Capítulo 9 - O Gato Preto, a Livraria e a Escada

Mas uma vez eu estava naquele lugar. Eu já deveria estar acostumado com aquela vida, mas infelizmente eu não estava. Olhei para o teto branco e aspirei o cheiro de desinfetante que inundava o ambiente, o maquinário estava conectado em meu corpo e bipava em um ritmo tranquilo. Tentei me sentar, mas a dor em minhas costas me inundou me fazendo fiar estático na cama. Observei o quarto atentamente e não vi ninguém sentado em uma poltrona ou cadeia como na ultima vez.

“E mais uma vez...” – suspirei ao sussurrar.

Olhei para o teto branco e uma onde de lembranças tombou minha mente de uma forma avassaladora que parecia uma projeção de mais um dia ruim em minha vida.

O sol adentrava a janela do meu quarto, me espreguicei e abri meus olhos devagar enquanto ouvia o canto dos passarinhos do lado de fora. Sentei-me devagar e me levantei, segui para o banheiro e tomei o costumeiro banho. A água quente de manhã cedo me ajudava apensar e a relaxar então eu acabava ficando muito tempo perdido em meus pensamentos naquele lugar. Quando terminei, me dirigi ao meu quarto, em cima da cama havia um cartão e um a rosa que dizia:

“Quando estou com você todas as minhas duvidas se vão, e só tenho a certeza de que é com você que eu quero ficar. Amo-te. – Marcos”.

Dei um breve sorriso, e guardei o bilhete em uma das gavetas da minha escrivaninha, eu não sabia como, mas ele sempre deixava um bilhete para mim todas as manhãs. Era impressionante. Como ele conseguia entrar no meu quarto sem ao menos me beijar? Eu não conseguiria fazer o mesmo com ele. Porque apesar de todos os meus esforços para me manter na minha zona de tranquilidade eu estava amando de novo. Eu não esperava sentir nada por ele, não esperava amar como eu o amo agora. E isso me da um pouco de medo, mas a felicidade que tenho com ele sobrepuseram qualquer duvida enquanto ele provasse que me amava.

 Fui ate o guarda roupa e peguei uma bermuda jeans azul em um quase preto e uma camiseta branca, calcei meu tênis e sai de casa. A manhã estava calma e tranquila apesar da movimentação por causa do Halloween. Alem de ser o dia das bruxas era aniversario de uma amiga e eu tinha que lhe dar alguma coisa e como eu sempre gostei de um bom livro e a Mary também resolvi ir a uma livraria nova para comprar algo decente tanto para ela quanto para mim.

Segui pela avenida principal observando as pessoas ate que cheguei na livraria, entrei e comecei a vasculhar as estantes de livros, haviam vários títulos e um deles me chamou a atenção “Por Você” olhei para  a capa e li a sinopse parecia bom então o coloquei debaixo do braço e continuei a minha busca pelo livro para dar de presente.

- Posso ajudar? – disse um rapaz sorrindo para mim de forma simpática.

Ele era alto, tinha cerca de um metro e oitenta, pele alva e com um sorriso largo. Vestia uma calça jeans e uma camisa vermelha, calçava um All Star preto surrado, mas que lhe dava algum charme, seus olhos eram castanhos e seus cabelos eram curtos. Seus olhos me analisavam então sorri de volta.

- Algo para dar de presente.

- Acho que tenho o que procura. –disse ele rindo.

Ele caminhou pelos corredores apinhados de livros e sumiu por alguns instante e reapareceu com um livro de capa azul.

- Este é uma ótima opção. – ele estendeu o livro para mim.

Olhei para a capa. Já havia ouvido alguns comentários sobre o livro e ele pareci bom, peguei ele de suas mãos e nossas mãos se tocarão. Ri sem jeito e ele retribuiu, mas parecia estar feliz com o acontecido.

- Eu vou levar – disse por fim.

Ele riu e pegou os livros das minhas mãos.

- Por aqui. – disse ele ainda sorrindo.

O segui ate o balcão e ele o atravessou, passou os livros no leitor de barras e me informou o preço. Paguei e agradeci.

- Volte sempre. – disse ele sorrindo, mas desta vez me olhava nos olhos.

Fiquei vermelho.

- Cla... Claro... – eu disse e sai em direção à saída.

Olhei para trás antes de sai da loja e ele continuava me olhando com o sorriso no rosto, atravessei a porta e caminhei pela avenida sem olhar para trás, mas do nada apareceu um gato preto que pulou em cima da minha abeca me derrubando no chão. O gato guinchou e saiu correndo por entre os carros da avenida movimentada enquanto eu tentava me recolar de pé.

Minha avó sempre dizia que não era um bom sinal ver um gato preto em pleno Halloween, muitas pessoas podem não acreditar, mas eu prefiro acreditar que tudo sem fundo de verdade. E aquele gato não era um bom sinal.

Quando cheguei em casa e adentrei o meu quarto, deixei os livros em cima da escrivaninha e vi mais um bilhete em cima da cama, com um pacote ao seu lado.

“Aceita ser assombrado por mim esta noite? – Marcos”.

