Música

Como permitira que Any, Sam, Val e João entrassem em seu quarto? Perguntou-se Naty amuada. Desde que eles colocaram o pé em seu quarto não paravam de tentar convence-la a ir para o estúpido baile de Rudá.

— Não vai ter graça sem você — pontuou João, vestido de terno preto, camisa branca social e lustrosos sapatos de bico fino. — Como vou saber se estou dançando bem?

— João, você é um ótimo dançarino — retrucou emburrada.

— Naty, o nosso grupo vai ficar incompleto sem você — Any falou, muito bonita em um vestido branco com detalhes dourados. — Além disso, já lhe arranjamos uma nova companhia. — Any sorriu e olhou para Val, que usava um longo vermelho.

— Lembra-se do meu irmão, André, que faz faculdade na capital? — Ao ver que ela assentia explicou: — Ele veio nos visitar e eu lhe pedi para que fosse seu acompanhante.

— Não quero um acompanhante, não quero ir. Prefiro ficar bem aqui, na minha casa — insistiu.

Deu mil desculpas, justificou de várias formas, mas sempre era rebatida com argumentos das amigas. Por fim, cansada de lutar contra, suspirou vencida.

— Tudo bem, mas só ficarei por alguns minutos.

— Eu aposto que você vai adorar o baile — Any profetizou dando palminhas empolgadas.

— Por favor, chega de aposta — exigiu melancólica.

— Certo — Any ficou séria por um segundo, mas quando Naty se afastou para se trocar, sorriu amplamente para os amigos e voltou a bater de leve as mãos em comemoração. Seu plano caminhava para o sucesso.

Em poucos minutos, já usando o vestido que lhe caiu muito bem, Naty deixou-se arrumar pelas amigas. Any a maquiou com esmero e Val prendeu seus rebeldes cachos acobreados no alto da cabeça formando uma cascata de fios vermelhos.

— Está linda! — Sam a felicitou.

Ao se olhar no espelho, Naty ajustou os óculos e assentiu em uma concordância carregada de frieza. Ao seguir as amigas escada abaixo foi recepcionada por João, que descera assim que ela falara que ia se trocar, e o par que suas amigas lhe arranjaram, o irmão mais velho das gêmeas, André.

— Me sinto honrado por levar uma jovem tão linda ao baile — ele falou com um sorriso galanteador.

— Obrigada — agradeceu sem empolgação. Para ela todos os elogios eram vazios, inúteis e incômodos.

— Vamos logo pessoal! — ordenou Any saindo da casa sendo seguida pelos demais. — O baile vai ser sensacional, o melhor das nossas vidas.

Naty torceu o nariz, irritada com o otimismo da amiga, cruzou os braços em frente ao corpo e, em silêncio, acompanhou o grupo surpreendendo-se ao ver três carros parados em frente a sua casa.

No primeiro, um vermelho, o motorista era Marcos, irmão mais velho de Any, com Val ao seu lado, Davi e Clara no banco de passageiros. João saiu com Kassy no Mercedes prateado do pai dela, dirigido por um motorista da família. De picape, Cícero aceitou levar Fernando, Sam, Flor e Zack. Any foi de moto com Chris. Seguiram como uma comitiva para o colégio, onde já estavam reunidos vários habitantes de Rudá.

O salão estava todo enfeitado nos tons de branco e vermelho, no teto vários balões em forma de coração, principalmente acima do palco, aonde uma banda de alunos da escola iriam se apresentar ao vivo, por enquanto a música saia de várias caixas de som espalhadas pelas quadras. A pista de dança era iluminada por luzes vermelhas e, ao seu redor, ficavam as barracas de comida e bebidas. Várias pessoas já ocupavam as arquibancadas com seus lanches e bebidas em mãos.

Seguindo os amigos, Naty reparou que tinham colocado algumas mesas redondas de plástico perto do palco depois do dia que tinham ajudado Clara. Foi para lá que seguiram. Naty sentou-se entre André e João. Nas mesas ao lado estavam seus amigos, todos empolgados com aquele dia.

— Podemos nos sentar aqui? — pediu Any acompanhada por Chris.

— Tem espaço para todos — respondeu André puxando novas cadeiras para os dois novos ocupantes da mesa.

— Logo a banda vai chegar e teremos música ao vivo, quero vê-la dançar muito Naty — ordenou Any, acrescentando para André: — Ela é ótima dançarina, até me ensinou alguns passos.

— Aprendi tudo com minha avó — contou com orgulho. — Ela dava aulas antes de machucar o quadril anos atrás. Agora ela mora afastada da cidade.

— Tive aulas com ela na adolescência — lembrou André. — Na época você não tinha mais que uns seis anos.

— Verdade — Naty sorriu. — Lembro que eu e Carol, a filha mais velha do prefeito, ficávamos o observando dançar. Ela sempre foi apaixonada por você, dizia até que se casariam — soltou aleatoriamente.

André riu.

— Falando nela, ainda não a vi.

— Ela e a filha de sua madrasta estão passando um tempo na fazenda da família.

Ao som de músicas do momento, conversaram sobre vários assuntos, a maioria contendo lembranças de infância entre eles. Naty estava tão distraída que pensou muito pouco em William e na aposta, deixando-se levar pela conversa.

Às vezes, quando o assunto não a incluía ou tocavam alguma balada romântica, que enchia o salão de casais, Naty se distraia olhando ao redor. Apesar de ter resistido à ideia, era bom apreciar o que tinham feito e gostava de observar os outros, até mesmo os pares dançando no centro do salão, seguindo a cadencia das melodias.

