replicou — polir as minhas botas é um excelente exemplo.
— De qualquer forma — estalou Mackenzie prontamente — você poderia ter montado em seu cavalo esse tempo todo. — Ela observou com esperteza, o que não foi muito do agrado do druida, porque realmente, não havia nada que o prendesse ali além da menina. Talvez fosse a ingenuidade, a impotência dela. De qualquer forma, druidas possuíam instintos protetivos e essa menina, mais do que qualquer um, precisava de ajuda.
Ele continuou a andar, agora, sem mais olhar para a garota, e ela continuou a segui-lo dando passadas largas na areia para alcançá-lo.
— Você quer uma bruxa — ela argumentou — eu quero voltar para minha casa. — Mackenzie voltou a insistir, olhando para ele que não olhava para ela. — Podemos trabalhar juntos e nós dois conseguiremos o que queremos.
Ela estava fazendo um bom trabalho, mas em outros tempos, Mackenzie nunca teria insistido pela ajuda de um estranho, porque sempre havia mais pessoas para ajudar com suas necessidades. No entanto, agora, só havia essa curiosa criatura, e ela realmente estava disposta e convencê-lo. Ela precisava disso. Seu povo precisava dela e ela precisava ser coroada Rainha.
— Por favor. — Mackenzie pediu, usando seu último recurso, a gentileza, para convencê-lo.
O druida parou o cavalo e respirou fundo, prestes a tomar a sua decisão, subiu em sua montaria e fitou enquanto o vento sacodia suas vestes e seu cabelo.
Mackenzie também o encarava, esperando pela resposta; os dedos das mãos enganchados um no outro, na frente das pernas, denunciavam o receio de ser abandonada.
— A menos que vá sozinha — disse ele, de cima do cavalo — você não partirá até termos conseguido encontrar uma bruxa. — Advertiu o druida, esticando o braço para ajudá-la a subir também.
Mackenzie temeu aquele acordo enquanto encarava a palma da mão dele virada para cima e hesitava em pegá-la ou não. Ele era tão anatomicamente humano. Cinco dedos nas mãos, cabelos tão negros quanto a noite mais densa. Os olhos eram intensos demais como Mackenzie havia sonhado noites a fio. Ele seria facilmente confundido com um homem, não fossem as orelhas protuberantes.
— A propósito — o druida disse — Edlyn.
— Edlyn... — Mackenzie repetiu, fitando a mão dele. Este era o nome do druida.
Edlyn, ele era tudo o que ela tinha. Era isso ou tentar a sorte sozinha na floresta; pensar nisso a fez esticar o braço e tentar pegar a mão dele. O druida retirou a mão antes mesmo que ela pudesse tocá-la e ele balançou a cabeça de um lado para o outro.
— Não — ele recusou-se a pegar a mão dela e o cavalo trotou para trás. — Se quer realmente vir comigo, preciso ao menos saber como se chama.
Mackenzie recuou um pouco.
— Anne. — Ela mentiu, esperando conseguir sustentar a identidade de sua babá até verdadeiramente estar segura.
Ele ergueu a sobrancelha em resposta.
— Esse nome não combina com você... — Edlyn fez o cabelo andar em círculo ao redor dela. — Ora. O que você está dizendo? — Mackenzie tentou parecer normal.
— É como uma espada com o punho trocado. — Ele tentou explicar, mas não insistiu, porque esticou o braço novamente e pegou a mão da menina, ajudando-a a subir nas costas de Minelau.
— Essa bruxa... — Mackenzie disse. — Você tem alguma noção de onde pode encontrar?
O druida não se deu ao trabalho de lhe expressar alguma resposta, apenas bateu a rédea e o cavalo saiu apressado na direção oposta a que ela deveria seguir em sua volta para casa.
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