Sorri. Abri o pacote e lá estava uma fantasia de elfo. Dei uma gargalhada e pensei:

“É Halloween...”

A festa de Halloween da Arque era um tanto ostentação, algo luxuoso e extravagante. Marcos estava fantasiado de vampiro, bem clichê na verdade. Sedutor e bonito, mas as coisas pareciam diferentes ultimamente. Ele ainda estava comigo, mas parecia distante, ele mal havia ficado comigo ali e já havia se afastado dizendo que precisava cumprimentar a todos, mas percebi que ele passava mais de meia hora com algumas pessoas e me deixara sozinho ali. Nosso relacionamento era apenas de bilhetes ao que parecia e eu estava arrependido de ter ido a essa festa. Deveria ter ficado em casa e assistido a maratona de filmes de terror dos Simpsons na Fox.

Enquanto divagava em meus pensamentos caminhei ate o bar – o garçom era um zumbi – pedi um Martine e me dirigia ao salão quando rapaz de pele alva, que vestia uma camiseta cavada que mostrava seus músculos fantasiado de caveira esbarrou em mim e derramou minha bebida em cima de mim.

- Oh droga! Desculpe-me.

O olhei vagamente e suspirei.

- Não se preocupe, é um bom motivo para ir embora.

Ele me olhou surpreso e deu de ombros, parecia não querer se intrometer na minha vida o que era ótimo já que todos estavam fazendo isso. Ele estendeu a mão e:

- Airton prazer.

- Prazer. Alex. – dei um breve sorriso.

- Eu sinto muito pela bebida. Posso te pagar outra?

- Esquece isso. Foi um prazer. Agora eu tenho que ir.

- Eu realmente sinto muito. – disse ele e tirou a mascara de caveira e pude ver seu rosto.

Era o garoto da livraria.

Ele sorriu para mim e se aproximou me dando um beijo na bochecha.

- Foi bom te ver aqui. – ele sorriu.

- O que faz aqui?

- Fui convidado por alguém que trabalha aqui. Acho que ta interessado em mim.

- E você não esta interessado nessa pessoa?

- Vim porque insistiu muito e não queria ser mal educado. Pareceu que queria muito que eu viesse para cá hoje.

- Entendo.

- Então eu vou indo. Preciso encontra-lo. Mas ganhei a noite. - disse ele em meio a um sorriso maroto.

- Ganhou? – disse confuso.

- Sim. Porque vi você de novo. – disse ele piscando enquanto se afastava acenando em sinal de ate logo.

Caminhei entre as pessoas e segui pela escadaria ate o segundo andar, entrei no banheiro e olhei para a minha fantasia. Eu estava na pior das hipóteses muito infantil, não eu estava mais do que isso. Limpei a bebida com papel umedecido e desci as escadas, mas algo em meio aquele amontoado de gente me chamou a atenção.

Marcos.

Mas ele não estava sozinho. Ele estava com...

Airton.

Os dois pareciam conversar animadamente, mas algo em meu corpo começou a se contorcer, fiquei gelado e meus pulmões não queriam me deixar respirar. Airton falava cada vez mais perto de Marcos e ele não se importava e então o que eu já esperava aconteceu.

Marcos o puxou e o beijou. Seus braços se entrelaçaram na cintura dele e o apertou contra seu corpo. Suas mãos passeavam pela sua cintura enquanto o garoto da livraria o retribuía. Foi Marcos quem convidou ele, e esse era o cara que Airton havia me falado. Esse era o motivo de todo o distanciamento. Eu não era mais necessário, meu prazo de validade havia acabado e mais uma vez senti o golpe penetrar em meu coração. As feridas se reabriram com mais força, as lagrimas quiseram cair pelo rosto, mas eu não faria aquilo ali e muito menos iria tirar satisfações com ele. Comecei a descer as escadas rapidamente e esbarrei em alguém.

- Esta tudo bem? – um garoto com mascara prateada me perguntou.

- Estou.

O garoto me segurou.

- Não parece, posso te ajudar?

- Ninguém pode. – disse eu já deixando as lagrimas caírem pelo rosto.

Então o garoto me abraçou.

- Vai ficar tudo bem. – dizia ele.

Afastei-me dele. Não o olhei por muito tempo, apenas dei um meneio de cabeça e continuei a descer as escadas. Mas meu corpo estava agindo estranho e o ar que eu tanto precisava começou a sumir e como consequência, tombei na escada e rolei por ela ate chegar ao hall.

Um grito de socorro.

A face de Marcos.

E o garoto de mascara.

Foram as ultimas coisas que eu vi antes de me deixar levar pela escuridão.

Meu coração se apertou novamente. As lagrimas caiam pelo meu rosto. Eu estava cansado. Não queria mais sentir nada daquilo, não queria amar, não queria estar passando por tudo aquilo. Eu queria simplesmente ser feliz, mas é pedir de mais para mim.

A porta do quarto começa a se abrir, os aparelhos apitam de forma estrondosa. O ar me falta. Meu coração se aperta e uma pontada me faz guinchar de dor. Minha visão fica embaçada e vejo apenas um rosto desesperado machado pelas minhas lágrimas e pelo que eu acho justo meu ultimo suspiro.

- Me deixe mor...

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