Estava tão distraída ouvindo os comentários a respeito da vida acadêmica de André que só foi notar que o palco seria usado, quando luzes fortes reservadas para iluminar os músicos atingiram a mesa que ocupava. Piscou, reclamando mentalmente por terem colocado as mesas tão perto do palco.

Observou a banda se arrumar e, assim que os primeiros acordes foram dados, Naty reconheceu de imediato que tocariam "She's like the Wind", música que fazia parte da trilha sonora de Darty Dancing, seu filme predileto. Aguardou ansiosa pela canção consagrada na voz maravilhosa do, lindíssimo, ator Patrick Swayze, e que fazia parte da cena que arrancava lágrimas e suspiros dela toda vez que assistia.

Foi então que Naty viu William caminhando pelo palco, a luz de um forte holofote acompanhando-o até o microfone. Ainda amargurada, decidiu ir embora, mas percebeu surpresa que seus amigos tinham sido mais rápidos, se levantado e se posicionados as suas costas. Fernando lhe segurava o ombro esquerdo, Davi o direito e Chris mantinha as mãos em ambos, os três fazendo com que ela não pudesse se erguer e partir do salão.

— O que pensam que estão fazendo? — perguntou irritada sem conseguir se mover, pois seus lados também eram bloqueados por André e João.

— Calma, Naty! Só queremos ajudar — Chris se explicou pelos outros rapazes.

Olhou alarmada para os lados, em busca da ajuda das amigas, mas todas sorriam como se nada demais estivesse acontecendo. Até André, que, até onde ela sabia, desconhecia a aposta, não parecia inclinado a ajuda-la de alguma forma.

— Ouça, Naty! — Any aconselhou, o dedo indicador apontando para o palco.

Foi então que percebeu, acompanhando a cadência da música, William trocara a letra por uma versão em português. Como sabia a letra da tradução, também pode notar que ele usara aquele momento para fazer uma declaração, um pedido público de desculpas.

Naty, me perdoe.

Fui um idiota, um imbecil.

Fiz algo imperdoável.

Mas eu te amo muito.

Por favor,

Perdoe-me, pois errei.

Quis seduzir,

Mas acabei assim

Amando-te loucamente,

Sem você não sou nada

Sei que te magoei,

Mas foi sem querer.

Perdoe-me.

Naty sentiu as lágrimas rolarem por seu rosto. Nunca imaginara que algo assim, tão singelo e bonito, que ela só vira em filmes, fosse acontecer com ela. Seus olhos estavam focalizados em Willi, que também mantinha os olhos nela enquanto continuava a cantar sua versão:

Acredite em mim, essa aposta acabou assim que descobri que

Sou louco por você

Nessa história infeliz

A Fera fui eu

Que te machuquei

E também me machuquei.

Quis seduzir,

Mas acabei assim

Amando-te loucamente

Sem você não sou nada

Sei que te magoei,

Mas foi sem querer

Perdoe-me.

Sei que te magoei, mas me perdoe, Eu Te Amo.

Com os olhos turvos de água, Naty notou que um holofote em tom de vermelho estava mirando nela, provavelmente fazendo com que todos olhassem em sua direção.

No palco, Willi a encarava com o rosto aflito, na expectativa de qual seria sua reação.

— Perdoa ele, Naty — Any pediu alto, dando inicio a torcida para William.

— Ele está arrependido — acrescentou Clara pelo microfone, posicionada ao lado do rapaz em pé no palco com os olhos fixos em Naty.

— Tem que estar bem apaixonado para fazer uma coisa dessas — algum garoto gritou ao fundo.

— Perdoa Naty — gritou uma garota, seguida por várias outras pessoas.

As mãos, que a prendiam durante toda a declaração, soltaram seus ombros. Ela podia ir para onde bem entendesse e, emocionada, Naty se levantou e andou determinada até o palco, sem perder Willi de vista, cada passo seu sendo seguido e iluminado pelo holofote avermelhado.

Para ela só existia ele e o amor que sentia por ele, mais nada. Subiu no palco e, parando a alguns passos de Willi, ajeitou os óculos, um claro sinal de seu nervosismo, e sorriu.

— Fui uma idiota, não é?

Vencendo a distancia entre eles, Willi a abraçou, sentindo toda a tensão indo embora.

— Não, eu que fui um idiota por ter feito aquela aposta estúpida — ele respondeu contra seus cabelos.

— Eu o tratei muito mal...

— Eu mereci — ele disse e afastou o rosto para olha-la. — Me perdoe, Naty. Fui um idiota esse tempo todo, menti por muito tempo e sobre várias coisas, menos sobre a mais importante: Eu estou totalmente apaixonado por você.

Naty sorriu, um engasgo saindo junto da risada baixa, as lágrimas chegando a sua boca, o gosto salgado em sua língua.

— Parem de falar e se beijem — ouviu alguém gritar, o que fez ambos olharem na direção da voz.

— É isso ai — concordou alguém ao fundo, sendo acompanhado pelo coro de várias pessoas ao redor.

— Beija, beija, beija.

Natasha voltou a olhar para William.

— Acho que eles querem mais que música romântica.

— Talvez um passo ousado? Acho que consigo te segurar no ar.

Naty riu.

— Podemos dar a eles algo bem mais simples e melhor.

— Melhor? — ele sorriu com amor e malícia. — Como?

— Assim...

Sorrindo um para o outro, se beijaram apaixonado. Perdidos nos lábios e nos braços um do outro, felizes por estarem juntos novamente, nem se deram conta da salva de palmas que tomou conta do salão. Estavam absortos somente no amor que sentiam um pelo outro.

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